INTRODUÇÃO
O touro Nelore exerce alta prevalência de reflexo de flehmen (28 %) e de cheirar e lamber a genitália da fêmea (40 %) em testes de comportamento sexual, libido ou capacidade de serviço, realizados em curral (Oliveira et al., 2007). Esses resultados sugerem que os estímulos olfatórios exercem elevada importância na ativação do comportamento sexual de touros zebus.
O reflexo de flehmen consiste na elevação e enrugamento do lábio superior acompanhado da dilatação das narinas, inclinação do pescoço e forte inalação. Este comportamento é um mecanismo fisiológico destinado a facilitar a condução de feromônios (substâncias químicas que, quando detectadas pelos animais, causam excitação sexual) para o órgão vomeronasal (OVN; Hart e Leedy, 1987). Lamber e cheirar a genitália feminina constitui um outro mecanismo utilizado pelos touros, em testes de libido, para detectar os sabores e odores que identificam as fêmeas em estro, sendo que, nesse caso, a condução dos estímulos é realizada pelo nervo olfatório e independe do OVN (Gandelman, 1983).
Dessa forma, a percepção olfatória, nos mamíferos, se dá através de duas vias. A primeira é constituída pelo sistema olfatório principal e a segunda pelo sistema olfatório do OVN ou como também denominado, via do sistema olfatório acessório (Doving e Trotier, 1998; Dulac e Wagner, 2006). Acredita-se que a detecção de odores é função atribuída ao sistema olfatório principal, enquanto que a identificação de feromônios é considerada função do sistema olfatório acessório (Doving e Trotier, 1998). No entanto, esta separação da identificação de odores e feromônios podem sofrer variações conforme a espécie (Dorries et al., 1995; Kelliher e Baum, 2001; Dulac e Wagner, 2006).
O OVN é uma estrutura tubular quimiorreceptora do sistema olfatório acessório, responsável pela detecção de feromônios. Este órgão está localizado na base do septo nasal e se comunica com a cavidade oral por intermédio dos ductos incisivos que se abrem no palato lateralmente à papila incisiva (Halpern, 1987). Histologicamente, o OVN de bovinos apresenta modificações no epitélio. Ao nível do ducto incisivo este órgão apresenta epitélio do tipo respiratório. O resto do órgão é revestido por epitélio sensorial na sua parede medial, enquanto que na parede lateral continua sendo do tipo respiratório (Salazar et al., 1997).
No sistema olfatório acessório as informações periféricas são captadas pelo OVN. Este órgão processa a informação e conduz os estímulos sensoriais até o bulbo olfatório acessório através dos nervos vomeronasais. A partir do bulbo olfatório acessório as informações são levadas até o hipotálamo fazendo sinapses nos núcleos amidaloides mediais e no “bed nucleus of the stria terminalis” (Dulac e Wagner, 2006). Ao chegar no hipotálamo este sistema controla a secreção do hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) e, consequentemente de testosterona (Doving e Trotier, 1998), sendo este o motivo pelo qual este sistema está envolvido com a regulação do comportamento sexual. No entanto, sua influência na secreção sérica de testosterona depende da experiência sexual prévia (Doving e Trotier, 1998).
No sistema olfatório principal, as informações periféricas são captadas pelo nervo olfatório, por meio da mucosa olfatória, e enviadas ao bulbo olfatório principal localizado no telencéfalo, sem a dependência do OVN (Gandelman, 1983). Acredita-se que tanto a via do sistema olfatório principal quanto a acessória se comunicam por meio de inter neurônios no sistema nervoso central em animais sexualmente experientes (Gandelman, 1983), onde na ausência de uma das estruturas de uma via, a informação pode ser conduzida pela outra.
Apesar da relevância dos estímulos olfatórios na ativação do comportamento sexual de machos Nelore, até o momento, há poucos estudos relacionando a função deste órgão na estimulação sexual em animais Bos taurus indicus. Portanto, a hipótese desse estudo é que os bloqueios dos ductos incisivos irá afetar a condução de feromônios para o órgão vomeronasal, inibindo a expressão do comportamento sexual em machos da raça Nelore de modo que possa proporcionar melhor manejo dos animais destinados a sistema de recria e engorda, já que irá reduzir a secreção de testosterona sérica.
Para tal objetivou-se avaliar o efeito do bloqueio do órgão vomeronasal mediante a obstrução dos ductos incisivos em machos Nelore na pré puberdade sobre o comportamento sexual e suas correlações com concentrações séricas de testosterona e altura do epitélio sensitivo do OVN.
MATERIAL E MÉTODOS
Localização
Este estudo foi conduzido entre os meses de janeiro de 2008 a maio de 2009 na Fazenda Reunidas, município de Engenheiro Navarro - MG, Brasil. A fazenda tem como coordenadas geográficas de latitude 17° 17’ 43’’ S e longitude 43° 56’ 6’’ W e situa-se em área de Cerrado. A região apresenta clima quente e úmido com temperaturas máxima e mínima de 30,8 e 17,2 oC, com precipitação pluviométrica média anual de 1082 mm. Dois períodos climáticos são observados: o seco que se estende de abril a setembro e o chuvoso de outubro a março.
Animais e tratamentos
Foram utilizados 34 machos da raça Nelore pré púberes com idade média 14,6 ± 1,15 meses, peso corporal médio 244,2 ± 13,4 Kg e circunferência escrotal média 20,5 ± 1,4 cm no início do experimento, criados em piquetes homogêneos com regime de pastejo. No período da seca, os animais foram mantidos em pastagens irrigadas com pivô central. Os animais foram divididos em três grupos, sendo eles constituídos da seguinte forma: grupo um, denominados inteiros, constituído por 11 indivíduos, que não passaram por nenhum procedimento, sendo considerado o grupo controle. O grupo dois, denominados bloqueados, composto por 10 indivíduos que tiveram seus ductos incisivos bilateralmente cauterizados. O grupo três, denominados castrados, constituído por 13 indivíduos, os quais foram orquiepididectomizados bilateralmente (Emerick et al., 2019).
Procedimento cirúrgico para castração e cauterização dos ductos incisivos
A castração cirúrgica foi realizada pela orquiepididectomia bilateral convencional, utilizando a técnica da remoção do ápice do escroto, também denominada de tampão (Padua et al., 2003). A cirurgia foi realizada com os animais em estação contidos em troncos de contenção e imobilizados pelo imoboi®. Foi realizada antissepsia local com álcool etílico a 70%, e anestesia local, infiltrando lidocaína a 2.5 % intratesticular e na parte inferior do escroto, no local da incisão cirúrgica.
A obstrução dos ductos incisivos foi realizada bilateralmente por meio da abertura oral do ducto incisivo mediante cauterização com termo cautério (Booth e Katz, 2000). Para tal, os animais foram contidos em tronco de contenção e imobilizados pelo imoboi®. Foi realizada a antissepsia local no ducto incisivo e na parte rostral do palato utilizando álcool etílico a 70% e nitrato de prata 1:1.000. A anestesia local foi realizada infiltrando cinco mL de lidocaína a 2.5 % ao redor da papila incisiva. Tanto a castração cirúrgica quanto a obstrução dos ductos incisivos foram realizadas no início do experimento, um dia depois da primeira avaliação do comportamento sexual e da coleta de sangue. Após realização dos procedimentos os animais foram mantidos em pastos separados por tratamento para não haver interações sociais de modo a prejudicar a interpretação dos resultados. Quatro meses após a realização dos procedimentos, os animais foram avaliados quanto à libido e coleta de sangue (avaliação e coleta de maio de 2008).
Avaliação da libido
A avaliação da libido foi conduzida em um curral medindo aproximadamente 220 m2, de terra batida com superfície plana e cercada por pranchas de madeira encaixadas, de modo a não deixar pontas. Para análise do teste da libido, foram utilizadas cinco fêmeas soltas e adultas da raça Nelore com bom estado físico e clinicamente sadias. Vinte e quatro horas precedentes ao teste da libido utilizaram-se duas doses de cipionato de estradiol (ECP®, 5 ml) e uma dose de dinoprost trometamina administradas por via intramuscular, a fim de sincronizar o cio das fêmeas utilizadas para interpretação do teste. Em aproximadamente meia hora antes do teste da libido, os sinais clínicos do cio foram observados levando em consideração as seguintes características: edema vulvar com secreção mucosa clara, base da cauda ligeiramente afastada, comportamento agitado e com atitude de querer montar e de aceitação da monta por outras vacas do lote.
Todas as avaliações da libido foram realizadas no período da manhã, tendo seu início às 07:00, com temperatura média de 28°C, na ausência de chuvas. Para cada teste de libido, dois machos foram amostrados aleatoriamente e conduzidos ao curral onde estavam cinco vacas com sinais de cio bem evidentes. O comportamento sexual de cada macho foi observado e registrado durante um período de cinco minutos, por três observadores, posicionados em locais estratégicos no curral para que não fossem percebidos pelos animais (Salvador et al., 2003; Dias et al., 2009). Cinco repetições dos testes de libido por animal foram realizados nas seguintes datas: janeiro, maio, julho e outubro de 2008 e fevereiro de 2009. A média dos pesos corporais (Kg) e idades (meses) dos animais nas avaliações da libido com seus desvios padrão podem ser visualizados no Quadro 1.
Variável / Teste | Peso corporal (Kg) | Idade (meses) |
Teste 1 | 244,2 ± 13,4 | 14,6 ± 1,15 |
Teste 2 | 298,5 ± 17,8 | 18,6 ± 1,15 |
Teste 3 | 328,4 ± 18,5 | 20,7 ± 1,15 |
Teste 4 | 359,2 ± 19,8 | 24,0 ± 1,15 |
Teste 5 | 436,8 ± 24 | 27,7 ± 1,15 |
Cada comportamento sexual manifestado foi anotado em planilhas identificadas, a fim de se obter o seu número total. Ao final, foi realizada a média dos observadores para cada comportamento. A pontuação dos escores da libido foi realizada segundo propostas adaptadas de Chenoweth et al. (1996) e Dias et al. (2009), discriminadas no Quadro 2.
Identificação | Eventos sexuais | Definição |
0 | Sem interesse sexual | Não demonstra interesse |
1 | Cheirar e lamber a genitália da fêmea (CH/L) | Sem esboçar Flehmen |
2 | Perseguição ativa (PA) | Animal segue a vaca ativamente |
3 | Reflexo de Flehmen (RF) | Ergue a cabeça, enruga o nariz, eleva a o lábio superior, sugando o odor |
4 | Impulso de monta (IM) | Movimente súbito do animal em direção a fêmea, às vezes vocalizando ou abanando a cauda, sem retirar os membros anteriores do solo |
5 | Tentativa de monta (TM) | Animal segue subitamente em direção à fêmea elevando os membros anteriores do solo |
6 | Monta incompleta ou abortada (MA) | Animal monta com ou sem ereção, exposição e ereção do pênis, mas sem ejaculação; |
7 | Monta completa (MC) | Animal realiza o salto com ereção, penetração e movimento de galeio |
Adaptado de Chenoweth et al. e Dias et al.
Quanto ao escore da libido, utilizou-se como classificação: comportamento 0: animal não demonstrou interesse sexual (escore 0); comportamentos 1 a 3: libido fraca, apenas identifica a fêmea em cio (escore 1); comportamentos 4 e 5: libido média, identifica a fêmea em cio e testa sua receptividade (escore 2); comportamentos 6 e 7: libido alta, identifica o cio, testa a receptividade e realiza a monta adequadamente com ou sem ejaculação (escore 3 - Dias et al., 2009).
Análise sérica de testosterona
Para as análises séricas de testosterona foram considerados seis, quatro e seis animais, respectivamente, dos grupos inteiros, bloqueados e castrados.
As coletas de sangue foram realizadas pela manhã (07:00 horas) e no período da tarde (17:00 horas), sempre no dia seguinte ao teste de libido. Dessa forma, cinco repetições das coletas de sangue foram realizadas nas seguintes datas: janeiro, maio, julho e outubro de 2008 e fevereiro de 2009. Os horários das coletas de sangue foram definidos de acordo com os picos diários de testosterona (Chacur et al., 2007).
O sangue foi coletado a vácuo por punção da veia jugular externa. Após a coleta, o sangue foi centrifugado a 300 g durante 10 minutos, a fim de se obter o plasma, que foi armazenado no interior de botijões contendo nitrogênio líquido a -196°C até o momento das análises. As dosagens da testosterona foram realizadas seguindo técnicas de radioimunoensaio (RIE). Os kits utilizados foram obtidos por meio da Gênese Science®. As amostras foram testadas em duplicatas seguindo os procedimentos de ensaio realizados conforme recomendação do fabricante. Os coeficientes de variação intra e inter ensaio para a testosterona foram de 1,27 e 2,42%, respectivamente.
Análise do órgão vomeronasal
Ao final do experimento foram abatidos 20 animais que atingiram peso corporal maior que 480 Kg, sendo oito animais do grupo inteiros, sete do grupo bloqueados e cinco do grupo castrados. Durante o abate, foram retirados os órgãos vomeronasais para análise morfométrica. Procedeu-se o abate dos animais num frigorífico credenciado pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento.
No abatedouro, após o sacrifício dos animais, as cabeças foram identificadas na linha de abate para posterior transecção e retirada dos órgãos vomeronasais (OVN). Para obterem cortes homogêneos do OVN foram realizadas secções da região nasal do animal a nível do primeiro pré molar superior (Salazar et al., 1997). As amostras foram fixadas em líquido de Bouin até o momento de análise (Pannochia et al., 2008).
Os fragmentos fixados foram lavados em solução Ringer bicarbonato e, posteriormente, desidratados em concentrações crescentes de etanol. Após esse procedimento, as amostras foram infiltradas e incluídas em glicol metacrilato (Tecnovit 7.200® - Russell et al., 1998). Posteriormente, os blocos foram seccionados em ultramicrótomo Reichert-Jung, obtendo-se cortes de três mm de espessura, montados em lâminas histológicas e corados pelo azul de toluidina-0.5 % com borato de sódio a 1%, conforme técnica de rotina do Laboratório de Biologia da Reprodução do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais. De cada fragmento foram confeccionadas três lâminas com quatro cortes cada uma.
A mensuração histomorfométrica do epitélio sensitivo do OVN foi realizada utilizando-se microscópico com contraste de fase, o qual se encontrava acoplado a câmara Motic® de 3.0 megapixels. As imagens foram digitalizadas e medidas utilizando-se o programa de análise do fabricante da câmera. A altura do epitélio do OVN foi mensurada, tendo como base para análise a média das fotografias obtidas nos diferentes campos, cada qual com quatro mensurações, tanto do órgão esquerdo quanto o direito.
Todos os procedimentos deste estudo foram aprovados pelo Comitê de Ética no Uso de Animais para Experimentação da Universidade Federal de Minas Gerais sob o número de protocolo CEUA 159/09.
Análise estatística
O delineamento utilizado foi a análise inteiramente casualizada. Todas as variáveis foram submetidas ao teste homogeneidade de Levene e de normalidade de Komolgorov-Smirnov com a correção de Lilliefors, quando necessário, foi aplicada a transformação logarítmica das variáveis e reavaliadas quanto à normalidade. Quando ainda assim, não apresentavam distribuição normal, foram aplicados testes não paramétricos (Sampaio, 2002).
As variáveis de comportamento sexual não obtiveram distribuição normal, sendo avaliadas como não paramétricas. Dessa forma, para verificar o efeito de tratamento dentro de cada teste nas frequências dos eventos sexuais e dos escores da libido foi utilizado o teste de comparação de ranques de Kruskal Wallis. O teste de Friedman foi utilizado para avaliar os efeitos de teste dentro de cada tratamento. A correlação de Spearman entre todas as variáveis estudadas foi estimada. Para avaliar os efeitos de tratamento dentro de cada teste e de teste dentro do mesmo tratamento, assim como a análise das correlações, considerou-se o nível de 5% de significância.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O presente trabalho constitui como a primeira proposta para estudar as modificações do comportamento sexual de touros Nelore, Bos taurus indicus, com o bloqueio do órgão vomeronasal (OVN).
Após abate dos animais foi retirada a parte do crânio que envolve a parte da abertura oral dos ductos incisivos e a parte nasal na altura do primeiro dente pré molar. Na abertura incisiva foi injetada solução fisiológica para averiguar o bloqueio e em todas as peças cauterizadas o ducto incisivo estava bloqueado interrompendo a passagem do líquido.Este resultado nos permiti aferir que a cauterização dos ductos incisivos foi eficiente para obstruir a passagem de líquido por esta via.
Os resultados quanto ao comportamento sexual dos animais ao longo do experimento constam no Quadro 3. Os eventos do comportamento sexual do grupo de inteiros, bloqueados e castrados não apresentaram diferenças significativas (P>0,05) até o terceiro teste da libido, quando os animais tinham 20,7 ± 1,15 meses de idade. Nesses testes de libido também se observou baixa frequência dos eventos sexuais avaliados. Estes resultados são explicados pelo fato dos animais serem impúberes até este teste Essa observação assemelha-se com as de Price e Wallach (1991), que reportaram que a avaliação da libido, em animais no período anterior a puberdade, não prediz satisfatoriamente o comportamento sexual de animais adultos.
Tratamento | Evento Sexual | Inteiros (n=11) | Bloqueados (n=10) | Castrados (n=13) | ||||||||||||||||||||||||||||
Teste 1 | CH/L | 0,0b | 0,0c | 0,0c | RF | 0,0b | 0,0 | 0,0a,b,c | PA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | IM | 0,0b | 0,0 | 0,0 | TM | 0,0b | 0,0 | 0,0 | MA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | MC | 0,0b | 0,0 | 0,0 | ESCL | 0,0c | 0,0b | 1,0b,c |
Teste 2 | CH/L | 0,0b | 0,0c | 0,0c | RF | 1,0b | 1,0 | 0,0b,c | PA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | IM | 0,0b | 0,0 | 0,0 | TM | 0,0b | 0,0 | 0,0 | MA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | MC | 0,0b | 0,0 | 0,0 | ESCL | 1,0b,c | 1,0a,b | 0,0c |
Teste 3 | CH/L | 1,0a | 0,0b,c | 2,0b | RF | 1b | 0 | 1,0a,b | PA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | IM | 0,0b | 0,0 | 0,0 | TM | 0,0a,b | 0,0 | 0,0 | MA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | MC | 0,0a,b | 0,0 | 0,0 | ESCL | 1,0a,b,c | 1,0a,b | 1,0a,b |
Teste 4 | CH/L | 3,0a,A | 2,0b,A,B | 1,0b,B | RF | 1,0b | 1,0 | 0,0c | PA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | IM | 0,0a,b | 0,0 | 0,0 | TM | 1,0a,A | 0,0B | 0,0B | MA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | MC | 0,0a,A | 0,0B | 0,0B | ESCL | 3,0a,A | 1,0a,B | 1,0a,b,B |
Teste 5 | CH/L | 1,0a,B | 6,5a,A | 3,0a,A | RF | 5,0a,A | 3,0B | 1,0a,B | PA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | IM | 1,0a,A | 0,0A | 0,0B | TM | 0,0a | 0,0 | 0,0 | MA | 0,0 | 0,0 | 0,0 | MC | 0,0b | 0,0 | 0,0 | ESCL | 2,0a,b,A | 1,5a,A,B | 1,0a,B |
Letras minúsculas, nas colunas, representam diferenças (P<0,05) entre os testes de libido dentro de cada tratamento pelo teste não paramétrico de Friedman. Letras maiúsculas, nas linhas, representam diferenças (P<0,05) entre os tratamentos, pelo teste não paramétrico de Kruskal Wallis. Ausências de letras indicam que não há diferenças entre as médias (P>0,05). CH/L: cheirar e lamber a genitália da fêmea; RF: reflexo de flehmen; PA: perseguição ativa; IM: impulso de monta; TM: tentativa de monta; MA: monta abortada; MC: monta completa; ESCL: escore da libido.
Apesar dos aumentos nos registros dos escores da libido no quarto e quinto teste nos animais inteiros (P<0,05), de modo geral, houve baixas frequências nas manifestações de comportamentos sexuais como impulso e tentativa de monta, e das montas abortadas e completas (Quadro 3). Esses resultados são similares aos de Pineda et al. (2000); Salvador et al. (2003); Oliveira et al. (2007); Dias et al. (2009) e Costa e Silva et al. (2015), que trabalharam com animais Bos taurus indicus e observaram baixas prevalências dos eventos de comportamento sexual do tipo pré-copulatório e copulatório (Dias et al., 2020) Portanto, estes resultados sugerem que altas frequências de eventos sexuais como cheirar e lamber a genitália e de reflexo de flehmen em testes de avaliação do comportamento sexual, seja uma característica do touro zebu e que, possivelmente, estímulos olfatórios sejam importantes na pré-estimulação ou excitação sexual nesta espécie.
No quarto teste de libido, os animais inteiros apresentaram maior desempenho no evento sexual de tentativa de monta em relação aos animais bloqueados (P<0,05) e aos castrados (P<0,05). Possivelmente, diferenças nas concentrações séricas de testosterona entre os tratamentos, nessa mesma data, no período da tarde (inteiros - 10,3±1,3a x bloqueados - 5,7±1,2b ng/mL) e abaixo dos limites de detecção nos castrados (Emerick et al., 2019), possam justificar este resultado. Além disso, altas correlações positivas observadas entre as variáveis, tentativa de monta e testosterona pela tarde (Quadro 4), reforça a hipótese de que esse evento sexual está relacionado a altos níveis séricos de testosterona.
Parâmetros | Valor de r/p* |
Cheirar e lamber x Peso corporal | -0,58/0,06 |
Cheirar e lamber x Testosterona Manhã | -0,87/0,06 |
Impulso de monta x Escore da libido | 0,79/0,003 |
Impulso de monta x Testosterona manhã | -0,89/0,04 |
Tentativa de monta x Testosterona tarde | 0,89/0,04 |
Escore da libido x Monta abortada | 0,74/0,009 |
*Coeficiente de correlação (r) / significância (p). Somente as correlações altas foram apresentadas;
O evento sexual de monta completa, apesar de não ter sido verificada associação direta com as concentrações séricas de testosterona, sugere-se dependência de elevados níveis circulantes do andrógeno, uma vez que a manifestação deste comportamento apresentou elevação no quarto teste de libido (Quadro 3), comparado aos testes um, dois e cinco, nos animais inteiros. Essas observações assemelham-se com as de McGinnis et al. (1996), que reportaram que os comportamentos sexuais consumatórios, aqueles relacionados diretamente ao ato de cópula, são altamente dependentes de altas concentrações de andrógenos em roedores. Esse fato também contribui para justificar a redução desse evento sexual (monta completa) nos animais castrados e bloqueados no quarto teste de libido, uma vez que foi registrada menor (P<0,05) concentração sérica de testosterona pela tarde nos animais bloqueados e nos castrados abaixo dos limites de detecção dos kits (Emerick et al., 2019).
Ainda no quarto teste, o escore da libido foi maior nos animais inteiros (P<0,05). Considerando que este parâmetro é o conjunto de todos os eventos sexuais, pode-se considerar que neste teste de libido, fica demonstrado que os animais bloqueados e castrados apresentaram menor desempenho da atividade sexual.
Altas correlações foram registradas entre o escore da libido e o evento sexual de monta abortada nos animais inteiros (Quadro 4). Este resultado sugere que os eventos sexuais consumatórios influenciam fortemente a atividade sexual dos animais.
No quinto teste de libido, a frequência do reflexo de flehmen apresentou aumento nos animais inteiros, em relação aos bloqueados e castrados (P<0,05). Esse resultado evidencia que a cauterização dos ductos incisivos foi eficiente para obstruir a passagem de ferormônios por esta via e que esse evento sexual está envolvido com a captação dos estímulos olfatórios para o órgão vomeronasal em machos da raça Nelore. Esse fato pode ser reforçado pelo resultado das correlações entre o reflexo de flehmen e a altura do epitélio sensitivo do órgão vomeronasal (OVN) nos animais bloqueados (Quadro 5), ou seja, quanto mais estímulos enviados ao OVN maior o desenvolvimento do seu epitélio sensitivo. Esses resultados assemelham-se às observações de Hart e Leedy (1987), que trabalhando com gatos, descreveram que o reflexo de flehmen é um comportamento facilitador da condução dos feromônios sexuais ao órgão vomeronasal.
Parâmetros | Valor de r/p* |
Cheirar e lamber x Perseguição ativa | 0,75/0,02 |
Cheirar e lamber x Peso corporal | 0,71/0,03 |
Cheirar e lamber x Ganho diário | 0,66/0,05 |
Reflexo de flehmen x Tentativa de monta | -0,64/0,06 |
Reflexo de flehmen x Altura do epitélio sensitivo do órgão vomeronasal | 0,75/0,05 |
Impulso de monta x Testosterona manhã | -0,95/0,05 |
Escore da libido x Impulso de monta | 0,76/0,02 |
*Coeficiente de correlação (r)/significância (p).
No quinto teste da libido, observou-se que a frequência do evento sexual de cheirar e lamber a genitália foram menores nos animais inteiros (P<0,05). Esse resultado sugere que o aumento desse comportamento sexual nos animais bloqueados, possivelmente, foi uma tentativa olfatória de reparar o bloqueio do OVN e, por esse motivo, os eventos sexuais de impulso de monta e do escore da libido foram semelhantes entre os animais inteiros e bloqueados neste teste (P>0,05) (Quadro 3). Esse fato também foi observado por Meredith (1986), que registrou que machos roedores sem o OVN, após adquirirem experiência sexual, mantiveram comportamento copulatório, até que sulfato de zinco foi aplicado na mucosa da via olfatória principal, promovendo sua cauterização.
No entanto, esta tentativa olfatória da compensação exercida pelos animais bloqueados não foi eficiente para aumentar a concentração de testosterona pela tarde, uma vez que, esta foi maior nos animais inteiros no quinto teste da libido (8,9±2,05a x 2,7±1,3b ng/mL; P<0,05; Emerick et al., 2019).
O evento sexual de impulso de monta apresentou aumento nos animais inteiros no quinto teste de libido (P<0,05), comparado aos testes um, dois e três (Quadro 3). Este resultado sugere que no quinto teste da libido os animais tenham adquirido alguma experiência sexual, já que, Salvador et al. (2003) sugerem que o impulso de monta é um comportamento adaptativo das espécies zebuínas às condições tropicais, sujeitas a variações nutricionais, que influenciam as concentrações nos níveis séricos de testosterona, em que o macho, como mecanismo para poupar energia, utiliza este comportamento para testar a receptividade da fêmea reduzindo o número de saltos diários frustrados nas fêmeas ao longo do período de estro.
No quinto teste de libido, nos animais inteiros e bloqueados, o impulso de monta foi semelhante (P>0,05; Quadro 3). Além disso, foram registradas altas correlações entre o impulso de monta e o escore de libido nos animais de ambos os tratamentos (Quadros 4 e 5). Desta forma é plausível considerar que cheirar e lamber possa ter substituído o reflexo de flehmen para desencadear manifestação do impulso de monta. Esta substituição induziu a expressão da atividade sexual dos animais bloqueados de modo que não houvesse diferenças no escore da libido neste teste.
As concentrações séricas de testosterona matinais e vespertinas não foram diferentes entre o quarto e quinto testes de libido nos animais inteiros (P>0,05). No entanto, houve tendência de menores valores nas concentrações séricas de testosterona pela manhã no quinto teste de libido, comparado ao quarto teste (12,5±2,1a x 5,5±2,3a ng/mL; P=0,06). Esta flutuação da testosterona sérica, possivelmente, foi suficiente para promover uma redução da frequência do evento sexual de monta completa no quinto teste de libido nos animais inteiros, conduzindo-os para maiores prevalências de eventos de excitação sexual (Dominguez e Hull, 2005), como o reflexo de flehmen (nos inteiros) e cheirar e lamber (nos bloqueados), com intuito de aumentar a produção de testosterona (Doving e Trotier, 1998), que por sua vez, induziu os animais para, numa condição mais desfavorável, sob o ponto de vista alimentar e consequentemente hormonal, melhor testar a receptividade da fêmea em estro realizando o evento sexual de impulso de monta, com intuito de poupar energia. As altas correlações negativas observadas entre o evento sexual de impulso de monta e a concentração sérica de testosterona pela manhã nos animais inteiros (Quadro 4) e bloqueados (Quadro 5) reforçam esta hipótese.
Possivelmente, o aumento do tempo de observação em testes de avaliação da libido poderia implicar em aumento de eventos sexuais do tipo consumatórios como previamente descrito por Santos et al. (2004); Oliveira et al. (2007) e Dias et al. (2009), que trabalharam com animais Bos taurus indicus. Portanto, é plausível considerar que testes de libido realizados em curral com animais da raça Nelore, com curta duração, o evento sexual de impulso de monta deve ser mais bem considerado, como previamente descrito por Salvador et al. (2003). No entanto, se com aumento do tempo de observação no teste da libido os animais bloqueados executaria a monta completa permanece sem esclarecimento, necessitando de mais estudos para esclarecer essa hipótese.
Ainda no quinto teste da libido, foi observada menor performance do impulso de monta nos animais castrados (P<0,05). Esse resultado sugere que esse evento sexual depende de uma quantidade mínima no nível sérico de testosterona, já que nos bloqueados este evento foi semelhante aos inteiros.
CONCLUSÕES
O bloqueio do órgão vomeronasal em machos Nelore no período pré-puberal afetou a manifestação dos comportamentos sexuais consumatórios, visto que a tentativa de monta, a monta completa e o escore da libido foram reduzidos no quarto teste de libido nos bloqueados.
O reflexo de flehmen está envolvido com o transporte de feromônios sexuais através dos ductos incisivos para o órgão vomeronasal em machos da raça Nelore, já que este comportamento foi reduzido nos bloqueados no quinto teste de libido.
O evento sexual de cheirar e lamber a genitália da fêmea constitui-se em uma tentativa olfatória de compensar o evento sexual de reflexo de flehmen para excitação sexual em machos Nelore, já que este comportamento foi maior nos bloqueados no quinto teste de libido.