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Millenium - Journal of Education, Technologies, and Health

versão impressa ISSN 0873-3015versão On-line ISSN 1647-662X

Mill  no.esp9 Viseu dez. 2021  Epub 07-Dez-2021

https://doi.org/10.29352/mill029e.23740 

Educação e desenvolvimento social

Provas de aferição do 5.º ano de escolaridade: perceções de alunos e professores de português e história e geografia de Portugal

Assessement tests in the 5th year of schooling: perceptions of students and teachers of portuguese and history and geography of Portugal

Prueba de afecto del 5° año de escuela: percepciones de estudiantes y profesores de portugués e historia y geografía de Portugal

Marlene Magalhães1 

João Rocha1  2 
http://orcid.org/0000-0002-0454-5038

Henrique Ramalho1  2 
http://orcid.org/0000-0002-5512-1278

1 Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Educação, Viseu, Portugal

2 CI&DEI - Centro de Estudos em Educação e Inovação, Viseu, Portugal


Resumo

Introdução:

A avaliação externa das aprendizagens nos ensinos básico e secundário compreende a realização das provas de aferição (Despacho Normativo n.º 3-A/2019, de 26 de fevereiro). Estas provas têm como principal função regular e aferir as aprendizagens dos alunos e potenciar a avaliação interna realizada nas escolas.

Objetivos:

Conhecer as perceções dos alunos e professores sobre a realização das provas de aferição, no 5.º ano de escolaridade; Constatar a relevância, efeitos e impacto atribuído à realização das provas de aferição e seus resultados; Compreender de que forma as provas de aferição podem melhorar a qualidade do sistema de ensino; Analisar se os resultados das provas de aferição são considerados necessários para repensar o trabalho desempenhado pelos professores.

Métodos:

Foi utilizada uma metodologia mista, de caráter descritivo, interpretativo e compreensivo, com recurso ao inquérito por questionário e por entrevista. Participaram no estudo duas turmas de 20 alunos que frequentam o 5.º e 6.º ano e 4 professores do 2.º Ciclo do Ensino Básico (2.º CEB).

Resultados:

Os professores do 2.º CEB não são favoráveis à realização das provas de aferição, nem encontram nelas grandes benefícios. Os alunos não entendem o propósito do instrumento de aferição dos resultados, assemelhando-o a um teste de avaliação com um maior número de conteúdos avaliados e sem qualquer peso na classificação final.

Conclusão:

Os participantes no estudo têm uma opinião pouco favorável em relação ao instrumento de regulação e aferição das aprendizagens dos alunos do 5.º ano de escolaridade e de potenciação da avaliação interna realizada pelas escolas.

Palavras-chave: 2.º ciclo do ensino básico; provas de aferição; professores do 2.º ceb; alunos do 5.º e 6.º ano de escolaridade

Abstract

Introduction:

The external evaluation of learning in basic and secondary education comprises the assessment tests (Normative Order Number 3-A / 2019, of 26 February). These tests have the main function of regulating and measuring students' learning and enhancing the internal evaluation carried out in schools.

Objectives:

Know the perceptions of students and teachers about the realization of assessment tests, in the 5th year of schooling; Verify the relevance, effects and impact attributed to the performance of the measurement tests and their results; Understand how benchmarking tests can improve the quality of the education system; Analyse whether the results of the assessment tests are considered necessary to rethink the work performed by the teachers.

Methods:

A mixed, descriptive, interpretive and comprehensive methodology was used, using the questionnaire and interview. Two classes of 20 students attending the 5th and 6th grades and 4 teachers from the 2nd Cycle of Basic Education (2nd CEB) participated in the study.

Results:

The teachers of the 2nd CEB are not in favour of carrying out the assessment tests, nor do they find great benefits in them. Students do not understand the purpose of the instrument for measuring results, resembling it as an evaluation test with a greater number of evaluated contents and without any weight in the final classification.

Conclusion:

The study participants have an unfavourable opinion in relation to the instrument for regulating and measuring the learning of students in the 5th year of schooling and enhancing the internal evaluation carried out by schools.

Keywords: 2nd cycle of basic education; evidence of measurement; 2nd ceb teachers; 5th and 6th year students

Resumen

Introducción:

La evaluación externa de los aprendizajes en educación básica y secundaria incluye la realización de pruebas de evaluación (Orden Normativa n. 3-A / 2019, de 26 de febrero). Estas pruebas tienen la función principal de regular y medir el aprendizaje de los estudiantes y potenciar la evaluación interna que se realiza en las escuelas.

Objetivos:

Conocer las percepciones de estudiantes y docentes sobre la realización de pruebas de evaluación, en el 5º año de escolaridad; Verificar la relevancia, efectos e impacto atribuidos a la realización de las pruebas de medición y sus resultados; Comprender cómo las pruebas comparativas pueden mejorar la calidad del sistema educativo; Analizar si los resultados de las pruebas de evaluación se consideran necesarios para repensar el trabajo realizado por los docentes.

Métodos:

Se utilizó una metodología mixta, descriptiva, interpretativa e integral, utilizando el cuestionario y la entrevista. En el estudio participaron dos grupos de 20 alumnos de 5º y 6º curso y 4 docentes del 2º ciclo de Educación Básica (2º CEB).

Resultados:

Los profesores del 2º CEB no son partidarios de realizar las pruebas de evaluación, ni encuentran grandes beneficios en ellas. Los estudiantes no comprenden el propósito del instrumento para medir los resultados, asemejándose a él como una prueba de evaluación con mayor número de contenidos evaluados y sin ningún peso en la clasificación final.

Conclusión:

Los participantes del estudio tienen una opinión desfavorable en relación al instrumento para regular y medir el aprendizaje de los estudiantes de 5º año de escolaridad y potenciar la evaluación interna que realizan las escuelas

Palabras clave: 2º ciclo de educación básica; evidencia de medición; profesores de 2º ceb; alumnos de 5º y 6º curso

Introdução

Independentemente das conceções que podem ser equacionadas sobre a avaliação educacional, importa esclarecer se, enquanto docentes, o nosso papel está a ser bem executado, bem como conhecermos as principais capacidades e dificuldades dos nossos alunos. Neste âmbito, surge o ato de avaliar como sendo uma etapa importante do processo ensino-aprendizagem, na medida em que regula a prática educativa. Ferro e Roldão (2015) destacam que a avaliação das aprendizagens constitui uma “parte integrante do desenvolvimento curricular, como regulação e aferição das aprendizagens intencionalizadas mediante a ação de ensinar” (p. 570). Por outro lado, Dias (1999) acrescenta que “a avaliação da aprendizagem é uma componente essencial de um processo complexo composto por várias fases, que passam não só pela definição de objetivos educacionais como também pela elaboração de conteúdos programáticos e definição de métodos pedagógicos” (p.2), vinculando a prática educativa à produção de referenciais de escalas diferenciadas, ainda que sejam as escalas de matriz nacional que continuam a prevalecer.

As provas de aferição, na sua atual configuração, surgem quando o governo pôs término às anteriores provas realizadas em finais de ciclo e são dirigidas aos três ciclos do Ensino Básico, incidindo em anos intermédios, especificamente ao nível do 2.º, 5.º e 8.º anos. A opção pelos anos intermédios constituiu uma novidade e objetiva a possibilidade de atuação e orientação do trabalho dos alunos para as áreas em que eles ainda podem melhorar. As provas de aferição constituem um instrumento, obrigatório e universal, apresentando, como principal referencial de avaliação, os documentos curriculares em vigor, ainda que não tenham qualquer “peso” na classificação final dos alunos. A prova é aplicada a algumas áreas disciplinares segundo um sistema de rotação anual, de modo a detetar quais as disciplinas que necessitam de intervenção, a fim de garantir uma melhoria nas aprendizagens. O Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, em 2018, numa entrevista publicada pela Visão Júnior, referia que as provas de aferição permitem que os professores, os alunos e as famílias tenham um conhecimento verdadeiro dos progressos que cada aluno está a fazer, o conhecimento adquirido e também os aspetos em que poderá melhorar. Servem, ainda, para que tenhamos uma visão conjunta sobre como estão os alunos a aprender, em cada escola e a nível nacional. Isto é muito importante para definir o que poderá ter de se rever ou reforçar no projeto da escola ou nas próprias políticas educativas (Almeida et al., 2018).

A intenção de aplicar as provas de aferição vai desde perceber os progressos que cada aluno está a fazer, o que já aprendeu e onde poderá melhorar, até permitir uma visão conjunta das aprendizagens dos alunos em cada escola e no panorama nacional; contudo, existem muitas inconsistências referenciais e dúvidas acerca das reais finalidades deste instrumento de avaliação que ao longo dos anos tem vindo a ser alvo de debates e de mudanças.

Consolida-se, assim, o objetivo de convocar as perceções de alunos e de professores sobre as provas de aferição, precisamente em que medida compreendem o seu objetivo, quais as vantagens e desvantagens que destacam e, de uma forma mais global, se são a favor ou contra a realização das mesmas e porquê.

1. Enquadramento teórico

O papel da avaliação pedagógica é de relevância incontestável, na medida em que regula a prática educativa, tratando-se de uma referência incontornável no que reporta à sistematização do que se ensina e aprende, com uma tradução, em última análise, na gestão do currículo e na organização e operacionalização do trabalho pedagógico e didático. Para além da sua função sumativa, que conduz o aluno à aprovação, reprovação e, em fases mais terminais, de certificação, a avaliação também acarreta funções pedagógicas necessárias para a promoção da mudança e a alteração do trabalho pedagógico, com repercussões ao nível da conceção geral da educação. Autores, como Fernandes (2007), avançam que “para ajudar a melhorar a aprendizagem, a avaliação precisa ser bem utilizada” (p.373) e para tal, são vários os instrumentos de avaliação disponíveis para o efeito, entre os quais destacamos as provas de aferição, ainda que se apresentem como um instrumento gerador de controvérsia. São escassos os estudos que abordam este tema, sobretudo no que diz respeito à perceção dos professores e alunos, interessando-nos, agora, a análise das perceções que estes atores apresentam a respeito de uma temática restritamente estudada.

Eis um cenário em que à avaliação interna apensam-se os resultados da avaliação externa, sendo inevitável a sua confrontação. A opção por uma alegada concertação de avaliações internas e externas prende-se, segundo o Decreto-Lei n.º 17/2016, de 4 de abril, com a melhoria das aprendizagens e a criação de oportunidades de sucesso educativo para todos. Nesse seguimento, o Ministério da Educação (2015) justifica que a “avaliação interna e externa das aprendizagens é essencial para o sucesso educativo dos alunos e para o bom desempenho das escolas” (p. 1123); sendo, portanto, um dever de a administração educativa monitorizar o desempenho do sistema, nomeadamente no que respeita às aprendizagens. No ano letivo 2015/2016 surgiu a proposta de um sistema de avaliação das aprendizagens onde se inserem as provas de aferição. O governo quando deu por findas as provas finais realizadas em término de ciclo, deu início às atuais provas que são aplicadas no 2.º, 5.º e 8.º anos. O Despacho Normativo 1-F/2016, de 5 de abril descreve-as como um “instrumento transversal aos diferentes ciclos de ensino e componentes do currículo” (p.11440). Esta política educativa é efetivada pelo Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), cuja operacionalização assume um caráter obrigatório e universal nos três ciclos do ensino básico e é aplicado anualmente, de acordo com um sistema de rotação das áreas disciplinares, de forma a detetar quais as aprendizagens que necessitam de (re)incrementos pedagógicos e didáticos.

No que reporta aos critérios de classificação da prova, de acordo com o IAVE (2018) “todas as respostas são classificadas através de códigos que correspondem a níveis diferenciados de desempenho” (p.2). Assumindo o seu caráter criterial, trata-se de um subsistema de avaliação em que cada professor classificador analisa e enquadra as respostas ao descritor de desempenho adequado para poder atribuir o código. Quanto aos resultados das provas de aferição, estes dão origem a um conjunto de informações respeitantes ao desempenho do aluno, que ficam registadas na ficha individual do mesmo e, posteriormente, lhe são transmitidas não só a ele, como aos respetivos encarregados de educação e à escola, deixando, paradoxalmente, de parte a necessidade ou, pelo menos a ambição, de aferir a qualidade das próprias políticas educativas. Congruentemente, em vez da atribuição de uma classificação, são feitos relatórios que expressam categorias de desempenho manifestados da seguinte forma qualitativa: i) conseguiram (C); ii) conseguiram mas podem melhorar (CM); iii) revelaram dificuldade na resposta (RD); iv) não conseguiram responder de acordo com o esperado (NC) ou; vi) não responderam (NR) (IAVE, 2017). No entendimento do IAVE (2017), uma das vantagens deste método de avaliação é tornar possível que tanto os professores quanto os encarregados de educação percebam quais os conteúdos em que os alunos precisam de melhorar e consolidar conhecimentos. Estes relatórios, em casos específicos, indicam as áreas que necessitam de reforço, dando pistas para a (re)organização do trabalho curricular e pedagógico das escolas. Alertamos para o facto de que estas provas são elaboradas para “aferir apenas alguns aspetos do desempenho dos alunos, em determinadas competências, não permitindo os dados obtidos uma explicação completa de tais desempenhos, nem sendo possível, a partir deles, conhecer as práticas nas escolas que levaram aos resultados obtidos “(ME, 2004, p. 20). Ainda que apoiada por uns, as provas de aferição são alvo de muitas contestações da sua aplicação, de que é exemplo, Guinote, professor do 2.º CEB, e que referiu ao jornal Público (2019)1 que as provas de aferição são “algo desconexo, descontínuo, sem sequência e sem a possibilidade de gerar informação verdadeiramente relevante sobre a evolução das aprendizagens dos alunos, pois os relatórios que chegam às escolas de pouco ou nada servem, uma vez que, em regra, não é expectável que os alunos envolvidos voltem a ser aferidos”. A propósito, Fernandes (2005) diz que “não é fácil garantir que a avaliação abranja todos os domínios do currículo ou mesmo o essencial de cada um dos domínios” (p.81).

A prova de aferição de Português, com a duração de 90 minutos, foi realizada pela última vez no ano de 2018 e era para ser novamente aplicada em 2020 mas, tal não aconteceu dado o período de pandemia vivenciado devido à COVID-19. Nesta prova, avalia-se a aprendizagem ao nível dos domínios da Oralidade, Leitura, Educação Literária, Gramática e Escrita. As principais dificuldades detetadas mediante os resultados obtidos na prova de aferição realizada em 2018 prendem-se com o domínio da Leitura, cujas respostas ficaram aquém do expectado, bem como algumas fragilidades na interpretação, ou seja, referem-se à construção de inferência subjetiva que o aluno expressa acerca do texto. Face às maiores dificuldades na interpretação de textos não literários comparativamente aos literários, o IAVE (2018) aconselha que deve haver um reforço na leitura inferencial (que obriga à interpretação e dedução). Uma outra dificuldade manifesta prende-se com erros gramaticais abundantes, de que serve de exemplo, a dificuldade em conjugar certos verbos tais como “voar” e “cantar” e uma escrita pejada de erros ortográficos.

A prova de aferição de História e Geografia de Portugal dispõe, também, de 90 minutos para a sua resolução, esta foi aplicada pela primeira vez em 2017 e novamente em 2019. De uma forma global é nesta prova que os alunos conseguem alguns dos seus melhores resultados, porém as escolas levantam algumas críticas, entre elas o excesso de conteúdos objeto de avaliação e a extensão da prova face ao tempo regulamentar estipulado (Kotowicz, 2018). Algumas críticas dirigidas à prova prendem-se com a extensão de alguns dos enunciados dos exercícios face à resposta que se pretende curta e simples, o que pode confundir um aluno do 5.º ano. Em termos de eficiência de resposta elaborada e apresentada pelos alunos, podemos sistematizá-la nos seguintes termos: a grande maioria dos alunos mostrou saber identificar diferentes formas da superfície terrestre e cerca de 71% não manifestaram dificuldades na classificação das formas de relevo (Kotowicz, 2018). Um dos principais obstáculos reportou-se à atribuição dos nomes aos rios e à sua descrição de português ou luso-espanhol. Ainda no que reporta à Geografia, notaram-se conhecimentos não consolidados no que diz respeito aos pontos cardeais. No caso da área de História, as principais dificuldades prendem-se com a escrita em numeração romana e a distinção entre comunidades agropastoris e recoletoras. Uma percentagem igualmente baixa resultou no relacionamento de acontecimentos históricos com a data em que ocorreram. Neste aspeto, o relatório do IAVE (2018) releva a dificuldade que os alunos mostram na localização de acontecimentos no tempo, o que exige a aplicação de conhecimentos mais complexos.

2. Métodos

Face à problemática e aos objetivos definidos foi utilizada uma metodologia mista, de caráter descritivo, interpretativo e compreensivo (Lincoln, Lynham & Guba, 2011), com recurso ao inquérito por questionário aplicados a alunos do 5.º e 6.º anos, e por entrevista realizada com professores de Português e História e Geografia de Portugal do 2.º CEB.

2.1 Participantes

Os participantes no estudo correspondem a quarenta alunos do 2.º CEB, sendo que 20 (vinte) deles frequentam o 5.º ano e os restantes 20 (vinte), o 6.º ano. A opção por dois anos de escolaridade prende-se com o facto de ser conveniente interpretar perceções de alunos que já passaram pela experiência (6.º ano) e, como tal, já manifestam e consolidaram entendimentos mais sólidos sobre as diretrizes das provas, sendo possível comparar os seus entendimentos com os dos de alunos que frequentam o 5.º ano, que ainda não experienciaram a realização das provas e têm expectativas acerca das mesmas. Participaram, ainda, na investigação, 4 (quatro) professores do 2.º CEB, em que dois deles lecionam a disciplina de Português e outros dois a disciplina de História e Geografia de Portugal. Tanto os alunos como os docentes exercem a sua atividade num agrupamento de escolas do concelho de Viseu. Como tal, trata-se de uma amostra de conveniência, uma vez que foi escolhida por razões de ordem prática (Carmo & Ferreira, 1998). Apesar de considerarmos o número de participantes razoável, salientamos que os resultados do estudo não podem ser generalizados à população geral, dado que os resultados “só se aplicam à amostra, não podendo ser extrapolados com confiança para o Universo” (Hill & Hill, 2009, p. 50).

2.2 Técnicas e instrumentos de pesquisa

O questionário, precedido de um pré-teste, foi aplicado aos alunos e a sua construção partiu de um modelo estrutural simples, cujas questões estão distribuídas do geral para o particular, de forma a garantir uma configuração lógica para o respondente. Em termos de plano geral, foi dividido em duas partes, estando a primeira associada à caracterização sociodemográfica dos inquiridos, e a segunda estruturada por 27 (vinte e sete) questões de reposta fechada de escolha múltipla.

No caso da entrevista, assumiu a tipologia estruturada, aplicada aos professores, tendo consistido em “conversas orais, individuais ou de grupos, com várias pessoas selecionadas cuidadosamente, a fim de obter informações sobre factos ou representações, cujo grau de pertinência é analisado na perspetiva dos objetivos da recolha de informação” (Ketele & Roegiers, 1999, p.22). Foram considerados aspetos, tais como o objetivo a atingir, a construção do guião de entrevista, a escolha dos entrevistados e a preparação dos mesmos bem como a definição da data, hora e local.

2.3 Análise e tratamento de dados

Para a análise dos dados quantitativos, recorremos à estatística descritiva. No que reporta ao tratamento dos dados qualitativos, operámos com a análise de conteúdo sistemática (Bardin, 2016). A sua análise partiu de uma leitura flutuante das mesmas, seguida da sua interpretação com recurso a um processo de categorização e consequente sistematização dos dados. Sustentados pelas palavras de Rocha (2016), “a categorização ajuda o investigador a fazer comparações e contrastes entre padrões, para assim refletir profundamente sobre certos padrões e linhas complexas de dados, podendo-lhes dar sentido” (p.312).

3. Resultados

3.1. Análise dos dados quantitativos

Cerca de 50% das respostas concedidas pelos alunos do 5.º ano (cf. Tabela 1) apontam que as provas de aferição são “necessárias”, em contrapartida as perceções dividem-se entre 15% para “pouco necessárias” e outras 15% para “nada necessárias”. A maioria dos alunos do 6.º ano, que já realizou as provas de aferição considera que estas são “necessárias” (50%) e “muito necessárias” (35%), não existindo qualquer tipo de resposta a incidir nas opções “pouco necessárias” e “nada necessárias”.

Tabela 1 Necessidade de aplicar provas de aferição para verificar o que já foi aprendido e ajudar a melhorar: alunos do 5.º e 6.º anos 

Alunos do 5.º ano Alunos do 6.º ano
Respostas N % Respostas N %
Muito necessárias Necessárias Sem opinião formada Pouco necessárias Nada necessárias 4 10 0 3 3 20 50 0 15 15 Muito necessárias Necessárias Sem tenho opinião formada Pouco necessárias Nada necessárias 7 10 3 0 0 35 50 15 0 0
Total 20 100 Total 20 100

Apesar de ainda não terem realizado a prova de aferição, 75% dos alunos do 5.º ano pressupõe que o grau de dificuldade desta é superior ao dos testes de avaliação, 15% que são mais difíceis e 10% mais fáceis. Após a resolução da prova de aferição, os alunos do 6.º ano consideram maioritariamente (55%), que estas são “mais difíceis” do que os testes de avaliação interna, 5 % muito mais difíceis, sendo que 40% dos alunos diz não ter uma opinião formada (cf. Tabela 2).

Confrontados com a questão se se sentem preparados para a realização das provas de aferição, 55% dos alunos inquiridos do 5.º ano revela estar preparado e 25% assinalou a resposta “bem preparado”, o que manifesta autoconfiança. Inclusive, a maioria dos alunos afirma já ter resolvido modelos de provas de anos antecedentes a fim de se familiarizar e preparar. No caso dos alunos do 6.º ano, 90% das respostas revelam que estes se sentiam “Preparado/a” e “Bem preparado/a”, somente 5% admite estar “Nada preparado/a” para a prova.

Sendo plausível que os momentos de avaliação desencadeiam alguns sentimentos menos positivos provenientes de fatores externos, de que é exemplo, a ansiedade e/ou nervosismo que cada vez mais impactuam o modo de vida da população, tivemos, como propósito, perceber se os alunos manifestavam este tipo de sentimentos.

Tabela 2 Comparação do nível de dificuldade entre as provas de aferição (externas) e as provas internas: alunos do 5.º e 6.º anos 

Alunos do 5.º ano Alunos do 6.º ano
Respostas N % Respostas N %
Muito mais difíceis Mais difíceis Sem opinião formada Mais fáceis Muito mais fáceis 3 15 0 2 0 15 75 0 10 0 Muito mais difíceis Mais difíceis Sem opinião formada Mais fáceis Muito mais fáceis 1 11 8 0 0 5 55 40 0 0
Total 20 100 Total 20 100

Quanto ao índice da ansiedade e/ou nervosismo na realização das provas de aferição, cerca de 45 % dos alunos do 5.º ano afirmam sentirem-se “Pouco ansiosos”; contudo, uma percentagem considerável de 40%, divide-se entre o “Bastante ansioso/a” (15%) e o “Muito ansioso/a” (25%). Em contrapartida, verificamos que nos alunos do 6.º ano, estes sentimentos são mais manifestos, em que 85% dos alunos distribuem as respostas pelo “Bastante ansioso/a” e “Muito ansioso/a” e, apenas 15% dos alunos selecionou a opção “Pouco ansioso/a” (cf. Tabela 3).

Outro aspeto importante passou por perceber se todos os conteúdos que surgiram na prova de aferição dos alunos, agora do 6.º ano, foram previamente trabalhados em sala de aula, e não houve qualquer resposta que recaísse na opção “Nunca”, pelo que podemos deduzir que o programa que se pretende cumprido pelo professor foi executado.

Passando aos resultados obtidos através das entrevistas conduzidas aos 2 professores de Português e aos 2 professores de História e Geografia de Portugal do 2.º CEB, é possível verificar que os professores têm uma perceção consensual e não muito favorável quanto à real eficácia e comprometimento do propósito que as provas designam.

Tabela 3 Influência da ansiedade e/ou nervosismo na realização das provas de aferição: alunos do 5.º e 6.º anos 

Alunos do 5.º ano Alunos do 6.º ano
Respostas N % Respostas N %
Nada ansioso/a Pouco ansioso/a Sem opinião formada Bastante ansioso/a Muito ansioso/a 1 9 2 3 5 5 45 10 15 25 Nada ansioso/a Pouco ansioso/a Sem opinião formada Bastante ansioso/a Muito ansioso/a 0 3 0 10 7 0 15 0 50 35
Total 20 100 Total 20 100

3.2. Análise dos dados qualitativos

Percebemos que os professores não são a favor das provas de aferição e a maioria aponta um maior número de desvantagens face a eventuais vantagens. Algumas das vantagens destacadas passam pela: (i) utilidade para o professor em perceber as dificuldades e potencialidades dos seus alunos, face à média nacional e, posterior, reorientação das estratégias e metodologias de ensino; (ii) cumprimento dos programas e; (iii) revelar alguns aspetos de aprendizagem consolidados e menos consolidados nos alunos. Quanto às desvantagens, três dos professores entrevistados alertam para a “pressão exercida na comunidade escolar em prol de um bom resultado a nível nacional” e outras das respostas indicam desvantagens tais como: (i) menção negativa aos “rankings”, que desvirtuam o que está subjacente ao processo de ensino-aprendizagem; (ii) ausência de classificação, o que provoca falta de interesse e empenho nos alunos e; (iii) calendário da aplicação desajustado.

Sendo que uma das novidades deste instrumento de avaliação passa pela sua aplicação em anos intermédios, houve o interesse em perceber se os professores veem alguma relevância particular na implementação das provas ao nível do 5.º ano. A maioria dos entrevistados afirma que não vê qualquer vantagem na seleção deste ano, até porque nem todos continuam com os alunos em anos seguintes. Somente um dos entrevistados, no caso professor de Português, mostrou compreensão na escolha, justificando que possibilita a redefinição de estratégias para o 6.º ano e há uma maior coerência. Contudo, tal só tem efeito se o professor acompanhar o aluno no ano seguinte.

Relativamente à estrutura da prova de aferição, os professores dizem que os exercícios que nela constam se assemelham aos praticados nas aulas e revelam o cuidado em familiarizar os alunos com modelos de provas de aferição de anos antecedentes.

A relação entre as provas de aferição e o trabalho docente também tem sido alvo de alguma polémica e alguns dos membros da comunidade escolar acreditam que o real intuito das provas de aferição passa por avaliar o desempenho dos professores. Confrontados com esta questão, os entrevistados mostram-se ofendidos, afirmando que tal meio não é viável nem credível dada as condicionantes subjacentes.

Questionados acerca da capacidade da prova de aferição aferir o real conhecimento dos alunos, a opinião dos docentes oscila. A maioria revela dúvidas face à credibilidade dos resultados e apontam exemplos, como o facto da prova de avaliação não ter classificação o que, desta forma, contribui para que os alunos não se esforcem tanto. No entanto, um dos entrevistados atenta que a avaliação dos alunos não consegue ser feita através de uma prova, mas sim de um conjunto de instrumentos de aplicação contínua.

Dado que os resultados dos alunos na prova de aferição visam fornecer dados acerca das aprendizagens, a fim de serem úteis na orientação do trabalho feito, procurámos saber, junto dos professores, se os resultados são tidos em conta no delinear de estratégias futuras. As respostas não foram convincentes, dado que três dos entrevistados mencionaram que os resultados só são ou tentam ser tidos em consideração se existir uma justificação ou intenção. No entanto, afirmam que os mesmos são analisados, mas nada salientam sobre a formulação de estratégias. Tabela 4.

Tabela 4 Categorias e subcategorias da análise de conteúdo 

Categoria Subcategoria
Efeito das provas de aferição Não muito favorável Desfavorável
Vantagens e desvantagens das provas de aferição Vantagens Desvantagens
Impacto das provas de aferição Constrangimentos na resolução. Relevância na implementação

4. Discussão

Na perspetiva de vários autores, dos quais destacamos Kraemer (2006), os instrumentos de avaliação são desenvolvidos pela necessidade de avaliar e medir os conhecimentos adquiridos pelo indivíduo. Mediante esta evidência, somos confrontados com algumas reticências de alunos e de professores para com a eficiência das provas de aferição. Ainda que conhecedores do propósito que designam, todos os professores revelam uma opinião pouco favorável quanto à real eficácia e importância da sua aplicação. Estas opiniões divergem do preconizado pelo IAVE (2017), ao apontar como aspetos gerais da importância da prova: “(i) acompanhar o desenvolvimento do currículo nas diferentes áreas; (ii) fornecer informações às escolas, professores, encarregados de educação e aos próprios alunos sobre o desempenho destes últimos; (iii) potenciar uma intervenção pedagógica atempada, dirigida às dificuldades específicas de cada aluno” (p.1). No caso dos alunos, a maioria compactua com a necessidade das provas de aferição ainda que acreditem que o grau de dificuldade seja superior ao dos testes de avaliação. Tal crença pode ser consequência do aparato dos meios de comunicação e da comunidade escolar em torno do instrumento, bem como da maior panóplia de conteúdos alvo de avaliação, que embora trabalhados ao longo do ano letivo poderão estar esquecidos.

Confrontados com as vantagens do instrumento, os entrevistados não têm prontidão nas respostas e a grande maioria afirma que não vê grandes benefícios e que estes não superam as desvantagens que encontram. Estas convicções entram em contradição com o que o Decreto-Lei n.º 17/2016, de 4 de abril institui. Segundo este documento, as vantagens do instrumento passam por: “providenciar informação regular ao sistema educativo; fornecer informações detalhadas acerca do desempenho dos alunos à escola, aos professores, aos encarregados de educação e aos próprios alunos e potenciar uma intervenção pedagógica atempada, dirigida às dificuldades identificadas para cada aluno” (p.1125).

A fim de averiguar se existe um trabalho prévio direcionado para a preparação dos alunos para a prova de aferição, foram formuladas perguntas para os alunos e para os professores. Junto dos primeiros procurámos averiguar se estes já passaram por alguma simulação de situação de prova e, no caso dos professores, se existe um cuidado particular na preparação dos alunos para o momento. Segundo avança Giugni (1986, p. 167), “a organização racional de uma atividade educativa, como do resto de qualquer atividade, requer necessariamente uma planificação”, o que corrobora com o respondido pelos professores que admitem fazer revisão de conteúdos; assim como, permitem aos alunos o contacto com modelos de prova de anos anteriores. Os dados recolhidos através dos alunos foram pouco esclarecedores, uma vez que houve várias respostas que admitem “não saber”, o que nos levou a concluir que muitos deles não entenderam o conceito de “simulação”; porém, quando esclarecidos, a maioria diz ter tido um contacto prévio com modelos de prova de aferição anteriores. Muito por via das situações de “simulação” é que a grande percentagem de respostas dos alunos afirma sentir-se “Preparado” para a resolução da prova.

Sabemos que, derivado dos resultados das provas de aferição, são redigidos relatórios designados de RIPA (Relatório Individual da Prova de Aferição) e REPA (Relatórios de Escola das Provas de Aferição). Estima-se que uma análise cuidada destes relatórios auxilie os professores a ter uma melhor perceção das aprendizagens consolidadas e menos consolidadas dos seus alunos e, consequentemente, melhorar o seu desempenho. Os REPA surgem a partir da “agregação da informação apresentada nos RIPA e disponibilizam informação por “turma, escola e a nível nacional” (IAVE, 2018, p.1). Mediante os dados obtidos, é possível constatarmos que os REPA são analisados e debatidos em reuniões de grupo disciplinar, nas quais os docentes tentam delinear estratégias que vão ao encontro dos resultados.

Atentando na avaliação interna e externa, Machado (2001) afirma que “as organizações precisam de fazer a avaliação interna para serem tidas por responsáveis, sérias e bem administradas” (p. 60) e estudos de Lafond (1998) clarificam que a avaliação externa “só pode atingir o seu principal objetivo, o de ajudar a escola a aperfeiçoar-se, se for precedida e acompanhada por uma autoavaliação implementada pela própria escola” (p.20). Segundo o autor supracitado, podemos constatar que deve existir um trabalho complementar entre instrumentos, no entanto, a partir das respostas recolhidas dos professores percebemos que apenas um dos docentes defende que os instrumentos de avaliação externa e interna se complementam positivamente. Os restantes entrevistados têm dúvidas e são defensores da maior eficácia da avaliação interna o que contraria a opinião de autores como Gronlund e Linn (1990), que alertam que “os testes e os outros procedimentos para medir a aprendizagem dos alunos não se destinam a substituir as observações e juízos informais dos professores. Antes pelo contrário, visam complementar e suplementar os métodos informais de obtenção de informação acerca dos alunos” (p.4).

Conclusão

Inferimos do estudo que o assunto é gerador de alguma discórdia de opiniões no núcleo da comunidade educativa. Os professores partilham o consenso de que as provas de aferição não são necessárias, não trazem novidade nem progresso e dificilmente cumprem a função que prometem, daí o maior número de desvantagens apontadas comparativamente às vantagens. No caso dos alunos, as provas de aferição são tidas como necessárias. A maioria assemelha as provas de aferição a um teste de avaliação com um maior número de conteúdos avaliados e com a formalidade intrínseca associada ao momento; assim sendo, não vão além de mais um momento de avaliação para o qual os alunos devem estar preparados.

Aliado à ausência de classificação ou qualquer peso na nota final dos alunos, notamos que a importância atribuída a este instrumento não é muita, ainda que seja gerador de alguma ansiedade nos alunos e nos professores. No caso destes últimos, sobretudo em prol de um bom resultado das escolas a nível nacional e de uma boa classificação nos “rankings”.

Os docentes atribuem um maior papel à avaliação interna e contínua, ainda que haja quem defenda a relação de complementaridade entre avaliações (externa/interna). Quanto à estrutura das provas de aferição, bem como o nível de dificuldade das atividades de ensino-aprendizagem que nelas constam, os professores não apontam nenhum inconveniente e afirmam que os exercícios se assemelham aos praticados em sala de aula. No caso dos alunos do 6.º ano, estes afirmam que não houve qualquer conteúdo que não tivesse sido antecipadamente trabalhado nas aulas.

Perante os resultados obtidos com o estudo e embora não seja possível generalizar as perceções de alunos e professores do 2.º CEB, foi possível obter uma breve visão do assunto, o que nos leva a questionar se o modo como a avaliação é conduzida não deveria ser repensado.

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Recebido: 21 de Fevereiro de 2021; Aceito: 06 de Maio de 2021

Autor Correspondente João Manuel de Oliveira Rocha Escola Superior de Educação de Viseu Rua Dr. Maximiano Aragão, 41 3500-155 Viseu - Portugal jorocha@esev.ipv.pt

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