INTRODUÇÃO
Quelóides são tumores benignos de pele causados por alterações no processo de cicatrização de feridas caracterizado pela reparação excessiva local com produção anormal de colágeno pelos fibroblastos e migração de células inflamatórias.1,2Esses eventos são mediados pela super expressão de fatores de crescimento, como o fator de crescimento beta (TGF-beta), fator de crescimento vascular endotelial (VEGF) e fator de crescimento do tecido conjuntivo (CTGF).3
Fatores ambientais em pessoas com suscetibilidade genética são de valiosa importância para o surgimento dessas lesões.2 A frequência dos quelóides é mais evidente em indivíduos com ascendência africana e asiática, com maior incidência durante a puberdade e os locais mais comumente afetados são ombro, região pré-esternal, pescoço e braços.1,3
Várias modalidades de tratamento estão disponíveis para o tratamento de quelóides no lóbulo da orelha.1 As opções disponíveis incluem excisão cirúrgica, esteróides intralesionais, radioterapia, laser, pressão, crioterapia, creme de imiquimod a 5%, 5-fluorouracil e a combinação destes.1,4,5No entanto, estudos comparativos acerca da superioridade entre as terapias disponíveis ainda não foram realizados.4
O presente trabalho buscou demonstrar a confecção de brincos de borracha no intraoperatório para otimizar o tratamento cirúrgico de quelóides no lóbulo da orelha, de acordo com as guidelines CARE.6
MATERIAL E MÉTODOS
Foram avaliados cinco pacientes de fototipo V, 3 do género masculino e 2 do género feminino, com idades entre 18 e 32 anos (média de 22 anos). (Tabela 1) submetidos ao tratamento combinado de ressecção de quelóide no lóbulo da orelha e colocação de brinco de pressão, realizados em um hospital de referência na região norte do Brasil, no ano de 2019 a 2020. Todos os doentes deram o seu consentimento informado por escrito.
Todos os pacientes possuíam diagnóstico prévio de quelóides no lóbulo da orelha, uni ou bilaterais, como dimensões entre 1 a 6 cm e tinham sido submetidos a tratamento prévio com exérese das lesões (com ou sem corticoterapia), sempre com recidiva (Tabela 1).
Numa fase inicial foi realizada a exérese dos quelóides sob anestesia local e colocado brinco cirúrgico de pressão. A confecção dos brincos cirúrgicos foi realizada no intraoperatório utilizando dois êmbolos estéreis de seringas de 5 mL (Fig. 1) com posterior colocação dos êmbolos sobre a face anterior e posterior da área cruenta do lóbulo da orelha após a ressecção do quelóide, seguida de pressão realizada por ponto tipo U vertical com fio cirúrgico nylon 4-0 (Fig. 2). Os brincos foram mantidos por um período aproximado de 30 dias, mas 15 dias após o procedimento cirúrgico foi realizada infiltração intralesional com betametasona 7 mg/mL.
Caso nº | Idade | Fototipo | Género | Unidade anatómica | Lateralidade | Tempo de seguimento | Recidiva |
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1 | 19 | V | Masculino | Lóbulo | Bilateral | 6 meses | Não |
2 | 20 | V | Feminino | Lóbulo | Bilateral | 6 meses | Não |
3 | 18 | V | Masculino | Lóbulo | Unilateral | 6 meses | Não |
4 | 32 | V | Masculino | Lóbulo | Unilateral | 6 meses | Não |
5 | 21 | V | Feminino | Lóbulo | Unilateral | 6 meses | Não |
RESULTADOS
Após remoção dos brincos aos 30 dias foi evidente a cicatrização completa da ferida cirúrgica (Fig. 3A-C) e um bom resultado estético em todos os doentes. Os pacientes relataram ausência de dor local e fácil manuseamento e assepsia dos brincos.
Após um período de seguimento de 6 meses, não foi verificada recidiva das lesões em nenhum caso, mantendo-se um ótimo resultado estético (Fig. 3D e Tabela 1).
DISCUSSÃO
O tratamento isolado de quelóide com cirurgia excisional apresenta altas taxas de recidiva local que variam de 45% a 100% dos casos, variando conforme a literatura.1,3Logo, sempre que possível a combinação com outras técnicas atualmente disponíveis deve ser indicada para melhor resultado terapêutico e redução das taxas de recorrência.1
De acordo com Prasad et al a excisão de quelóide de lóbulo de orelha seguida de pressão local mostrou uma boa taxa de resposta, em torno de 90% a 100%.4 A aplicação da pressão pode ser obtida por diversos materiais como gesso, adesivo, brincos de pressão e talas personalizadas, sendo indicados após o procedimento cirúrgico, de forma contínua ou intermitente de 12-23 horas/dia, e de duração de 6 a 9 meses, com probabilidade de recidiva local nos casos de liberação prematura.7,8,9
Na presente série de casos não foi observada a ocorrência de recidiva local mesmo após a liberação da pressão após 30 dias, uma vez que estes pacientes realizaram infiltração com corticoide intralesional no 15° dia pós procedimento, dado o benefício anti-inflamatório e anti-mitótico desta substancia, e foram acompanhados por período de 6 meses.
A utilização de pressão após excisão de quelóide para ser efetiva deve ser de aproximadamente 20-40 mmHg e o mecanismo de ação subjacente a técnica de compressão se baseia na redução da perfusão, diminuição do oxigênio no local, redução da síntese de colágeno e degradação dos fibroblastos.5,10,11Nos casos aqui reatados, foi utilizada a técnica de pressão contínua por meio de êmbolos estéreis de seringas de 5 mL por serem de fácil acesso e reprodutíveis no momento do ato cirúrgico, além de boa aparência estética para utilização a longo prazo se assemelhando aos conhecidos brincos alargadores.
A eficácia da terapia por pressão depende principalmente da localização anatômica da cicatriz e da tolerabilidade do paciente.5
Por ser uma terapia geralmente isenta de dor quanto comparada as terapias intralesionais e de baixo custo para sua confecção, pode ser considerada uma importante opção terapêutica no tratamento de lesões queloidianas.5
Algumas limitações presentes neste estudo se devem ao tamanho da amostra relativamente pequeno, a não disponibilidade de grupo controle, um tempo curto de utilização da técnica no local e um período curto de acompanhamento pós-operatório. Estudos com maior amostra de pacientes, e acompanhamento a longo prazo são necessários para melhor avaliar a eficácia da técnica de brinco por pressão confeccionável em bloco cirúrgico.
CONCLUSÃO
Na análise de cinco casos de quelóides de lóbulo de orelha tratados com excisão, infiltração de corticosteróide no 15° dia e pressão contínua por brinco cirúrgico por 30 dias, com seguimento ambulatorial de 6 meses, não observamos nenhuma recidiva local. Além disso, a confecção do material utilizando êmbolos de seringas estéreis de 5mL foi considerada de baixo custo, fácil reprodutibilidade, boa aparência estética e boa tolerabilidade.