INTRODUÇÃO
Atualmente, um dos maiores problemas ambientais ao nível do globo é a perda de solo por erosão (Wang et al., 2016) e a consequente perda de matéria orgânica (Fonseca et al., 2017, 2022).
Em locais onde a erosividade da precipitação é elevada e a superfície do solo está desprovida de uma cobertura vegetal adequada, pode ocorrer grande degradação do solo associada a significativas perdas de solo, água e nutrientes, fatores essenciais para o crescimento e desenvolvimento das plantas. A perda de solo e os elementos químicos que lhe estão associados, causam relevantes danos ambientais, como o assoreamento e a eutrofização de cursos de água.
Neste sentido, a cobertura vegetal é uma grande aliada na prevenção do processo erosivo. Contudo, Portugal tem sido constantemente afetado por incêndios florestais desde a década de 80 (AFN, 2012), e o fogo é responsável por remover a cobertura vegetal viva e morta que recobre o solo, facilitando a perda de solo por erosão (Bertol et al., 1997; Fonseca et al., 2017).
O solo no NE de Portugal, onde está localizado o Parque Natural de Montesinho (PNM), é um recurso qualitativamente escasso, pelo que se impõe como prioridade a proteção desse recurso (Figueiredo et al., 2012). Os solos do PNM são dominantemente incipientes, classificados como Leptossolos.
No PNM as comunidades arbustivas apresentam notável interesse do ponto de vista pedológico e hidrológico, uma vez que se situam nas áreas marginais de relevo mais ondulado ou acidentado, onde predominam também os solos mais delgados, condições que podem gerar risco severo de erosão (IPB/ICN, 2007; Bompastor et al., 2009).
O presente trabalho tem como principal objetivo apresentar e discutir resultados de experimentação no terreno, com vista a avaliar o efeito do fogo controlado na erosão hídrica em áreas de matos no PNM.
MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo localiza-se no Parque Natural de Montesinho (PNM), NE Portugal (41°53'57.06"N, 6°40'55.39"W) (Figura 1). Apresenta relevo ondulado, declive suave e cotas superiores a 800 m. Assenta sobre uma litologia de xistos, com predomínio dos Leptossolos úmbricos, de textura média, ácidos, pedregosos, com teores médios a elevados de matéria orgânica no horizonte superficial (Agroconsultores & Coba, 1991).
A área de estudo corresponde a um antigo povoamento de Pinus pinaster, que em agosto de 1998 sofreu um incêndio, destruindo boa parte da floresta. Desde então, a área foi invadida por vegetação arbustiva espontânea. Em março de 2011, foi realizado um fogo controlado, com o objetivo de diminuir a quantidade de combustível disponível e reduzir o risco de incêndio (Fonseca et al., 2017). Após 10 anos, em março de 2021, foi aplicado um novo fogo controlado na mesma área com o mesmo objetivo.
Após o fogo controlado, foram instaladas seis parcelas de erosão de 4 metros de comprimento por 1 metro de largura (4 m2 de área), para quantificar a perda de solo e o escoamento superficial na área queimada (Figura 2). Os valores referentes à precipitação (mm), ao escoamento superficial (mm) e à perda de solo (g m-2) foram determinados para cada evento de precipitação, totalizando 6 avaliações (colheitas) num período de 8 meses (março a dezembro de 2021).
Em cada colheita procedeu-se à troca dos reservatórios de recolha do escoamento superficial e sedimento em suspensão e à recolha do solo acumulado no dispositivo colocado na frente das parcelas (Figura 3).
Nos cálculos da perda de sedimento e água de escoamento por parcela e evento utilizaram-se as seguintes expressões:
Produção de sedimento
PS = ((Csa × Vae) + Psf) / A (g m-2) (1)
Escoamento superficial
ES = Vae / A (mm) (2)
Csa - concentração de sedimento em 100 ml de água de escoamento (g L-1); Vae - volume de água de escoamento (L); Psf - peso de sedimento colhido na frente da parcela (g); A - área da parcela (m2).
Também foram quantificadas, para os dois primeiros eventos de precipitação após o fogo, as perdas de C e N nos sedimentos. Os sedimentos foram separados em 4 classes de tamanho: <0,2 mm, 0,2-0,5 mm, 0,5-2 mm e >2 mm e analisados para as concentrações de C e N em autoanalisador por combustão.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No período de 8 meses do ensaio foram registados 231,7 mm de precipitação total, a perda de solo média foi de 15,4 g m-2 e o escoamento médio de 1,4 mm (Quadro 1).
O coeficiente de escoamento foi de 4,2%, ocorrendo um ligeiro aumento quando comparado ao valor de 2,4% encontrado quando da aplicação do primeiro fogo controlado na mesma área em 2011 (Figueiredo et al., 2012).
Colheita | PS (g m-2) | ES (mm) | PT (mm) |
1ª | 4,5 | 0,4 | 32,8 |
2ª | 18,5 | 1,2 | 47,4 |
3ª | 31,7 | 1,3 | 56,6 |
4ª | 18,1 | 1,5 | 30,9 |
5ª | 13,4 | 2,1 | 43,9 |
6ª | 5,9 | 1,9 | 20,1 |
Média/Total | 15,4 | 1,4 | 231,7 |
A reduzida perda de solo, em primeira aproximação, será justificada pela baixa quantidade e intensidade da precipitação, uma vez que o escoamento superficial que é responsável pelo deslocamento das partículas de solo tem grande correlação com a precipitação (Lorenzon et al., 2015).
Outros fatores, ainda inexplorados na análise dos resultados, podem estar na origem do baixo potencial de perda de solo nas condições do ensaio. Destaca-se a elevada pedregosidade na superfície do solo, situação semelhante à de outras áreas estudadas no NE de Portugal (Figueiredo, 2001; Figueiredo et al., 2012; Fonseca et al., 2017).
Comparando a perda de solo com o escoamento, nota-se que na primeira colheita ocorreram baixos valores de escoamento e consequentemente baixos valores de perda de solo, uma vez que o escoamento superficial é a etapa do ciclo hidrológico mais associada ao desenvolvimento do processo erosivo (Pruski & Silva, 1997).
A evolução temporal da perda de solo e do escoamento superficial (Figura 4) segue um padrão já observado experimentalmente em áreas de solo nu ou de reduzido coberto vegetal (Figueiredo et al., 2012; Fonseca et al., 2017). As perdas de solo tendem a diminuir ao longo do tempo.
A quantidade média de C perdido no sedimento é de 32 kg ha-1, apresentando, as classes de sedimento de maiores dimensões os valores mais elevados. O N, com uma perda média de 0,75 kg ha-1, segue um padrão de distribuição pelas diferentes classes de sedimento idêntico ao do C (Figura 5). Estas perdas podem ser consideradas baixas, o que é principalmente explicado pelos baixos valores de perda de sedimento (Quadro 1).
Apesar dos valores baixos registados para as perdas de solo, C e N, trata-se de solos delgados (Leptossolos), com deficientes condições produtivas e consequentemente incapazes de suportar um coberto vegetal que permita a conservação do solo (Fonseca et al., 2017, 2022).
CONCLUSÕES
A perda média de solo foi de 15,4 g m-2. O escoamento superficial médio foi de 1,4 mm, correspondendo a um coeficiente de escoamento de 4,2%. A baixa precipitação total ocasionou baixos valores de escoamento e portanto, baixos valores de perda de solo. As perdas de C e N durante as primeiras chuvas após o fogo (32 e 0,75 kg ha-1, respetivamente), são relativamente reduzidas, estando estritamente relacionadas com a produção de sedimentos.