1. INTRODUÇÃO
A educação médica tem incentivado a adoção de metodologias ativas de ensino-aprendizagem como forma de inovação e adaptação às mudanças do perfil profissional geradas pelas transformações sociais, políticas, econômicas e tecnológicas das últimas décadas, que têm levado a uma interação global (Mitre et al., 2008).
No Brasil, após debates nacionais e internacionais, o currículo médico foi reestruturado a partir das críticas ao distanciamento da formação acadêmica e das reais necessidades da população e da saúde (Lampert et al., 2009). Assim, com a publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de Medicina em 2001, atualizadas em 2014 (Ministério da Educação do Brasil, 2014), o currículo passou a ser estruturado em torno da perspectiva do “aprender a aprender”, adotando-se metodologias ativas de ensino-aprendizagem, visando a humanização do ensino, a inserção precoce dos discentes nos campos de prática e o desenvolvimento das habilidades profissionais necessárias.
Nesse contexto, os estudantes são convidados a assumir uma postura crítica e autônoma, desde a formação inicial, para lidar com a amplitude, o dinamismo e a complexidade do trabalho médico. Tornam-se, então, protagonistas do processo de ensino-aprendizagem e assumem gradativamente maior controle e responsabilidade sobre o próprio aprendizado (Marin et al., 2010; Souza et al., 2014).
A produção acadêmica brasileira sobre a educação médica, embora vasta (Barbosa, 2020; Borges & Alencar, 2014; Conceição & Moraes, 2018; Jacques et al., 2022; Melo & Sant’Ana, 2012; Paiva et al., 2016; Sagrilo, 2022; Souza & Dourado, 2015; Torres et al., 2019), avança timidamente em relação às percepções dos estudantes sobre os alcances e limites das metodologias ativas na formação em saúde. No cenário internacional, estudos analisam intervenções com uso de metodologias ativas na educação médica, seus impactos e satisfações discentes (Aboregela et al. 2022; Albarrak et al., 2021; Burgess et al., 2020), outros fornecem uma visão geral dessas metodologias (Ahmed et al., 2022), mas poucos analisam as percepções discentes (Malhotra e Bhagat, 2023) - o que evidencia que o tema ainda constitui lacuna da produção científica.
Diante do inerente protagonismo assumido pelos estudantes, questiona-se: como os estudantes percebem a experiência formativa com metodologias ativas de ensino-aprendizagem? Quais as principais vantagens e fragilidades da implementação de tais metodologias no contexto acadêmico? Nesse sentido, este estudo teve como principal objetivo analisar a percepção dos estudantes de um curso de medicina sobre a utilização de metodologias ativas no âmbito de sua formação.
2. AS METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM
As metodologias de ensino constituem o caminho pelo qual professores e estudantes percorrem o processo de ensino-aprendizagem, definindo lugares e relações. Esses elementos, próprios da relação pedagógica, trazem uma matriz teórica e metodológica que os conformam. Apesar de teorizadas e implementadas no início do século XX, no contexto da educação básica brasileira (Araújo, 2015), as metodologias ativas de ensino-aprendizagem têm sido revigoradas nas primeiras décadas do século XXI na educação superior, com bastante difusão acadêmica.
Dessa forma, tais metodologias como articuladoras do processo de ensino-aprendizagem resultam de um aporte teórico que concebe a aprendizagem como proveniente da atividade e do protagonismo dos estudantes na relação com o conhecimento. Embora seja redundante a expressão “ativo” relacionada à metodologia e à aprendizagem, pois ambas implicam movimento, os pressupostos das metodologias levam a reconfiguração da relação pedagógica: o estudante como um ser ativo, o professor como mediador e o conhecimento como construção contínua, dialógica e compartilhada.
Essa perspectiva encontra ancoragem em tendências internacionais como sistematizado no “Relatório Delors” sobre os quatro pilares do conhecimento a serem desenvolvidos ao longo da vida: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser (Delors, 1998).
As metodologias ativas baseiam-se na aprendizagem pela ação/experiência do aprendiz, proposta por Dewey, e se aproximam dos pressupostos do movimento da Escola Nova. Além disso, se relacionam à aprendizagem significativa preconizada por Ausubel, principalmente no que se refere à valorização do conhecimento prévio e da disposição para aprender. Também inspira-se na educação problematizadora, preconizada por Freire, na qual educador e educando aprendem juntos numa relação dinâmica de reflexão crítica sobre a prática; e da educação para a autonomia do aprendiz, como condição para a transformação social (Berbel, 2011; Mitre et al., 2008).
São exemplos de metodologias ativas utilizadas na formação em saúde: estudo de caso, método de projetos, Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) ou Problem-Based Learning (PBL), Aprendizagem Baseada em Equipes (ABE) ou Team-Based Learning (TBL), Problematização, dentre outras. A partir dos métodos de ensino escolhidos pelo docente, o estudante “aprende a ser livre ou submisso; seguro ou inseguro; disciplinado ou organizado; responsável ou irresponsável; competitivo ou cooperativo” (Bordenave e Pereira, 2012, p. 74). Nesse sentido, as escolhas metodológicas para o ensino não são neutras, o que exige conhecimento das concepções sócio-pedagógicas que as embasam e dos fins almejados na prática educativa.
3. AS PERCEPÇÕES DISCENTES SOBRE AS METODOLOGIAS ATIVAS NA FORMAÇAO MÉDICA INTERNACIONAL
A maioria das pesquisas sobre as metodologias ativas na formação médica internacional têm demonstrado uma percepção positiva dos estudantes. Uma pesquisa com estudantes da Arábia Saudita evidenciou melhor desempenho nos estudos com uso da metodologia do TBL, preferida por reforçar a aprendizagem, proporcionar a troca e a competição entre os discentes (Aboregela et al., 2022). Os estudantes da Austrália apontaram a competitividade do TBL como vantagem que estimula a aprendizagem, além de benefícios como: o tamanho do grupo, a preparação, a ênfase em conceitos científicos, o feedback imediato, a consolidação do conhecimento, a discussão entre pares e a eficiência no tempo (Burgess et al., 2020; 2018; 2017).
Outro aspecto relevante é a percepção dos estudantes da Arábia Saudita de que as metodologias ativas os prepara de forma mais eficaz para a prática profissional, a partir do desenvolvimento de habilidades de comunicação, autoconfiança e compreensão (Albarrak et al., 2021). Também foram relatadas habilidades de resolução de problemas, de pensamento crítico, identificação de lacunas de conhecimento e aumento da confiança, por discentes do Paquistão (Ahmed et al., 2022).
Da mesma maneira, os estudantes de medicina do Nepal (Yadav et al., 2018), de Omã (Sannathimmappa et al., 2022) e da Indonésia (Lestari et al., 2019) descrevem a experiência do PBL como estimulante e enriquecedora, permitindo uma participação mais ativa na construção do conhecimento, na aplicação prática, melhorando a tomada de decisões clínicas e a resolução de problemas complexos, desenvolvendo habilidades práticas e decisórias necessárias para a prática médica.
Os estudantes australianos apontam o desenvolvimento do raciocínio clínico como vantagem do PBL (Burgess et al., 2018), mas relataram que a expertise variável dos tutores e seu reduzido direcionamento dificultava a aprendizagem do grupo (Burgess et al., 2017). Na Coreia, a receptividade ao PBL foi boa, porém necessita de adequações para melhor participação e engajamento (Yeo & Chang, 2016). Isso também foi constatado no Japão, onde os discentes consideraram essa metodologia eficaz, mas apresentaram dificuldades nas interações sociais (Lin-Aung et al., 2022) ou acharam difícil de executar, por estarem habituados à aprendizagem passiva (Iwata & Doi, 2017).
Um estudo na Índia analisou as percepções e desempenho dos estudantes de medicina com a metodologia da sala de aula invertida e do ensino tradicional, sendo eleita como preferida a primeira, apesar de não ter constatado diferenças no desempenho acadêmico (Malhotra & Bhagat, 2023). Por outro lado, Shen et al. (2022) exploram os efeitos da sala de aula invertida combinada com o TBL, na China, concluindo que houve melhor desempenho, interesse e aprofundamento. Tal resultado corrobora os achados de Angadi et al. (2019) e Baloch et al. (2022), nos quais houve melhora efetiva no desempenho e envolvimento dos alunos indianos e paquistaneses, respectivamente. Estudantes da Coreia do Sul também confirmam a promoção de um ambiente de aprendizagem ativo e centrado no aluno (Lee & Kim, 2018).
Apesar das percepções positivas, a implementação das metodologias ativas pode variar dependendo do contexto educacional e cultural. Desse modo, ao lançar luzes sobre o ponto de vista dos estudantes do curso de Medicina de uma universidade pública brasileira, o artigo pretende contribuir para o campo da educação médica ao desvelar as potencialidades e limitações dessa metodologia de ensino no contexto da formação de futuros médicos.
4. METODOLOGIA
Este artigo apresenta uma abordagem predominantemente qualitativa, escolhida por lidar com análise de aspectos das relações humanas, hábitos, atitudes e significados. A pesquisa qualitativa busca responder questões singulares de uma realidade que não pode ser quantificada, sem haver, de fato, uma dicotomia entre dados quantitativos e qualitativos, já que podem se complementar, interagindo dinamicamente para abranger a complexidade da realidade investigada (Minayo, 2001). Nesse sentido, embora nossas análises se mostrem efetivamente qualitativas, as percepções dos estudantes foram refinadas, a partir da articulação com dados de natureza quantitativa, buscando-se evidenciar as especificidades do fenômeno em questão e não sua intensidade.
4.1. CONTEXTO DE ESTUDO E PARTICIPANTES
A pesquisa foi realizada no curso de medicina de uma universidade federal brasileira, que oferece uma abordagem multi e interdisciplinar, pautada no compromisso com as necessidades de saúde da comunidade. Prevê a utilização de metodologias ativas, que favoreçam o “aprender a aprender”, estimulando os discentes a identificar necessidades, estabelecer metas de autodesenvolvimento, realizar a busca ativa de informações, em uma aprendizagem contextualizada e de problematização profissional.
Como se trata de um curso recente, o corpo docente encontra-se em estruturação e para viabilizar a implementação adequada dessas metodologias, contou com a consultoria de outras universidades federais na capacitação inicial em metodologias ativas, que, posteriormente, passou a ser oferecida pela própria instituição.
A amostra foi estruturada a partir da resposta voluntária dos discentes a um questionário enviado por e-mail a todos os/as 349 estudantes, de outubro a dezembro de 2019. Assim, obteve-se 140 respostas (40,11%), com representação de todos os períodos do curso (Tabela 1), com menor expressividade do último período, fase caracterizada por intensa busca por inserção profissional e transição de vínculos, o que pode explicar a baixa adesão. Na análise dos dados não foram encontradas diferenças entre os/as estudantes por período, portanto, optou-se por considerar a população total.
Período do curso | N | % |
---|---|---|
1.º | 14 | 10,0 |
2.º | 8 | 5,7 |
3.º | 15 | 10,7 |
4.º | 9 | 6,4 |
5.º | 15 | 10,7 |
6.º | 12 | 8,6 |
7.º | 17 | 12,1 |
8.º | 10 | 7,1 |
9.º | 8 | 5,7 |
10.º | 14 | 10,0 |
11.º | 14 | 10,0 |
12.º | 4 | 2,9 |
Total | 140 | 100,0 |
Os participantes têm idade entre 18 e 37 anos, sendo 84 mulheres, 55 homens e um/a estudante que não declarou o sexo. Predominam estudantes do sexo feminino (60%); de cor/raça branca (47,1%); com faixa etária de 21 a 24 anos (57,9%); solteiros (96,4%); sem filhos (93,6%) e provenientes do estado de Minas Gerais (90%).
4.2. INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS
Os dados foram coletados por meio de um questionário1 de autopreenchimento on-line, com questões abertas e fechadas, elaborado a partir dos estudos de Duarte (2018) e de Melo e Sant’Ana (2012), na plataforma Google Forms®. O questionário contemplou variáveis sociodemográficas (sexo, idade, cor/raça, estado civil, prole, naturalidade) e abordou questões sobre a percepção dos discentes em relação ao uso das metodologias ativas, tais como: experiência com metodologias ativas; metodologias mais utilizadas no curso; dificuldades; vantagens, fragilidades e benefícios para desenvolvimento de habilidades profissionais.
4.3. ANÁLISE DOS DADOS
Os resultados foram tabulados em planilha eletrônica gerada pela plataforma utilizada e, posteriormente, importados para o software Excel® para descrição das frequências absolutas e relativas das variáveis das questões fechadas e construção de gráficos. O corpus composto pela transcrição das respostas abertas foi submetido à análise de conteúdo, conforme Bardin (1977), na modalidade categorial-temática, abrangendo etapas: 1) pré-análise - leitura e formulação de hipóteses; 2) exploração do material - classificação e agregação dos dados para codificação; 3) tratamento dos resultados e interpretação - organização significativa dos dados.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da instituição onde foram recolhidos os dados, cujos resultados são apresentados na seção seguinte.
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir dos relatos dos/as estudantes foram definidas cinco categorias de análise temática descritas nos tópicos, a seguir, que ajudam a compreender as percepções dos/as estudantes do curso de medicina, sobre as metodologias ativas.
5.1. EXPERIÊNCIA PRÉVIA COM METODOLOGIAS ATIVAS
A maioria dos participantes afirmou não possuir experiência prévia com metodologias ativas (86%) e as experiências relatadas por 14% dos/as discentes foram adquiridas no mesmo curso, iniciado em outras instituições, cursos de idiomas, ou, em raras ocasiões, no Ensino Médio. Esses relatos evidenciam a reduzida utilização de metodologias diferenciadas para ensinar, tanto na educação básica quanto no ensino superior. Todavia, esse tipo de metodologia vem sendo adotada em diversos níveis de ensino, com predominância na área da saúde e engenharias (Paiva et al., 2016; Ribeiro, 2010).
Os participantes consideram as metodologias ativas uma prática inovadora (85%) por motivos como: ser diferente do que se propõe no ensino tradicional; tornar as aulas mais interessantes; estimular novas formas de pensar; incentivar o protagonismo discente e o desenvolvimento da autonomia, maturidade, senso crítico e autoaprendizagem, melhorando a retenção de conteúdo e preparação para atuação profissional.
Há também um pequeno grupo de discentes (4%) que relataram não gostar das metodologias ativas ou que há problemas em sua aplicação (8%), indicando a necessidade de ajustes para melhor aproveitamento por todos os estudantes. Outros (3%) descreveram algumas dificuldades de adaptação inicial, que foram superadas e, hoje, percebem a importância dessas metodologias sobre seu desenvolvimento e maturidade, conforme relatado por um dos participantes: “Embora eu tenha tido muitas dificuldades de adaptação, hoje eu enxergo a maturidade que alcancei ao longo do curso e os benefícios que [a metodologia] pode trazer” (E35P8).
Tal perspectiva é confirmada por Barbosa (2020) ao constatar que, com o passar dos anos, os estudantes se sentem melhor adaptados às novas metodologias, destacando os primeiros períodos como definitivos no processo de adaptação. Essa situação também é compreensível e até mesmo esperada, uma vez que “a dinâmica interna de cada aluno é diferente da dos demais, uns encontram desafio e satisfação onde outros acham aborrecimento e frustração” (Bordenave & Pereira, 2012, p. 74).
Também foi possível constatar que boa parte dos/as discentes (75%) demonstra satisfação com as metodologias, o que condiz com estudos brasileiros (Jacques et al., 2022; Barbosa, 2020) e internacionais (Aboregela et al., 2022; Albarrak et al., 2021; Burgess et al., 2020; 2018; 2017) que apontam a percepção predominantemente positiva dos estudantes sobre as metodologias ativas.
5.2. AS METODOLOGIAS ATIVAS UTILIZADAS NO CURSO E AS DIFICULDADES DOS/AS DISCENTES
A Figura 1 apresenta a diversidade de metodologias ativas que são utilizadas ao longo de todos os períodos do curso, das quais se destacam o PBL (21,5%), os Grupos de discussão (20%), os Seminários (19,5%) e os TBL (17,6%). Os dados de Sagrilo (2022) também apontam para o uso majoritário das metodologias PBL e TBL no curso de Medicina da Universidade Federal do Pampa.
O PBL é uma metodologia de ensino-aprendizagem que parte da discussão de situações ou problemas da vida real, em pequenos grupos (8 a 10 estudantes), dividida em duas sessões, com intervalo destinado à pesquisa e ao estudo individual para posterior compartilhamento de informações (Mitre et al., 2008, Ribeiro, 2010). Já o Grupo de Discussão é uma metodologia na qual os estudantes devem testar, rever, questionar e discutir sobre o assunto, através da resolução de perguntas pré-determinadas, que devem orientar a discussão e debate em sala de aula (Gontijo et al., 2015).
O Seminário é uma metodologia de ensino socializado na qual os discentes têm oportunidade de investigar um tema/problema, ou analisar criticamente um fenômeno, sob a orientação de um professor (Veiga, 2011). O TBL, por sua vez, é utilizado em classes numerosas, subdivididas em grupos menores (5 a 7 estudantes) dentro do mesmo espaço, compreendendo a realização de etapas: preparação prévia; verificação da preparação individual e coletiva; e aplicação dos conhecimentos adquiridos em cenários condizentes com a prática profissional (Bollela et al., 2014).
Por fim, o Fishbowl é um método de discussão dinâmico e colaborativo que promove o diálogo e a troca de experiência de modo proporcional, revezando-se nos papéis de ouvinte e participante. Para isso organiza-se a sala em dois círculos concêntricos, cuja discussão ocorre no círculo interno, mantendo-se uma cadeira sempre vazia como convite a quem desejar contribuir com a discussão (Meriguete et al., 2019).
Dentre as dificuldades dos/as estudantes com as metodologias em geral, destacam-se relatos de conflitos relacionados às habilidades de comunicação, relacionamento interpessoal, organização dos estudos e necessidade de orientação:
A metodologia ativa, no geral, exige o estudo prévio individual, o que é difícil para mim, pois não me adapto bem aos estudos sem orientação e somente por livros, sem a existência de alguma aula prévia sobre o assunto (E53P2).
O primeiro contato com metodologias de ensino-aprendizagem pode causar estranheza aos estudantes e até resistência, especialmente porque é exigida a quebra da passividade habitual, deixando-os desconfortáveis e requerendo uma postura proativa, nem sempre bem assimilada por todos (Borges & Alencar, 2014). Além disso, o ensino centrado no professor e na transmissão de conteúdos pressupõe a existência de “alto grau de dependência intelectual e afetiva dos alunos em relação ao professor” (Souza et al., 2014, p. 288), fazendo-os esperar a contínua e passiva exposição dos assuntos que serão aprendidos ou apenas memorizados para aplicação nas provas (Moraes & Manzini, 2006).
As dificuldades relatadas com o método PBL estão relacionadas à habilidade de exposição do pensamento, por timidez ou insegurança; dúvidas quanto aos objetivos de estudo e nível de aprofundamento; dificuldades de organização da discussão, execução de papéis, administração do tempo nos grupos tutoriais, conforme esclarece um dos participantes “Tive algumas dificuldades com PBL, pois não sabia se estava estudando o conteúdo certo ou até onde deveria estudar” (E28P4).
Em relação aos seminários, foram relatadas as mesmas dificuldades: timidez, comunicação e insegurança, somadas à dificuldade de aprender com os colegas. Os discentes indicaram, também, a necessidade de melhor orientação, direcionamento e feedback dos docentes:
Ter um tema importante apenas por apresentação de seminário gera certa insegurança, não sentimos que dominamos completamente o tema e às vezes é necessário que o professor filtre e nos mostre os pontos principais daquilo que iremos levar para profissão, o que muitas vezes não é feito (E119P6).
Quanto ao Fishbowl, as críticas foram feitas por, supostamente, estimular em demasia a competitividade e ocasionar mais problemas do que benefícios, conforme expresso por um dos estudantes:
Gera muita competição de quem fala mais e mais rápido, para surpreender o professor e ganhar mais nota. Você precisa "brigar" com os colegas para conseguir espaço de fala no tempo proposto, sua dupla precisa que você fale, você se pressiona para falar algo simplesmente "por falar", para ser bem avaliado (E93P11).
O planejamento isolado/combinado das metodologias de ensino-aprendizagem deve considerar os conteúdos, objetivos de ensino, contexto educacional, realidade da turma e competências a serem alcançadas (Souza et al., 2014). Além disso, a busca de alternativas diversificadas deve ter o objetivo de estimular o desenvolvimento de diferentes habilidades de pensamento dos alunos, já que uma só forma de trabalho pode não atingir a todos do mesmo modo/intensidade (Berbel, 2011).
5.3. PROCESSO DE ADAPTAÇÃO ÀS METODOLOGIAS ATIVAS E INFLUÊNCIA SOBRE OS ESTUDOS
Conforme exposto, para a maioria dos participantes essa é a primeira experiência com metodologias ativas, sendo, portanto, necessário um período de adaptação. A Figura 2 apresenta os fatores que mais contribuíram para essa adaptação, destacando-se, principalmente, a ajuda de outros discentes (31%) e o apoio dos tutores/professores (27%). Tais dados corroboram os estudos de Jacques et al. (2022), Barbosa (2020) e Torres et al. (2019), que identificaram o apoio de estudantes veteranos como principal fator de adaptação. Também se aproximam de Melo e Sant’Ana (2012), no qual o apoio de tutores e ajuda de outros discentes aparecem em segundo e terceiro lugar.
Conforme respostas de muitos discentes, a atuação do professor necessita ser mais dinâmica para direcionar o aprendizado dos estudantes e reduzir a insegurança diante do conteúdo estudado, corroborando os resultados de Torres et al. (2019). Nesse sentido, exige-se do docente uma atuação maior do que numa aula tradicional, tendo em vista que “trabalhar para além do conteúdo é um desafio, que corresponde à participação no processo de autonomia a ser conquistado com e pelo aluno” (Souza et al., 2014, p. 289).
Além disso, percebe-se que 14% dos participantes ainda não se adaptaram aos métodos de ensino; ao mesmo tempo, a categoria outros (12,9%) agregou fatores como tempo, esforço e dedicação pessoal, organização e autoestudo, feedback de tutores e auxílio dos serviços de apoio institucional. Nesse sentido, destaca-se a necessidade de criar/fortalecer as estruturas de acompanhamento pedagógico e psicológico, desde os primeiros períodos do curso, aos discentes cuja proposta de formação seja fundamentada em metodologias ativas, a fim de atenuar o impacto de novas metodologias e de favorecer o desenvolvimento de recursos de aprendizagem pelos estudantes (Torres et al., 2019; Melo & Sant’Ana, 2012).
Ao serem questionados sobre a influência das metodologias ativas nas formas de estudo, a maioria (84%) dos/as estudantes relatou alterações nas técnicas de estudo, fontes de pesquisa e tempo de dedicação, corroborando os resultados de Torres et al. (2019) em que a gestão do tempo de estudo e seleção de fontes de pesquisa foram apontadas como desafios pelos participantes. Nesse sentido, o estudo pode ter se tornado mais trabalhoso, entretanto, percebe-se o relato de fatores positivos como: aumento da organização e dedicação, desenvolvimento de uma sólida rotina de estudos, exploração de diferentes metodologias, ampliação da atenção e criticidade em relação às fontes de informação, conforme se observa no seguinte relato: “Certamente. Após um penoso período de adaptação foram bem trabalhadas as habilidades de autonomia, eficiência no gerenciamento de tempo e crítica das fontes e das informações” (E72P1).
Em relação às fontes de informação, os/as estudantes relataram a utilização de livros e artigos científicos. Ainda, demonstraram elevado grau de pesquisa em base de dados como a Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), PubMed e MedLine, além de softwares on-line de conteúdo médico, bem como diretrizes, manuais e tratados de grandes organizações da área. Com isso, percebe-se maior autonomia e busca por fontes diversificadas, confiáveis e atualizadas.
5.4. VANTAGENS E FRAGILIDADES DAS METODOLOGIAS ATIVAS
A Figura 3 representa a visão dos/as estudantes sobre as vantagens das metodologias ativas, com destaque para a capacidade de estimular o autoestudo (84,3%), o desenvolvimento do sujeito crítico-reflexivo (77,1%) e o dinamismo do processo educacional (66,4%). Tais vantagens são semelhantes aos resultados de Melo e Sant’Ana (2012) em que os dois primeiros fatores ocuparam posições majoritárias.
Nota: questão de múltiplas respostas - total de 809(577,9%); média de 5,77 respostas por participante
Observa-se que a principal vantagem consiste no estímulo ao autoestudo, o que demonstra a efetividade desse método para a formação profissional voltada para a perspectiva do “aprender a aprender”, imprescindível na atualidade e previsto no Projeto Pedagógico do Curso.
Também é possível perceber que a metodologia ativa favorece o desenvolvimento de uma atitude de crítica e de reflexão, que para Souza e Dourado (2015) são fundamentais ao exercício profissional, dada a sua complexidade, e que exige aprimoramento e reflexão contínua, conforme (Freire, 2004). Essas atitudes exigidas na formação se relacionam com o desenvolvimento do autoestudo, já que o estudante precisa discernir sobre a validade da informação, questionar o que lhe é oferecido como verdade e refletir sobre o conhecimento adquirido, estabelecendo relações e conexões para apreendê-lo (Almeida, 2013). Portanto, consideramos que as metodologias ativas compreendem instrumento de ensino-aprendizagem que promove a reflexão crítica - atitude imprescindível aos profissionais da área médica - desde a formação inicial.
O dinamismo do processo de ensino-aprendizagem, terceira vantagem indicada pelos/as estudantes, seria responsável por ativar a motivação para aprender. Tal fator desperta a curiosidade do discente pelos temas estudados, fazendo-o envolver-se mais na aprendizagem qualificada, especialmente pela possibilidade de interação com a realidade, gerando maior satisfação (Souza & Dourado, 2015).
Portanto, as metodologias ativas possuem vantagens ligadas ao desenvolvimento de habilidades e atitudes importantes para a formação e para a prática profissional, além de tornar o processo de ensino-aprendizagem dinâmico, valorizando o estudante, melhorando a retenção do conhecimento e a integração com a prática. Para além da formação acadêmica e profissional, um dos participantes ponderou que “a metodologia ativa faz muito mais do que um médico, ela faz um ser humano com uma visão mais holística e crítica” (E60P10).
Sob outra perspectiva, as metodologias ativas também apresentam limitações. Conforme a Figura 4, a exigência de maturidade do discente (71,4%), as lacunas no processo de ensino (62,1%), a carência de suporte dos docentes no processo de adaptação aos métodos de ensino (58,6%) e a insegurança quanto à aprendizagem (57,9%) evidenciam tais limites. Esses resultados aproximam-se dos dados encontrados por Melo e Sant’Ana (2012), nos quais a carência de suporte e a imaturidade foram as principais fragilidades eleitas pelos discentes.
Nota: questão de múltiplas respostas - total de 516(386,6%); média de 3,68 respostas por participante
A exigência de maturidade pode estar relacionada ao aumento da responsabilidade que é exigida do discente por seu próprio aprendizado e à incessante cobrança por proatividade. O desenvolvimento da maturidade é gradual, resultante da experiência e da constante tomada de decisões. Além disso, a crença de que a imaturidade do estudante seja um obstáculo ligado à adaptação deposita toda a responsabilidade sobre o próprio estudante (Moraes & Manzini, 2006). Convém ressaltar que esses discentes estão inseridos em um contexto formativo e, portanto, os professores precisam ser
[...] mediadores de seus conhecimentos, facilitadores de estratégias que possam ajudá-lo a retomar seu equilíbrio cognitivo e emocional, para enfrentar novos desequilíbrios. Ainda que nem todos os estudantes imaturos deixem de sê-lo e se tornem independentes, autônomos, precisamos tentar encontrar estratégias que possibilitem seu desenvolvimento (Moares & Manzini, 2006, p. 130).
A percepção de que as metodologias ativas apresentam lacunas no processo de ensino pode estar associada à sensação de insegurança na busca de conhecimentos, gerada pela incerteza quanto ao conteúdo correto, nível de aprofundamento, falta de direcionamento quanto à escolha bibliográfica ou medo de não saber o necessário para o exercício profissional (Sagrilo, 2022, Almeida, 2013). Isso também pode ser proveniente da falta ou do inadequado suporte docente e institucional, essencial em uma estrutura curricular com metodologias ativas (Torres et al., 2019; Marin et al., 2010).
Para Sagrilo (2022) e Torres et al. (2019), o professor possui papel crucial nesse aspecto, ao orientar e propiciar um feedback adequado, fornecendo orientação a fim de não deixar o grupo à deriva, reduzir a ansiedade, aumentar a confiança e a autoestima discente. De outro modo, tal lacuna pode relacionar-se à inexperiência ou às inquietações diante do novo, por ter de alterar a forma passiva de assistir à aula, conforme um dos estudantes: “acredito que a mudança abrupta de metodologia seja o mais assustador para quem vai adentrar na nova modalidade” (E65P5), perspectiva igualmente confirmada por Torres et al. (2019).
Apesar das inseguranças, os discentes têm a possibilidade de aprender muito, já que a própria busca permite ir além do proposto e de estarem sempre atualizados (Almeida, 2013). Todavia, essa ação do estudante só será eficaz com o direcionamento docente adequado, constituindo-se responsabilidade coletiva (Anastasiou, 2015).
5.5. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL COM METODOLOGIAS ATIVAS
De acordo com 94% dos/as estudantes, as metodologias ativas proporcionam maior interação com os colegas e a aprendizagem entre pares é eficaz, aspecto condizente com outras pesquisas (Sagrilo, 2022; Barbosa, 2020; Conceição e Moraes, 2018). Esse percentual mostra que, apesar das dificuldades iniciais, a interação é vista de forma positiva, pois prepara-os para o trabalho em equipe, permite desenvolver as inteligências intra/interpessoal, expor opiniões, fazer/receber críticas, conviver com as diferenças e refletir sobre o ponto de vista do outro, ou seja, “aprender a viver junto”.
Do mesmo modo, relatam que a discussão em grupo ajuda na compreensão do assunto, sob diversas perspectivas, em linguagem simples e próxima da realidade estudantil. E ainda, auxilia na fixação ou retomada do conteúdo, na correção do erro e no reforço positivo do estudo realizado, conforme um dos relatos:
À medida que trabalhamos em grupo, ouvimos informações de diferentes fontes, ouvimos diferentes pontos de vista, descobrimos que as informações podem variar e que não existem verdades absolutas em relação a diversos temas. Além disso, com os colegas, podemos descobrir novos jeitos de pensar, podemos ouvir explicações que facilitam nosso aprendizado (E127P7).
Nesse sentido, no trabalho em grupo os estudantes exercem determinados papéis “da exposição e da contraposição, do divergir, do sintetizar e do resumir, enfim, habilidades necessárias no desenvolvimento do papel profissional, para o qual o aluno se prepara na universidade como local de ensaio, de acertos e de erros” (Anastasiou, 2015, p. 77). Esse tipo de trabalho exige maturidade e autonomia que precisam ser desenvolvidas gradativamente ao lidar com o outro, reafirmando a sala de aula como um lugar de aprendizagem.
Almeida (2013) ressalta que a mediação docente, nesses casos, traz desafios devido às diferentes características dos estudantes - alguns possuem as habilidades de exposição oral, desenvoltura e liderança, enquanto outros ainda estão desenvolvendo-as. Compete ao professor sensibilidade para mediar situações, abrindo espaço para o desenvolvimento da representatividade (Anastasiou, 2015), buscando o equilíbrio entre deixá-los livres ou interferir, garantindo que questões críticas sejam levantadas (Torres et al. 2019; Ribeiro, 2010).
Para 89% dos/as estudantes, as metodologias ativas permitem relacionar os temas estudados ao cotidiano profissional, principalmente com casos clínicos e simulações. Essa relação permite aos discentes compreender a experiência profissional, desde a formação inicial, evidenciando situações relevantes para a prática médica, integrando teoria e prática - o que torna a aprendizagem mais didática, sólida, coerente e significativa para os estudantes (Paiva et al., 2016; Almeida, 2013). Ademais, a aproximação entre o ensino e o serviço contribui para a compreensão ampliada do cotidiano profissional pelos estudantes (Marin et al., 2010).
Para os/as discentes, as metodologias ativas auxiliam no desenvolvimento de habilidades como: busca de informações em diversas fontes (82,1%), comunicação verbal melhorada (71,4%) e motivação para a autoaprendizagem (69,3%), conforme figura 5, semelhante aos resultados encontrados por Sagrilo (2022).
Nota: questão de múltiplas respostas - total de 582(415,7%); média de 4,15 respostas por participante.
O desenvolvimento dessas habilidades fica explícito nas afirmações dos/as estudantes e parece estar ligado ao novo papel discente, que adquire maior controle sobre o aprendizado, bem como ao trabalho em grupo que estimula o “desenvolvimento da inteligência relacional, autonomia e maior responsabilidade sobre o autoaprendizado” (Souza et al., 2014. p. 289). Há um constante encorajamento dos alunos a se expressarem e a respeitar a individualidade do outro, estimulando o desenvolvimento dessa habilidade interpessoal (Sagrilo, 2022) - fundamental para a prática profissional futura, permeada de contradições, mudanças e imprevisibilidades, onde será necessário atuar com espontaneidade, auto-organização e criatividade.
As principais atitudes desenvolvidas por meio das metodologias ativas que poderão ser úteis na atuação profissional, conforme a figura 6, são: o trabalho em equipe (85,7%), a autonomia (79,3%), o raciocínio clínico (71,4%) e a responsabilidade (65%), percentuais condizentes com resultados obtidos por Sagrilo (2022), Conceição & Moraes (2018) e Melo & Sant’Ana (2012).
Nota: questão de múltiplas respostas - total de 683(487,9%); média de 4,87 respostas por participante.
A Figura 6 indica que o trabalho em equipe é uma das principais atitudes promovidas pelas metodologias ativas - apreendida durante a formação médica e de grande importância para o desenvolvimento profissional. Para exercer a medicina, o estudante precisa aprender a ser responsável, a valorizar a comunicação com o outro e o contexto de vida das pessoas (Moraes & Manzini, 2006). Ademais, através da articulação com outros profissionais, o estudante exercita a interdisciplinaridade, essencial no trabalho interprofissional na área da saúde (Paiva et al., 2016).
A segunda atitude indicada pelos/as estudantes é a autonomia. Nesse aspecto, Paiva et al. (2016) afirmam que o desenvolvimento da autonomia do aluno é central no processo de aprendizagem com metodologias ativas, servindo à libertação e transformação criadora, pautada na ação e reflexão sobre a realidade. A autonomia, como processo constante de amadurecimento, vai se constituindo na tomada de decisões, por isso, uma prática pedagógica voltada para autonomia precisa “estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade” (Freire, 2004, p. 107).
Já o raciocínio clínico é inerente ao processo de formação médica, muito discutida a partir das metodologias baseadas em problemas, que estimulam a investigação pelos estudantes, provocando a integração dos conteúdos, com utilização de diferentes processos mentais, para além da simples memorização de diagnósticos médicos (Cyrino & Toralles-Pereira, 2004). Permite ao discente desenvolver sua capacidade de analisar uma situação a partir das condições locais e regionais, apresentando soluções contextualizadas (Berbel, 2011) e sob uma lógica de cuidado amplo e integral (Marin et al., 2010).
Em uma proposta pedagógica com metodologias ativas, os/as estudantes percebem o desenvolvimento de diversos conhecimentos, habilidades e atitudes importantes para a formação acadêmica, profissional e pessoal. Essa aprendizagem é desenvolvida sob a perspectiva das relações com o outro e com o conhecimento, de forma contextualizada, integrada e humanizada.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As metodologias ativas são percebidas pelos/as estudantes como uma experiência inovadora que exige tempo, empenho e adaptação, mas que contribui efetivamente para o aprendizado e formação crítica, preparando-os para a atuação profissional.
Constatou-se que as metodologias ativas interferem na rotina de estudo e organização dos/as estudantes, ampliando e diversificando as fontes de pesquisa, aumentando o tempo de estudo e dedicação. Foram relatadas dificuldades relacionadas à participação nas discussões e insegurança quanto à aprendizagem, situações nas quais o apoio de outros discentes e a orientação docente se tornam fundamentais para o desenvolvimento dos estudantes.
A proposta de ouvir os/as estudantes revelou importantes nuances das metodologias ativas no processo de formação. A primeira refere-se às transformações epistemológicas relativas às posturas cognoscentes de docentes e discentes: os métodos ativos exigem que os estudantes assumam posturas acadêmicas distintas das quais estavam acostumados; e, de igual modo, pressupõe professores que se apresentem como mediadores do processo de construção do conhecimento.
Além disso, algumas metodologias implicam no desenvolvimento de distintas habilidades docentes, exigindo diretividade e conduções mais específicas para sua execução, lidando com situações imprevistas e dinâmicas nas salas de aula. Por esse motivo, as instituições que adotam metodologias ativas de ensino-aprendizagem precisam prover não só as condições estruturais necessárias, mas também formações contínuas para o corpo docente, uma rede de apoio ao ensino para docentes e discentes e uma avaliação sistematizada da condução de tais metodologias.
Outra importante questão é que as metodologias ativas são mobilizadoras do engajamento dos estudantes no processo formativo. Entretanto, sozinhas, elas não se configuram como a panaceia para todos os problemas da formação em medicina e demais áreas. Mais que isso, se utilizadas de forma inadequada e sem apropriação efetiva pelo docente, tais metodologias causam cansaço e fadiga nos estudantes, sobrecarregando-os ao invés de aperfeiçoar a formação. Por isso, é importante o aprimoramento das metodologias ativas de maneira a não se transformarem em um conjunto de técnicas desarticuladas das finalidades formativas.
Convém mencionar que o uso de metodologias ativas não exclui, necessariamente, outras metodologias de caráter mais tradicional em determinadas situações. Desse modo, é possível que tais metodologias sejam combinadas, complementadas, para atender necessidades específicas.
De modo geral, os cenários nacional e internacional se convergem em relação às percepções dos estudantes de medicina, que são predominantemente positivas, com relatos de maior engajamento, motivação, desempenho e desenvolvimento de habilidades profissionais. Entretanto, a implementação eficaz dessas metodologias pode variar conforme o contexto cultural e educacional. Além disso, alguns estudantes podem enfrentar desafios relacionados à autodisciplina, interação e gerenciamento do tempo. Nesse sentido, para experiências exitosas, torna-se crucial os papéis das estruturas de apoio institucional e profissional disponibilizadas aos atores do processo de ensino-aprendizagem.
Como limitações deste estudo, apontamos a dificuldade em generalizar os resultados para outra realidade, uma vez que o objeto de estudo se constituiu por um grupo específico de estudantes. Sugere-se novas investigações quanto a aspectos mais específicos em relação às dificuldades com cada metodologia, visando o desenvolvimento de ações interventivas ou estratégias para superá-las.
Esta pesquisa contribui para a ampliação e fortalecimento do debate sobre as metodologias ativas, no campo teórico e empírico, pois revela alcances e limites para essas práticas no ensino superior e na formação médica. Também aponta para a necessidade de refletir sobre o impacto da implantação dessas metodologias para discentes e docentes, alterando práticas educativas e modificando papéis, o que pode ser relevante para outras instituições que pretendam utilizar tais metodologias, tanto nas áreas de saúde, como nas demais áreas de conhecimento. Além disso, apresenta contribuições ao próprio contexto de pesquisa, visto que apresenta dados que podem subsidiar o planejamento e as possíveis intervenções da equipe pedagógica em relação ao uso de metodologias ativas no curso. Muito além do planejamento das metodologias adotadas, é preciso escutar os sujeitos em formação.