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Análise Social
versão impressa ISSN 0003-2573
Anál. Social no.227 Lisboa jun. 2018
https://doi.org/10.31447/AS00032573.2018227.09
ARTIGOS
Identidade, ideias e normas na construção dos interesses em política externa: o caso português
Identity, ideas and norms in the construction of foreign policy interests: the Portuguese case
Pedro Emanuel Mendes*
*Instituto Português de Relações Internacionais, Universidade Nova de Lisboa. Rua de Dona Estefânia, 195, 5.º D - 1000-155 Lisboa, Portugal. pemanuelmendes@gmail.com
RESUMO
Este artigo desenvolve uma argumentação construtivista eclética sobre o papel da identidade, das ideias e das normas na definição dos interesses em política externa. Começa por expor as limitações do modo excessivamente materialista e estático das análises racionalistas sobre os interesses dos Estados. Depois, discute a importância da construção social das identidades e dos interesses e da sua inter-relação com a estrutura social e normativa da ordem internacional. Finalmente, advoga a necessidade de uma abordagem sociocultural sobre os interesses e apresenta um novo modelo de análise da política externa dos Estados, que aplica ao caso português.
PALAVRAS-CHAVE: análise da política externa; construtivismo; Portugal; identidade.
ABSTRACT
This article develops an eclectic constructivist argument about the role of identity, ideas, and norms in the definition of Portugal's foreign policy interests. It begins by exposing the limitations of the excessively materialistic and static way of rationalizing states' interests. Then it discusses the importance of the social construction of identities and interests and their interrelation with the social and normative structure of the international order. Lastly, it advocates the need for a socio-cultural approach regarding interests, and presents a new model for foreign policy analysis that applies to the Portuguese case.
KEYWORDS: foreign policy analysis; constructivism; Portugal; identity.
INTRODUÇÃO
Este artigo desenvolve uma argumentação alternativa às tradicionais visões racionalistas sobre as fontes de comportamento dos Estados em política externa. Apresenta uma abordagem construtivista eclética que, sem negar a importância dos fatores materiais, assume a identidade, as ideias e as normas como elementos indispensáveis para melhor compreendermos a política externa dos Estados. Propõe um modelo sociocultural da política externa que explica as dinâmicas de (re)construção das identidades e respetivos interesses dos Estados e dá o caso português como exemplo.
A política externa é a política pública que expressa de forma mais completa a identidade política do Estado. Os discursos dos líderes sobre a política externa estão constantemente impregnados de sentimentos subjetivos relativos a costumes, instituições, territórios, mitos e rituais reveladores de uma especificidade cultural e identitária. Estas manifestações da identidade moldam as perceções dos decisores sobre o passado e o presente da inserção internacional dos Estados, bem como as suas futuras escolhas e opções de política externa. A identidade do Estado é a base constitutiva da sua cultura política e do estilo nacional da sua política externa. São as ideias e valores culturais do Estado que, interpretadas como um "belief system" (Schafer e Walker, 2006), fundamentam as doutrinas da política externa dos Estados.
As imagens e as ideias sobre quem somos e como nos situamos no mundo servem como guias essenciais para a construção das visões do mundo dos decisores e agentes diplomáticos na sua ação política. Estas imagens culturais[1] funcionam como lentes conceptuais através das quais os atores da política externa percecionam as relações internacionais e tendem a formatar aquilo que eles próprios passam a considerar como a mais racional política externa.
A questão que este trabalho coloca não é a de saber se os fatores materiais são importantes em política externa. Para uma análise sofisticada sobre a política externa, esta é uma pergunta errada. Os fatores materiais contam e estão sempre presentes na construção da política externa dos Estados. O problema que aqui discutimos não é o de saber se os interesses materiais prevalecem sobre as ideias, normas e identidades, ou vice-versa, mas sim de que modo as ideias, identidades e normas influenciam a forma como os atores escolhem e definem os seus interesses.
A questão fundamental é saber se os interesses podem ser explicados unicamente por fatores materiais, e isoladamente dos fatores ideacionais, ou se, pelo contrário, estes fatores têm necessariamente de ser tidos em conta para compreendermos melhor os processos de formação de interesses e de implementação das políticas.
O artigo começa por expor as limitações do modo excessivamente materialista e estático da visão racionalista sobre os interesses na formulação da política externa. Depois, discute a importância de assumirmos a construção social das identidades e dos interesses em política externa e a sua inter-relação com a estrutura social e normativa da ordem internacional. Posteriormente, enfatiza a importância de uma visão ideacional, menos económica, e mais sociológica, sobre os interesses e apresenta um modelo de análise que sintetiza os principais fatores presentes na construção da política externa dos Estados. Finalmente, em função da discussão teórica proposta,[2] dá o exemplo português como um caso significativo da relação dinâmica entre política externa, identidade e construção de imagens e interesses nacionais.
O seu principal objetivo é o de demonstrar que para compreendermos o processo dinâmico de construção social dos interesses e preferências da política externa dos Estados, nomeadamente da política externa portuguesa contemporânea, é necessário uma abordagem sociocultural que interligue os fatores ideacionais e materiais. Neste quadro, o primeiro argumento apresentado é que os interesses são produtos das identidades dos Estados. O segundo argumento é que as identidades não são estáticas. As preferências e interesses dos Estados resultam de processos de construção identitários que dependem do seu contexto histórico, social, cultural e político.
A CONSTRUÇÃO DOS INTERESSES DOS ESTADOS: O OBJETIVISMO MATERIAL DO RACIONALISMO E O IDEALISMO INTERSUBJETIVO DO CONSTRUTIVISMO
Em Relações Internacionais (RI), instituiu-se um debate teórico importante entre o racionalismo e o construtivismo (Mendes, 2012a). Este debate reflete duas visões gerais sobre a forma como os Estados definem e constroem os seus interesses.[3] O racionalismo engloba as tradições teóricas que, partindo da rational choice, explicam o comportamento dos decisores com base na visão utilitária de maximização dos interesses materiais. Em RI, o racionalismo inclui os desenvolvimentos da teoria dos jogos e, sobretudo, a visão positivista e instrumental da explicação da política externa dos Estados em termos de "goal-seeking behaviour" (Snidal, 2013, p. 87). As abordagens racionalistas explicam o comportamento dos atores nas relações internacionais através de uma assunção básica, sintetizada na seguinte fórmula: "Desire + Belief = Action" (Fearon e Wendt, 2002, p. 59). O racionalismo expressa a perspetiva clássica do homo economicus, ou seja, o ator é uma entidade calculista que analisa cuidadosamente as várias opções de ação e escolhe aquela que for a mais eficiente para atingir os seus objetivos (Mendes, 2007).
Esta perspetiva racionalista objetivista, de obtenção de resultados materiais, teve o seu corolário com a invenção do realismo, a teoria dominante no período de formação das RI (Mendes, 2014 e 2017a). Com o realismo, as RI passaram a ser a disciplina que explicava o comportamento dos Estados com base na racional busca pelo poder. Mesmo os posteriores desenvolvimentos racionalistas, teoricamente mais sofisticados, concordavam numa ideia essencial: a existência de uma estrutural lógica competitiva de poder material na política internacional. Aqui, o poder, entendido convencionalmente como capacidades materiais, era a principal determinante da formação dos interesses e comportamento dos Estados. Apesar de existirem exceções, em regra as explicações sobre a política internacional corroboravam as ideias parcimoniosas e dominantes do neorrealismo e do neoliberalismo assentes na máxima: todos os Estados querem Poder, Segurança e Riqueza (PSR). Estas ideias racionalistas não são incorretas. Todavia, podemos com igual grau de certeza afirmar que são claramente incompletas, podendo mesmo ser tautologicamente mistificadoras.
Ao não considerarem os aspetos constitutivos e histórico-sociais da construção da política internacional, as análises realistas tradicionais apresentam limitações.[4] Mais do que explicações sobre a formação dos interesses, as teorias realistas sobre a busca do poder são, sobretudo, uma descrição[5] sobre um tipo de comportamento existente na política internacional que necessita de ser mais bem explicado (Vasquez, 1998). Contudo, é inegável o poder empático[6] de muitas das teorias racionalistas, desde logo o realismo. Na prática, precisamente porque os decisores acreditam que o mundo funciona basicamente através de uma aritmética material relativa à busca de PSR, em grande medida as relações internacionais funcionam de acordo com este modo de pensar e agir dos atores. É o que designamos de síndroma cartesiano da política: penso logo ajo.
Muitas decisões em política externa não podem ser explicáveis se não levarmos em linha de conta a lógica racionalista e consequencial de maximização de interesses e distribuição de poder material da estrutura internacional. É tradicional, na teoria e prática da política externa, os analistas e decisores assumirem visões racionalistas otimizadoras de um interesse nacional abstrato, neo-funcional, ligado a um conjunto de princípios básicos relativos aos objetivos de sobrevivência, adaptação e obtenção de poder dos Estados. Este interesse nacional resulta da identidade corporativa do Estado (Wendt, 1999). Por isso, existe um interesse nacional universal intrínseco à qualidade das entidades estatais. Assumir esta ideia objetivista, segundo a qual todos os Estados têm alguns interesses nacionais básicos objetivos - sobrevivência, autonomia, bem-estar económico, autoestima coletiva, não significa deixar de perceber que para perseguir estes interesses objetivos, na prática, os Estados definem políticas que são determinadas por interesses subjetivos (Wendt, 1999, pp. 234-235). Ainda que seja possível identificar um universal interesse nacional mínimo na política externa dos Estados, a realidade é que todos os Estados têm a sua política externa que, por definição, é uma política que exprime interesses nacionais particulares face aos outros Estados. Mesmo este interesse nacional mínimo não pode ser desligado das perceções e construções identitárias particulares e históricas de cada Estado. Em abstrato, existem alguns interesses nacionais relativamente estáveis, na prática, todos os interesses dos Estados são construídos socialmente e resultado de um processo histórico e contingencial, em que o ambiente cultural, institucional e ideacional dos decisores políticos são decisivos, como o nosso caso demonstra.
Para compreendermos melhor a formação dos interesses não podemos limitar-nos às explicações tradicionais, excessivamente objetivistas, materialistas e estáticas. Sobretudo, não devemos explicar as preferências e formação de interesses dos Estados, mesmo os óbvios interesses materiais de PSR, numa lógica dicotómica entre o poder e as ideias.
Ao contrário do naturalismo ontológico de grande parte dos racionalistas, a abordagem construtivista enfatiza a importância dos fatores ideacionais na construção dos interesses, práticas e instituições da política internacional e não assume o mundo como uma materialização estática e associal. Para o construtivismo, o mundo não é estático e natural, mas sim emergente e histórico. A ordem internacional é dinâmica e definida por estruturas e agentes através de processos interdependentes, intersubjetivos e coletivamente construídos (Carlsnaes, 2012; Mendes, 2016a; 2018).
Os interesses dos Estados não são constatações naturais, são contingentes e diretamente relacionados com os projetos políticos relativos aos processos de construção nacional e identitária dos Estados. Os interesses são construídos por um processo de interação social (Katzenstein, 1996, p. 2). Este processo é um jogo dinâmico em que os fatores ideacionais se interligam com fatores materiais numa determinada conjuntura cultural e política. Como o nosso modelo defende, os interesses devem ser compreendidos como o resultado da relação que se estabelece entre fatores ideacionais cognitivos individuais e fatores sociais, culturais e normativos coletivos.
Obviamente que em política externa existem importantes decisões de imposição de poder ligadas a um cálculo geoestratégico de fatores materiais. Mas não parece ser menos óbvio que os seus processos de formulação, e os seus efeitos, estão envolvidos em ambientes ideacionais intersubjetivos (Mendes, 2016a). Os interesses materiais não existem independentemente da interpretação dos atores. Da mesma forma que os factos, os fatores materiais da ordem internacional "do not speak for themselves" (Hanson, apud Thasnberg, 2006, p. 28), têm de ser interpretados. Ao contrário do materialismo naturalista do realismo[7], que assume que as estruturas fundamentais da ordem internacional são puramente materiais, é essencial perceber que as estruturas internacionais, mesmo as que implicam poder material, são construções sociais intersubjetivas.
Para contarmos melhores histórias sobre a política externa dos Estados devemos ter em conta não apenas a lógica explicativa consequencial dos jogos instrumentais, racionais e estruturais, de busca de PSR, mas também as explicações constitutivas, ideacionais, sociais e agenciais de construção dos interesses (Weldes, 1996; Kowert, 2010; Adler e Pouliot, 2011; Mendes, 2018). Para além dos fatores materiais devemos prestar atenção aos seguintes fatores ideacionais e sociais:
a) construção ideacional dos interesses (ideias);
b) construção dinâmica, social e interrelacional dos agentes (identidade);
c) papel e influência das regras e princípios normativos (normas);
d) importância dos contextos, hábitos culturais e rotinas institucionais (práticas).
O PAPEL DA IDENTIDADE NA (RE)CONSTRUÇÃO DOS INTERESSES
Para as abordagens racionalistas tradicionais as identidades e os interesses dos Estados são assumidos de uma forma apriorística, homogénea e não problemática. Tanto o neoliberalismo como o neorrealismo apresentam os interesses dos Estados de forma exógena, como adquiridos, e não os conseguem explicar nem prever convenientemente (Keohane, 1993, p. 285). Sobretudo o realismo tende a assumir as identidades e os interesses dos Estados na política internacional como relativamente invariáveis ao longo do tempo e do espaço. O que é sublinhado é que todos os atores da política internacional têm um poderoso e imutável fator identitário: o interesse próprio e egoísta dos Estados de busca de PSR.
O construtivismo não nega a importância dos Estados perseguirem PSR. O que diz é que não podemos explicar os desejos de poder material dos Estados de uma forma não social. Para compreendermos e explicarmos os interesses de PSR temos de ter em conta a sua construção social, os seus ambientes ideacionais, identitários e culturais. O nosso modelo não contraria o argumento que os interesses dos Estados partem de expectativas autocentradas e, essencialmente, egoístas, nem que os interesses são constrangidos por fatores materiais e pelo interesse básico de autopreservação. O que argumentamos é que mais do que os puros fatores materiais de poder, o que conta é a sua interpretação intersubjetiva e a sua respetiva assunção partilhada (Mendes, 2018).
Os interesses não nascem naturalmente, são socialmente construídos, desde logo através da identidade. Para explicar os interesses da política externa dos Estados temos de compreender, em primeiro lugar, o papel constitutivo da identidade. As identidades são anteriores à formação dos interesses e têm efeitos constitutivos na definição dos interesses em política externa (Jepperson, Wendt e Katzenstein, 1996, p. 65). Os Estados desenvolvem interesses diretamente ligados às suas identidades políticas particulares e mesmo as identidades ideológicas do jogo da política interna podem ser refletidas na formação de interesses na política externa (Mendes, 2004; 2013).
As identidades dos Estados emergem historicamente e resultam das interações com diferentes ambientes sociais, simultaneamente domésticos e internacionais. As identidades constroem nacionalmente os Estados e são cruciais para podermos compreender melhor os processos políticos que estão na origem da formação dos interesses ligados à definição da política externa. Como as identidades e os interesses dos Estados são variáveis, devemos analisar os interesses e preferências dos Estados em função da evolução dos contextos históricos.
Diferentemente do que defendem as teorias mais tradicionais, as fontes socioculturais da política externa são dinâmicas e podem ser objeto de mudança. Os Estados não são unitários, mas constituídos por um conjunto variado de grupos sociais com interesses e preferências identitárias diferenciadas. Os Estados sofrem transições políticas que afetam a sua cultura política e a consequente identidade da sua política externa. Em circunstâncias históricas particulares ocorrem transformações que têm impactos tão profundos nos Estados que podem levar a redefinições na identidade, preferências e interesses das suas políticas externas. Numa sociedade nacional nem sempre todos têm necessariamente de apoiar as decisões dos seus governos, nem interpretar a sua identidade política de uma forma unitária. Em determinados momentos existem fossos de credibilidade na cultura política do Estado que originam o surgimento de interpretações identitárias e de sentidos históricos diferentes e competitivos entre si.[8]
Da mesma forma, na sociedade internacional existem atores com identidades diferenciadas. Estas identidades influenciam a forma como os Estados constroem os interesses e interpretam os próprios fatores de poder. Mesmo o poder material hierárquico presente nas relações internacionais é conexo com as práticas sociais que constantemente constroem, solidificam e reproduzem as identidades dos atores na política internacional. Muitas vezes independentemente da quantificação do poder material, os atores definem interesses e políticas que, mais do que a busca objetiva e racional de PSR, traduzem perceções e visões ideológicas subjetivas sobre o que os decisores pensam e interpretam como sendo o interesse racional dos Estados.[9]
Os Estados interiorizam e reproduzem identidades diferenciadas no jogo da política internacional e nas respetivas políticas externas. Identidades específicas, como no caso do Estado Novo - um Estado Autoritário, Imperial e Autárcico - ou identidades gerais como a potência hegemónica; o inimigo; o aliado; o infrator das normas internacionais, o defensor dos Direitos Humanos, etc. Isto significa que a forma como os Estados se autodefinem e definem os outros tem consequências comportamentais. As identidades que os Estados assumem têm implicações importantes na forma como estes agem e reagem na política internacional. Todo o comportamento em política externa só é possível e inteligível no âmbito de um contexto social e cultural intersubjetivo. Os diversos atores do sistema internacional desenvolvem as suas relações com outros atores através da construção de identidades e das consequentes normas e práticas que vão mediar os seus comportamentos.[10]
O PAPEL DA SOCIALIZAÇÃO NORMATIVA INTERNACIONAL
As explicações racionalistas sublinham, bem, a importância da distribuição de poder material para a explicação da política externa dos Estados. Todavia, para uma completa compreensão dos seus interesses, é necessário ir além das explicações materiais da estrutura internacional: o famoso "poder estrutural" (Guzzini, 2013). Não basta investigar e compreender a estrutura internacional de poder material, é fundamental ter em consideração a estrutura internacional normativa, as suas ideias, normas e práticas sociais: os seus significados coletivos (Onuf, 1989; Wendt, 1999; Adler, 2013; Mendes, 2018).
É verdade que os Estados querem PSR, mas não é menos verdade que não podemos compreender o que os Estados querem sem termos em consideração a estrutura sociocultural, interna e internacional, de que fazem parte. Os Estados são atores sociais embebidos em redes sociais que influenciam e moldam as suas perceções do mundo, bem como os papéis que aí desempenham. Os Estados são socializados a quererem determinadas coisas (Wendt, 1999; Smith, 2001; Johnston, 2008). O que estes querem não pode ser desligado da estrutura social e normativa da ordem internacional que os envolve e do processo de construção histórico-social de determinada ordem internacional. Neste processo, as preferências e interesses dos Estados vão ser influenciados por redes normativas - políticas, sociais e institucionais - que compõem a sociedade internacional e em que os decisores e os seus públicos participam e interagem socialmente (Finnemore, 1996c, p. 2).[11]
À medida que as elites nacionais interagem com o ambiente internacional, começam a adquirir conhecimento das normas internacionais, bem como um entendimento das políticas, preferências e práticas que os líderes e elites internacionais estabelecem entre si. O conhecimento destas normas internacionais, e a sua relação com as políticas externas dos seus Estados apresentam-se às elites nacionais como opções de conformidade ou desconformidade.
A política externa de um Estado pode rejeitar a estrutura normativa da sociedade internacional e assumir um conjunto de preferências e interesses que não são conformes às normas internacionais. Quando isto acontece, o Estado tende a ter uma política externa isolacionista ou especial[12] que, de qualquer forma, sofrerá consequências negativas por não estar conforme às normas internacionais. Ao contrário, as elites políticas podem alterar as ideias sobre a sua política externa e elaborar uma nova doutrina que esteja de acordo com as normas internacionais, como aconteceu com Portugal na sua transição democrática (Mendes, 2004; 2012b).
As elites podem optar por uma reconstrução das ideias políticas e dos consequentes interesses das sua políticas externas, de modo a ultrapassarem as consequências negativas relativas à não conformidade com as normas internacionais, e passarem a utilizar a conformidade com tais regras como mais um argumento para tentarem maximizar os seus interesses.[13]
Para além do papel desempenhado pelo contexto político interno e internacional na definição dos interesses, é fundamental assumir a importância do contexto normativo internacional. Este contexto é baseado na influência e disseminação das normas que estruturam as regras do comportamento adequado e influencia o comportamento dos decisores e das suas sociedades civis.[14]
Por outro lado, o contexto normativo internacional é dinâmico e vai sofrendo alterações à medida que as normas e os valores internacionais aceites e legítimos mudam. Estas mudanças criam muitas vezes condições para alterações coordenadas e conjuntas nos interesses e comportamentos dos Estados nas relações internacionais. Para além de estarem ligados a pressões externas ou a exigências domésticas, os interesses dos Estados são moldados pela vivência partilhada das normas internacionais[15] que estruturam e dão sentido às relações internacionais (Finnemore 1996a, 1996c; Acharya, 2012).
As normas dizem respeito às ideias e expectativas coletivas sobre o comportamento apropriado dos atores dentro de uma determinada identidade (Katzenstein, 1996, p. 5; Finnemore e Sikkink, 1998, p. 891), definem os padrões do comportamento legítimo e refletem não só o que os Estados fazem, mas também o que devem fazer. Independente da sua maior ou menor eficácia, as normas influenciam o conjunto de valores, regras, leis e práticas que estruturam a política internacional e ajudam a explicar a natureza e o modo de funcionamento da sociedade internacional. Como elementos não materiais da estrutura internacional, estas refletem a evolução das ideias e princípios legítimos sobre o comportamento adequado (Risse, Ropp e Sikkink, 2013).
Embora existam vários tipos de normas, em geral desempenham duas funções essenciais: funções constitutivas e funções regulativas (Kowert e Legro, 1996; Kratochwil, 1989; Goertz, 2003). Podendo desempenhar estas duas funções de forma simultânea, em primeiro lugar as normas operam como regras que definem e constituem a identidade dos atores. Têm efeitos constitutivos na invenção das próprias regras do jogo. Noutras situações, operam como especificadoras do comportamento legítimo, determinando o que se pode ou não fazer num determinado jogo. Têm efeitos regulativos, pois definem e regulam padrões de comportamento adequado.
A influência das normas é variável e depende de vários fatores[16], mas existem duas condições básicas para a sua influência: o seu grau de especificidade e de aceitação partilhada (Legro,1997, pp. 34-35). Primeiro, uma norma é tanto mais influente quanto mais clara e específica for a sua discriminação entre o comportamento apropriado e o inapropriado. Segundo, uma norma é tanto mais influente no comportamento dos atores quanto maior for a sua capacidade de se difundir, tornar comum e abrangente.
Para uma explicação sociocultural da política externa devemos prestar atenção às normas que claramente discriminam entre o comportamento adequado e inadequado e, ao mesmo tempo, têm um elevado grau de aceitação comum. Ao nível interno, uma alta aceitação comum é indicada pela institucionalização das normas na ordem constitucional do Estado, bem como pelo consenso alargado entre os partidos políticos representados no parlamento. Ao nível internacional, a existência de uma aceitação partilhada de valores e normas sobre o comportamento adequado por um vasta maioria de Estados é considerada decisiva. Tratados, atos legais de organizações internacionais, acordos e outros documentos similares aprovados por uma larga maioria de Estados podem ser um bom indicador da influência das normas.
Embora a implementação e internalização das normas dependa de um processo de socialização (Checkel, 1999; Risse, Ropp e Sikkink, 2013), quando as expectativas sobre valores e normas relativamente ao comportamento adequado são expressas de uma forma simultânea ao nível nacional e internacional, e apontam na mesma direção, é expectável uma forte influência no comportamento do Estado.
A IMPORTÂNCIA DAS IDEIAS: UMA VISÃO SOCIOLÓGICA
A visão não exclusivamente material dos interesses tinha já sido adiantada por alguns trabalhos reunidos no influente Ideas and Foreign Policy (Goldstein e Keohane, 1993). Aqui, é sublinhado o carácter ideacional da formação dos interesses e das políticas e a importância decisiva que as ideias têm, sobretudo ao nível dos agentes, mas também ao nível da institucionalização da estrutura normativa internacional.
De acordo com Goldstein e Keohane (1993), as ideias têm três tipos de impacto na formulação da política externa. Atuam como road maps, servem como focal points na definição de soluções cooperativas, e são decisivas nos processos de institucionalização de normas, práticas e doutrinas.[17]
Vários autores próximos de uma visão racionalista analisam a importância dos fatores ideacionais e o carácter ideológico e interpretativo das elites na definição dos interesses nacionais dos Estados (Snyder, 1991; Walt, 1996; Moravcsik, 2008; Lobell, Ripsman, e Taliaferro, 2009). Nesta ótica, os interesses dos Estados resultam de coligações internas que refletem interesses locais dos líderes políticos e de valores ideológicos que condicionam a perceção dos interesses e preferências da política externa.
Estas análises racionalistas encaram os fatores ideacionais de forma instrumental e privilegiam as explicações materialistas sobre os interesses. Todavia, as identidades, normas e ideologias não servem unicamente propósitos instrumentais (March e Olsen, 1989, 1998, 2004). O comportamento dos atores políticos não é motivado apenas por objetivos a atingir, por uma maximização utilitária.
Os decisores são igualmente motivados pelas suas interpretações relativas ao comportamento adequado e aos papéis que têm de desempenhar para legitimarem as suas ações face às circunstâncias do ambiente político e social. Toda a ação política, desde a mais improvisada à mais estratégica, está embebida num ambiente social que ajuda a constituir a identidade dos atores e molda as normas e práticas que definem os seus interesses e opções.[18] Os processos políticos não são caracterizados simplesmente pelas escolhas e respetivas decisões, mas também, e de forma decisiva, pela criação e administração de visões interpretativas face a estas escolhas (March e Olsen, 1989, p. 51).
Existem duas lógicas de comportamento principais que, em geral, orientam a ação e o comportamento dos decisores: a "logic of expected consequences" e a "logic of appropriateness" (March e Olsen, 1998, pp. 949-952).
Na lógica das consequências, o decisor atua com base no cálculo das diferentes opções, escolhendo aquela que, aparentemente, é a mais eficiente para atingir os seus objetivos.
Na lógica do comportamento apropriado, o decisor atua de acordo com as normas, sejam elas diretamente derivadas de regras e leis jurídicas ou do ambiente identitário e social do decisor.
As decisões não podem ser explicadas apenas com base na lógica de ação tradicional, racional-consequencialista, pois existem diferentes e variadas motivações que conduzem a ação dos decisores. March e Olsen (2004, p. 17) sublinham que o comportamento humano é motivado "by habit, emotion, coercion, and calculated expected utility, as well as interpretation of internalized rules and principles". Uma vez que as ações e decisões não são enquadráveis apenas numa lógica comportamental, é necessário ter em conta as interligações entre diferentes lógicas (March e Olson, 2004). Qualquer tentativa de explicar o comportamento dos decisores deve ter em consideração a diversidade das motivações humanas e das suas lógicas de ação.[19]
O nosso argumento é que uma visão sociológica sobre a explicação dos interesses não significa automaticamente a contradição ou a eliminação de uma visão económica sobre a explicação dos interesses. Significa, isso sim, que muitas vezes uma visão sociológica é imprescindível para complementar a visão económica dos interesses. Tal visão não se limita a assumir os interesses aprioristicamente e introduz importantes determinantes sociais que ajudam a compreender melhor a formação dos interesses, designadamente os contextos culturais, institucionais e identitários dos Estados e das suas elites decisoras (Katzenstein, 1996; Lapid e Kratochwil, 1996).
A construção da política externa é o resultado de um complexo processo de interação entre a sociedade nacional e a sociedade internacional. Todavia, para explicarmos este processo devemos dar particular atenção aos fatores internos: societários, culturais, institucionais e ideológicos. É essencial analisar os fatores percetivos e ideacionais, especialmente a cultura política e as imagens nacionais e internacionais (Boulding, 1969) das elites decisoras. Na sua origem doméstica, as elites nacionais transportam consigo um conjunto de ideias, mais ou menos elaboradas, sobre a política externa do seu país, que podemos designar de doutrinas. Estas doutrinas são influenciadas por questões identitárias normalmente embebidas em mitos culturais, símbolos, valores, crenças, tradições geopolíticas e discursos históricos.
Por isso insistimos na importância das imagens culturais dos decisores e na sua influência na construção das práticas sociais que mútua e simultaneamente constituem as ações dos atores e as regras das estruturas institucionais em que estão embebidos. Embora consequência das identidades e imagens culturais, para uma boa análise da política externa devemos também prestar atenção às práticas e hábitos institucionais dos decisores (Adler e Pouliot, 2011).[20] A influência das ideias ao nível das práticas e hábitos dos decisores poder ser um bom indicador interpretativo, e ultrapassou algumas limitações epistemológicas e operacionais da investigação das ideias. Contudo, o que permanece mais relevante, porque precedente, é a qualidade constitutiva das ideias (Wendt, 1999; Tannenwald, 2005; Adler e Pouliot, 2011). As ideias têm um caráter constitutivo sobre o que os decisores acham que é o mundo e o modo como funciona. O que eu sou e o que quero fazer no mundo depende, em larga medida, das minhas ideias sobre o que penso que é o mundo e o seu modo de funcionamento, designadamente sobre a importância que os fatores materiais desempenham no mundo. Assim, não podemos esquecer o papel constitutivo das ideias na definição dos próprios interesses. O significado do poder material e de muitos dos interesses a ele associados não podem ser desligados das ideias, pois os interesses são funções materializadas de ideias (Wendt, 1999, p. 96).
Na esteira de Goldstein e Keohane (1993), assumimos que as ideias atuam como guias comportamentais e têm consequências na explicação da formulação das políticas externas dos Estados, quer ao nível individual (ideias, valores, perceções ), quer ao nível institucional (doutrinas governamentais, direito e normas internacionais).
Todavia, a nossa proposta refina esta conceção neo-weberiana ao introduzir a importância dos efeitos constitutivos e dinâmicos das ideias (Wendt, 1999; Schmidt, 2008; 2010; 2012; Hay, 2011), das normas (Finnemore, 1996b) e práticas (Adler e Pouliot, 2011) nas imagens culturais (Mendes, 2018) dos atores, e na consequente definição dos seus interesses e preferências. Com esta abordagem, incorporarmos a análise da identidade nacional numa perspetiva sociocultural holística da política externa que permite integrar os aspetos ideacionais individuais, a cultura e os contextos políticos, bem como as estruturas sociais e normativas, nacionais e internacionais.
Neste quadro, o nosso modelo sociocultural assume quatro pressupostos teóricos básicos. Primeiro, os agentes fundamentais na política externa são os decisores, indivíduos que atuam num determinado contexto social: governo nacional; sociedade nacional e internacional e instituições internacionais. Segundo, os interesses e as preferências dos governos têm de ser compreendidos não só como resultado de pressões das estruturas domésticas e dos seus respetivos processos de construção de coligações em resposta a exigências internas, mas também tendo em conta o seu contexto identitário e os fatores internacionais, nomeadamente a estrutura de poder e a estrutura normativa da ordem internacional. Terceiro, as ideias - valores, ideologias, imagens culturais, conhecimento, identidade, normas - são fatores consequenciais de causalidade nas relações internacionais, designadamente na definição dos interesses, preferências e escolhas dos Estados. As ideias estão sempre presentes na formação das preferências e interesses dos decisores. Quarto, a estrutura da ordem internacional, embora condicionada por fatores materiais, é social e intersubjetiva. Encontra-se em permanente possibilidade de construção através das instituições internacionais que a compõem, apresentando, de uma forma dinâmica e contínua, sucessivos constrangimentos e oportunidades aos seus atores.
A construção da política externa dos Estados é sempre o resultado de um complexo processo interativo entre a sociedade internacional (S. I.) e a sociedade nacional (S. N.), onde o papel da identidade, das ideias e das normas influenciam decisivamente a conceção dos atores sobre os seus interesses e preferências e, consequentemente, as decisões que têm de tomar em política externa.
IDENTIDADE E CONSTRUÇÃO DOS INTERESSES EM POLÍTICA EXTERNA: O CASO PORTUGUÊS
Existiu um período em que Portugal foi uma grande potência no sistema internacional.[21] Todavia, em regra, foi um Estado relativamente periférico face ao concerto principal de potências. Mesmo sendo um pequeno Estado, soube contrabalançar a pressão continental da sua única fronteira terrestre, a Espanha com uma vocação atlântica (Macedo, 1987), que lhe proporcionou alianças estratégicas e uma expansão marítima, de que resultou um vasto império.
Estas condicionantes geopolíticas e históricas proporcionaram o desenvolvimento de um padrão histórico (Mendes, 2017b) da política externa portuguesa que, apesar dos sucessivos modelos de inserção internacional (Telo, 1997; 2000; Teixeira, 2011), formataram constantes e linhas de força: o Atlântico, a Europa a África e uma diplomacia ecuménica, que ajudou a marcar a presença de Portugal em todos os continentes.
No século XX, Portugal experienciou importantes transições políticas que resultaram na construção de uma dualidade identitária básica: o autoritarismo e a democracia. Assim, o nosso caso centra-se na explicitação da relação entre a identidade política e construção dos interesses da política externa portuguesa no período autoritário e no período democrático.
Durante o Estado Novo, Portugal consolidou uma identidade política que se refletiu na construção dos interesses da sua política externa. Portugal era um Estado autoritário, imperial e autárcico (AIA). A sua política externa caracterizava-se por ser tendencialmente bilateral, nacional-soberanista e isolacionista. As principais ideias e imagens culturais que fundamentavam as doutrinas da política externa portuguesa no período autoritário foram o imperial-essencialismo, o ocidentalismo e o especialismo.
A ideia imperial essencialista significava que as elites do Estado Novo assumiam o império como a essência, missão e finalidade histórica de Portugal no mundo. Construiu-se uma ideologia e cultura política entre as elites do Estado Novo que defendia que sem império Portugal faleceria como entidade histórica.
A ideia do ocidentalismo traduzia-se na assunção de uma identidade cultural e civilizacional ocidental e cristã, bem como numa identidade política anticomunista, de que resultou o posicionamento geopolítico de Portugal na lógica bipolar da Guerra Fria.
A ideia do especialismo português dizia respeito ao conjunto de ideias, práticas e políticas que defendiam que Portugal era um caso especial. Esta argumentação baseava-se em três dimensões: a histórica, a antropológica e a geopolítica. Historicamente, Portugal era um caso especial devido à expansão global que se iniciou com o movimento das descobertas e originou as primeiras tentativas de globalização político-diplomática. Antropologicamente, Portugal revelou uma particular capacidade de diálogo intercultural e de desenvolvimento de uma política de miscigenação, de que resultou uma aptidão para criar sociedades multiculturais. Finalmente, usufruía de uma situação geopolítica particular no Atlântico, especialmente no seu flanco sul, e conjugava interesses na Europa, em África, e na Ásia. Estas três ideias interligavam-se e foram a base ideacional que justificou a doutrina de resistência imperial da política externa portuguesa. Esta doutrina defendia que Portugal deveria resistir às pressões descolonizadoras e insistir na sua razão imperial-essencialista, legitimada pelo seu especialismo lusotropical e pela luta do ocidentalismo anticomunista que também se travava em África.
Com a entrada na ONU e o desenvolvimento do movimento anti-colonial, Portugal passou a ter uma política externa não conforme com o zeitgheist internacional e as suas normas. Com as guerras coloniais, a não conformidade normativa da política externa portuguesa acentuou-se. Portugal passou a ter crescentes dificuldades em explicar o especialismo da sua política externa e em legitimar a sua política de resistência imperial.
De um ponto de vista normativo, a partir da década de 60 começou a existir uma perceção internacional que via Portugal como um Estado anómalo. Apesar dos aliados, Portugal começou a ser vítima de um entendimento partilhado, relativamente geral, que considerava que as suas ideias e práticas na política internacional não eram conformes com as normas internacionais.
O ocidentalismo foi, em termos gerais, uma ideia bem aceite, particularmente pelos aliados de Portugal, enquanto o especialismo teve mais dificuldades. Nesta altura, as ideias especiais de pluricontinentalidade e multirracialidade, apoiadas na ideia imperial-essencialista defensora de que Portugal, para além de existir na Europa, também existia em África, na Ásia e na Oceânia - o Portugal do Minho a Timor -, começaram a ser difíceis de compreender. Numa visão estática e irrealmente otimista do seu especialismo, Portugal não conseguiu desenvolver uma política que acomodasse as tensões anticoloniais e o consequente estigma e perceção internacional de que Portugal não agia em conformidade com as normas.
Apesar da resiliência e das justificações das elites políticas portuguesas, esta não conformidade normativa causou estragos na imagem da política externa portuguesa, e até os seus diplomatas começaram a socializar a "angústia das causas perdidas" (Vilas-Boas, 2012, p. 316).
Neste momento é pertinente questionarmos como é que os líderes do Estado Novo (Salazar e Marcelo), dois políticos altamente racionalistas, não perceberam a equação dos custos e ganhos de PSR envolvidos na opção de resistência imperial? A resposta não é óbvia e taxativa, mas só é possível encontrá-la se levarmos em linha de conta a identidade e as ideias que constituíam as leituras das elites autoritárias sobre os interesses nacionais. Isto significa que não é possível compreender a política externa do Estado Novo sem uma análise interligada da lógica racional dos interesses materiais e geopolíticos com a lógica identitária das ideias e imagens culturais dos decisores do Estado Novo. É decisivo reconhecer que os interesses e preferências da política externa portuguesa no Estado Novo refletiam e legitimavam a sua identidade e cultura política.
No dia 25 de Abril de 1974, tem lugar o início do fim do Portugal autoritário e imperial. A partir daqui inicia-se um processo de reconfiguração identitária de Portugal com consequências importantes na reconstrução dos interesses da sua política externa. Com a transição democrática desenvolveu-se uma profunda alteração na imagem identitária de Portugal e na sua política externa. A identidade do Portugal autoritário com base na ideia essencialista (Mendes, 2012b) de nação ultramarina especial deixa de existir para dar lugar à construção de uma nova identidade política.
A mudança de regime trouxe consigo uma negação da visão do mundo existente na antiga ordem autoritária e imperial e deu origem a uma nova ordem que foi legitimada por novas ideias e princípios normativos que vão determinar uma nova agenda política e um novo road-map (Goldstein e Keohane, 1993) para Portugal e para a sua política externa. Estas ideias foram inicialmente plasmadas no programa do MFA através da fórmula: Democratização, Descolonização, Desenvolvimento, e significaram o princípio de uma importante redefinição dos interesses da política externa portuguesa.[22] No período pré-constitucional, 1974-1976, a transição interpenetrou-se com processos revolucionários originando uma turbulenta luta política, que também exprimiu a busca por uma nova identidade política e inserção internacional de Portugal (Telo, 1999; Mendes, 2004).
A transição democrática portuguesa inicia numa mudança na sua cultura e identidade política, que influenciou as dinâmicas de reconstrução dos interesses da política externa. Estas dinâmicas efetuaram-se através de duas dimensões fundamentais: a normalização e a europeização. A normalização corresponde ao período inicial da institucionalização da democracia e prende-se com as ideias e práticas das novas elites relativas à construção de uma nova imagem política de Portugal. Isto significou a tentativa de emancipar Portugal rapidamente da sua imagem tradicional de Estado autoritário, imperial e autárcico, que perdurou ao longo de grande parte do século XX. Portugal passa a ser imaginado (Anderson, 1991) como um Estado ecuménico, europeu, democrático e anticolonialista.[23] Será esta estratégia de normalização que dominará o ambiente ideacional e político de grande parte das elites emergentes, e que teve como marco institucional original o primeiro governo constitucional.[24]
A segunda dimensão fundamental de reconstrução dos interesses da política externa do Portugal pós-imperial e democrático foi a europeização, e teve duas fases. A primeira foi a europeização dos objetivos e centrou-se nas negociações e objetivos a atingir para ultrapassar as diversas etapas de adaptabilidade para conseguir alcançar a adesão à CEE. Após a adesão existiu uma segunda fase, que designamos por europeização das práticas, em que se assistiu a uma continentalização europeia inédita da política externa portuguesa. Embora a qualidade de "paradoxo atlântico" (Vasconcelos, 1993) do Estado português não tenha desaparecido, foi evidente uma forte europeização dos interesses e preferências na política externa portuguesa.
A entrada de Portugal na CEE significou um choque cultural euro-multilateral na política externa portuguesa com consequências globais no modo de pensar e agir da diplomacia portuguesa. O Estado português passa a estar simultaneamente embebido nos ambientes institucionais doméstico e europeu, o que implicou um novo contexto social e inter-relacional na formulação das imagens culturais dos atores políticos portugueses. Esta persistente interligação entre o nacional e o europeu introduziu um novo, e profundamente europeu, contexto político e institucional. Os decisores portugueses socializaram o ambiente ideacional, normativo e cultural europeu e internalizaram ideias, práticas e hábitos. Desenvolveu-se uma crescente europeização da identidade de Portugal e a definição dos interesses das políticas públicas portuguesas foram exemplarmente influenciados pelo contexto institucional e ideacional europeu.
Ao socializaram as normas e práticas europeias os decisores portugueses começaram a operar como agentes no processo de (re)construção de identidades e interesses domésticos, que passam a ser imaginados para além do quadro nacional. Outro dos efeitos da socialização europeia foi a ultrapassagem da tradicional visão bilateral soberanista da política externa portuguesa e a sua crescente multilaterização. Isto significou, por exemplo, pôr em causa duas ideias clássicas da política externa do Portugal autoritário: a ideia que defendia o alinhamento com o Reino Unido em assuntos internacionais[25], e a ideia da Espanha como inimigo tradicional. A euro-multilateralização da política externa portuguesa permitiu a Portugal ganhar autonomia face ao Reino Unido e construir uma relação de cooperação impar com o seu vizinho continental.[26]
Portugal assume uma nova condição, material e ideacional, internacional: é um Estado euro-comunitário. Isto originou uma redefinição na sua forma de relacionamento externo. A europeização das práticas veio reforçar e potenciar os outros eixos tradicionais, não europeus, da política externa portuguesa. Portugal passa a projetar os seus interesses de uma forma mais eficiente.
Este processo de reconstrução dos interesses e imagem nacional foi consolidado na transição do milénio. Entre finais da década de 90 e o início do novo século, Portugal solidifica a sua nova identidade internacional, como país democrático, europeu e desenvolvido (DED).
Claro que existe uma relativa continuidade estratégica dos interesse objetivos abstratos da política externa de Portugal, bem como das suas coordenadas geopolíticas. Contudo, a política externa portuguesa sofre alterações qualitativas que refletem a evolução da identidade política de Portugal. O Portugal DED introduziu novas ideias estratégicas para a política externa portuguesa, como por exemplo:
(a) A articulação entre a política externa e a política de defesa no quadro da projeção da imagem internacional de um Estado normativamente comprometido, nomeadamente através da participação em operações de paz.
(b) A crescente multilateralização da política externa portuguesa, com uma forte e ativa participação nas organizações internacionais.
(c) A institucionalização das relações externas lusófonas com a CPLP.
(d) A definição de "uma diplomacia económica ativa", que passou a articular e potenciar a internacionalização dos interesses empresariais e económicos de Portugal.
(e) A definição e consolidação de uma política de cooperação, bem como a operacionalização, através do Instituto Camões, de uma dimensão cultural da política externa.
Importa enfatizar a construção de uma importante dimensão normativa e de valores da política externa portuguesa. Em conformidade com as normas internacionais, baseada nos princípios da legitimidade democrática e dos Direitos Humanos, a política externa do Portugal DED desenvolveu ideias e práticas que, conjugadas com a sua tradição ecuménica, resultaram numa eficaz estratégia de soft power, nomeadamente na questão de Timor.
Assumidas as categorias conceptuais avançadas no nosso modelo sociocultural sobre a relação entre sociedade interna/sociedade internacional; identidade, cultura, ideias/interesses e preferências na definição da política externa, bem como da sua relação de conformidade com as normas internacionais, apresentamos uma análise sistemática que demonstra a reconstrução identitária - e consequentes interesses, ideias e políticas - que ocorreu com a transição do Portugal Autoritário, Imperial e Autárcico (AIA) para o Portugal Democrático, Europeu e Desenvolvido (DED).
CONCLUSÃO
Analisados os principais argumentos relativos à importância de uma abordagem sociocultural, eclética e dinâmica da construção dos interesses em política externa, podemos retirar algumas conclusões. Em primeiro lugar, os fatores ideacionais e normativos são cruciais para a análise política e não significam uma abordagem utópica ou irracional. Pelo contrário, é essencial reconhecer que a identidade, as ideias e as normas estão intimamente ligadas à construção dos interesses e das políticas. As ideias e imagens culturais dos decisores contam e têm consequências comportamentais.
Em segundo lugar, a identidade dos Estados varia no tempo e no espaço, o que afeta os seus interesses e políticas. É necessário assumir a qualidade dinâmica da construção identitária dos interesses e da sua relação interdependente com as imagens culturais das elites que governam os Estados. Devemos compreender as escolhas e definição dos interesses dos Estados como processos históricos, políticos e ideacionais dinâmicos. Como o caso português demonstra, as construções identitárias dos Estados não são fixas ou permanentes, mas contextualmente dependentes. A identidade política evolui e muda ao longo do tempo de acordo com os contextos ambientais, nomeadamente do ambiente ideacional e político nacional e da estrutura normativa e de poder que, em determinadas circunstâncias históricas, caracterizam a ordem interna e internacional.
Em terceiro lugar, os fatores ideacionais, nomeadamente institucionalizados através de normas e práticas ajudam a definir a identidade e os interesses particulares dos atores da política externa. Não podemos ignorar a influência dos valores culturais e das identidades sociais domésticas na determinação das preferências dos Estados. É a identidade política e social do Estado que projeta a sua legitimidade externa. A cultura da política externa de uma sociedade, o seu estilo e doutrina política, os seus valores, normas e ideias institucionalizadas são fatores explicativos da formação dos interesses e das respetivas continuidades e mudanças das ações dos Estados. Para uma visão compreensiva sobre a política externa portuguesa no período autoritário, temos de ter em conta, antes de tudo, o ambiente ideacional do Estado Novo, isto é, a sua identidade e cultura política autoritária, imperial e autárcica. O mesmo se aplicando para o período democrático, no qual as circunstâncias socioculturais da transição e consolidação democrática portuguesa, juntamente com a necessidade de construção de uma nova imagem identitária de Portugal, marcaram as ideias e as práticas dos ciclos adaptativos de reconstrução dos interesses da política externa portuguesa, até a definição do Portugal democrático europeu e desenvolvido (DED).
Diferentemente das explicações simplistas de maximização de poder material, os Estados agem com base em práticas culturais e princípios normativos que, não raras vezes, contrariam a lógica tradicional e determinista de maximização de benefícios materiais. Como foi exemplificado, os interesses materiais são sempre interpretados de acordo com as ideias, identidade e cultura políticas existentes. Embora os interesses abstratos de PSR, e as condicionantes geopolíticas da política externa portuguesa sejam relativamente contínuas, os interesses e preferências da política externa portuguesa sofreram adaptações e reconfigurações importantes em função da mudança dos contextos políticos, identitários e ideacionais, designadamente do período autoritário para o período democrático.
Para contarmos melhores histórias sobre a política externa é importante complementar as perspetivas tradicionais, mais racionalistas, com perspetivas mais compreensivas e sociológicas. Uma análise de política externa sofisticada deve fazer apelo a explicações que, sem deixarem de ter em conta os fatores materiais, utilizem os fatores ideacionais como instrumentos essenciais na elucidação da construção dos interesses e das políticas.
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Recebido a 03-08-2016. Aceite para publicação a 10-08-2017.
[1] Introduzimos o conceito de imagem cultural do ator para operacionalizar a ligação entre identidade, ideias e comportamentos em política externa. Por um lado, as imagens culturais são ideias e crenças que: a) formatam a perceção do decisor e b) constroem a sua visão → sobre o consequente comportamento expectável. Por outro lado, (re)produzem hábitos, práticas e discursos que balizam as linhas de orientação e ação dos decisores sobre determinado problema em política externa. As imagens culturais refletem a identidade e cultura política dos Estados e funcionam como guias comportamentais que os decisores utilizam para interpretarem a realidade e legitimarem as suas opções (Mendes, 2018). Agradeço as sugestões dos revisores e editores da Análise Social.
[2] O artigo enquadra-se no debate global sobre a importância de discutir aspetos meta-teóricos para a compreensão da política externa dos Estados (Kubálková, 2001; Hudson, 2005; Houghton 2007; Kaarbo, 2015) e progresso das RI (Jackson, 2011; Bennett, 2013; Dunne, Hansen, Wight, 2013; Reus-Smit, 2013; Mendes, 2017a). O que não significa que a teoria não tenha que estar relacionada com a investigação empírica. É o oposto. O trabalho empírico não deve alienar o objetivo máximo em ciência: construir teorias. O ambiente atual tende a sobrevalorizar o teste de hipóteses empíricas à custa de uma desvalorização dos raciocínios teóricos, mas tem efeitos negativos (Mearsheimer e Walt, 2013). Como será visível não concordamos com a ingénua divisão entre investigação empírica e teórica, ou entre factos e conceitos, uma vez que, como notou Goethe: "the highest wisdom is to realize that every fact is already a theory" (apud, Waltz, 2003, ix).
[3] Por razões de objeto e de espaço fazemos generalizações parcimoniosas sobre as teorias e não especificamos todas as variantes ou exceções à regra dos seus pressupostos teóricos gerais. Como notamos, nem todos os racionalistas ignoram os aspetos ideacionais. Também nem todos os construtivistas estão interessados na interligação entre os fatores materiais e ideacionais (Adler, 2013; Parsons, 2015; McCourt, 2016). É possível uma atitude eclética de construção de pontes teóricas e disciplinares, mas existem sempre preferências e culturas paradigmáticas (Mendes, 2012a). No atual momento pós-paradigmático (Jackson e Nexon, 2013) importa uma leitura benigna e plural dos teorias, até para conhecermos bem quais os pontos das margens onde podemos, ou não, lançar pontes.
[4] Existem abordagens realistas que tentam superar estas limitações como, por exemplo, o neo-realismo clássico (Lobell, Ripsman, e Taliaferro, 2009), os diálogos com o construtivismo (Barkin 2003, 2009) e com as correntes psicológicas (Schafer e Walker, 2006), ou os trabalhos sobre o status (Paul, Larson e Wohlforth, 2014).
[5] A descrição e a especificação de um comportamento não é igualà sua explicação.
[6] Uma das razões para justificar a relevância da teoria realista reside no seu poder empático. Esta capacidade resulta da especial empatia que podem provocar as teorias parcimoniosas ao explicarem de forma sintética e elegante fenómenos sociais. Este poder empático da teoria pode ter um impacto tão importante no mundo prático que os seus pressupostos passam a ser assumidos como naturais e verdadeiros. Este fenómeno foi evidente com o nascimento e ascensão do realismo durante a guerra-fria. Neste caso, como noutros, muitas vezes as explicações realistas foram tão empaticamente poderosas que se tornaram constitutivas das práticas e das identidades dos atores. O que comprova que as próprias teorias, quando assumidas pelos atores e decisores, têm a capacidade de mudar a realidade, podendo mesmo, no limite, tornar-se profecias autorrealizáveis. Wendt (1999) e Vasquez (2009) argumentam que o comportamento de power politics auto-alimenta os dilemas de segurança.
[7] O realismo, em regra, assume uma conceção ontológica material-naturalistae associal das relações internacionais. Ao invés de assumir as estruturas materiais e de poder como fenómenos sociais e historicamente construídos, o realismo olha para os fatores de poder material como fenómenos naturais. Os realistas tendem a comparar as estruturas materiais de poder dos Estados como os geólogos comparam o tamanho das pedras. O problema é que o poder dos Estados não é simplesmente um fenómeno da natureza, é um fenómeno social, enquanto o tamanho de uma árvore ou de um pedraéum fenómeno natural. Do mesmo modo, tendem a naturalizar a realpolitik e a sua cultura anárquica neo-hobesiana. Isto não impede a particular aptidão do realismo para captar a continuidade da lógica abstrata de busca de PSR dos Estados contemporâneos e dos seus dilemas de segurança.
[8] Sobre o caso português veja-se Teixeira (1996) e Mendes (2004; 2012b; 2013).
[9] Numa abordagem contrafatual de maximização eficiente de PSR, Portugal deveria ter realizado uma normalização interna (democratização) e externa (descolonização) logo na década de 1950. Setal tivesse acontecido, Portugal poderia ter evitado a guerra colonial (1961-1974) e o PREC (1974-1976), duas circunstâncias objetivas de desperdício de PSR. Mas essa não foi a interpretação racional das elites decisoras da época. Um exemplo menos contrafatual foi a decisão de Salazar, pretensamente racional e de busca de PSR, de negar o apoio americano ao plano Anderson de descolonização africana. O racional da decisão teria sido a negação da perda das colónias. Como se, racionalmente, elas não tivessem de obrigatoriamente ser perdidas, como veio a acontecer. Numa lógica puramente racionalista, aceitar o plano americano e ter possibilitado uma descolonização organizada e sem roturas teria sido economicamente mais racional. Todavia, Salazar, de forma subjetiva e sociocultural - não racionalista, portanto -, não aceitou o plano, pois isso contrariava a identidade imperial-essencialista de Portugal, ideia constitutiva primacial do seu pensamento, logo das suas ideias sobre qual era o interesses nacional português.
[10] Embora com diferentes abordagens (Berenskoetter, 2010), a identidade é uma importante categoria conceptual que ajuda a explicar o comportamento dos Estados; quer através de teorias específicas parciais ligadas à APE, à role theory e à interligação entre decisão e fatores ideacionais, (Thies, 2012) próximas da nossa abordagem, quer através de teorias mais gerais sobre as RI (Lebow, 2008; 2012).
[11] No caso português este processo foi evidente após a "opção europeia".
[12] Especial era a forma como as elites portuguesas explicavam a política externa portuguesa imperial e a sua não conformidade com as normas internacionais (Mendes, 2012b).
[13] Este argumento de conformidade com as normas internacionais é um elemento poderoso na legitimação das ações de política externa. Ele foi utilizado contra Portugal no período autoritário. Mudaram-se os tempos e os interesses e Portugal, no período democrático, passou a utilizá-lo contra a Indonésia na questão timorense (Mendes, 2017c).
[14] Nas sociedades demo-liberais os decisores políticos necessitam de legitimar as suas opções e construir uma relação de acountability com os seus eleitores. Decisões importantes de política externa podem fazer ganhar eleições ou demitir chefes de governo. Em regimes não democráticos a influência das sociedades civis é mais limitada. Todavia, especialmente em fases de transição de regime, muitas vezes questões de política externa são alvo de debate e originam reconstruções de preferências e interesses (Mendes, 2004; 2012b; 2016b; 2018).
[15] Isto foi evidente com o ocidentalismo e especialismo no Estado Novo e com a normalização e o europeísmo no período democrático.
[16] O nosso enfoque é no papel da socialização e da conformidade das normas. Existem outras problemáticas importantes (Wiener, 2007; Schmidt, 2014; Epstein, 2017).
[17] Seguindo esta visão, vários autores demonstram três aspetos-chave das ideias. (1) As ideias atuam como guias na formação das preferências dos decisores. Ao selecionarem uma ideia, os decisores estão a definir as suas preferências e a excluir outras interpretações da realidade. Através das ideias os decisores elaboram o nexo causal entre os objetivos e as alternativas existentes relativas às estratégias políticas para os alcançar. (2) As ideias afetam as interações estratégicas e negociais. Numa situação de decisão institucional, estas atuam como o cimento que consegue unir vários pontos de vista e facilitar a coesão de grupo numa determinada direção. (3) As ideias são decisivas na criação e solidificação de organizações políticas e burocráticas e, sobretudo, nos processos adaptativos e de mudança institucional (Parsons, 2002; Hay, 2011; Schmidt, 2008; 2010; 2012; Morrison, 2016). Como aqui demonstramos, as ideias são decisivas quer na justificação do status quo (regime autoritário), quer em situações de mudança política (transição democrática).
[18] Só a esta luz é possível compreender a política externa de resistência imperial do Estado Novo que, na sua essência, era uma politica de identidade do regime.
[19] O nosso problema não é o de discutir as várias lógicas de ação: lógica argumentativa; lógica consequencial; lógica apropriada; lógica dos hábitos; lógica das práticas; lógica emocional; lógica intuitiva, etc. (March e Olsen, 1998; Pouliot, 2008; Hutchison e Bleiker, 2014; Holmes, 2015). O nosso argumento é que os decisores não decidem de uma forma linear e mecanicamente racional. Mesmo os argumentos pré-racionais, intuitivos ou práticos, não deixam de estar ligados a decisores subjetivos, embebidos em contextos burocráticos, culturais, identitários e ideacionais particulares que constituem as suas ideias e determinam as práticas, políticas e instituições da política externa dos Estados.
[20] No Estado Novo, existia uma ideia identitária nacionalista básica que era o imperial-essencialismo. Neste período, na prática política e diplomática portuguesa existia um tabu político e diplomático relativamente a todas as opções, decisões e práticas de política externa que, de algum modo, prejudicassem a ideia identitária da política externa portuguesa: a política imperial.
[21] Embora isso não significasse automaticamente riqueza (Costa, Palma, e Reis, 2015).
[22] Claro que nem tudo mudou. Por exemplo, a relação com a NATO, embora contestado por visões concorrentes, resultou numa importante continuidade.
[23] Veja-se os sucessivos discursos do PR, do PM ou do MNE nas Nações Unidas neste período (Soares, 1974; Ferreira, 1976; 1981).
[24] Dois decisores políticos tiveram um papel decisivo na construção da nova e democrática política externa de Portugal: o primeiro-ministro, Mário Soares, e o ministro dos negócios estrangeiros, Medeiros Ferreira. Foram eles que (re)definiram o quadro geral dos principais eixos da política externa do Portugal democrático, que todos os posteriores governos seguiram e aprofundaram, nomeadamente a estruturante "opção europeia". Da mesma forma que a opção imperial tinha sido a ideia estratégica do Portugal autoritário, a opção europeia foi a ideia estratégica da política externa portuguesa neste período. O que não significou uma visão dicotómica entre a Europa e o Atlântico. Como então se afirmou: "A opção europeia, consubstanciada na integração institucional, não é excluidora de uma política atlântica (…)." Programa do I Governo Constitucional: 127 (apud, Mendes, 2012b).
[25] Ideia confirmada em entrevista ao embaixador Seixas da Costa (Mendes, 2018).
[26] Pela primeira vez, Portugal e Espanha passam a fazer parte das mesmas alianças extra-peninsulares: a CEE e a NATO.