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Gazeta Médica

versão impressa ISSN 2183-8135versão On-line ISSN 2184-0628

Gaz Med vol.11 no.2 Queluz jun. 2024  Epub 26-Jun-2024

https://doi.org/10.29315/gm.v11i2.938 

Editorial

Cirurgia Robótica: Uma Revolução Silenciosa na Medicina Moderna

Robotic Surgery: A Silent Revolution in Modern Medicine

1. Gazeta Médica, CUF, Portugal


Introdução

Desde o advento da cirurgia robótica em Portugal em 2010, esta técnica tem revolucionado o campo da medicina cirúrgica. A introdução desta tecnologia marcou o início de uma nova era na abordagem minimamente invasiva de procedimentos cirúrgicos complexos. Este editorial explora o panorama global e nacional da cirurgia robótica, destacando os avanços significativos e as futuras perspetivas desta tecnologia.

Vantagens da cirurgia robótica

A cirurgia robótica oferece múltiplas vantagens para os pacientes, médicos, instituições de saúde e sistemas nacionais de saúde. Para os pacientes, os benefícios incluem incisões menores, menor perda de sangue, menos dor pós-operatória e recuperação mais rápida. Mas mais importante, a literatura indica que a precisão dos robots cirúrgicos reduz o risco de complicações e infeções, resultando em melhores outcomes clínicos.1 Acresce que, no campo da oncologia cirúrgica, a robótica vem evidenciando progressivamente resultados superiores às vias de abordagem alternativas, mesmo para lá do campo da cirurgia urológica onde tais benefícios já se encontram bem estabelecidos; é este o caso, por exemplo, da cirurgia oncológica colorretal.2

Para os médicos, a cirurgia robótica proporciona uma visualização 3D ampliada e estável do campo cirúrgico, movimentos precisos, melhor ergonomia e a capacidade de realização procedimentos complexos com maior facilidade, segurança e eficiência.3 Além disso, a curva de aprendizagem para novos cirurgiões é mais curta e mais segura.4

As instituições prestadoras de cuidados de saúde beneficiam de menores tempos de internamento, menor necessidade de transfusões e reoperações e uma utilização mais eficiente dos recursos hospitalares. A longo prazo, estas melhorias traduzem-se em redução de custos operacionais e otimização do uso das infraestruturas de saúde.5

Para o sistema nacional de saúde, a disseminação da cirurgia robótica significa um avanço significativo na qualidade dos cuidados prestados. Os países que incorporaram esta tecnologia em larga escala indicam uma melhoria global nos resultados cirúrgicos e na satisfação dos pacientes.6

Evolução da cirurgia robótica em portugal

Desde a introdução da cirurgia robótica em Portugal em 2010, várias instituições têm desempenhado um papel pioneiro na adoção e desenvolvimento desta tecnologia. Os cirurgiões portugueses realizaram procedimentos inovadores na Península Ibérica, incluindo o primeiro bypass gástrico em Y de Roux e a primeira cirurgia robótica da parede abdominal (hérnia). Destacam-se ainda a descrição de uma nova técnica para prostatectomia radical (The CUF Technique; Pinheiro et al, 2022)7 e a primeira transplantação hepática robótica da Europa (e segunda no mundo). Também veio de Portugal o primeiro proctor (instrutor oficial da Intuitive para a formação de novas equipas) de cirurgia robótica bariátrica na Europa, tendo realizado mais de 100 proctorings de cirurgia robótica bariátrica e colorretal em diversas instituições hospitalares de Espanha, Reino Unido, Bélgica e Países Baixos.

Apesar destes avanços, o desenvolvimento da cirurgia robótica no Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi lento na década 2010/20. A aquisição de dispositivos cirúrgicos robóticos foi restrita a três ou quatro hospitais privados. Este enorme atraso, em relação a outros países com que habitualmente nos comparamos, tem causas diversas: o elevado custo dos sistemas cirúrgicos robóticos, quer na aquisição, quer na utilização (para o que muito contribuiu a situação de monopólio que então existia neste mercado); a situação de crise nacional; alguma inércia de todas as partes interessadas (médicos incluídos). A situação começou a mudar em julho de 2019 com a doação de um sistema cirúrgico robótico ao Hospital Curry Cabral pela Fundação Aga Khan.

Expansão e competição no mercado de cirurgia robótica

O fim do monopólio da Intuitive, com a introdução dos sistemas Hugo da Medtronic e Versius da Cambridge Medical Robotics, vem trazendo uma redução lenta mas consistente dos custos. Esta mudança permitiu a aquisição de novos sistemas pelo SNS nos últimos cinco anos. A diversificação de fornecedores está a impulsionar a competitividade no mercado, resultando em custos mais acessíveis e maior acessibilidade às tecnologias robóticas.

Em todos os casos, a adesão entusiástica dos cirurgiões portugueses à tecnologia robótica tem sido notável. Recentemente, uma equipa de cirurgiões realizou a primeira transplantação hepática robótica da Europa, um feito que destaca a excelência e a inovação contínua no campo da cirurgia robótica em Portugal, apesar do investimento público escasso, lento e hesitante.

Perspetivas futuras

O futuro da cirurgia robótica em Portugal é promissor. A crescente competição no mercado está a levar a uma redução de custos e à aquisição de mais dispositivos para os hospitais do SNS. A já referida e ilustrada adesão dos cirurgiões portugueses à tecnologia robótica augura um período de grande inovação e melhoria contínua na técnica cirúrgica.

Espera-se que as próximas gerações de sistemas robóticos tragam avanços significativos, como maior precisão e personalização da cirurgia, instrumentos “inteligentes”, automação e novas aplicações em diferentes especialidades médicas. Além disso, a disseminação da cirurgia robótica poderá transformar profundamente os cuidados de saúde, permitindo intervenções mais seguras, menos invasivas e com melhores resultados para os pacientes.

Possíveis avanços na cirurgia robótica

Com o desenvolvimento contínuo dos sistemas robóticos, podemos antecipar uma série de avanços tecnológicos e clínicos. A introdução de inteligência artificial e machine learning nos sistemas robóticos pode proporcionar suporte adicional aos cirurgiões, oferecendo sugestões em tempo real e melhorando a precisão dos procedimentos. A telecirurgia, com a possibilidade de cirurgia à distância, também pode tornar-se uma realidade comum, ampliando o acesso a cirurgiões diferenciados e facilitando ações de formação, independentemente da localização geográfica.

A personalização dos instrumentos robóticos para atender às necessidades específicas dos pacientes e dos tipos de cirurgia também é uma área promissora.

Além disso, a redução continuada dos custos dos sistemas robóticos pode permitir que mais hospitais, incluindo aqueles em regiões menos desenvolvidas, adotem a tecnologia, democratizando o acesso a cuidados cirúrgicos de alta qualidade.

Finalmente, a educação e formação continuada dos cirurgiões na utilização de sistemas robóticos é crucial. Programas de simulação avançada e plataformas de formação podem garantir que os cirurgiões estejam sempre na vanguarda das práticas cirúrgicas, proporcionando os melhores resultados possíveis para os pacientes.

Conclusão

A cirurgia robótica representa um marco importante na evolução da medicina moderna. O seu impacto positivo nos cuidados de saúde é incontestável, trazendo benefícios substanciais para pacientes, médicos e instituições. Com a contínua inovação e a expansão dos sistemas cirúrgicos digitais, estamos à beira de uma revolução silenciosa que promete elevar a qualidade da cirurgia a uma nova dimensão.

No médio prazo, toda a cirurgia minimamente invasiva vídeo-endoscópica será realizada através de uma interface digital, com e sem automação - o que hoje designamos por cirurgia robótica.

Referências

1. Ng KT, Tsia AKV, Chong VYL. Robotic Versus Conventional Laparoscopic Surgery for Colorectal Cancer: A Systematic Review and Meta-Analysis with Trial Sequential Analysis. World J Surg. 2019;43:1146-61. doi: 10.1007/s00268-018-04896-7. [ Links ]

2. Feng Q, Yuan W, Li T, Tang B, Jia B, Zhou Y, et al. Robotic versus laparoscopic surgery for middle and low rectal cancer (REAL): short-term outcomes of a multicentre randomized controlled trial. Lancet Gastroenterol Hepatol. 2022;7:991-1004. doi: 10.1016/S2468-1253(22)00248-5. [ Links ]

3. Wong Sw, Crowe P. Manipulation ergonomics and robotic surgery - a narrative review. Ann Laparoscopic Endoscopic Surg. 2024;9:15. doi: 10.21037/ales-23-64. [ Links ]

4. Müller PC, Kuemmerli C, Cizmic A, Sinz S, Probst P, de Santibanes M, et al. Learning Curves in Open, Laparoscopic, and Robotic Pancreatic Surgery: A Systematic Review and Proposal of a Standardization. Ann Surg Open. 2022;3:e111. doi: 10.1097/AS9.0000000000000111. [ Links ]

5. Sadri H, Fung-Kee-Fung M, Shayegan B, Garneau PY, Pezeshki P. A systematic review of full economic evaluations of robotic-assisted surgery in thoracic and abdominopelvic procedures. J Robot Surg. 2023;17:2671-85. doi: 10.1007/s11701-023-01731-7. [ Links ]

6. Maynou L, McGuire A, Serra-Sastre V. Efficiency and productivity gains of robotic surgery: The case of the English National Health Service. Health Econ. 2024 (in press). doi: 10.1002/hec.4838. [ Links ]

7. Pinheiro A, Pedro Bargão Santos P, Lima E. The CUF Technique: Extraperitoneal Robot-Assisted Radical Prostatectomy. In: Nathan S, Ren S, Pavan N, Gu D, Sridhar A, Autorino R, editors. Robot-Assisted Radical Prostatectomy: Advanced Surgical Techniques. Berlin: Springer; 2022. p. 209-14. [ Links ]

Recebido: 26 de Junho de 2024; Aceito: 26 de Junho de 2024; : 26 de Junho de 2024; Publicado: 26 de Junho de 2024

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