Processos de separação-individuação aos pais
A consolidação da identidade começa na adolescência e estende-se até ao início da idade adulta com a exploração dos diferentes papéis sociais (Erikson, 1968), possibilitando a construção da autonomia (Arnett, 2014). A teoria do desenvolvimento psicossocial desenvolvida por Erikson (1968) tem sido a alavanca de vários modelos teóricos que explicam a construção da identidade, especificamente o modelo dos estados identitários (Márcia, 2002).
Segundo Márcia (2002), o desenvolvimento da identidade pode ser compreendido a partir do cruzamento de dois processos: o compromisso (aquisição de um conjunto de valores e crenças), e por outro lado a exploração (questionamento das decisões tomadas, e dos objetivos alcançados). O autor destacou quatro estatutos de identidade: a identidade realizada (construção de compromissos depois da exploração de alternativas), difusão da identidade (inexistência de exploração de alternativas e compromissos), identidade fechada (estabelecimento de compromissos e objetivos, sem uma fase de exploração) e a identidade moratória (o processo de exploração condicionado pela dificuldade da tomada de decisão, e da criação de compromissos) (Márcia, 2002).
Arnett (2014) define a adultez emergente como o período que ronda os 18 e os 25 anos, em que se desenvolve a passagem para a adultícia. É neste período que se verifica uma significativa exploração dos jovens em relação a si e ao mundo exterior, traduzindo-se na autonomia em relação aos pais. O processo de separação-individuação é promovido pelo sistema vinculativo saudável (Erikson, 1968), em que as figuras significativas conferem à criança sentimentos de segurança e apoio na exploração de si e do mundo prestando-lhe proteção perante circunstâncias adversas (Bowlby, 1988). A evolução da autonomia e identidade da criança desenvolve-se a partir da base segura em que são transmitidos, quando a criança estabelece representações positivas de si e dos outros (Bowlby, 1988).
A separação dos pais é primeiramente psicológica e, por norma, acompanha um sentimento de não identificação em relação às figuras parentais, pelo facto de os jovens não se sentirem compreendidos por estas, levando-os a procurar apoio e conforto no seu grupo de pares ou em outros adultos. É a separação face às figuras parentais que possibilita a consolidação da autonomia nos jovens (Erikson, 1968). O processo de separação-individuação pelo qual os jovens passam não implica a rutura dos laços vinculativos com as figuras parentais, uma vez que o apoio e o suporte destas ajudam a que este processo seja levado a cabo (Arnett, 2014). A separação-individuação integra dois processos desenvolvimentais que se estendem ao longo da vida do indivíduo: vinculação versus separação, o que se traduz na procura de autonomia (Arnett, 2014). A qualidade das primeiras relações de vinculação facilita o processo de separação-individuação aos pais (Buhl, 2008), uma vez que quando os pais são percecionados como carinhosos e disponíveis estimulam a concretização do processo de autonomia e de afirmação da identidade dos jovens adultos (Bowlby, 1988; Erikson, 1968). Morais e Mota (2020) apontam para a importância da separação-individuação pautada por níveis de perceção de suporte, ligação aos pais e autoconfiança no desenvolvimento da personalidade adaptativa e no bem-estar dos jovens adultos. Por outro lado, a prática de estratégias manipuladoras pelos pais, com o intuito de terem os filhos mais perto tanto a nível físico, como emocional, conduzem a jovens mais dependentes (Cook, 2020; Dutton & White, 2012; Wang et al., 2021). A superproteção e as ligações sem limites dos designados helicopter parents, condicionam a vivência dos jovens adultos no exterior, no estabelecimento de novas relações e o ultrapassar de novos desafios, constituindo um entrave à autonomia dos mesmos (e.g., Wang et al., 2021). Por outro lado, relações pautadas por desinvestimento e abusos constituem fatores de risco para a continuidade de uma vivência relacional desadaptativa (e.g., Choe et al., 2022; Leadbeater et al., 2017; Monteiro et al., 2022).
Deste modo, tanto o processo de separação-individuação como a vinculação segura bem-sucedidos são fundamentais para o equilíbrio na autonomia do jovem, bem como na aptidão de confiar nos outros (Blom & Bergman, 2013). Todavia, segundo Arnett (2014), as alterações sociais, económicas e demográficas ocorridas no último século, o maior investimento académico, dificultam o processo de separação-individuação dos jovens. Embora os jovens neste período estejam mais autonomizados face às figuras parentais, muitas vezes não estão preparados, nem emocionalmente disponíveis para assumirem responsabilidades no que concerne à adultícia (e.g., Arnett, 2014; Kavčič & Zupančič, 2019). Assim, se por um lado, as figuras parentais devem garantir a vinculação, são também estas as responsáveis pelo incentivo à separação e à individuação (Erikson, 1968). Estudos recentes apontam para o papel fundamental da família no suporte emocional e financeiro dos jovens, no sentido do equilíbrio entre a ligação e a promoção da autonomia, particularmente na vivência em situações de crise (e.g., Choe et al., 2022; Oliveira et al., 2020; Permatasari et al., 2021).
Resiliência e os conflitos no namoro
A individuação realizada de forma adaptativa permite aos jovens adultos estarem mais disponíveis para os outros e a vivência exterior ao contexto familiar (Buhl, 2008). A vivência nas relações com as figuras significativas de afeto traduz-se na internalização de estratégias e competências pessoais que os jovens vão integrando na sua forma de perspetivar o mundo (Bowlby, 1988; Marcia, 2002). É a partir das interações pais-filhos que as crianças aprendem a lidar com o conflito (Alarcão, 2006). A resolução de conflitos de forma construtiva potencia o desenvolvimento de competências adaptativas nos jovens, incrementando a sua tolerância à frustração e a procura de estratégias adaptativas de resolução em torno das dificuldades (Costa & Matos, 2007). Por outro lado, o risco cumulativo e a ausência na qualidade das relações com as figuras significativas de afeto comprometem de forma significativa a capacidade de gestão emocional, e em consequência a resolução de conflitos nas relações (e.g., Bittar& Nakano, 2017; Özbay & Aydogan, 2020). A resiliência é caraterizada como um processo adaptativo que desenvolve o fortalecimento do individuo perante situações adversas, permitindo a construção de novas trajetórias (Rutter, 2006). A individuação dos jovens permite o desenvolvimento da resiliência fazendo face de forma adaptativa a experiências negativas, e tal como o desenvolvimento pessoal, o desenvolvimento de competências e habilidades do indivíduo são processos que potenciam a resiliência (Rutter, 2006). A resiliência deve ser entendida como um processo dinâmico em constante reorganização, articulando fatores de risco e de proteção na vivência dos jovens (Rutter, 2006). O processo da resiliência tem vindo a ser estudado no que concerne à violência nas relações amorosas (Flett et al., 2015), enquanto vítimas e perpetradores, sendo que a resiliência se mostra na sua maioria negativamente correlacionada com o papel de vitimização (Bisquert-Bover et al., 2019; Herrero et al., 2018; Korkmaz & Överlien, 2020; Monteiro et al., 2022). Ainda assim, a literatura associa o processo resiliente com a resolução dos conflitos de forma construtiva, permitindo atribuir um novo significado às situações de risco e diminuir práticas violentas (Barreira & Nakamura, 2006; Grych et al., 2015; Korkmaz & Överlien, 2020).
A idade dos jovens pode constituir um fator relevante na vivência dos conflitos no namoro, pelo que jovens com as relações precoces pautadas por inconstância e descontinuidades emocionais parecem ser mais vulneráveis à vivência de conflitos e violência no namoro (e.g., Bittar & Nakano, 2017; Nascimento et al., 2018; Oliveira et al., 2016; Özbay & Aydogan, 2020). Nesta medida, a transferência da organização afetiva das crianças e adolescentes para o início da idade adulta não poucas vezes arrasta sentimento de baixa autoestima, ineficácia e desvalorização pessoal que se misturam com preconceitos e mitos face à desejabilidade das relações amorosas (Bisquert-Bover et al., 2019; Martín-Salvador et al., 2021; Monteiro et al., 2022) e que reflete a incapacidade para regular emocionalmente situações de abuso (Korkmaz & Överlien, 2020).
A literatura reporta ainda diferenças de sexo, pelo que apesar dos trabalhos realizados neste sentido, as mulheres continuam a ser reconhecidas como vítimas de discriminação e violência nas relações (WHO, 2023). A sociedade atual parece não proteger as mulheres deste flagelo, pelo que o avanço da tecnologia, embora positivo em muitas componentes, potencia nos jovens sentimentos de maior individualidade, isolamento e sentimentos de posse, conduzindo não poucas vezes a estratégias abusivas na relação amorosa (e.g., Schokkenbroek et al., 2022). Assim, embora tanto jovens do sexo feminino como do masculino estejam envolvidos enquanto vítimas e perpetradores em situações de conflito e violência na relação, são os jovens do sexo masculino que tendencialmente apresentam mais comportamentos abusivos e violentos (e.g., Ahmadabadi et al., 2021; Amin et al., 2023; Bisquert-Bover et al., 2019; Machado et al., 2014). Apesar da vitimização, são as mulheres que encontram mais estratégias de adaptação face aos conflitos na relação romântica (e.g., Bisquert- Bover et al., 2019; López-Fuentes & Calvete, 2015).
O presente estudo pretende compreender melhor o papel da separação-individuação aos pais e da resiliência no desenvolvimento dos conflitos no namoro, e testar o papel moderador da resiliência na associação entre a separação-individuação aos pais e os conflitos no namoro. A presente investigação procura demonstrar que o processo de separação-individuação aos pais alcançado com sucesso se reflete de forma positiva no desenvolvimento do processo resiliente. Com este estudo procurou-se também dar conta da importância do desenvolvimento da resiliência em jovens adultos, da prática de estratégias ajustadas nas relações íntimas e da remissão de condutas abusivas e violentas.
Objetivos e hipóteses
O presente estudo tem como objetivo testar de que forma os processos de separação individuação aos pais e a resiliência predizem os conflitos no namoro, bem como testar o efeito moderador da resiliência na associação entre a separação-individuação aos pais e os conflitos no namoro. Aguarda-se que os processos de separação-individuação aos pais e a resiliência predigam negativamente os conflitos no namoro em jovens adultos. Espera-se que a resiliência assuma um papel moderador na associação entre a separação-individuação aos pais e nos conflitos no namoro.
MÉTODO
Participantes
A amostra deste estudo é constituída por 817 jovens adultos (530 do sexo feminino - 64.8 %) com idades compreendidas entre os 18 e os 30 anos de idade (M = 21.46, DP = 3.21). Os jovens compreendem habilitações entre o 8.º ano (3.º ciclo) e o ensino superior (mestrado) (M = 12.44, DP = 1.03), sendo que 25.2% são estudantes universitários. Verifica-se quanto às relações, que dos 817 jovens adultos em estudo, 493 (52%) têm presentemente uma relação amorosa, com uma duração média de 30.95 meses, correspondendo aproximadamente a 2 anos e 7 meses (M = 30.95, DP = 33.30), 324 (34.2%) já tiveram uma relação amorosa, com uma duração média de 14.96 meses, correspondendo aproximadamente a 1 ano e 3 meses (M = 14.96, DP = 17.03), 129 (13.6%) nunca tiveram algum tipo de relacionamento e 27 (2.8%) sustentam ter um relacionamento amoroso mas sem compromisso. Foi critério de exclusão jovens que nunca tinham tido uma relação romântica ou tiveram uma relação romântica sem compromisso.
Instrumentos
No sentido de obter informações pessoais acerca dos participantes e das figuras parentais, foi utilizado um Questionário de Dados Sociodemográficos que tem como objetivo avaliar aspetos como a identificação pessoal, familiar e relação romântica (e.g., idade, sexo, escolaridade, configuração familiar, ter ou ter tido relação amorosa e a sua duração).
Para avaliação da individuação aos pais utilizou-se o Individuation Test for Emerging Adults (ITEA- Komidar et al., 2013), adaptado por Nunes et al. (2019). O teste comporta 36 itens distribuídos em cinco fatores avaliados para o pai e mãe separadamente: suporte de si (e.g., “Quando eu estou com problemas nas minhas relações pessoais eu peço-lhe conselhos”); ligação (e.g., “Ele(a) respeita as minhas vontades”); intrusividade (e.g., “Eu acho que ele(a) quer saber demasiado sobre mim”); autoconfiança que descreve atitudes e condutas dos indivíduos pautadas pela autossuficiência, autonomia, independência e maturidade (e.g., “Eu tomo decisões sobre a minha carreira, independentemente da opinião dele (a).”) e medo de desapontar os pais (e.g., “Quando eu faço algo de errado, preocupo-me com a reação dele (a)”. No ITEA os valores mais altos equivalem a maiores níveis de suporte de si, ligação, intrusividade, autoconfiança, medo de desapontar os pais. Os itens apresentam-se numa escala de Likert através de uma gradação de 5 pontos (1-5) que varia entre “completamente falso” e “completamente verdadeiro”. A análise da consistência interna, na presente amostra, do instrumento total para a mãe e para o pai, respetivamente, é de .81/.85 , e para as dimensões revelou valores de alfa de Cronbach: suporte de si = .82/.84; ligação = .85/.86; intrusividade = .85/.83; autoconfiança = .80/.79; medo de desapontar os pais = .77/.82. A análise fatorial confirmatória para a mãe e para o pai, respetivamente, apresenta índices de ajustamento adequados com os seguintes valores: χ2(53) = 256.29; χ2(52) = 314.82, p < .001/ .001 , CFI = .96/.95, TLI = .94/.93, RMR = .05/.06, RMSEA = .06/.07.
Para avaliação dos diferentes tipos de abuso utilizou-se o Conflict in Adolescent Dating Relationships Inventory (CADRI; Wolfe et al., 2001) adaptado para a população portuguesa por Saavedra et al. (2008). É constituído por 35 itens e apresentam-se numa escala de Likert através de uma gradação de 3 pontos (0-3) que varia entre “Nunca” e “Frequentemente”. Foi usado para avaliar os tipos gerais das estratégias ou formas de resolução de conflitos nas relações de intimidade utilizadas pelo próprio(a), todavia as formas específicas de abuso associadas a cada dimensão estão implícitas. É constituído por três dimensões que agregam formas específicas de abuso: estratégias de resolução não abusivas (e.g., “Eu apresentei os meus motivos”), estratégias de resolução abusivas (e.g., “Eu tentei pôr os amigos dele(a) contra ele(a)”), e comportamentos violentos (“Eu toquei-o(a), sexualmente, contra a vontade dele(a)”). No CADRI os valores mais elevados traduzem maiores níveis da adoção de estratégias de resolução de conflitos não abusivas, estratégias de resolução de conflitos abusivas, e comportamento violento. A dimensão do comportamento do parceiro(a), na presente investigação não foi utilizada porque não apresentava propriedades psicométricas ajustadas pelo que foi retirada. A escolha do presente instrumento deve-se ao facto de inexistirem instrumentos validados para a população portuguesa para as faixas etárias do nosso estudo que são jovens adultos entre os 18 e 30 anos. A análise da consistência interna, na presente amostra, para a totalidade do instrumento é de .82. E para as três dimensões apresenta os seguintes valores: estratégias de resolução não abusivas = .74, estratégias de resolução abusivas = .80 e para os comportamentos violentos = .69. A análise fatorial confirmatória apresenta índices de ajustamento adequados com os respetivos valores: χ2 (21) = 109.68, p < .001, CFI = .95, TLI = .92, RMR = .42, RMSEA = .07.
Para a avaliação dos níveis de adaptação psicossocial positiva face a eventos de vida adversos utilizou-se a Resilience Scale (Wagnild & Young, 1993), adaptada para a população portuguesa por Araújo e Mota (2011). É composta por 26 itens, agrupados em 5 dimensões: perseverança (e.g., “Quando faço planos levo-os até ao fim”), autoconfiança (e.g., “Eu sou disciplinado”), serenidade (e.g., “Sinto-me orgulhoso(a) das coisas que já concretizei na vida”), sentido de vida (e.g., “Sou amigo(a) de mim mesmo(a)”), e auto-suficiência (e.g., “Normalmente aceito as coisas como elas são”). Na Resilience Scale os valores mais altos refletem maiores níveis de perseverança, auto-confiança, serenidade, sentido de vida e autossuficiência Os itens apresentam-se numa escala de Likert através de uma gradação de 7 pontos (1-7) que varia entre “Discordo Totalmente” e “Concordo Totalmente”. Na escala de Resiliência realizou-se uma análise fatorial exploratória em componentes principais, uma vez que se consideraram preenchidos os requisitos básicos para a realização desta, sendo os valores respetivamente para o Teste de Kaiser-Meyer- Olkin (KMO) .909 e para o Teste de Barlett de 6389.825 com uma significância de p < .001. Os resultados revelam que na sua maioria os itens saturam em dimensões diferentes dos originalmente propostos pelos autores. Na presente amostra, os resultados apontam então para uma proposta de uma estrutura unidimensional na escala de Resiliência, oferecendo desta forma maiores garantias de consistência interna. Importa ainda ressaltar que os itens 11, 12 e 22 foram retirados do estudo, uma vez que estes não se ajustam ao modelo e baixam a consistência interna do instrumento. Na presente amostra, o instrumento apresenta um valor de alpha de Cronbach na totalidade de .88. A análise fatorial confirmatória apresenta valores ajustados χ2(204) = 1232.11, p < .001, CFI = .83, TLI = .81, RMR = .06, RMSEA = .07.
Procedimentos e estratégia de análise de dados
Procedeu-se à elaboração do protocolo, sendo submetido ao conselho de Ética da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e aprovado com o n.º 20/2016. Posteriormente, foi pedida autorização às respetivas escolas/faculdades da UTAD para proceder à realização da recolha de dados. A recolha da amostra foi realizada na UTAD mediante a seleção aleatória de turmas em vários cursos, assim como através do procedimento em bola de neve, na população em geral da região Norte e Centro de Portugal continental. A participação e a recolha de dados foram presenciais, solicitando o preenchimento do protocolo e a sua entrega à equipa de investigação em envelope selado. A duração média de preenchimento do protocolo foi de 30 minutos. Foi necessária a realização de um consentimento informado onde foram apresentados os objetivos gerais do estudo e todos os pressupostos referentes à participação voluntária e à confidencialidade dos dados prestados.
O presente estudo é quantitativo e de natureza transversal. O tratamento dos resultados foi realizado no programa estatístico SPSS - Statistical Package for the Social Sciencies (SPSS) versão 27.0 para o sistema Windows. Para efeitos de limpeza de dados, foram excluídos os missing values e os outliers. No que refere à estatística descritiva, foram testados os pressupostos de normalidade (medidas de assimetria e achatamento), sendo assumida a normalidade quando os valores absolutos se encontram entre -1 e 1. Foi analisada a informação estatística relativamente ao teste de Kolmogorov-Smirnov, os gráficos de Histogramas, Q-QPlots e Boxplot. Procederam-se as análises com testes paramétricos (Marôco, 2007). Foram desenvolvidas análises de regressão múltipla hierárquica para a predição dos conflitos no namoro. A partir do programa MACRO PROCESS de Andrew F. Hayes (Hayes, 2013), verificou-se o papel moderador da resiliência na associação entre separação-individuação pais e conflitos no namoro.
Resultados
Papel preditor da separação-individuação aos pais e da resiliência nos conflitos no namoro
No sentido de testar o efeito preditor da separação-individuação aos pais e da resiliência nos conflitos no namoro, primeiramente foi necessário realizar regressões lineares múltiplas, utilizando como variável dependente os conflitos no namoro. Nas análises de regressão múltipla hierárquica foi necessário a inclusão de 5 blocos, especificamente, idade, sexo, resiliência, separação-individuação na figura materna e separação-individuação na figura paterna. As variáveis sexo e idade foram recodificadas em dummy (Marôco, 2007), de modo a analisar qual dos sexos (0 - masculino; 1 - feminino) e idades (0-18 aos 24 anos; 1-25 aos 30 anos) que predizem as variáveis em estudo.
Relativamente às estratégias de resolução não abusivas do próprio, observa-se que no bloco 1, a idade (dummy) não contribui de forma significativa para a variância do modelo, F(1, 810) = 2.89, p = .089, assim como o sexo (dummy), F(2, 829) = 1.79, p = .168. Quanto ao bloco 3, a resiliência contribui de forma significativa para a variância do modelo F(3, 808) = 6.33, p < .001, contribuindo com 2.3% da variância total (R 2 = .023) e com 1.9% de forma individual para a variância do modelo (R 2change =.019). No bloco 4 confere-se que a separação-individuação na figura materna contribui de forma significativa para a variância do modelo F(8, 803) = 4.68, p < .001, fornecendo 4.5% da variância total (R 2 = .045) e 2.2% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .022), todavia, analisando cada uma das dimensões não se verifica significância na predição das estratégias de resolução de conflitos não abusivas. Por fim, no bloco 5 a separação-individuação na figura paterna coopera de forma significativa para a variância do modelo F(13, 798) = 3.35, p < .001, contribuindo com 5.2% da variância total (R 2 = .052) e com .07% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .007). A partir da análise individual do papel de cada uma das variáveis independentes em relação à predição das estratégias de resolução não abusivas do próprio verifica-se significância nas seguintes variáveis: autoconfiança na figura paterna (β = .193) e resiliência (β = .122) (Tabela 1).
No que diz respeito às estratégias de resolução abusivas do próprio, verifica-se que no bloco 1, a idade (dummy) contribui de forma significativa para a variância do modelo F(1, 810) = 4.38, p = .037, explicando .05% da variância total (R 2 = .005) e .05% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .005). Relativamente ao bloco 2, o sexo (dummy) contribui de forma significativa para a variância do modelo F(2, 809) = 5.61, p = .004, e explica 1.4% da variância total (R 2 = .014) e .08% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .008). Ainda no bloco 3, a resiliência contribui de forma significativa para a variância do modelo F(3, 808) = 8.44, p <. 001, contribuindo com 3% da variância total (R 2 = .030) e com 1.7% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .017). No que concerne ao bloco 4, a separação-individuação na figura materna contribui de forma significativa para a variância do modelo F(8, 803) = 7. 07, p < .001, explica 6.6% da variância total (R 2 = .066) e contribuiu com 3.5% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .035). Por último, no bloco 5, a separação-individuação da figura paterna contribui de forma significativa para a variância do modelo F(13, 798) = 5.91, p < .001, explica 8.8% da variância total (R 2 = .088) e contribuiu com 2.2% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .022). A partir da análise individual do papel de cada uma das variáveis independentes em relação à predição das estratégias de resolução abusivas verifica-se significância nas seguintes variáveis: ligação na figura paterna (β = -.184), intrusividade na figura materna (β = .142), idade- 18 aos 24 anos (β = .084), sexo masculino (β = .083), resiliência (β = -.10) (Tabela 1). Quanto aos comportamentos violentos do próprio, verifica-se que no bloco 1, a idade (dummy) não apresenta um contributo significativo para o modelo F(1, 810) = .00, p = .965, assim como o sexo (dummy) não contribui de forma significativa para a variância do modelo F(2, 809) = .17, p = .844. No que diz respeito ao bloco 3, a resiliência contribui de forma significativa para a variância do modelo F(3, 808) = 7.72, p < .001, explica 2.8% da variância total (R 2 = .028) e contribuiu com 2.7% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .027). Quanto ao bloco 4, a separação- individuação na figura materna contribui de forma significativa para a variância do modelo F(8, 803) = 6. 12, p < .001, explica 5.7% da variância total (R 2 = .057) e contribuiu com 3% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .030). Finalmente, no bloco 5, verifica-se que a separação-individuação na figura paterna contribui de forma significativa para a variância do modelo F(13, 798) = 4.86, p < .001, explica 7.3% da variância total (R 2 = .073) e contribuiu com 1.6% de forma individual para a variância do modelo (R 2change = .016). A partir da análise individual do papel de cada uma das variáveis independentes em relação à predição dos comportamentos violentos do próprio, verifica-se significância nas seguintes variáveis: autoconfiança na figura paterna (β = -.23), autoconfiança na figura materna (β = .21), ligação na figura materna (β = -.16), intrusividade na figura paterna (β = .14), resiliência (β = -.10) (Tabela 1).
Estratégias de resolução não abusivas- CADRI EU | R 2 | R 2 Change | B | SE | β | t | p |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Bloco 1 - Idade (dummy) | .00 | .00 | -.07 | .05 | -.05 | -1.51 | .13 |
Bloco 2 - Sexo (dummy) | .00 | .00 | -.00 | .04 | -.00 | -.04 | .17 |
Bloco 3 - Resiliência | .02 | .19 | .1 | .03 | .12 | 3.28 | .00 |
Bloco 4 - Separação-individuação mãe | .05 | .02 | |||||
Suporte de si | .08 | .05 | .12 | 1.69 | .09 | ||
Ligação | -.04 | .05 | -.05 | -.73 | .46 | ||
Intrusividade | -.03 | .03 | -.06 | -.95 | .34 | ||
Auto-confiança | -.06 | .06 | -.08 | -.93 | .35 | ||
Medo de desapontar | .03 | .05 | .04 | .56 | .56 | ||
Bloco 5 - Separação-individuação pai | .05 | .01 | |||||
Suporte de si | -.00 | .05 | -.01 | -.08 | .94 | ||
Ligação | -.03 | .04 | -.04 | -.64 | .52 | ||
Intrusividade | -.02 | .04 | -.03 | -.57 | .57 | ||
Auto-confiança | .13 | .06 | .19 | 2.18 | .03 | ||
Medo de desapontar | .04 | .05 | .07 | .92 | .36 | ||
Estratégias de resolução Abusivas - CADRI EU | R 2 | R 2 Change | B | SE | β | t | p |
Bloco 1 - Idade (dummy) | .01 | .01 | .09 | .04 | .08 | 2.40 | .02 |
Bloco 2 - Sexo (dummy) | .01 | .01 | .07 | .03 | .08 | 2.34 | .02 |
Bloco 3 - Resiliência | .03 | .02 | -.07 | .02 | -.10 | -2.82 | .01 |
Bloco 4 - Separação-individuação mãe | .07 | .04 | |||||
Suporte de si | .03 | .04 | .06 | .85 | .40 | ||
Ligação | .01 | .04 | .02 | .33 | .75 | ||
Intrusividade | .07 | .03 | .14 | 2.48 | .01 | ||
Auto-confiança | .1 | .05 | .17 | 1.97 | .05 | ||
Medo de desapontar | -.03 | .04 | -.05 | -.66 | .51 | ||
Bloco 5 - Separação-individuação pai | .09 | .02 | |||||
Suporte de si | -.02 | .04 | -.04 | -.47 | .64 | ||
Ligação | -.10 | .04 | -.18 | -2.81 | .01 | ||
Intrusividade | -.04 | .03 | -.07 | -1.25 | .21 | ||
Auto-confiança | -.05 | .05 | -.09 | -.97 | .33 | ||
Medo de desapontar | .08 | .04 | .14 | 1.89 | .06 | ||
Comportamentos violentos - CADRI EU | R 2 | R 2 Change | B | SE | β | t | p |
Bloco 1 - Idade (dummy) | .00 | .00 | -.00 | .02 | -.00 | -.03 | .97 |
Bloco 2 - Sexo (dummy) | .00 | .00 | -.00 | .01 | -.00 | -.07 | .94 |
Bloco 3 - Resiliência | .03 | .03 | -.03 | .01 | -.10 | -2.80 | .01 |
Bloco 4 - Separação-individuação mãe | .06 | .03 | |||||
Suporte de si | .01 | .02 | .05 | .73 | .47 | ||
Ligação | -.05 | .02 | -.16 | -2.63 | .01 | ||
Intrusividade | -.01 | .01 | -.05 | -.83 | .41 | ||
Autoconfiança | .05 | .02 | .21 | 2.35 | .02 | ||
Medo de desapontar | .02 | .02 | .06 | .88 | .38 | ||
Bloco 5 - Separação-individuação pai | .07 | .02 | |||||
Suporte de si | -.02 | .02 | -.11 | -1.35 | .18 | ||
Ligação | .01 | .02 | .02 | .36 | .72 | ||
Intrusividade | .03 | .01 | .14 | 2.51 | .01 | ||
Autoconfiança | -.06 | .02 | -.23 | -2.63 | .01 | ||
Medo de desapontar | -.01 | .02 | -.06 | -.73 | .47 |
Nota: B, SE e β para um nível de significância de p <.05; Bloco 1- Sexo; Bloco 2- Idade; Bloco 3- Resiliência; Bloco 4- Dimensões da separação-individuação Mãe; Bloco 5- Dimensões da separação-individuação Pai.
Papel moderador da resiliência na associação entre a separação-individuação aos pais e os conflitos no namoro
Os resultados apontam que a resiliência exerce um papel moderador na associação entre a intrusividade na mãe e as estratégias de resolução de conflitos não abusivas (ΔR 2 = .006, ΔF(3, 808) = 7.12, p = .022, β = .082 , t(3, 808) = 2.30, p < .001, [.01; .15]). Assim, na presença de uma elevada intrusividade na relação com a mãe e na presença de uma alta resiliência, observa-se um aumento das estratégias de resolução de conflitos não abusivas do próprio. Porém na presença de uma elevada intrusividade na mãe e uma baixa resiliência, verifica-se uma diminuição das estratégias de resolução de conflitos não abusivas do próprio (Figura 1).
A partir da análise dos dados percebe-se que a resiliência exerce ainda um papel moderador na associação entre a autoconfiança na mãe e os comportamentos violentos do próprio (ΔR 2 = .038, ΔF(3, 808) = 10.51, p = .006, β = -.084 , t(3, 808) = -2.74, p < .001 [-.14; -.01]). A presença de uma elevada autoconfiança na mãe e na presença de uma resiliência alta, traduz uma diminuição dos comportamentos violentos do próprio. Todavia, quando está presente uma elevada autoconfiança na mãe e uma baixa resiliência, verifica-se um aumento dos comportamentos violentos do próprio (Figura 2).
Discussão
O presente estudo teve como principal objetivo testar o papel da separação- individuação aos pais e da resiliência nos conflitos no namoro, assim como analisar o papel moderador da resiliência na associação entre a separação-individuação aos pais e os conflitos no namoro.
De acordo com os objetivos delineados, foi possível observar que a idade, o sexo, a separação-individuação aos pais e a resiliência têm um papel preditor nos conflitos no namoro nos jovens adultos. A separação-individuação aos pais assume um papel significativo na predição dos conflitos no namoro. A perceção das figuras parentais como uma base segura, possibilita que o processo de separação-individuação seja concretizado de forma adaptativa, na medida em que recria uma imagem positiva de si e do mundo e permite aos jovens explorar a relação com os demais (e.g., Galambos et al., 2018; Komidar et al., 2014; Morais & Mota, 2020; Mota & Rocha, 2012). Relações de segurança conduzem os jovens à vivência das relações de forma mais saudável, pelo que tendencialmente os conflitos no namoro poderão ser resolvidos de forma adaptativa (e.g., Choe et al., 2022; Leadbeater et al., 2017; Grych et al., 2015; Rollè et al., 2018). No presente estudo torna-se evidente o contributo da separação-individuação aos pais nos conflitos no namoro, uma vez que as dimensões positivas respetivamente, autoconfiança na figura paterna prediz positivamente as estratégias de resolução de conflitos não abusivas e negativamente aos comportamentos violentos, bem como a ligação a ambas as figuras parentais prediz de forma negativa as estratégias de resolução de conflitos abusivas e os comportamentos violentos. Assim, a qualidade da relação com os pais reflete-se no sentimento de segurança e autoconfiança que constitui uma base para a construção de relações saudáveis com os demais. Jovens mais seguros e confiantes tendem a encontrar estratégias de resolução de conflitos não abusivas e a rejeitar os comportamentos violentos (Choe et al., 2022; Dutton & White, 2012; Leadbeater et al., 2017; Sigelman & Rider, 2018). Porém, torna-se importante evidenciar que, ao invés do esperado, a autoconfiança na figura materna apresentou uma predição positiva dos comportamentos violentos, pelo que a autoconfiança que os jovens apresentam em relação à figura materna pode implicar, de forma menos adaptativa, a sua dominância na relação, traduzindo-se em condutas violentas. Importa refletir sobre este resultado, pelo que na presente amostra poderá postular algumas hipóteses. O excesso autoconfiança associa-se muitas vezes a traços de narcisismo que poderão suprimir emoções no intuito de esconder a sua vulnerabilidade e fragilidade, reforçando, deste modo, a sua autoimagem positiva (Cheshure et al., 2020). Relações pautadas por dominância e baixa tolerância à frustração desde cedo na relação com as figuras significativas de afeto poderão conduzir os jovens adultos a dificuldades no que concerne à regulação emocional, e por isso à dificuldade na resolução de conflitos de forma adaptativa (Di Pierro et al., 2018).
A dominância excessiva nos relacionamentos com o parceiro leva à humilhação e manipulação, interferindo negativamente na independência e autoestima do cônjuge, em consequência à subversão da relação (e.g., Bisquert- Bover et al., 2019; Bittar & Nakano, 2017; Herrero et al., 2018; Martín-Salvador et al., 2021; Özbay & Aydogan, 2020). Por outro lado, a intrusividade prediz positivamente as estratégias de resolução de conflitos abusivas, assim como os comportamentos violentos (Martín-Salvador et al., 2021; Nascimento et al., 2018; Oliveira et al., 2016; Sigelman & Rider, 2018). De acordo com Rutter (2006), a intrusividade, superproteção e controlo inibem a independência do indivíduo, limitando o seu desenvolvimento de ferramentas para solucionar os problemas.
Os resultados apontam ainda que a resiliência prediz positivamente as estratégias de resolução de conflitos não abusivas, e prediz negativamente as estratégias de resolução de conflitos abusivos, tal como os comportamentos violentos. A capacidade de enfrentar de forma ajustada os acontecimentos adversos conduz a uma perceção mais adaptada dos atritos que surgem nas relações, pelo que a resiliência implica maior tolerância e leitura das dificuldades, permitindo diminuir as práticas violentas nas relações amorosas (e.g., Barreira & Nakamura, 2006; Herrero et al., 2018; Özbay & Aydogan, 2020).
No que concerne à idade, denota-se que os jovens mais novos são quem revela mais estratégias abusivas nas suas relações amorosas. Este resultado pode ser justificado na medida em que no início da jovem adultícia muitas vezes verifica-se uma instabilidade emocional que é transferida a partir das relações da infância e adolescência maladaptativas com as figuras significativas de afeto (Galambos et al., 2018; Leadbeater et al., 2017; Meeus et al, 2005; Monteiro et al., 2022; Mota & Rocha, 2012; Rollè et al., 2018). Assim, jovens adultos com menor maturidade emocional, insegurança e baixa autoconfiança verificam muitas vezes o recurso a maiores níveis de controlo do cônjuge e dificuldades na perceção ajustada das vivências em momentos de maior tensão nas suas relações de intimidade (e.g., Bisquert- Bover et al., 2019; Caridade et al. 2007; Martín-Salvador et al., 2021; Nascimento et al., 2018; Oliveira et al., 2016).
O sexo masculino apresentou uma maior predição nos comportamentos violentos. Este resultado já seria esperado, pelo que no sul da Europa os preconceitos e mitos face aos papéis de género nas relações amorosas descrevem a figura masculina enquanto dominadora e mais coersiva (e.g., Ahmadabadi et al., 2021; Amin et al., 2023; Barroso, 2017; Bisquert-Bover et al., 2019; Martín-Salvador et al., 2021). Assim, apesar do trabalho sob o paradigma dos preconceitos na sociedade atual (Barroso, 2017; WHO, 2023), pela vivência cada vez mais interativa, dependente e controladora dentro e fora das redes sociais (Schokkenbroek et al., 2022), verificamos que nos jovens adultos os conflitos nas relações amorosas se resolvem ainda maioritariamente através de estratégias abusivas particularmente no sexo feminino, e com comportamentos abusivos e violentes nos sexo masculino (e.g., Ahmadabadi et al., 2021; Amin et al., 2023; Bisquert-Bover et al., 2019; Machado et al., 2014).
Por último, observa-se que a resiliência assume um papel moderador positivo na associação entre a separação-individuação aos pais e os conflitos no namoro. Nesta medida, quando existe uma alta perceção de intrusividade na relação com a mãe, mas é moderada por uma elevada resiliência, observa-se um aumento das estratégias de resolução de conflitos não abusivas pelos jovens nas suas relações amorosas, comparativamente com a variável moderadora com uma baixa resiliência. Nesta medida, a resiliência reflete mais maturidade e potencia uma maior capacidade de reflexão face às adversidades, permitindo a resolução dos conflitos de forma construtiva e diminuir o uso abusivo na relação (Barreira & Nakamura, 2006; Grych et al., 2015; Korkmaz & Överlien, 2020). Por sua vez, observa-se que apesar de uma baixa autoconfiança na mãe, na presença de elevados níveis de resiliência, diminuem os comportamentos violentos, comparativamente com a existência de baixos níveis de resiliência. Desta forma, é possível observar que apesar dos processos de separação-individuação poderem apresentar condicionamentos na resolução de conflitos (e.g., Özbay & Aydogan, 2020), a presença de elevados níveis resilientes nos jovens atenua o desenvolvimento de comportamentos violentos nos jovens adultos (e.g., Grych et al., 2015; Korkmaz & Överlien, 2020). Destaca-se no presente estudo que uma maior resiliência pode associar-se a uma imagem positiva de si e maior responsabilidade na relação (Rutter, 2006), mostrando-se mais predispostos a lidarem com as práticas coercivas e intrusivas nas suas relações amorosas (Korkmaz & Överlien, 2020).
Implicações práticas, limitações e pistas futuras
A presente investigação demonstrou que o processo de separação-individuação aos pais alcançado com sucesso, reflete-se de forma positiva no desenvolvimento do processo resiliente. Observou-se ainda que este processo levado a cabo de forma ajustada traduz-se de forma positiva na prática de estratégias ajustadas e de forma negativa na aquisição de condutas abusivas e violentas nas relações de intimidade. Ao longo do processo de investigação verificaram-se algumas limitações inerentes ao estudo. Inicialmente, cabe ressaltar o facto de a presente investigação ser de caráter transversal, uma vez que impossibilita estabelecer relações de causa e efeito entre as variáveis. Como o método de recolha foram os questionários de autorrelato, este facto poderá ter conduzido a alguma desejabilidade social nas respostas. Importa salientar ainda a extensão do protocolo de investigação, que parece ser o principal fator responsável pela exclusão de outliers. A presente investigação alerta para o impacto que a violência no namoro tem nos jovens adultos. Desta forma, seria interessante a utilização dos dados para a promoção de programas de prevenção no contexto educativo para promover competências pessoais de assertividade e autocontrolo, a fim de identificar de forma precoce os comportamentos abusivos, bem como ajudar a identificar e consciencializar para os vários estereótipos, preconceitos e descriminações que emergem associadas aos papéis de género. Este trabalho torna-se ainda útil face à sensibilização para a promoção de programas com vista ao desenvolvimento de estratégias de coping e regulação emocional para lidar com as adversidades dos jovens e pais. Assinalar também a relevância da realização de futuros estudos qualitativos com entrevistas a multi-informantes com o objetivo de compreender o desenvolvimento de estratégias abusivas e violência nas relações íntimas dos jovens. Seria também pertinente introduzir a variável vinculação aos pais e a vinculação amorosa (Hazan & Shaver, 1987) para uma melhor compreensão do desenvolvimento dos conflitos no namoro nas relações dos jovens adultos (e.g., Choe et al., 2022; Leadbeater et al., 2017). Por último, em futuras investigações seria pertinente alargar a faixa etária de modo a obter dados mais significativos entre os diferentes grupos de idade, nomeadamente numa abordagem longitudinal desde o início da adolescência à adultícia.
Declaração de contribuição de autoria credit
Helena Morais: Concetualização; Curadoria dos dados; Análise formal; Investigação; Metodologia; Visualização; Redação do rascunho original. Catarina Pinheiro Mota: Concetualização; Curadoria dos dados; Análise formal; Aquisição de financiamento; Investigação; Metodologia; Administração do projeto; Recursos; Software; Supervisão; Validação; Visualização; Redação do rascunho original; Redação - revisão e edição.