INTRODUÇÃO
A gestão de infestantes foi, desde sempre, um grande desafio para o agricultor (Monteiro & Moreira, 2004). Não só pelas quebras de produção associadas à competição, mas também pela opinião social criada e divulgada pelas pessoas que passam junto aos terrenos agrícolas (Figura 1). Não é caso raro associar uma vinha com infestantes a uma vinha abandonada. Esta perceção é verificada um pouco por toda a Europa do Sul. É neste contexto que os herbicidas assumem um papel preponderante junto dos agricultores. No entanto, a falta de diversidade de substâncias de ativas (s.a) coloca algumas dificuldades no momento da escolha do herbicida a aplicar, o que se traduz na repetição de s.a. e na consequente quebra de eficácia, devido, provavelmente, a situações de resistência adquirida.
No caso da Península de Setúbal, acresce o facto dos solos serem maioritariamente arenosos e existir a perceção que há risco de lixiviação dos herbicidas e que poderão atingir as raízes das cepas. O glifosato sempre ocupou um papel de destaque, não só pelo preço, mas também pelo rápido efeito. Nos últimos anos o preço do glifosato subiu de cerca de 4€/L, em 2017, para cerca de 8€/L, em 2023, o que levou muitos agricultores a considerarem outras alternativas. Associadas ao aumento do preço, as questões ambientais e a pressão dos consumidores para a redução do uso de pesticidas favoreceu o controlo mecânico. No entanto, o preço dos combustíveis também aumentou e essa opção deixou de por ser considerada com a frequência pretendida. Os ensaios de campo que a AVIPE tem instalados permitem compreender melhor os fatores que condicionam a eficácia das diversas substâncias ativas. Os dias de campo permitem que os agricultores fiquem mais cientes da necessidade de alternância de substâncias ativas e da melhoria na eficácia de pulverização. Outra prática habitual no controlo de infestantes é a mobilização da entrelinha através de grades de discos. O preço do combustível também contribuiu para a redução desta prática, mas ainda assim, uma vinha com infestantes na entrelinha é considerada abandonada. Nos ensaios que a AVIPE implementou, foi estudado o impacto que o enrelvamento da entrelinha (sementeira de misturas comerciais de gramíneas e leguminosas em outubro), tem no controlo de infestantes em março/abril. Os resultados foram apresentados aos agricultores e houve o reconhecimento que é uma prática a ser considerada no futuro. É conhecida a importância que as ações demonstrativas têm junto dos agricultores, pelo que a AVIPE considera importante continuar a demonstrar, educar e informar os agricultores das várias formas de controlo das infestantes.
Nos últimos anos, a dificuldade com as infestantes passou de espécies vivazes como Panicum repens L. para populações de Conyza spp. resistentes (Figura 2). O desconhecimento da forma como devem controladas, tem conduzido a aplicações pouco racionais de herbicidas, em especial do glifosato, sabendo da resistência que estas espécies já apresentam a este herbicida (Mendes et al., 2012).
Este trabalho tem como objetivo dar conhecimento dos principais problemas de controlo de infestantes das vinhas na Península de Setúbal e dos métodos utilizados, bem como contribuir para a avaliação de diversos métodos de controlo de infestantes em vinhas da Península de Setúbal.
MATERIAIS E MÉTODOS
O ensaio foi montado em vinhas da casta ‘Castelão’ instaladas em 2013 e dotadas de rega gota-a-gota. O delineamento experimental inclui sete modalidades com 5 repetições distribuídas de forma aleatória. Cada repetição corresponde a 12 cepas. As modalidades foram definidas conforme se apresenta no Quadro 1. Em 2023, a data de aplicação foi a 3 de maio. As aplicações foram efetuadas com um pulverizador de dorso, bicos anti-deriva, com um volume de calda equivalente a 300 L ha-1. Em 2024, o ensaio será repetido estando prevista a aplicação de herbicidas na 2ª quinzena de fevereiro. Apesar de existir a proibição legal de aplicação de herbicidas antes de 1 de março, as alterações climáticas têm precipitado o abrolhamento da vinha e as aplicações de herbicidas tornam-se arriscadas.
Modalidades | Produto | Área (m2) | Dose ( g s.a. ha-1) | Volume de calda (L ha-1) |
M1 | SHARPEN® (pendimetalina, 330 g L-1, EC, SHANDRA) | 60 | 1980 | 300 |
M2 | NIRO® (diflufenicão, 500 g L -1 , SC, SYNGENTA) | 1500 | 300 | |
M3 | Galigan® (oxifluorfena, 240 g L -1 , EC, NUFARM) | 144 | 300 | |
M4 | BOAVIN® (penoxsulame, 20 g L-1, OD, CORTEVA) | 7 | 300 | |
M5 | MINSK® (flazasulfurão, 25 %, WG, SYNGENTA) | 16,75 | 300 | |
M6 | Controlo | ----- | 300 | |
M7 | ROUNDUP® (glifosato, sal potássico,360 g L-1, SL, BAYER) | 1440 | 300 |
Antes das aplicações, foi efetuada uma mobilização na linha para garantir correta aplicação e eficácia do herbicida.
Em 2023 foi efetuada apenas uma avaliação da eficácia dos herbicidas de forma não quantitativa, mas em 2024 a avaliação será realizada com recurso à escala de Barralis (1976). Após a aplicação, seguir-se-á uma nova observação no mês de maio, à floração em agosto e à vindima. Não se pretende avaliar o impacto na produtividade das vinhas, mas somente a eficácia no controlo de infestantes.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados deste ensaio preliminar foram interessantes e motivadores. Os herbicidas controlaram a maioria das infestantes, com exceção de algumas gramíneas e malváceas. Também se observou, relativamente à testemunha, o solo com poucas infestantes e com abundância reduzida. Na ação de campo realizada com os agricultores em 2023, os resultados foram bastante elogiados tendo-nos sido pedidas recomendações para aplicação de herbicidas residuais na próxima campanha de 2024.
A Arctotheca calendula (L.) K. Lewin (Moreira et al., 2000) é bastante frequente na região. Está muito associada à presença de um insecto coleóptero (Oxythyrea funesta Poda; escaravelho-das-flores) que pode danificar os abrolhamentos (Figura 3). Surge geralmente numa época mais precoce e é uma das razões que motiva a mobilização dos solos. Aproveitou-se a oportunidade de realização de ensaios e divulgação aos agricultores para demonstrar o efeito inibitório do enrelvamento na ocorrência de populações de A. calendula. O enrelvamento foi considerado pelos agricultores como uma prática a adotar no futuro (Figura 3).
Uma das formas de reduzir o uso de herbicidas é através do controlo mecânico de infestantes. Apesar de dispendiosas, este tipo de intervenções vai tendo adeptos. A questão ambiental aliada aos bons resultados faz com que alguns agricultores optem por este método de gestão do solo. Não deixa de ser também importante referir que a subida considerável no preço do glifosato tenha levado alguns agricultores a reduzirem a aplicação de herbicidas. Por outro lado, a subida no preço do combustível levou a que muitos agricultores deixassem de mobilizar a entrelinha.
CONCLUSÕES
As diferentes vicissitudes dos últimos anos têm levado os agricultores a depararem-se com novos desafios no controlo de infestantes. Sejam por razões políticas, de mercado, de percepção do consumidor ou por práticas agrícolas, os agricultores sentem-se na obrigação de reduzir o consumo de herbicidas.
A gestão das infestantes tem particular importância em vinhas até aos cinco anos, o que é uma grande preocupação para os agricultores. Com a aplicação dirigida e utilizando campânulas, é possível que sejam usados herbicidas em vinhas com idades inferiores a quatro anos. Esta prática reduz consideravelmente os custos de controlo de infestantes.
O controlo mecânico tem sido muito utilizado, no entanto, num futuro próximo, o preço do combustível poderá limitar a sua utilização extensiva. De referir que a textura do solo tem uma grande importância no sucesso deste método.
Apesar de na Península de Setúbal os solos serem arenosos e a precipitação no período de março a outubro ser reduzida, o uso de enrelvamento nas entrelinhas no período outono-inverno para controlo de infestantes é recomendável, e teve particular sucesso no controlo de Arctotheca calendula. Por fim, os herbicidas têm a capacidade de controlar as principais infestantes e dar um aspecto à vinha socialmente aceitável. A pouca oferta de substâncias ativas limita as possibilidades de alternância de modos de ação, sendo que o apoio técnico e os serviços de extensão rural têm um papel crucial na informação e avisos para prevenir o aparecimento de resistências. Os resultados dos ensaios de 2024 serão determinantes para a confirmação da percepção da eficácia dos tratamentos realizados em 2023.