SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.14 número2Contextos, práticas e conceções em torno da Mediação Artística e Cultural: resultados das pesquisas desenvolvida por futuros profissionaisA Mediação Cultural e Artística na Escola - Perspetivas na primeira pessoa ou um lugar de fala para o mediador artístico-cultural a operar em contexto educativo e comunitário índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Da Investigação às Práticas

versão On-line ISSN 2182-1372

Invest. Práticas vol.14 no.2 Lisboa jun. 2024  Epub 24-Jan-2024

https://doi.org/10.25757/invep.v14i2.364 

Artigos

Mapa de Olhares: Práticas de intervenção em Mediação Artística e Cultural no Espaço Artes do Instituto Politécnico de Lisboa

Map of Sights: Intervention Practices in Artistic and Cultural Mediation at the Arts Space of the Polytechnic Institute of Lisbon

Mapa de Vistas: Prácticas de Intervención en Mediación Artística y Cultural en el Espacio de las Artes del Instituto Politécnico de Lisboa

Carte de Regardes: Pratiques d'intervention en Médiation Artistique et Culturelle à l'Espace des Arts de l'Institut Polytechnique de Lisbonne

Mariana Gouveia Faria1 
http://orcid.org/0009-0003-2539-8879

1 Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa


Resumo

O presente estudo, desenvolvido no ano de 2021, durante a pandemia da Covid-19 em Portugal, teve como objetivo dar a conhecer o Espaço Artes do Instituto Politécnico de Lisboa (Espaço Artes do IPL) à comunidade da Escola Superior de Educação (ESELx), através de um projeto em Mediação Artística e Cultural (MAC) no plano digital e afastar a distância simbólica que existia entre os mesmos. A proposta de intervenção teve como ponto de partida a exposição de Desenho e Ilustração Científica dos alunos da Licenciatura de Artes Visuais e Tecnologia da ESELx, que procurou despertar nos participantes novas formas de se relacionarem com as obras expostas através de processos de composição interpretativa baseados na linguagem fotográfica. O resultado dessa atividade foi a criação da galeria virtual Mapa de Olhares. O projeto reforçou que é possível o mediador adaptar-se às imprevisibilidades através de distintos modelos de comunicação e participação. Por outro lado, os vários estímulos lançados nas atividades originaram composições dinâmicas e motivaram a inter-relação dos grupos. Constatou-se ainda a necessidade da construção de uma rede de parceiros locais que facilite o acesso dos grupos para os quais as atividades criativas e a conexão social são pré-condições para o envolvimento cultural. Por fim, foram discutidas algumas das contradições no uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) nos projetos em MAC.

Palavras-chave: Projeto em Mediação Artística e Cultural; participação cultural; processos criativos; tecnologias da informação e comunicação

Abstract

The present study, conducted in 2021 during the Covid-19 pandemic in Portugal, aimed to familiarize the community of the School of Education (ESELx) with the Arts Space of the Polytechnic Institute of Lisbon (Espaço Artes do IPL). This was achieved through a project in Artistic and Cultural Mediation (MAC) on a digital platform, with the goal of eliminating the symbolic distance that existed between them.

The intervention proposal centered around the exhibition of Scientific Drawing and Illustration by students of the Degree in Visual Arts and Technology of ESELx. The intention was to inspire new ways of engaging with the exhibited works by encouraging interpretative composition based on the language of photography. The outcome of this initiative was the creation of the virtual gallery called "Map of Sights" (Mapa de Olhares).

The project demonstrated that mediators can adapt to unpredictability through various communication and participation models. Additionally, the activities stimulated dynamic compositions and fostered inter-group relationships. The study also identified the necessity to establish a network of local partners to facilitate access for groups where creative activities and social connections are prerequisites for cultural involvement.

Finally, the study delved into discussing some of the contradictions in the use of Information and Communication Technologies (ICT) in MAC projects.

Keywords: Project in Artistic and Cultural Mediation; cultural engagement; creative processes; Information and Communication Technologies

Resumen

El presente estudio, realizado en el año 2021 durante la pandemia de Covid-19 en Portugal, tuvo como objetivo dar a conocer el Espacio de las Artes del Instituto Politécnico de Lisboa (Espaço Artes do IPL) a la comunidad de la Escuela de Educación (ESELx), mediante un proyecto de Mediación Artística y Cultural (MAC) en el ámbito digital y eliminar la distancia simbólica que existía entre ellos. La propuesta de intervención tuvo como punto de partida la exposición de Dibujo Científico e Ilustración de los estudiantes del Grado en Artes Visuales y Tecnología de ESELx, que buscaba despertar en los participantes nuevas formas de relacionarse con las obras expuestas a través de procesos de composición interpretativa basados en el lenguaje fotográfico. El resultado de esta actividad fue la creación de la galería virtual Mapa de Vistas (Mapa de Olhares). El proyecto reforzó la idea de que es posible que el mediador se adapte a lo imprevisible mediante diferentes modelos de comunicación y participación. Por otra parte, los diversos estímulos lanzados en las actividades dieron lugar a composiciones dinámicas y motivaron la interrelación de los grupos. También se identificó la necesidad de construir una red de socios locales para facilitar el acceso de grupos para los cuales las actividades creativas y la conexión social son condiciones previas para la participación cultural. Por último, se discutieron algunas de las contradicciones en el uso de las Tecnologías de la Información y la Comunicación (TIC) en los proyectos de MAC.

Palabras clave: Proyecto en Mediación Artística y Cultural; participación cultural; procesos creativos; Tecnologías de la Información y la Comunicación

Résumé

La présente étude, menée en 2021 pendant la pandémie de Covid-19 au Portugal, avait pour objectif de faire connaître l'Espace des Arts de l'Institut Polytechnique de Lisbonne (Espaço Artes do IPL) à la communauté de l'École d'Éducation (ESELx) à travers un projet de Médiation Artistique et Culturelle (MAC) sur le plan numérique et d'éliminer la distance symbolique qui existait entre eux. La proposition d'intervention a pris comme point de départ l'exposition de Dessin Scientifique et d'Illustration des étudiants de la Licence en Arts Visuels et Technologie de l'ESELx, cherchant à susciter chez les participants de nouvelles façons de se rapporter aux œuvres exposées à travers des processus de composition interprétative basés sur le langage photographique. Le résultat de cette activité a été la création de la galerie virtuelle Mapa de Olhares. Le projet a souligné la capacité du médiateur à s'adapter à l'imprévisibilité à travers différents modèles de communication et de participation. D'autre part, les divers stimuli lancés au cours des activités ont entraîné des compositions dynamiques et ont encouragé l'interrelation des groupes. Il a également été noté la nécessité de créer un réseau de partenaires locaux pour faciliter l'accès des groupes pour lesquels les activités créatives et la connexion sociale sont des prérequis à l'engagement culturel. Enfin, certaines contradictions dans l'utilisation des technologies de l'information et de la communication (TIC) dans les projets MAC ont été discutées.

Mots-clés: Projet de Médiation Artistique et Culturelle; participation culturelle; processus créatifs; Technologies de l'information et de la communication

Introdução

O trabalho que origina este artigo teve início com a unidade curricular de Projeto de Intervenção em Mediação Artística e Cultural III, inserida no 3o ano do plano de estudos da Licenciatura de Mediação Artística e Cultural (MAC). O trabalho realizado decorreu entre os dias 24/02/2021 e 13/06/2021, durante os períodos de emergência e contingência correspondentes à aplicação do Decreto em resposta à pandemia da Covid-19 em Portugal. O objetivo foi elaborar, executar e avaliar um projeto em MAC e relacionar questões sobre a participação cultural entre uma comunidade do ensino superior - a Escola Superior de Educação de Lisboa (ESELx) - e o Espaço Artes do Instituto Politécnico de Lisboa (Espaço Artes do IPL). Toda a abordagem desenvolveu-se no âmbito digital.

As questões de partida para o projeto centraram-se na participação cultural, uma preocupação que tem sido constante entre agentes ligados à arte e à cultura nos contextos em que o envolvimento dos públicos simplesmente não acontece.

O que dificultaria o acesso aos espaços e às instituições culturais? Seria a própria oferta cultural suficientemente plural, de forma a ser convidativa à diversidade existente nos territórios, como, por exemplo, na comunidade académica? E, por outro lado, como os projetos em MAC poderiam auxiliar no desenvolvimento da relação entre os novos espaços culturais, os artistas e esses públicos?

Por um lado, enfatiza-se o contributo que as atividades culturais podem dar para o desenvolvimento, a identidade e a coesão das comunidades, por outro lado, e no âmbito de uma perspetiva que tem ganho maior expressão nos anos mais recentes, valoriza-se o papel que a participação pode desempenhar no reforço das competências e das capacidades individuais (Ferreira, 2014, p. 48).

Acredita-se, portanto, que os projetos que estejam comprometidos com a participação dos públicos, enquanto decisores efetivos, contribuem não apenas para o bem-estar social como promovem uma cidadania ativa.

No contexto das cinco licenciaturas da ESELx e das suas respetivas ofertas formativas, orientadas direta e indiretamente para a instrução educacional, cultural e artística, é curioso notar, após uma sondagem informal junto a alguns alunos, que poucas pessoas tinham conhecimento do Espaço Artes do IPL e de onde o mesmo se localiza.

Um segundo desafio foi constatar se, de facto, seria possível reinventar os espaços culturais de forma digital, idealizando atividades de mediação que criassem uma extensão das obras que esses lugares expõem, assim como dialogar com os públicos, considerando somente a esfera virtual.

Nessa perspetiva, e frente ao momento histórico experienciado e às suas limitações e possibilidades, os mediadores artísticos e culturais foram confrontados com a necessidade de diversificar formatos e acionar outras ferramentas ainda pouco exploradas na profissão - no caso deste projeto, com o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). Este cenário impôs ao mediador a aquisição de novas competências que, segundo Lévi (1999), passam por dispositivos de comunicação interativos e comunitários.

A possibilidade de desenvolver este projeto em estreita parceria com o Espaço Artes do IPL revelou, de forma manifesta, a disponibilidade da equipa responsável pelo espaço para desenvolver novas áreas de ação, destacando-se a possibilidade de a identidade do local refletir a conceção de uma expansão sociocultural conjunta com a comunidade académica do Instituto Politécnico de Lisboa (IPL). Neste sentido, a construção de um projeto, como destaca Guerra (2002), nasce sempre a partir de um problema, de uma vontade ou de um desconforto com a realidade que se coloca eminente, a qual devemos ser capazes de adaptar ao contexto que experienciamos.

As instituições artísticas e culturais são unidades importantes em toda a sociedade. Uma vez orientadas para o exercício da cidadania e da democracia cultural, reforçam os elos comunitários através de elementos inclusivos e de representatividade.

Metodologia

A metodologia utilizada no projeto foi formulada a partir da técnica de observação direta e participante, da análise documental, da entrevista estruturada, do inquérito por questionário e de uma avaliação intermédia e final.

A técnica de observação direta e participante permitiu, no início do projeto, identificar algumas das potencialidades e fragilidades associadas ao Espaço Artes do IPL, bem como pré-identificar o público-alvo a ser trabalhado. Através da técnica de análise documental foi possível caracterizar o contexto sociocultural da Freguesia de Benfica, no qual está inserida aquela instituição e algumas das suas dimensões territoriais e sociais.

As entrevistas realizadas com os responsáveis pela gestão da programação do Espaço Artes do IPL e do Gabinete de Comunicação e Imagem, foram preparadas através de um guião estruturado com a finalidade de conhecer e caracterizar o contexto institucional, a carreira artística da instituição, a programação, os respetivos públicos e as barreiras de acesso ao espaço. Permitiram ainda identificar as estratégias de comunicação utilizadas pelo gabinete de comunicação.

O inquérito por questionário tinha como objetivo compreender se os alunos, professores e funcionários não docentes da ESELx conheciam e participavam do Espaço Artes do IPL. As respostas foram tratadas quantitativamente e, em seguida, procedeu-se à respetiva análise dos dados. O inquérito permitiu averiguar o nível de presença do público-alvo da ESELx no Espaço Artes do IPL e, posteriormente, determinar a problemática associada à intervenção do projeto. “O objetivo do diagnóstico é o conhecimento da realidade. Constitui uma das ferramentas teórico-metodológicas mais importantes para nos aproximarmos do conhecimento da realidade do objeto de estudo” (Serrano, 2008, p. 29). Definiu-se, ainda entre o diagnóstico e o plano de ação, que a avaliação do projeto seria quantitativa e qualitativa. Com esse intuito, foram utilizadas duas técnicas distintas entre os participantes do projeto: a primeira, um inquérito de participação; a segunda, uma sessão de discussão. A avaliação intermédia, por sua vez, permitiu redefinir estratégias de atuação durante a implementação do projeto, ao passo que a avaliação dos dados recolhidos na fase final reuniu a informação e demonstrou se os objetivos propostos no projeto foram alcançados.

O Projeto em MAC - Caracterização da instituição e do público-alvo

O Espaço Artes do IPL, criado em 2019, localiza-se junto dos Serviços da Presidência do Politécnico de Lisboa, em Benfica. Destina-se a atividades culturais, artísticas e científicas, como exposições, conferências, colóquios e concertos, e, segundo os seus responsáveis, se pretende dinâmico na sua programação. A equipa que o coordena procura, nas exposições que organiza, acolher diferentes linguagens e colaborar com variados projetos de intervenção, lançando um entendimento de que a comunidade escolar, e não só, pode contribuir para a construção de diferentes significados, bem como de que esse espaço procura ser de todos e para todos.

No âmbito do diagnóstico, foi definido que o público-alvo seria a comunidade de alunos da ESELx, para quem é direcionada uma oferta formativa composta atualmente por diferentes ciclos de estudo, distribuídos entre licenciaturas, pós-graduações, mestrados profissionalizantes e pós-profissionalizantes. Por outro lado, a constatação de que a comunidade estudantil do Campus do IPL em Benfica encontra-se a 650-750 metros de distância do espaço cultural reforçou o desenvolvimento de um projeto associado à formação de laços entre os alunos da ESELx e o Espaço Artes do IPL.

Para auxiliar o diagnóstico inicial, foi realizado, entre os dias 04/03/2021 e 25/03/2021, um inquérito por questionário que tinha como objetivo compreender se os alunos, professores e funcionários não docentes da ESELx conheciam o Espaço Artes do IPL e se dele participavam.

Para que o inquérito chegasse ao maior número de pessoas dentro da comunidade, contou-se com a colaboração do Gabinete de Comunicação e Imagem da ESELx, remeteu o documento para um universo de 4.512 alunos, 130 docentes e 22 funcionários. Estes números dizem respeito a todos os contatos institucionais que a ESELx possuía no ano de 2021 (antigos e atuais alunos, docentes e funcionários não docentes). Paralelamente foram contactados 13 professores por e-mail, aos quais se pediu que divulgassem, junto aos seus alunos, a solicitação de participação no inquérito.

Durante três semanas, 330 pessoas responderam ao inquérito. Ficou então evidenciado que 89% dos inquiridos eram alunos (293 indivíduos), 10% professores (34) e 1% funcionários não docentes (3). Do total de 330 pessoas que participaram o inquérito, foi auferido que 81% não tinham conhecimento da existência do Espaço Artes do IPL, (Figura 1)ao passo que 19% afirmaram o contrário.

Figura 1: Dados do Inquérito - Gráfico 1. Fonte Própria. 

Figura 2: Dados do Inquérito - Gráfico 2. Fonte Própria. 

Das 64 pessoas que conheciam o Espaço Artes do IPL, 44% declararam nunca ter visitado nenhuma das exposições, enquanto 28% afirmaram ter ido a mais do que uma exposição e 28% a apenas uma (Figura 2).

Em primeiro lugar, foi possível constatar o desconhecimento sobre o Espaço Artes do IPL para a maioria da comunidade da ESELx que participou do inquérito, o que indicava ser necessário pensar em estratégias mais efetivas de comunicação e divulgação do mesmo. Em segundo lugar, era ainda relevante o número de pessoas que tinha conhecimento do espaço, mas que nunca esteve presente em nenhuma das suas exposições.

Objetivos e estratégias do projeto de intervenção em MAC

O projeto teve como objetivos: (I) promover a participação da comunidade da ESELx no Espaço Artes do IPL através de processos criativos (fomentando assim a proximidade e o envolvimento entre ambos por meio da utilização da linguagem fotográfica como recriação artística a partir de uma exposição de desenho e ilustração científica e a construção de uma Galeria Virtual); (II) contribuir para a dinamização da programação do Espaço Artes do IPL (com o intuito de atrair e mobilizar a comunidade em geral a participar do espaço, favorecendo o desenvolvimento da fruição cultural coletiva).

Durante a execução do projeto teve lugar a inauguração da exposição de Desenho e Ilustração Científica dos alunos da Licenciatura de Artes Visuais e Tecnologias no Espaço Artes do IPL, evento do qual muitos alunos não tiveram a oportunidade de participar. Tendo em conta este cenário, foi disponibilizado o catálogo digital da exposição para que a comunidade estudantil conhecesse, por um lado, as obras e os autores, e, por outro, tivesse a informação de que o local continuava a promover uma programação.

Face às limitações impostas pela Covid-19, que não propiciou a implementação de atividades presenciais junto da comunidade estudantil, foram elaboradas, no âmbito do projeto, as seguintes estratégias:

Potencialização da relação dos alunos da ESELx com o Espaço Artes do IPL através de parcerias com a Associação dos Estudantes e a Comunidade de Integração Académica da ESELx;

Utilização da linguagem fotográfica como forma de reinterpretar as obras artísticas pertencentes à Exposição de Desenho e Ilustração Científica que esteve patente no Espaço Artes do IPL;

Criação de uma galeria virtual no site da ESELx/Espaço Artes do IPL, resultado das imagens produzidas pelos participantes.

Mapa de Olhares - Uma atividade digital

A primeira atividade do projeto, denominada de Mapa de Olhares , tinha como propósito recorrer à linguagem fotográfica como ferramenta para reinterpretar as obras da exposição de Desenho/Ilustração Científica. A partir do uso de uma câmara digital/smartphone, foi então proposto aos participantes da atividade que tivessem autonomia para decidir acerca do processo criativo.

A atividade esteve disponível oficialmente nos sites do IPL e da ESELx entre os dias 20/04/2021 e 30/04/2021 e as redes de parceiros foram fundamentais para a divulgação e a realização da atividade Mapa de Olhares. No caso dos professores, esta colaboração existiu tanto pela ligação pedagógica com os alunos, quanto pela possível associação e exploração da atividade relacionada a conteúdos de produção artística (como o exercício proposto em conjunto com UC de Teoria e Prática da Criatividade, aplicado aos alunos do 2º ano da Licenciatura em MAC).

Figura 3: Sinopse da Atividade Mapa de Olhares (2021). Grafismo criado por - GCI/IPL Fonte: Própria. 

Através de dispositivos digitais presentes na vida da maioria das pessoas, num tipo de relação que cresceu sobretudo no contexto pandémico, o público foi convidado no que concerne ao olhar, a ser protagonista da sua própria narrativa imagética.

Era relevante perceber se alguns departamentos e grupos sociais dentro comunidade escolar teriam mais influência na promoção e na participação de mais pessoas na atividade Mapa de Olhares. Neste sentido, o contato com a Associação de Estudantes e a Comunidade de Integração Académica da ESELx deu-se pela proximidade privilegiada que ambos os grupos possuem com os vários alunos da ESELx, e pelo desejo de perceber se estes organismos teriam mais influência na dinamização da atividade. Por fim, o Gabinete de Comunicação e Imagem do IPL e a Comunicação da ESELx publicaram e publicitaram a mesma atividade através de seus sites a toda a comunidade Académica, ratificando a ideia de que “Os parceiros encontrados são estrategicamente veículos fundamentais de disseminação de informação” (Barriga, 2007, p. 53). Os parceiros, com efeito, podem ser facilitadores na comunicação da mensagem e, não raro, colaboram com um objetivo comum.

A segunda atividade esteve associada à criação de uma Galeria (Mapa de Olhares Fig. 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12), pensada também como um catálogo a ser exibido no formato digital. O convite para que a comunidade académica desenvolvesse trabalhos artísticos individuais ou coletivos procurou assim incentivar não apenas outras formas de observar uma obra de arte, como também desenvolver diferentes meios de participação. “É na relação com a obra e com o contexto que a pessoa elabora sentidos, e, por meio do que foi sugerido e possibilitado na relação com a obra, amplia suas significações de mundo” (Kupiec, Neitzel & Carvalho, 2014, p. 169). Desta forma, a arte passa a ser um veículo para o desenvolvimento do autoconhecimento e de inter-relação com o mundo.

Galeria Mapa de Olhares

Sistema de parte dos satélites de Júpiter - Pedro Timóteo*  

Sem título Henrique Martins**  

Corpo humano, ossos da mão - Duarte Morais* 

A Sensação da Saudade - André Martins** 

Crânio humano Renata Castanheira* 

Sem título Pamela Leal** 

Sem título Turma Artes Visuais e Tecnologia** 

Araracanga Joana Toledo* 

Sem título Turma Animação Sociocultural** 

Alguns dos trabalhos foram descortinados posteriormente através de um grupo de discussão virtual, que teve por base a partilha, os sentimentos, os comentários e as reflexões de alguns dos intervenientes no projeto. Os participantes foram assim os próprios curadores da exposição da Galeria Mapa de Olhares, criando um espaço conjunto através das imagens desenvolvidas para este fim.

Resultados da avaliação do projeto em MAC

Entre os dias 20/04/2021 e 30/04/2021, a atividade foi divulgada no site do Instituto Politécnico de Lisboa, no site da ESELx e no Instagram da Associação dos Estudantes da mesma unidade orgânica. Os indicadores dos dados quantitativos estavam associados ao número de imagens submetidas à atividade Mapa de Olhares, ao passo que a reflexão dos participantes acerca do surgimento da Galeria foi responsável pela geração dos dados qualitativos.

Nesta fase foram submetidas, no total, 5 imagens da autoria dos participantes. Durante a avaliação intermédia, ao longo dos dias em causa, é de se referir que a divulgação, tanto nos sites como no Instagram (com 1.259 seguidores), não produziu resultados diretos (ou seja, mais submissões de imagens) entre os alunos. Ao avaliar-se a não existência de participação, deduziu-se que a comunicação da atividade com os alunos não passaria somente pelo modelo digital e que seria necessário encontrar parceiros facilitadores que apresentassem laços de proximidade com a comunidade da ESELx. Pensou-se então em grupos que pudessem desenvolver ações diretas junto aos alunos. Nesta fase, a Comunidade de Integração Académica foi contactada após a constatação de que a mesma tinha uma atuação bastante presente dentro das diversas turmas de licenciatura, por intermédio da promoção de inúmeras práticas que procuram agregar os respetivos estudantes e desenvolver os vínculos de convivência entre os grupos, como é o caso, por exemplo, da praxe, ritual de integração académica.

A ideia proposta estava relacionada com a possibilidade de o grupo da Comunidade de Integração Académica participar da iniciativa e incluir uma atividade cultural, a exemplo das tantas praxes que a mesma desenvolve, abrindo campo também para o relacionamento com os alunos que não fazem parte da comunidade “praxante”. Deste modo, após uma reunião ocorrida no dia 29/04/2021, na qual se estabeleceu uma parceria com os estudantes responsáveis desta comunidade, o prazo da atividade Mapa de Olhares foi estendido exclusivamente para este grupo até ao dia 10/05/2021, resultando na submissão direta de 15 imagens de produções fotográficas, muitas delas coletivas, com as quais vários estudantes estiveram envolvidos. Foram ao total submetidas 20 imagens (individuais e coletivas) e os participantes revelaram, num inquérito quantitativo, estar distribuídos entre as diversas licenciaturas e mestrados oferecidos pela Escola Superior de Educação.

Os números apresentados nas duas fases apontam que, apesar da estratégia de publicitar a atividade através de vários veículos de informação, o maior impacto ocorreu quando a Comunidade de Integração Académica se associou ao projeto. Revelou-se então que o papel deste parceiro, em conjunto com os grupos com que trabalha, facilitou a implementação da atividade.

Outro indicador qualitativo importante para o projeto era conhecer alguns pensamentos e reflexões dos participantes após o processo criativo em que estiveram envolvidos. Neste sentido, procurou-se desenvolver duas ações em momentos distintos, visando a recolha de um maior número de opiniões e, posteriormente, a análise das respostas. Para isto foram utilizadas duas técnicas: a primeira, um inquérito de participação por questionário concebido para ser aplicado ao grupo da Comunidade de Integração Académica; a segunda, por sua vez, uma sessão de discussão com a presença dos alunos que participaram na primeira fase da atividade Mapa de Olhares.

Na primeira questão de resposta livre do inquérito, os estudantes tiveram de indicar qual foi a motivação que os levou a participar na atividade Mapa de Olhares. O maior número de respostas revelou que a interpelação realizada pela Comunidade de Integração Académica foi o principal motivo, seguindo-se o interesse pelas obras apresentadas na exposição de Desenho/Ilustração Científica. A segunda questão procurava compreender o que os estudantes tinham aprendido ou que competências desenvolveram com a atividade. A generalidade das respostas indicou que as principais competências desenvolvidas foram a criatividade, em primeiro lugar, seguida da capacidade de desenvolver novas interpretações em relação a imagens e obras artísticas. A terceira questão, por fim, indagava aos estudantes se era importante participar nas atividades artísticas e culturais promovidas pela comunidade da ESELx e solicitava, igualmente, que justificassem a sua resposta. Todos os inquiridos responderam positivamente a esta pergunta, tendo a maioria justificado o desenvolvimento de competências pessoais e a entreajuda como os fatores mais relevantes para a participação nas atividades.

Os dados analisados no inquérito por questionário reforçam os dados quantitativos. Estes, por sua vez, indicam a potencialidade e a relevância da parceria entre a Comunidade de Integração Académica e os estudantes, bem como a participação dos mesmos na atividade Mapa de Olhares. Tal facto evidencia que, devido aos laços de proximidade com os alunos da ESELx, a Comunidade de Integração Académica contribuiu não apenas para a estratégia de comunicação, mas permitiu também estabelecer mais facilmente uma ação coletiva em prol da familiaridade pré-existente nos grupos.

O indicador qualitativo era relevante uma vez que ainda recaem muitas dúvidas se estas práticas em contexto digital têm realmente um papel transformador em quem participa e nos locais de intervenção. Neste sentido era importante para o projeto conhecer alguns pensamentos e reflexões dos participantes após o processo criativo em que estiveram envolvidos. No dia 27/05/2021, desenvolveu-se uma ação, na plataforma Zoom, visando a recolha de opiniões e, posteriormente, a análise das respostas. Através de uma sessão de discussão com um grupo de 5 estudantes participantes da atividade Mapa de Olhares, contou ainda com a assistência de uma professora, que testemunhou, enquanto observadora, a dinâmica do coletivo. Quando questionados sobre qual teria sido a motivação para participarem na atividade, a afinidade apareceu como primeiro fator para a maioria dos elementos, seguido do desejo de participar e, finalmente, também foram considerados pontos relevantes para o envolvimento do grupo, as obras e a liberdade de criação. A segunda questão procurava compreender o que os estudantes tinham aprendido ou que competências desenvolveram com a atividade, tendo sido a observação crítica das obras um ponto em comum entre os presentes. Pode-se dizer que surgiram também afirmações em relação à aquisição da capacidade percetiva da diversidade de perspetivas, à desconstrução de pensamentos e ideias, bem como à possibilidade de conceber novas ligações a partir das obras da exposição de Desenho/Ilustração Científica.

Num segundo momento foi perguntado aos presentes qual era a perceção que o grupo tinha em relação às obras criadas pelos outros participantes. Houve respostas que refletiam sobre o processo de criação das imagens mais elaboradas e complexas incluídas no catálogo, em contraponto com produções que facilmente eram passíveis de identificação com os originais que lhes serviram de inspiração. Outra interrogação passava por saber se os integrantes consideravam ter havido mais ou menos participação devido à natureza digital da atividade. A maioria considerou que houve mais participação na modalidade digital e valorizou o facto de a mesma não inibir tanto os participantes, bem como sublinhou a comodidade de realizar uma atividade no seu ambiente pessoal e o tempo alargado para conceber e entregar uma tarefa.

A mediação artística e cultural e a integração das TIC em suas ações

Em virtude da exponencial transformação tecnológica e da difusão acelerada da internet, o setor cultural encontrou um conjunto renovado de oportunidades que, além da conquista de públicos distintos, possibilitam a criação, atualmente, de novos espaços de acesso cultural e que fomentam, de forma cada vez mais evidente, comportamentos participativos e interativos (Leal, 2017, p. 40-41).

As TIC foram uma das principais ferramentas utilizadas por mediadores artísticos e culturais durante a pandemia da Covid-19 em Portugal na tentativa de estabelecer relações e divulgar conteúdos dos seus lugares de ação.

É possível sugestionar, após a implementação do projeto em MAC junto à comunidade da ESELx, que a relação entre as TIC e a mediação artística e cultural pode ser um ponto de partida para explorar cognitivamente novas práticas, linguagens e métodos artísticos, entre diferentes comunidades estudantis.

Segundo Sancho (2009), as visões cognitivas e neocognitivas da aprendizagem e do ensino encontram no uso dos computadores em ambientes de educação, uma metáfora explicativa do que é o cérebro humano, uma vez que tal ferramenta possui capacidades de realizar ações humanas, como calcular, tomar certas decisões, ensinar ou transformar a realidade. Nesta lógica,

toda a atividade mediada por um computador pressupõe, por parte de quem o utiliza, um desenvolvimento de habilidades cognitivas e metacognitivas como a resolução de problemas, o planejamento, a algoritmização de tarefas, e etc. Este seria um dos argumentos de que “a experimentação e a exploração da informação “melhora imediatamente a motivação, o desempenho e as habilidades cognitivas dos alunos (Sancho, 2009, p. 662).

É uma realidade que, na contemporaneidade vivida, as novas tecnologias e a “exploração desta informação”, de modo geral, alteram as formas como as pessoas atuam no seu quotidiano, apresentando de igual modo um impacto sem precedentes no conhecimento adquirido nos universos educacionais. É igualmente um facto que “quanto mais os processos de inteligência coletiva se desenvolvem […] melhor é a apropriação, por indivíduos e por grupos, das alterações técnicas, e menores são os efeitos de exclusão ou de destruição humana resultantes da aceleração do movimento tecnosocial” (Lévi, 1999, p. 26). No entanto, é preciso reconhecer que a forma como os conhecimentos são propagados e como as pessoas recebem esta informação ainda é alvo de muito debate, tanto nas esferas de educação formal quanto nas esferas da educação informal.

As Tecnologias de Informação e Comunicação, nomeadamente, a Internet tem vindo a ser integradas na atividade humana, mas este processo não é neutro nem homogéneo, no sentido em que não chega a todos os lugares nem a todas as pessoas da mesma forma, nem com os mesmos propósitos. Se a chegada da Era Digital permitiu e impulsionou maior agilidade e velocidade na comunicação, o campo educacional deve avançar com mecanismos que permitam que o seu público, alvo tenha capacidades cognitivas para acompanhar esta realidade (Gonçalves, 2012, p. 3).

É importante ressaltar que não seriam só as capacidades cognitivas o alvo de certos constrangimentos quando o ambiente digital se impõe. Tais assimetrias reveladas nos contextos digitais automaticamente excluem aqueles que não dispõem dos respetivos dispositivos. Quando há cada vez mais uma preocupação de implementar uma educação inclusiva e uma efetiva democratização no acesso à cultura, questões como estas são pontos fundamentais a se ter em conta nas propostas associadas ao ensino informal, que apresentam a sua ação no contexto digital.

Para parte dos estudantes que puderam participar na atividade, verificou-se o desenvolvimento de pensamentos críticos, ligados à diversidade de perspetivas, e a conceção de novas ligações a partir das obras da exposição de Desenho/Ilustração Científica. Foi por isso notória, por parte das respostas indicadas pelos estudantes do grupo de discussão, muito mais a valorização do processo, em muitos momentos, em detrimento do produto final (as imagens para a Galeria). Estes dados reforçam o impacto que um desafio interativo pode originar entre uma comunidade académica: ser o motor de desenvolvimento do potencial criativo de cada um. O uso de ferramentas digitais possibilita que as pessoas desenvolvam as suas capacidades artísticas e competências pessoais através das próprias pesquisas, composições e tomada de decisões. O trabalho cooperativo e a integração social dos participantes, evidente na entreajuda dos vários grupos que produziram imagens coletivas, também foi outra repercussão positiva do projeto

A ideia do “aprender a aprender”, eco do modelo construtivista, pode, junto com uma atividade de mediação associada às tecnologias, reforçar o conceito de conexão e ajudar a explicar como se faz e porquê se faz: “conhecer um objeto é agir sobre ele e transformá-lo, apreendendo os mecanismos dessa transformação, vinculados com as ações transformadoras” (Piaget, 1970, p. 30). Esta relação motivaria participantes cada vez mais atuantes nas atividades artísticas e culturais ao desenvolverem pensamentos com maior autonomia, a partir de conteúdos que mobilizassem os seus interesses. Entende-se, com base nesta lógica, que o público não deve ser somente um recetor de informação, mas um cocriador de significados. Para Bidarra (2012) ao vivermos na era das médias digitais o típico “recetor passivo” da comunicação seria por isso um interlocutor capaz de expressar uma opinião crítica sobre o que vê, selecionando o que gosta e apto a criar os seus próprios conteúdos. Em tal contexto, para o autor, “faz sentido considerar a integração de sistemas de aprendizagem que são geridos pelos estudantes, permitindo-lhes definir objetivos pessoais, controlar os conteúdos e comunicar uns com os outros” (Bidarra, 2012, p. 33).

Neste tipo de lógica, é assaz relevante que o exercício da mediação artística e cultural em ambientes digitais não oprima ou direcione o pensamento e a construção imagética dos públicos com que irá trabalhar, dado que a cocriação da obra através do olhar passa inicialmente pela descodificação da mesma pelo espectador, o qual constrói, de forma pessoal, a sua narrativa.

Considerações Finais

O projeto em MAC procurou dar a conhecer o Espaço Artes do IPL à comunidade da ESELx no contexto digital e afastar a distância simbólica que existia entre os mesmos. Por meio da utilização da linguagem fotográfica como recriação artística a partir da exposição de Desenho e Ilustração Científica, foram dinamizadas, durante todo o processo, atividades que pudessem atrair a comunidade em geral e mobilizá-la a participar de forma remota do conteúdo expositivo do espaço, favorecendo assim o desenvolvimento da fruição cultural coletiva. Para isto, foi essencial não só dar a conhecer a oferta cultural do Espaço Artes do IPL, mas também estabelecer uma relação entre os objetos artísticos da exposição em causa e a comunidade da ESELx.

Ferreira (2014) acredita que o encontro do visitante com uma exposição é sempre pessoal e defende que, se uma instituição cultural tenta apresentar uma única perspetiva de suas obras, o visitante pode ser induzido a uma apreensão passiva de conteúdos, dificultando assim uma construção individual em relação aos possíveis significados, como se ocorresse a anulação de uma experiência de interioridade. Ao ressaltar que podem existir diferentes meios de experiências participativas, destaca que a mediação seria capaz de criar, no ouvinte, o envolvimento do seu eu.

Os participantes, através das imagens escolhidas, puderam determinar o que é possível aprender através de uma obra, experiência que coexistiu com os seus próprios interesses e processos criativos. Este aspeto reforça um dos muitos caminhos possíveis para o Espaço Artes do IPL, uma vez que as instituições que desejam ser participativas, “devem ser convidativas a muitas formas de estar, de ver e de experimentar, e abertas à construção colaborativa, a diferentes formas de participar, à partilha de conteúdos, valorizando o contributo do indivíduo para a construção de significados” (Ferreira, 2014, p. 4).

Os estímulos lançados pela atividade Mapa de Olhares promoveram criações dinâmicas, convidando, por exemplo, os participantes a realizarem o desafio em conjunto e estimulando a inter-relação dos grupos pré-existentes na comunidade académica. A atividade procurou apresentar uma proposta promotora de múltiplas leituras e ter em conta os diferentes perfis de aprendizagem.

Os estudantes da sessão de discussão aprofundaram, através dos seus sentimentos, as singularidades das diversas obras que a Galeria Mapa de Olhares expôs, revelando um envolvimento com as suas próprias criações e gerando novas conexões com as obras de outros autores. O resultado apresentado pelos participantes foi o desenvolvimento de competências pessoais e criativas, a aquisição de capacidades percetivas e autorreflexivas, bem como a desconstrução de pensamentos e ideias preconcebidas. “A emancipação começa quando se compreende que olhar é também uma ação que confirma ou transforma… O espectador também age… Observa, seleciona, compara, interpreta… compõe o seu próprio poema com os elementos do poema que tem a sua frente” (Rancière, 2010, p. 22). É nesse estado de liberdade sensível que o indivíduo se reinventa e constrói novos mundos.

De acordo com Immordino-Yang & Damasio (2007) é necessário ter em conta o pensamento sobre o papel da emoção na educação. É importante desenvolver atividades que possam recrutar as habilidades sensíveis dos participantes, uma vez que estas escolhas seriam baseadas no desenvolvimento do pensamento emocional. Segundo os autores, a fisiologia da emoção e o seu consequente processo de sentir têm enormes repercussões na forma como se aprende e na forma como se consolida este conhecimento. Desta forma, quanto mais os educadores não formais - como os mediadores - compreendem a natureza da relação entre emoção e cognição, melhor poderão alavancar esse relacionamento nos seus projetos.

Os dados das estratégias aplicadas demostraram que os parceiros não apenas facilitaram o acesso aos grupos com que interagiram, mas puderam também colaborar com o Espaço Artes do IPL através de ações integradas, como foi o caso da atividade Mapa de Olhares. Esta disponibilidade para “ouvir o outro”, existente nas várias estruturas, poderia, no futuro, ser um fator de estímulo para estabelecer encontros periódicos com o Espaço Artes do IPL, contagiando os estudantes e reforçando a participação cultural de toda a comunidade da ESELx.

Outro aspeto é a constatação de que, para contribuir com esta dinâmica, o mediador artístico e cultural necessita de tempo para promover relações consistentes. A manutenção e renovação destas relações dá-se com a continuidade e com a construção de um lugar-comum que se estrutura somente em conjunto.

A mediação gera cumplicidade, pois ela é um acontecimento que necessita de envolvimento, se faz no processo, na própria experiência com o objeto. Ela necessita de um trabalho coletivo, de problematização e construção de alternativas e respostas (mesmo que provisórias) no e do coletivo (Johann & Roratto, 2011, p. 11).

Para isso, o mediador deve tentar sempre desempenhar um papel relevante, buscar novas estratégias para encontrar soluções e transformar o meio em que atua, muitas vezes valorizando mais o processo do que o produto final.

Os resultados associados às atividades no contexto digital, embora reflitam uma pequena parte da comunidade da ESELx, demonstraram o impacto gerado pela intervenção em MAC, tanto em relação à comunicação com o Espaço Artes do IPL, até então inexistente, como no que diz respeito ao desenvolvimento de algumas competências e sentimentos junto daqueles que participaram das atividades.

O projeto em MAC reforçou que é possível ao mediador adaptar-se face à imprevisibilidade gerada pela Covid-19. Por outro lado, revelou também, em determinados momentos, algumas limitações, como, por exemplo, a assimetria revelada por uma atividade em que a participação do público estava condicionada ao acesso à internet ou à necessidade de possuir uma câmera/smartfone.

Considera-se, entretanto, que as contradições dos projetos em MAC podem conduzir a transformações. De facto, a atuação prática nesta área depende do contato direto com os públicos para criar laços através de um trabalho que envolve estar e conquistar. Para isso é determinante o investimento na formação do mediador e na sua capacidade para lidar com esta nova realidade, bem como a manutenção de um pensamento que articule as atividades presenciais com os meios tecnológicos.

É sintomático que um desafio criativo elaborado para toda a comunidade da ESELx, através da submissão de imagens, não tenha garantido a adesão de nenhum docente ou funcionário não docente. Esta ausência de envolvimento fornece pistas para novas questões e projetos futuros, reforçando a suposição de que as atuais estratégias de comunicação ainda não são suficientes para motivar a participação desses grupos junto ao Espaço Artes do IPL. Nessa perspetiva, seria relevante, por exemplo, criar um livro de presença voluntária para os públicos do Espaço Artes do IPL, de modo a compreender melhor quem são os seus frequentadores atuais e que tipo de estratégia de sensibilização pode ser desenvolvido para os não visitantes.

É possível ainda criar condições para que projetos como este possam ser continuados, aplicados em outras unidades orgânicas do Instituto Politécnico de Lisboa e associados às novas exposições que irão ocorrer no futuro. Entretanto é indispensável questionar e medir se o impacto de uma atividade digital pode estabelecer a mesma relação que uma atividade presencial com os públicos.

Finalmente, o projeto ofereceu a oportunidade de refletir e compreender se iniciativas como esta, apresentadas periodicamente, seriam capazes de criar uma relação de maior consistência com o público académico e se reforçariam a convicção de que há outras formas de descodificarmos as obras de arte e o espaço que as alberga.

Agradecimentos

Agradeço ao professor Paulo J. Morais-Alexandre, Pró-presidente para as Artes do IPL (em 2021), e à Coordenadora do Gabinete de Comunicação e Imagem (GCI) do Instituto Politécnico de Lisboa, Vanessa de Sousa Glória, bem como toda a sua equipa pela disponibilidade, acompanhamento, divulgação e criação da imagem para a atividade Mapa de Olhares e para a Galeria Mapa de Olhares. Agradeço à professora Laurence Vohlgemuth pelo acompanhamento como observadora participante na sessão de discussão. Agradeço ao professor Leonardo Charréu e à professora Filipa Burgo pela colaboração e parceria ao difundirem a atividade Mapa de Olhares em algumas das disciplinas que lecionam. Agradeço à Susana Torres do Gabinete de Comunicação e Imagem da ESELx pela publicação e divulgação da atividade Mapa de Olhares, pela publicação e divulgação da Galeria Mapa de Olhares através dos sites oficias da Instituição. Agradeço ainda à toda a comunidade académica da Eselx.

Referências bibliográficas

Barriga, B.S. (2007). “Plano de Acção Educativa: Alguns Contributos para a sua elaboração.” InServiços Educativos na Cultura, editado por Sara Barriga, e Susana Gomes da Silva, 44-56. Coleção Públicos 2. Lisboa: Setepés. Consultado emhttp://www.slideshare.net/JDLIMA/coleco-pblicos-servios-educativos. [ Links ]

Bidarra, J. (2012). Novos Ambientes Multimédia na aprendizagem a distância: instrumentos, experiências e reflexões in TIC na Educação: Perspetivas de Inovação. Centro de Competência Universidade do Minho. [ Links ]

Ferreira, C. (2014). O envolvimento cultural comunitário, in Paisagens Socioculturais Contemporâneas. Cescontexto. Centro de Estudos Sociais, Universidade de Coimbra. Consultado emhttps://eg.uc.pt/bitstream/10316/81037/1/O%20envolvimento%20cultural%20comunit%C3%A1rio.pdfLinks ]

Guerra, I. (2002) Fundamentos e Processos de Uma Sociologia de Ação: O Planeamento em Ciências Sociais. Cascais: Publicações Universitárias e Científicas [ Links ]

Gonçalves, A. (2012). O Papel das TIC na Escola, na Aprendizagem e na Educação. Dissertação de mestrado em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação. ISCTE. Instituto Universitário de Lisboa. [ Links ]

Instituto Politécnico de Lisboa. IPL. (2021). Espaço-Artes - Politécnico de Lisboa. Disponível em https://agendacultural.ipl.pt/venue/espaco-artes-politecnico-lisboa/Links ]

Immordino-Yang, M. & Damasio, A. (2007). We Feel, Therefore We Learn: The Relevance of Affective and Social Neuroscience to Education. Journal Compilation International Mind, Brain, and Education Society and Blackwell Publishing, 1(1) P. 3 [ Links ]

Johann, M. & Roratto, L. (2011). A dimensão educativa da mediação artística e cultural: a construção do conhecimento através da apreciação na presença da obra. LAV - Revista Digital do Laboratório de Artes Visuais. No 7. Disponível em https://periodicos.ufsm.br/revislav/article/view/3071/2154Links ]

Leal, Ana. (2017). Os museus de arte na era da revolução digital: considerações sobre os processos de mediação, educação e espetáculo. Dissertação de Mestrado em Estudos Artísticos apresentada à Faculdade de Letras. Universidade de Coimbra. [ Links ]

Kupiec, A., Neitzel, A., & Carvalho,C. (2014). A mediação cultural e o processo de humanização do homem. Antares: Letras e Humanidades, 6(11). [ Links ]

Lévi, P. (1999). Cybercultura. Editora 34. [ Links ]

Piaget, J. (1970). Psicologia e pedagogia. Editora Forense Universitária. [ Links ]

Rancière, J. (2010). O espectador emancipado. Orpheu Negro. [ Links ]

Sancho, J. (2009). La transformación de las tecnologías de la información y la comunicación en tecnologías de la educación: componentes de un camino incierto. Revista Diálogo Educacional, 9(28), 651-669. https://www.redalyc.org/pdf/1891/189114443017.pdfLinks ]

Serrano, G. (2008). Elaboração de Projetos Sociais. Casos práticos. Coleção Educação e Trabalho Social. Porto Editora. [ Links ]

Recebido: 02 de Junho de 2023; Aceito: 07 de Outubro de 2023

Nota Biográfica Mariana Gouveia Faria Mestranda em Educação Artística na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Licenciada em Mediação Artística e Cultural na Escola Superior de Educação de Lisboa. Participa no projeto ENTRE: Investigação em Mediação Artística e Cultural no âmbito do CIED/ESELx. É mediadora cultural no Centro de Arte Moderna Gulbenkian (CAM). Os interesses de investigação e de intervenção centram-se nas temáticas ligadas a projetos colaborativos e de intervenção em Mediação Artística e Cultural, ao discurso dos mediadores culturais em museus de arte moderna e contemporânea, à curadoria participativa e à participação cultural. https://orcid.org/0009-0003-2539-8879 Morada Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, Largo da Academia Nacional de Belas Artes 4, 1249-058 Lisboa, Portugal faria.g.mariana@gmail.com

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons