INTRODUÇÃO
A enfermagem de reabilitação (ER), enquanto especialidade, abrange um conjunto de conhecimentos e intervenções específicas que permitem aos enfermeiros especialistas em enfermagem de reabilitação (EEER) potenciar a funcionalidade de pessoas com doenças agudas, crónicas ou com as suas sequelas (1), constituindo-se igualmente como um campo com especificidade de atuação e de construção de conhecimento (2). A Association of Rehabilitation Nurses (ARN) advoga a atuação dos EEER em vários contextos de prática clínica, nomeadamente em contexto agudo, com o intuito de maximizar o processo de reabilitação e minimizar a deficiência (3).
Em Portugal, a ER surge na década de sessenta, resultante da necessidade de especializar um conjunto de profissionais de saúde, entre os quais enfermeiros, e de construir um centro de reabilitação capaz de dar resposta às necessidades dos grandes deficientes motores. Este centro incluiria uma equipa multiprofissional e multidisciplinar, onde o EEER daria particular atenção aos aspetos que dizem respeito ao autocuidado e atividades de vida diária (AVD), perspetivando-os num paradigma de recuperação funcional tendencialmente dirigida para a retoma da autonomia nas atividades de vida diárias (4). Desde então, a ER tem sido uma especialidade em evolução, no intuito de dar resposta ao desenvolvimento científico e necessidades das populações, expandindo o seu campo de intervenção, não apenas na resposta aos processos saúde doença, mas igualmente enquanto facilitadores nos processos de transição que pessoa/cuidador/família experienciam (5).
Dentro dos diferentes contextos de prática clínica onde os enfermeiros desenvolvem a sua atividade, emergem os serviços de urgência (SU), como contextos de elevada complexidade, elevada afluência e rotatividade de doentes, que apresentam necessidade de intervenção aos mais variados níveis (6) e em que a prestação de cuidados de enfermagem é pluridimensional, implicando conhecimento técnico-científico abrangente sobre os processos de saúde doença, em diferentes momentos do ciclo da vida. Estes serviços constituem-se cada vez mais como a principal porta de entrada do Serviço Nacional de Saúde, dando assistência a milhares de pessoas todos os dias, muitas dessas com múltiplas comorbilidades, acometidas de situações agudas, desde não graves até graves, com risco de falência de funções vitais (6). Muitas dessas pessoas são idosos que, permanecendo vários dias nestes serviços, confrontam-se com restrições à mobilidade, o que os torna mais suscetíveis a complicações como insuficiência cardíaca, deterioração articular, risco trombo-embólico, perda funcional e aumento da dependência para as AVD. A prevenção de tais complicações deve ser o princípio orientador de qualquer plano terapêutico, com necessidade de introdução precoce de medidas com vista à diminuição do grau de dependência da pessoa (5).
Neste contexto, o Regulamento da Norma para Cálculo de Dotações Seguras dos Cuidados de Enfermagem, que equipara as salas de observação no SU a um internamento de curta duração, prevê a integração de EEER nestas equipas, atuando em complementaridade e garantindo a prestação de cuidados, todos os dias da semana (7). A prestação de cuidados de ER no SU poderá abranger intervenções diversificadas nomeadamente: a avaliação objetiva e completa da pessoa e família; a educação da pessoa e família; medidas de evicção/modificação de fatores de risco; apoio nutricional e psicossocial; reeducação funcional cardíaca, respiratória, motora, sensorial e cognitiva; manobras acessórias respiratórias; drenagem postural; exercícios de tosse; exercícios de amplitude respiratória; exercícios de correção postural; treino de exercício físico; treino AVD e reinserção social e profissional (8). Para além disso, a Organização Mundial de Saúde alerta que a reabilitação é parte integral da resposta em contexto de cuidados agudos e reforça a importância da integração de profissionais da área da reabilitação em contextos de emergência/catástrofe (9), recomendando explicitamente a sua integração nas equipas de emergência médica em situações de catástrofe e desastres, nomeadamente EEER. Acrescenta ainda que a integração destes profissionais nestas equipas garante que numa fase muito precoce a pessoa seja orientada no seu plano terapêutico no sentido de alcançar o melhor resultado funcional possível após uma lesão ou doença, explicando que a reabilitação ajuda a minimizar o impacte das cirurgias, reduz o tempo de permanência no hospital, previne complicações, reduz a necessidade de cuidados contínuos à pessoa e melhora a possibilidade de retorno à sua atividade laboral (9).
No entanto, e apesar das recomendações existentes para a integração de um EEER no SU, mais concretamente nas salas de observação, não foi encontrada evidência da sua efetiva integração nestes contextos no nosso país. Para além disso, Regulamento da Norma para Cálculo de Dotações Seguras dos Cuidados de Enfermagem (7) não explicita ou delimita o campo de intervenção do EEER neste contexto de prática clínica. Neste enquadramento, surge a seguinte questão de investigação: Qual a relevância atribuída à prestação de cuidados de Enfermagem de Reabilitação em contexto do SU? Esta pesquisa contribuirá para ampliar o conhecimento, na perspetiva dos EEER e dos enfermeiros que exercem nos SU, relativamente ao contributo e pertinência dos cuidados de ER nos SU.
Assim, o objetivo deste estudo é o de compreender a relevância do contributo do EEER no contexto atual nos SU.
METODOLOGIA
Partindo da questão de investigação e procurando dar resposta ao objetivo de compreender a relevância do contributo do EEER no contexto atual nos SU segundo a perspetiva dos enfermeiros peritos na área de urgência e dos EEER, foi escolhido um percurso de investigação, do tipo descritivo e exploratório, num paradigma de natureza qualitativa, seguindo a metodologia Standards for Reporting Qualitative Research (10). Como técnica de recolha de dados foi escolhida a técnica de focus group, cuja principal vantagem assenta no facto de permitir fornecer dados de um grupo de forma mais rápida e com menor custo do que se essa informação fosse sido obtida a partir de entrevistas individuais, permitindo abordar temas em profundidade, revelando características dos elementos que compõem o grupo focal. Trata-se de um processo de diálogo em grupo em que os participantes se juntam e conferenciam em torno de um tema, num processo de interações focadas, orientadas pelo moderador, com o intuito de obter dados qualitativos (11). O guião do focus group foi constituído por questões abertas de forma a estimular o pensamento livre e a favorecer a exploração em profundidade da resposta do participante e utilizou como ponto de partida as experiências de cada um dos participantes e a sua perspetiva da relevância da ER em contexto de SU.
Para a realização deste focus group foram convidados a participar enfermeiros peritos, tidos como informantes chave, mais relevantes para fornecer informação e discutir o tema em questão de acordo com os seguintes critérios de inclusão: ter mais de dez anos de experiência como EEER ou enfermeiro especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica (EEEMC) em contexto de SU, consentir explicitamente à participação no estudo e gravação áudio do focus group. Participaram neste estudo oito enfermeiros, por amostragem não probabilística intencional, quatro deles em exercício em SU, todos EEEMC (50%) e quatro EEER (50%). Os mesmos foram identificados aleatoriamente de P1 a P8 com o objetivo de manter o anonimato. Os participantes eram maioritariamente do sexo feminino (n = 6), correspondendo a 75% dos profissionais. A idade média foi de 43,1 ± 6,2 anos (mínimo de 36 e máximo de 54). Os participantes, para além do título profissional de enfermeiro especialista, todos detinham pelo menos uma pós-graduação (n=8; 100%), 25% tinha mestrado (n=2) e 12,5% doutoramento (n=1).
O focus group foi realizado pelos investigadores, via Microsoft Teams®, a 28 de setembro de 2020 com a duração aproximada de uma hora, moderado por um enfermeiro, doutorado, com experiência profissional na área de urgência. O focus group foi gravado e transcrito integralmente. A análise e tratamento dos dados qualitativos foram realizados com recurso ao QDA Miner 4 Lite, que começou com uma codificação inicial que gerou uma lista de códigos que posteriormente progrediu para uma codificação focada e consequente categorização. A redução dos dados qualitativos seguiu a metodologia proposta por Bardin (12). A análise dos dados quantitativos, nomeadamente os dados sociodemográficos dos participantes, foi realizada com recurso ao IBM SPSS Software, versão 25.0. O estudo teve parecer favorável da Comissão de Ética da instituição de ensino superior que acolheu o estudo (Parecer n.º 17/2020, de 19 de maio de 2020).
RESULTADOS
Da análise dos dados resultaram duas categorias: organização de cuidados e prestação de cuidados. Estas duas categorias foram divididas em subcategorias para facilitar a compreensão do conteúdo em análise (tabela 1).
Organização de cuidados
Esta categoria surgiu da reflexão dos participantes sobre o funcionamento dos SU e a importância de ter uma equipa diferenciada para a prestação de cuidados de qualidade. Dentro desta categoria inseriram-se as subcategorias: equipas, organização dos SU e qualidade dos cuidados.
Das subcategorias incluídas nesta categoria, a que se salientou pela sua frequência foi a equipas, onde os participantes deram particular relevância à inclusão do EEER no serviço de urgência: “papel deste enfermeiro especialista como uma mais valia no nosso serviço” (Perito [P]6), na mesma linha de pensamento o P3 refere: “enfermeiro com conhecimentos alargados em determinadas áreas será sempre uma mais valia”
Os participantes não descuraram a importância da exclusividade do EEER “ficar única e exclusivamente dedicado à reabilitação” (P4), ressalvando também que “o ideal era termos enfermeiro de reabilitação todos os dias, todos os turnos” (P8). Referiram também a importância da cooperação com outras equipas: “faz a ponte com os cuidados de saúde primários e hospitalização domiciliária” (P2), “referenciar para (…) colega da ECCI, para o colega dos cuidados continuados, para o colega do lar, para os cuidadores informais” (P5) e com a própria equipa do serviço de urgência “papel importante (…) para com os colegas, nomeadamente na ergonomia” (P6), “não é só cuidar do doente, mas também dos colegas” (P1).
Na subcategoria organização dos SU os participantes deram especial ênfase à permanência dos doentes no SU, “os doentes acabam por ser protelados, um bocadinho, na urgência e quando dizemos um bocadinho é 1 dia, 2 dias quando já deveriam estar numa unidade de internamento” (P1), P3 referiu também: “um doente deveria passar pela urgência para ser feito o diagnóstico e deveria seguir para o domicílio ou para o internamento, não deveria ficar cá e por isso nunca deveríamos ter aqui um doente horas suficientes (…) mas não é essa a realidade”. Referindo ainda a elevada afluência a este serviço: “o [elevado] volume de doentes que nós temos no SU” (P6), P2 refere também “a porta que tem mais trabalho é o SU”.
A par das duas anteriores subcategorias emergiu a qualidade dos cuidados. Os participantes referiram: “uma boa organização de equipas e serviços traduz-se na excelência da qualidade de cuidados e em “ganhos em saúde” (P4), P2 refere ainda “doentes são privilegiados e vão ter sempre os cuidados de reabilitação”, “ajudar neste tipo de articulação de cuidados, é isso a nossa essência do cuidar” (P2)
Prestação de cuidados
Esta segunda categoria surgiu da identificação das diferentes áreas em que o EEER pode atuar no SU de acordo com as suas competências e foi dividido em onze subcategorias: prevenção de complicações, capacitação para a alta e regresso a casa, resultados da intervenção na área respiratória, resultados da intervenção na área traumatológica, capacitação para a autonomia, gestão do regime terapêutico, resultados da intervenção na área cardíaca, resultados da intervenção na área neurológica, capacitação da família e cuidador e resultados da intervenção na área pediátrica.
A subcategoria mais frequentemente referida foi a prevenção de complicações. Nesta, a discussão levou-os a salientar que o EEER “tem um papel muito importante naquilo que também é um dos focos da enfermagem de reabilitação que se chama a prevenção de complicações” (P1), “enfermeiro de reabilitação neste sentido iria prevenir muitos reinternamentos” (P2) e “vindas às urgências recorrentes” (P7).
A segunda subcategoria com maior frequência foi a capacitação para a alta/regresso a casa, onde os intervenientes referiram que “[no serviço de urgência] não planeamos a alta, não fazemos ensinos” (P4), “vai para casa e não existe (…) qualquer nível de ensinamento para a saúde” (P6) mas que estas atitudes podem ser alteradas “esses ensinos pontuais devem começar… na urgência” (P4) realizados pelos EEER sendo uma das “competências do Enfermeiro Especialista em Reabilitação da Ordem” (P4). Ainda dentro das competências foi referida a pertinência do EEER como “elo da promoção da saúde” (P2) ressalvando que era importante criar uma “consulta de enfermagem de reabilitação” (P4) onde pudéssemos “reavaliar e perceber a capacidade que o doente tem em gerir o seu processo de doença” (P4).
Os participantes identificaram ainda resultados das intervenções do EEER nas áreas da reabilitação respiratória, cardíaca, traumatológica, neurológica e pediátrica. Destas, a subcategoria a que deram mais destaque foi aos resultados da intervenção na área respiratória dando ênfase à importância da capacitação da pessoa no âmbito da inaloterapia como forma de prevenção de readmissões hospitalares: “As técnicas são complexas, são vários passos, vários itens, ou panóplia de dispositivos e o doente não assimila tudo de uma só vez (P2) e sem o contributo do enfermeiro de reabilitação “os doentes vão com inaladores para casa e, se eles não fizerem a técnica correta, não adianta estarem a fazer” (P2). Acrescentaram ainda nesta subcategoria a importância da reabilitação respiratória, “o enfermeiro de reabilitação (…) executa técnicas de reeducação funcional respiratória com o ensino da tosse com mobilização de secreções (…) potencia a [sua] eliminação” (P5).
Os resultados da intervenção na área pediátrica também foram abordados pelos participantes quase sempre associados à área respiratória, ressalvando importância de aprimorar o que já é feito pelos “colegas da pediatria fazem este trabalho muito bem… da inaloterapia e dos ensinos para casa” (P2) com “os pais que vão com os miúdos asmáticos à urgência” (P2).
Quanto aos resultados da intervenção na área traumatologia/motora os participantes englobaram os doentes que recorrem ao SU devido a um traumatismo com necessidade de cuidados de reabilitação: “fazer o primeiro ensino a deambular com um auxiliar de marcha” (P2), (…) não descurando os cuidados com “o gesso (…) ou [imobilizador] Velpeau/Gerdy” (P4).
No que concerne aos resultados da intervenção na área cardíaca os intervenientes reconheceram a importância do EEER na abordagem aos “[doentes] insuficientes cardíacos precisam de ser muito trabalhados, são recorrentes no serviço de urgência” (P2).
Por fim, no que respeita às áreas de intervenção a que surgiu com menor frequência, mas não com menos relevância, foi resultados da intervenção na área neurológica: “doente que teve um AVC” (P4), com “depressão do seu estado de consciência” (P6) e/ou “compromissos da deglutição” (P7).
Todas estas áreas de intervenção abordadas anteriormente culminaram na importância dos ensinos transmitidos pelo EEER aos doentes, com vista à sua autonomia. Assim, a capacitação para a autonomia foi uma subcategoria abordada recorrentemente pelos peritos: “Os ensinos são em todos os momentos” (P7) e o “ajudar, ensinar, instruir, treinar, orientar, informar, avaliar e referenciar” (P5), são verbos que fazem parte de campo lexical diário dos enfermeiros de reabilitação para “capacitar a pessoa” (P4).
Para esta capacitação é importante que o utente faça a gestão do regime terapêutico, que foi mais uma subcategoria abordada pelos peritos intervenientes: “No serviço de urgência, frequentemente, detetam-se doentes com gestão do regime terapêutico (…) ineficaz e inadequado e eles voltam por isso mesmo” (P2). Por isso, a função do EEER passa por “reavaliar e perceber a capacidade que o doente tem em gerir o seu processo de doença” (P4), facilitar “adesão à terapêutica” (P7), “promover o reconhecimento das agudizações (…) fazer os ensinos e que têm de perceber na agudização” (P2).
Para que este processo de doença seja ultrapassado com sucesso os peritos falaram da importância do cuidador e assim despontou a subcategoria na qual o EEER tem um papel preponderante que é a capacitação família/cuidador, sendo que o “enfermeiro de reabilitação faz… a ponte muito grande quer com o cuidador… e com o próprio doente (P2) com vista a “capacitar a família” (P4) promovendo a autonomia do doente.
Por fim, na última subcategoria sem utilidade/sem interesse os participantes referiram que “não será fundamental [o EEER no SU]” (P3) principalmente “se alguém faltasse esse elemento da reabilitação era o primeiro a ter que saltar para os cuidados” (P1) e assim “teria que deixar de fazer as suas tarefas para substituir colegas nos cuidados gerais” (P3), ou seja, “estar lá se for para fazer cuidados gerais como os outros todos não é uma mais-valia” (P3).
Categoria | Subcategoria | Frequência | % |
---|---|---|---|
Organização de cuidados | Equipas | 59 | 18,0% |
Organização dos SU | 42 | 12,8% | |
Qualidade de cuidados | 32 | 9,8% | |
Prestação de cuidados | Prevenção de complicações | 39 | 11,9% |
Capacitação para a alta/regresso a casa | 38 | 11,6% | |
Resultados da intervenção na área respiratória | 35 | 10,7% | |
Resultados da intervenção na área traumatologia/motora | 21 | 6,4% | |
Capacitação para a autonomia | 20 | 6,1% | |
Gestão do regime terapêutico | 9 | 2,7% | |
Sem utilidade/sem interesse | 9 | 2,7% | |
Resultados da intervenção na área cardíaca | 8 | 2,4% | |
Resultados da intervenção na área neurológica | 6 | 1,8% | |
Capacitação família/cuidador | 6 | 1,8% | |
Resultados da intervenção na área pediátrica | 4 | 1,2% | |
Total | 328 | 100% |
DISCUSSÃO
Da análise do discurso dos participantes emergiram essencialmente duas categorias. Ao nível da organização dos cuidados, no Regulamento da Norma para Cálculo de Dotações Seguras dos Cuidados de Enfermagem, a integração do EEER é feita no contexto das salas de observação (7), no entanto, no discurso dos participantes não foram percecionadas distinções neste domínio, ou seja, os contributos que os participantes identificaram não foram distinguidos quanto ao posto de trabalho a ocupar. Nesta perspetiva, identificaram contributos direcionados à equipa do SU, nomeadamente ao nível da ergonomia. De facto, esta dimensão do exercício profissional do EEER é evidenciada nos critérios de avaliação da unidade de competência relacionada com a gestão do ambiente terapêutico (13) e que, tendo em atenção o conjunto de competências específicas do EEER, poderá tomar um sentido mais abrangente quando a equipa de saúde do SU é perspetivada como alvo dos cuidados. Neste sentido, a enfermagem de reabilitação ganha significado que efetivamente irá além da sua integração em contexto da sala de observação e, assim, um contributo relevante para a qualidade e segurança dos cuidados no contexto global do SU. Igualmente a ARN, dos domínios que compõe o modelo de competências para a prática de enfermagem de reabilitação, existem dois que traduzem os contributos identificados no discurso dos participantes: a liderança, na medida da responsabilidade do EEER na promoção de um ambiente de cuidados seguro, por exemplo ao nível da manipulação de doentes e os cuidados interprofissionais (14). Este modelo reflete o paradigma da enfermagem de reabilitação dentro do metaparadigma da enfermagem, salientando o papel fulcral do EEER enquanto facilitador dos cuidados interprofissionais e elemento determinante na equipa no sentido da obtenção de ganhos em saúde para as pessoas. Neste contexto, a ARN advoga que a prestação de cuidados de enfermagem de reabilitação é multicontextual havendo necessidade em cuidados de reabilitação desde as unidades de reabilitação à comunidade, passando pelos serviços de prestação de cuidados em situação aguda (14). De facto, numa análise das competências do enfermeiro em serviços de atendimento de situações agudas, na perspetiva das necessidades em reabilitação da pessoa, foram identificados quatro domínios sobreponíveis, de onde, uma vez mais, se salientam a liderança e os cuidados interprofissionais (15). Desta análise emergiram outros dois domínios - a promoção da saúde e a capacitação da pessoa para a gestão da incapacidade e doença crónica - onde se enquadra a categoria da prestação de cuidados. Nesta categoria, pela frequência no discurso, sobressaíram as subcategorias da prevenção de complicações e capacitação para a alta, traduzindo as competências específicas do EEER (1), bem como as prioridades definidas no mandato social da profissão (5). Os participantes salientaram o contributo do EEER na capacitação para a gestão da doença crónica enquanto estratégia para a redução das idas à urgência, indo ao encontro da evidência que existe da dificuldade que os doentes sentem na gestão de sintomas e da relevância desta estratégia educacional na redução de readmissões hospitalares (16). Revisitando as áreas de intervenção do EEER, foram identificados contributos da enfermagem de reabilitação ao longo do ciclo vital, tendo sido evocada a área pediátrica, e, com maior expressão, as áreas respiratória e motora. A perceção dos participantes foi ao encontro dos resultados encontrado por Falé (8), que concluiu que a intervenção do EEER se traduziu em ganhos ao nível da capacidade respiratória em doentes com patologia respiratória crónica em sala de observação e a redução de dias de internamento. Igualmente na área motora, a evidência sugere que a intervenção de um profissional da área da reabilitação, na modalidade de consultadoria, nas situações de lesão musculoesquelética aguda, dor lombar e perturbações da marcha, se traduzem em ganhos para a pessoa (17, 18). Numa revisão integrativa sobre as experiências e/ou perceção de profissionais de saúde e doentes no domínio da reabilitação no SU, conclui-se que profissionais de saúde e doentes vêm estes profissionais como tendo habilidades clínicas especializadas e um papel educacional, mas que existe confusão de papéis e fraca integração nas equipas dos SU (19).
A comparabilidade destes achados com a evidência produzida a nível internacional torna-se difícil uma vez que, do ponto de vista da organização dos serviços de urgência, as realidades na organização dos serviços é diferente de país para país (19) e, por outro lado, a enfermagem de reabilitação não é uma realidade em muito países e, mesmo nas que existe, verificam-se especificidades em cada um deles (2). Grande parte da evidência encontrada neste contexto traduz os resultados da intervenção de técnicos de diagnóstico e terapêutica (20), limitando ainda mais a comparabilidade, dadas as diferenças de competências e âmbito de intervenção de cada um destes profissionais.
CONCLUSÃO
Os participantes consideram a integração de um EEER no SU como uma mais valia tanto na organização do serviço como na prestação de cuidados, salientando a sua importância no âmbito das competências específicas do EEER e das comuns do enfermeiro especialista, com os conhecimentos abrangentes na intervenção à pessoa e na articulação com a equipa multidisciplinar. É ao nível da prevenção das complicações que salientam maior relevância das suas intervenções, assim como na capacitação da pessoa e cuidador para a alta. Estes resultados vão assim ao encontro dos referenciais da profissão sobre a necessidade de dotar os SU de EEER, sugerindo mesmo que a intervenção do EEER não se limitará apenas às salas de observação, identificando ganhos aos mais variados níveis de intervenção.
Este estudo tem algumas limitações, nomeadamente relacionadas com a técnica de recolha de dados e número de participantes, que limita a transferibilidade destes resultados para além do contexto em que foi realizado. Neste sentido mostra-se pertinente aprofundar e dar continuidade à investigação nesta área, procurando criar evidência dos ganhos resultantes da integração dos EEER no SU, consolidando para o nosso país os contributos identificados pelos participantes. A integração de EEER nos SU, enquanto atores na melhoria de cuidados à pessoa, implicará uma mudança na cultura organizacional dos hospitais no que concerne a prestação de cuidados de ER nestes contextos de prática clínica.