1.Introdução
A Conferência de Incheon da Unesco enfatizou duas qualidades da educação, incorporadas ao Objetivo de Desenvolvimento sustentável nº 4 das Nações Unidas: qualidade e inclusão. Ambas são transversais a todos os objetivos consensuados ao evento (Unesco, 2015). Assim, levou-se a cabo uma investigação qualitativa sobre a execução da política educativa em Portugal, consubstanciada em atos legais. Para isto, realizou-se um estudo de caso num Agrupamento de Escolas no Sul do País, de modo a definir o conceito de inclusão seguido nas práticas educativas e as formas de desenvolvimento da experiência em campo. O estudo seguiu o clássico triângulo de Stake (2007), composto por análise documental, observação e entrevistas semiestruturadas com dirigentes e professores. As condições adversas da pandemia, com o fechamento das escolas e a oscilação do seu funcionamento, conforme o comportamento da COVID-19, exigiram contornar vários problemas, como a realização de entrevistas por meio virtual e as observações registadas em caderneta de campo, nos poucos e breves períodos de funcionamento presencial, além do arquivo da primeira autora, dirigente do respetivo Agrupamento, que, ao exercer a supervisão, pôde anotar múltiplas observações diretas, não sistemáticas. A principal constatação foi que, tanto na legislação e normas, quanto no entendimento das.os educadoras.es havia uma tendência a estreitar o foco para o alunado com necessidades especiais. Com isso, evitaram-se as preocupações com a pluralidade de línguas e culturas, de que é rica a região (Algarve), como resultado da presença de minorias étnicas, imigrantes e refugiados de mais de um continente. Normas sobre a educação especial eram compreendidas e cumpridas pelas.os educadoras.es, no entanto, deixaram de ser enfatizadas as questões relativas à pluralidade cultural ou a interculturalidade (Cambi, 2001). Esta aceção mais ampla, inerente à qualidade e igualdade, ficou esmaecida, se bem que não esquecida, quer na política, quer nas práticas educativas. Ademais, embora os objetivos das entrevistas tenham sido alcançados, verificou-se que o contacto presencial teria permitido uma interação mais completa, pela compreensão das linguagens corporais e outras, simbólicas e não simbólicas, chamadas pelo clássico antropólogo Edward Hall (1990) de linguagem silenciosa. Desse modo, embora as condições fossem singulares, pela pandemia, consideramos que, preferentemente, a pesquisa qualitativa seja presencial.
2.Contextualização do estudo
2.1 Objetivos
Nos últimos anos, a inclusão tem vindo a assumir reconhecidos contornos hegemónicos em diferentes áreas, sendo especialmente notório na educação. As nossas escolas são o reflexo de uma sociedade caracterizada por uma enriquecedora diversidade social, que nem sempre é entendida da melhor forma como tesouro descoberto, mas como deficiência de capital cultural (Bourdieu & Passeron, 1970). Portugal reconheceu a importância da educação inclusiva ao ratificar, em 1994, a Declaração de Salamanca, tendo mais recentemente, em 2018, assumido a inclusão como uma forma de intervenção educativa prioritária, através da publicação do Decreto-Lei 54/2018 e Decreto-Lei nº 55/2018. Tais normativos visam criar um paradigma de inclusão centrado em fundamentos de equidade, baseado num eixo do respeito pela diferença. A escola tem revelado, ao longo dos anos, uma relevante capacidade de adaptação, deparando- se ainda com inúmeras dificuldades na implementação dos ideais política e legislativamente defendidos. A ténue distinção entre os conceitos de integração e inclusão dificulta a operacionalização da teoria legislativa que evidencia a universalidade da educação. Portugal abraça esta linha educacional inclusiva através da implementação responsável do estabelecido no Decreto-Lei nº 54/2018 (2018), em articulação com o pressuposto do Decreto-Lei nº 55/2018 (2018a), permitindo assim que a escola flua para uma dinâmica de compreensão da diversidade humana. A questão consiste em sensibilizar o corpo docente e restante comunidade educativa para a necessidade de mudança do paradigma educacional, para que a escola não continue a ignorar o que acontece à sua volta nem a marginalizar as diferenças. Embora as políticas educativas assentem num fundamento teórico predominantemente inclusivo, as escolas ainda não o operacionalizaram totalmente, encontrando-se demasiado dependentes do cariz do Decreto-Lei nº3/2008, de 7 de janeiro, o qual anunciava uma educação inclusiva direcionada exclusivamente para os grupos de crianças e jovens tradicionalmente excluídos, os denominados alunos com Necessidades Educativas Especiais. Este normativo prima por caracterizar o público-alvo da Educação Especial os alunos com Necessidades Educativas Especiais de Caráter Permanente “ [...] alunos com limitações significativas ao nível da atividade e da participação, num ou vários domínios da vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de caráter permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social.” (Decreto-Lei nº 3/2008. Artigo 1.º, inciso 1º). As políticas educativas assumidas em Portugal tentavam, deste modo, concretizar o princípio da inclusão defendida pela Declaração de Salamanca e reforçada, em 2011, pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Promulgam-se normativos na tentativa de teorizar uma educação inclusiva eficaz e eficiente, mas, “não chega saber como se faz, (…) é necessário querer fazer e acreditar que é possível construir uma escola e, obviamente, uma sociedade onde todos têm um lugar.” (Silva, 2011, p.120). Acreditar é ganhar consciência de que, face às exigências atuais, já não basta integrar os alunos, proporcionar-lhes um espaço comum de aprendizagem, é necessário oferecer-lhes oportunidades para aprenderem ao seu ritmo e de acordo com as suas potencialidades e/ou dificuldades. Não há alunos-modelo, cada um tem características próprias e únicas, assim, o desafio da educação atual consiste em adequar o processo de ensino/aprendizagem a cada um dos alunos, alargando a educação a todos. Em Incheon, o conceito de inclusão transcendeu as necessidades educativas especiais, para abranger diferentes backgrounds sociais e culturais, inclusive aqueles selecionados pelos filtros da reprodução educativa, segundo a teoria bourdieusiana. A inclusão e a exclusão não são totais, ao contrário, há estudantes incluídas.os em certas comunidades e excluídas.os de outras, de modo que cabe ao sistema educativo atuar nessa área cinzenta (Qvortrup, & Qvortrup, 2017). A análise da inclusão, ao decompor-se no âmbito organizacional, é multidimensional, dividindo-se, de acordo com o cubo de Schuelka e Engsig (2020), nos níveis macro, meso e micro. Esta investigação focalizou o nível macro da legislação e normas, o meso do Agrupamento e o micro das escolas. A coerência interna e externa é essencial para que os efeitos se concretizem para as.os discentes. O discurso sobre a temática em causa inclui frequentemente recorrer aos conceitos de integração/inclusão, muitas vezes assumidos como termos idênticos. Esta assunção é fator condicionante da verdadeira construção de uma cultura da escola equitativa, limitando a abordagem integracionista aos alunos considerados “deficientes”. O percurso fez-se encaminhando estes alunos para Unidades Especializadas integradas em escolas regulares, como contemplado no artigo 26º do Decreto-Lei nº 3/2008. Pretendia-se que as Unidades de Apoio Especializado para a educação de alunos com deficiência constituíssem uma resposta educativa especializada organizada em função do “tipo de dificuldade manifestada, pelo nível de desenvolvimento cognitivo, linguístico e social e pela idade dos alunos” (Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de janeiro, artº 26 (2018). Em simultâneo, estes alunos seriam integrados nas turmas regulares, para efeitos administrativos, revelando o despreparo da escola para a inclusão. Incluir não é considerar estes alunos iguais, mas antes reconhecer a sua individualidade, as suas limitações e potencialidades para construir um processo de ensino-aprendizagem que lhes faculte as mesmas condições de sucesso educativo, pessoal e social O presente estudo de caso pretende, pois, descortinar as formas de implementação das metodologias inclusivas, seus fatores facilitadores e obstáculos no Agrupamento selecionado. A partir deste propósito central foram delineados objetivos específicos, nomeadamente aferir a materialização do constante no Decreto-Lei nº 54/2018, em simbiose com o Decreto-Lei nº 55/2018 92 (2018, 2018a); reconhecer o alargamento da inclusão a todos os alunos e avaliar o papel da Direção, Estruturas Intermédias e Equipa Multidisciplinar de Apoio à Educação Inclusiva (EMAEI) na implementação de uma educação inclusiva. O caso em estudo, como informado, é o de um Agrupamento de Escolas, localizado na região Sul de Portugal Continental, mais precisamente no Algarve, cujo Plano de Ação/Projeto de Intervenção da Diretora reflete uma consciencialização da importância de construir uma escola inclusiva, capaz de acompanhar as mudanças sociais emergentes, com base numa visão de autonomia, e outras características. As convicções da preponderância da inclusão no processo educativo encontram-se ainda expressas nos compromissos assumidos, pela mesma, na Carta de Missão, nomeadamente, o investimento “na imagem do Agrupamento como instituição pública, aberta e inclusiva e como fator de coesão entre as várias Unidades Orgânicas que o constituem, desenvolvendo uma forte cultura de Agrupamento” e no Projeto Educativo do Agrupamento, cuja visão assenta “num investimento claro no aluno enquanto indivíduo, através da promoção de uma diversidade de situações de aprendizagem, e enquanto indivíduo social cujo desenvolvimento do sentido de cidadania é fundamental em todo o seu processo formativo.” O Agrupamento em estudo é constituído por nove unidades orgânicas que abrangem todos os Ciclos de Ensino e que se encontram dispersos geograficamente pelo Concelho, acolhendo crianças e jovens de contextos socioeconómicos distintos, pelo que constitui um desafio em termos de diversidade. Podemos considerar a coexistência de comunidades escolares díspares, incluindo minorias étnicas, dentro do mesmo Agrupamento, uma comunidade escolar tipicamente citadina com predomínio de indivíduos de estrato médio-alto, uma comunidade escolar de estrato baixo-médio ligada ao mar e outra comunidade de camada baixa-média tipicamente rural. O Agrupamento de Escolas em estudo apresenta um universo de cerca de 2000 alunos, diferentes quanto ao background familiar, às expetativas face à escola e ao futuro, às condições de vida, aos hábitos culturais, à língua materna, às vivências, às capacidades ou limitações. É um Agrupamento com uma população escolar diversificada, dotada de uma miscigenação cultural, que caracteriza a região algarvia, imprimindo um caráter de extrema exigência à sua missão educativa.
3.Metodologia
O caso em estudo focaliza um Agrupamento de Escolas, localizado no Algarve, cujo Plano de Ação/Projeto de Intervenção da Diretora reflete uma consciencialização da importância de construir uma escola inclusiva que possa responder às exigências sociais, materializada nos documentos estruturantes que alicerçam todo o processo educativo. O Agrupamento é constituído por nove unidades orgânicas que abrangem todos os Ciclos de Ensino (ISCED 0, 1 e 2 na terminologia da Unesco) e que se encontram dispersos geograficamente pelo Concelho, acolhendo uma população escolar diversificada, dotada de uma miscigenação cultural, que caracteriza a região algarvia, imprimindo um caráter de extrema exigência à missão educativa do Agrupamento. Efetivamente, conforme Patton (2000), a escolha da amostra na pesquisa qualitativa, inclusive a destinada à avaliação, segue lógicas próprias, diferentes da investigação clássica, com amostragem aleatória. Na investigação quantitativa busca-se primordialmente a abrangência, enquanto a investigação qualitativa, prefere a profundidade em detrimento da abrangência. Consequentemente, podem-se selecionar casos ricos de informação, como casos extremos ou desviantes, amostra de casos com variação máxima, de casos típicos, de casos críticos, confirmativos ou divergentes e outras amostras, segundo diversos critérios. A experiência em tela aproxima-se de um caso rico em informações por roçar o extremo da diversidade social e cultural, tanto nas raízes históricas (uma região onde a civilização muçulmana alcançou profundas raízes na Península Ibérica e, simultaneamente, pela imigração e arco de diversidades da população local, quer em meio urbano, quer em meio rural. Tais procedimentos, segundo o autor, são perfeitamente legítimos quando os objetivos fogem da ortodoxia. Neste caso, busca-se o sentido inerente às paisagens socioculturais. Estes procedimentos têm sido utilizados largamente pela pesquisa em contexto mundial e ibero-americano. Por estas riqueza e pluralidade cultural, o caso foi selecionado para o estudo, desenvolvido, conforme observação, no triângulo de Stake (2007), com o entrecruzamento dos dados da análise documental, observação e entrevistas semiestruturadas, que foram foco de análise de conteúdo. A dinâmica de interação entre os vértices permite detetar convergências e divergências, para aprofundamento, já que a opção é pela profundidade do caso. A pesquisadora é uma das dirigentes, participante e ao mesmo tempo testemunha da escola, dois papéis sociais que buscou separar na investigação. Por isso, tem em mente as pontes de interação entre as teorias, a legislação e as práticas. Neste caso, o conceito de objetividade não pode ser empirista- positivista, porém, sim, o preconizado por Weber: o pesquisador é um ser imerso no lago, que, sem a condição humana, não seria capaz de compreender (Verstehein) o lago e os demais peixes, ao contrário da objetividade das ciências da natureza e, sim, de acordo com o distanciamento crítico da sua visão participante nas ciências do “espírito” (Geistwissenschaften, na expressão original, tão difícil de traduzir para o português) (Gomes, 2012). No primeiro vértice do triângulo, foram analisadas a legislação e normas, em particular o Decreto-Lei nº. 3/2008 e os vigentes Decretos-Leis nºs 54 e 55/2018 (2008, 2018, 2018a), assim como os documentos de tradução destes atos nas práticas educativas do Agrupamento em tela, isto é, a sua Carta de Missão, o seu Projeto Educativo e outros documentos selecionados. O segundo vértice do triângulo envolve a observação. A limitação aqui consistiu na dificuldade de observar as cenas de salas de aula, corredores e pátios e de entrevistar o alunado, disperso, todo menor de idade, nas condições então correntes. Acrescente-se que, para dificultar a compreensão da “linguagem silenciosa”, antes mencionada, existia ainda o uso compulsório de máscaras, com várias camadas, obrigatoriamente, a dificultar a compreensão da fala e a ocultar parte do rosto, com a sua extraordinária dinâmica. Ainda assim, a primeira pesquisadora aproveitou as “janelas” que se abriram e fecharam, além de recorrer às experiências da sua supervisão e direção, como profissional, para suprimento. Por sua vez, o terceiro vértice foi o das entrevistas semiestruturadas. A escolha desta técnica assentou no facto de permitir recolher uma quantidade significativa de dados e informações que permitirão enriquecer o estudo e promover momentos de reflexão. Segundo Bogdan & Biklen (1994, p. 85), “uma entrevista é utilizada para recolher dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspetos do mundo.” A entrevista foi previamente planeada, tendo sido elaborado um guião que funcionou como linha orientadora das informações que se pretendiam recolher com o estudo em causa. Antes de realizar as entrevistas, procedeu-se a um teste de fiabilidade/eficácia da entrevista que contou com a participação da Coordenadora do Centro de Apoio à Aprendizagem e uma Coordenadora de Disciplina, tendo os dados recolhidos sido utilizados unicamente para aferição da coerência das questões construídas. Atestada a coerência das questões planificadas, partiu-se para a aplicação das entrevistas. Dado o contexto pandémico vivenciado, optou-se por aplicar as entrevistas online, por videoconferência, utilizando o Microsoft Teams. Os dados foram recolhidos através da gravação/transcrição das respostas. Antecipadamente solicitou-se autorização aos inquiridos, conforme as normas da ética da pesquisa, para a aplicação da entrevista. Seguiu-se a organização do material recolhido e a categorização dos dados da pesquisa através da construção de grelhas de análise, no processo de análise de conteúdo (Bardin, 2015). A utilização de meio virtual satisfez aos objetivos, no contexto da pandemia, com o fechamento dos estabelecimentos escolares ou a sua abertura intermitente, conforme o comportamento do vírus na região. A sociologia clássica, ainda na era do rádio e do telefone, na primeira metade do século XX, reconheceu as diferenças entre os contatos sociais diretos, pessoais, e os contatos sociais indiretos (Casale, Tella, & Fioravanti, 2013), por meio de uma técnica, tendo consequências importantes sobre a criança e a conceção de infância, processos analisados percucientemente por Postman (1994), ao tratar do “fim da infância”, pois, mesmo pré-letrada, era exposta a fatos interditos ou parcialmente velados, como o sexo e a violência. Os contactos indiretos multiplicaram-se com a televisão, a internet e outros meios, a partir da Segunda Guerra Mundial. Hoje, por exemplo, os horrores das guerras podem ser vistos até por crianças menores, para as quais não é útil afirmar que o conflito está longe do seu meio e que elas nada têm com isso. Como se indicou acima, esta foi uma das limitações da técnica. Ao invés de uma entrevista presencial em que ocorre o livre trânsito da interação social e a.o entrevistador.a pode observar melhor as reações da.o entrevistada.o, perdem-se as nuances das linguagens simbólica e não simbólica. Portanto, reitera-se que, noutras circunstâncias, a investigação qualitativa seja efetuada em presença. A primeira opção virtual é a comunicação com imagem e som, seguindo-se, na pior das hipóteses, apenas com o som. Como na antropologia, a ousada Margaret Mead (2001) viveu e vestiu-se como as jovens samoanas, aprendeu sua língua, tornou-se íntima de várias delas, imergindo no seu contexto sociocultural para compreender a sua adolescência e compará-la com a dos Estados Unidos. Do mesmo modo, os Diários Índios, de Darcy Ribeiro (2020) resultam das anotações de campo durante a vida vivida pelo ilustre antropólogo brasileiro, cujo centenário este ano se comemora, junto a povos originários do Meio Norte e da Amazónia. Na educação, inúmeras investigações quase etnográficas ou etnográficas resultaram da imersão em escolas durante todo um ano letivo, como na investigação de Lira & Gomes (2018), sobre a violência percebida por adolescentes numa escola de periferia urbana, em Brasília, Brasil. A riqueza descerrada por estes projetos, aqui exemplificados, sugerem o valor das vivências in loco, para compreender os processos sociais. Conseguintemente, cabe frisar a relevância do chamado contacto direto na pesquisa que abdica da abrangência em favor da sua profundidade, para que os seus fins e objetivos plenamente se concretizem. Este é um dos riscos do uso de bases eletrónicas de dados, à disposição sob condições na internet. Ou seja, o uso da computação, inclusive a prospetiva da inteligência artificial, muda as epistemologias, com a pesquisa in vitro a substituir ou a concorrer a pesquisa in vivo (Ganascia, 2018). Como nos jogos de luzes e sombras, existem notáveis vantagens, como a de diferentes investigadores utilizarem os mesmos conjuntos de dados com teorias e metodologias diversas e reiterarem ou não as conclusões de colegas. Todavia, se existe luz, também se pode contar com as sombras. Cumpre refletir sobre tudo o que perdemos com a pesquisa in sílico, nas revoluções do século XXI. Por exemplo, as investigações sobre a transmissão do vírus SARS-CoV-2 por superfícies, realizadas nos ambientes laboratoriais, isto é, in vitro, teve resultados iniciais quase alarmantes. Quando se investigou in vivo, fora das “cápsulas” dos laboratórios, verificou-se que a probabilidade de contágio era muito mais reduzida.
4.Resultados e Conclusões
A caracterização da amostra acompanha a composição nacional do corpo docente, três quartos das.os entrevistadas.os foi do sexo feminino e a maioria absoluta contava com o Mestrado. Eram experientes profissionalmente e se encontravam em maioria na meia-idade. Quatro quintos dos membros da equipa intermédia claramente distinguiam inclusão de integração, abrangendo todo o alunado, com a sua pluralidade sociocultural. Era claro para a maior parte do grupo que a integração não significa necessariamente inclusão e que adotava, na prática, metodologias inclusivas para o alunado com necessidades educativas especiais. Consideravam que a inclusão não se restringe à educação especial, mas, sim, alcança todo o corpo discente, para os quais é preciso traçar diferentes rotas para atingir os mesmos fins e objetivos educacionais. Era também muito elevado o conhecimento sobre a legislação. Diante das diversidades, seguiam uma abordagem abrangente, visando, inclusive, discentes com dificuldades oriundas do capital cultural, social e económico, segundo Bourdieu e Passeron (1970) e que, com frequência, se afastam do caminho do sucesso escolar. A Equipa Multidisciplinar de Apoio à Educação Inclusiva articulava com as famílias, técnicos especializados, docentes e entidades sociais na busca de soluções para a inclusão das.os educandas.os. Com base na consciencialização das.os educadoras.es, declararam que haviam sido dados os primeiros passos rumo a uma escola realmente inclusiva. Notavam mudanças nas práticas docentes nos termos da legislação e normas, embora houvesse um consenso quanto às dificuldades e resistências no sentido de alterar práticas e atitudes incrustadas no fazer educativo. No entanto, uma minoria ainda se restringia à visão de que a inclusão se referia à educação especial. Os documentos do Agrupamento eram coerentes com os atos legislativos e normativos. Igualmente, as observações disponíveis ratificaram a coerência entre documentos, atitudes e práticas da imensa maioria das.os educadores. Ou seja, o Agrupamento selecionado, em que pesasse a sua diversidade e complexidade, se colocava maioritariamente em sintonia com o espírito da Conferência de Incheon e dos Objetivos de Desenvolvimento das Nações Unidas, em especial do nº 4, concernente à educação.