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Sociologia, Problemas e Práticas

versão impressa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  no.105 Lisboa ago. 2024  Epub 11-Out-2024

https://doi.org/10.7458/spp202410533897 

ARTIGOS ORIGINAIS

“Amarramos-te ali à cadeira”: perceções sobre os ofensores e o risco de violência na idade avançada

“We’re going to tie you to the chair”: the perception of perpetrators and the risk of violence in old age

“Nous vous attacherons au fauteuil”: perceptions des agresseurs et risque de violence dans la vieillesse

“Te ataremos a la silla”: percepciones de los agresores y riesgo de violencia en la vejez

Isabel Dias1  , concetualização, investigação, visualização, redação do original, revisão e edição
http://orcid.org/0000-0001-8688-4385

Henrique Barros2  , investigação, revisão e edição
http://orcid.org/0000-0003-4699-6571

Sílvia Fraga3  , concetualização, investigação, visualização, redação do original, revisão e edição
http://orcid.org/0000-0002-5268-7751

1 Instituto de Sociologia da Universidade do Porto (ISUP)/Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Porto, Portugal

2 Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), Porto, Portugal

3 Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), Porto, Portugal


Resumo

Este artigo analisa as vivências e perceções de uma amostra de pessoas com mais de 60 anos sobre o tipo de violência mais frequente na idade avançada, os fatores de risco, os ofensores e as reações aos abusos. Foi realizado um estudo misto, com a aplicação sequencial de 677 questionários e 45 entrevistas. Os resultados mostram que as pessoas mais velhas são vítimas principalmente de abuso psicológico e de exploração financeira; o tipo de abuso varia consoante o tipo de agressor/a; e que o machismo, idadismo, problemas de saúde mental, comportamentos aditivos e o isolamento social são fatores de risco de violência. Os profissionais de saúde e da justiça são percecionados como aqueles a quem as vítimas devem recorrer e confiar.

Palavras-chave: perceções; abusos sobre pessoas mais velhas; fatores de risco; tipo de ofensores; reações à violência

Abstract

This article analyses the experiences and perceptions of a sample of people over 60 about the most frequent type of violence in old age, the risk factors, the offenders and the reactions to abuse. A mixed study was carried out with the sequential application of 677 questionnaires and 45 interviews. The results show that older people are mainly victims of psychological abuse and financial exploitation; the type of abuse varies according to the type of aggressor; and that machismo, ageism, mental health problems, addictive behaviours and social isolation are risk factors for violence. Health and justice professionals are perceived as those to whom victims should turn and confide.

Keywords: perceptions; abuse of older people; risk factors; type of offenders; reactions to violence

Résumé

Cet article analyse les expériences et les perceptions d’un échantillon de personnes âgées de plus de 60 ans concernant le type de violence le plus fréquent chez les personnes âgées, les facteurs de risque, les auteurs et les réactions à la maltraitance. Une étude mixte a été réalisée avec l’application séquentielle de 677 questionnaires et 45 entretiens. Les résultats montrent que les personnes âgées sont principalement victimes d’abus psychologiques et d’exploitation financière; le type d’abus varie en fonction du type d’agresseur; et que le machisme, l’âgisme, les problèmes de santé mentale, les comportements addictifs et l’isolement social sont des facteurs de risque de la violence. Les professionnels de la santé et de la justice sont perçus comme les personnes vers lesquelles les victimes doivent se tourner et en qui elles doivent avoir confiance.

Mots-clés: perceptions; maltraitance des personnes âgées; facteurs de risque; type d’agresseur; réactions à la violence

Resumen

Este artículo analiza las experiencias y percepciones de una muestra de personas mayores de 60 años sobre el tipo de violencia más frecuente en la vejez, los factores de riesgo, los agresores y las reacciones ante el maltrato. Se realizó un estudio mixto con la aplicación secuencial de 677 cuestionarios y 45 entrevistas. Los resultados muestran que las personas mayores son principalmente víctimas de maltrato psicológico y explotación económica; que el tipo de maltrato varía según el tipo de agresor; y que el machismo, el edadismo, los problemas de salud mental, las conductas adictivas y el aislamiento social son factores de riesgo para la violencia. Los profesionales de la salud y la justicia son percibidos como aquellos a los que las víctimas deben acudir y confiar.

Palabras-clave: percepciones; maltrato a personas mayores; factores de riesgo; tipo de agresores; reacciones ante la violencia

Introdução

A Organização Mundial de Saúde (WHO, 2002) considera que os maus-tratos a idosos se referem a atos consecutivos e repetidos, ou à falta de ação adequada para com os idosos, causando lesões, dor, angústia, ansiedade e privação de conforto às vítimas. Assumem a forma de abuso físico, sexual, psicológico, financeiro, assim como a negligência, negação da privacidade e de participação na tomada de decisões (Gholipour, Khalili e Abbasian, 2020). Entretanto, a Organização Mundial de Saúde reforçou esta definição e considera que este tipo de violência também constitui uma violação dos direitos humanos, envolvendo a perda de dignidade e respeito pelos cidadãos mais velhos (WHO, 2022).

Paralelamente, os abusos podem ser agrupados como ativos ou passivos. Os primeiros incluem insultos, agressões e outros tipos de violência agressiva, enquanto os passivos incluem ameaças físicas prejudiciais e a indução de medo na vítima (Pritchard, 2001). Assim, os abusos a idosos podem ser classificados de acordo com o tipo de abuso - psicológico, físico, sexual, negligência e abuso financeiro; o tipo de agressor - membros da família, cuidador informal e formal, ou conhecido; o ambiente em que ocorre - na comunidade ou numa instituição. No contexto institucional, o abuso pode ser classificado em abuso de residente para residente ou entre funcionários e residentes (Yon e outros, 2019).

Apesar desta classificação, o debate acerca da definição do conceito de abuso sobre as pessoas mais velhas permanece em aberto. Não se pode esquecer que os abusos também são um fenómeno cultural que reflete uma distinção social entre comportamentos interpessoais aceitáveis e inaceitáveis. É de notar ainda que a compreensão dos comportamentos aceitáveis relativamente às pessoas mais velhas varia de uma sociedade para outra e de uma cultura para outra devido à variedade de valores e normas existentes (Gholipour, Khalili e Abbasian, 2020). No entanto, não há tanto desacordo quanto à prevalência do fenómeno em diferentes regiões do mundo, o qual se tornou num verdadeiro problema de saúde pública (Fraga e outros, 2012).

Não obstante, muitas vezes, os próprios idosos não denunciam os abusos por vergonha, intimidação, medo ou porque o abuso pode ter sido iniciado por um ente querido (Thomson e outros, 2011). Por outro lado, se o abuso for perpetrado por cuidadores formais, a pessoa idosa pode temer as repercussões da denúncia. As pessoas mais velhas também podem ter problemas de comunicação e cognição, e não conseguirem denunciar os maus-tratos. Ao mesmo tempo, devido a possíveis danos à reputação das estruturas residenciais ou por receio de sanções legais, os próprios profissionais podem não denunciar formalmente os abusos, a menos que estes envolvam danos físicos graves (Lemos e outros, 2022). Assim, o abuso de pessoas mais velhas é um problema que é subnotificado quer pelas vítimas (Acierno e outros, 2010), quer pelos profissionais (Pillemer e outros, 2016) e que é subprocessado no sistema de justiça criminal (Ho e outros, 2017). É igualmente, e quase sempre, um comportamento que é infligido por aqueles que estão numa posição de confiança, poder ou que têm a responsabilidade de cuidar da pessoa idosa (Gholipour, Khalili e Abbasian, 2020), o que agrava, como foi antes referido, a sua subnotificação.

Embora exista algum atraso comparativamente à investigação realizada sobre a violência contra crianças e mulheres, a investigação, nos últimos anos, tem vindo a fornecer evidência empírica suficiente para identificar os fatores de risco associados aos ofensores, às vítimas na idade avançada e aos contextos onde ocorrem os abusos (Storey, 2020). O crescente envelhecimento da população poderá resultar num agravamento do problema dos abusos contra as pessoas idosas.

A partir do estudo Harmed, que analisou as determinantes económicas e de saúde do abuso de pessoas mais velhas (Dias e outros, 2022), este artigo pretende contribuir para clarificar como as pessoas mais velhas, com ou sem experiência de abusos, percecionam as formas de abusos mais prevalentes nesta fase do ciclo de vida, quais são os fatores de risco, quem são os principais ofensores, como é que gerem as dinâmicas de violência e que significados lhes atribuem. Pretende ainda dar um contributo para a visibilidade do abuso contra as pessoas mais velhas num país onde a violência doméstica é prevalente e constitui um crime público (Lei n.º 112/2009).1

Revisão da literatura

Apesar de ter conhecido, inicialmente, um certo atraso face à investigação realizada sobre outras formas de violência familiar, como, por exemplo, o abuso de crianças e a violência entre parceiros íntimos (Dyer, Connoly e McFeeley, 2003), nos últimos anos a investigação sobre os abusos contra pessoas idosas conheceu um avanço significativo, de tal forma que passou a ser alvo do estudo especializado de várias áreas científicas e de intervenção (Storey, 2020). A literatura de investigação tem vindo a dedicar-se a várias temáticas relacionadas com o abuso de idosos de grande utilidade para o conhecimento deste problema, mas também para melhor orientar a intervenção dos diferentes profissionais desde a área médico-social até à justiça criminal.

Um dos temas que tem merecido maior atenção da investigação nos últimos anos é a identificação de fatores de risco, uma vez que pode ajudar a orientar os profissionais na gestão de casos de violência e na redução do risco (Douglas e outros, 2013; Hart, Douglas e Guy, 2016). Estes fatores são classificados em estáticos (referem-se a variáveis fixas que geralmente não mudam) ou dinâmicos (referem-se aos fatores que podem ser alterados ou modificados através de intervenções a curto ou longo prazo) (Andrews e Bonta, 2010; Douglas e Skeem, 2005). Numa revisão da literatura sobre os fatores de risco dinâmicos de abuso a idosos, Storey (2020) identifica: (1) os fatores relacionados com o perpetrador; e (2) os fatores relacionados com a vítima.

Nos fatores relacionados com os ofensores, Storey (2020) destaca os problemas de saúde física e mental (e.g., problemas médicos, incapacidades, deficiências funcionais, desordens de personalidade, problemas cognitivos, depressão); o uso de substâncias aditivas; a dependência face à vítima (e.g., financeira, residencial, emocional); problemas de stresse; atitudes idadistas face às pessoas mais velhas e à prestação de cuidados; experiência prévia de vitimização e problemas relacionais. Os fatores relacionados com a vítima, para além dos problemas de saúde física e mental, estão igualmente relacionados com o declínio cognitivo das pessoas idosas; a sua dependência funcional e social; o consumo abusivo de substâncias e de álcool; dificuldades de relacionamento com o ofensor e outras pessoas; isolamento social e familiar; problemas de stresse relacionados com limitações físicas e de mobilidade (Storey, 2020).

Pillemer e outros (2016), baseados no modelo ecológico, identificam fatores de risco ligados ao indivíduo (vítima e perpetrador), à natureza da relação entre vítima e ofensor, e à comunidade/sociedade. Ligados à vítima, no plano individual, são referidos a dependência funcional, deficiências, baixos níveis de saúde física e mental, défice cognitivo, baixos rendimentos, género, idade, dependência financeira, raça/etnicidade. No caso dos ofensores, os autores referem a doença mental, o abuso de substâncias, dependência face à vítima e o estatuto conjugal/marital. Nos fatores de risco centrados na relação, é referida a relação entre vítima e ofensor e o estatuto marital. No caso da comunidade e sociedade são identificados fatores como a localização geográfica, os estereótipos face ao envelhecimento e as normas culturais. Os autores identificam, ainda, alguns fatores protetores como, por exemplo, a existência de redes sociais de apoio às vítimas (2016).

A revisão da literatura mostra-nos que o conhecimento dos fatores de risco pode ajudar a prever futuros abusos. Aumenta a consciencialização dos profissionais acerca das pessoas idosas em situação de risco e fornece, ao mesmo tempo, ferramentas para a intervenção. Porém, segundo Storey (2020), o principal ponto forte desta análise é o seu enfoque nos fatores dinâmicos de risco, porque é maior a capacidade de mudança dos comportamentos associados a estas variáveis (e.g., ofensores com problemas de adição, de desemprego, dependência residencial ou económica) e, consequentemente, a capacidade de gestão e prevenção dos abusos. Contudo, e tal como é preconizado pelo modelo ecológico, a complexidade do problema requer um olhar sobre todos os fatores identificados em cada um dos níveis, desde o nível mais individual ao nível mais contextual.

Porém, ao contrário do que sucede na área da violência por parceiro íntimo (Nicholls e outros, 2013), os instrumentos de avaliação do risco ainda não estão tão estruturados. As ferramentas disponíveis são mais de rastreio ou deteção da presença de abusos a idosos e não tanto de avaliação do risco de danos, tal como sucede com o Elder Assessment Instrument (Fulmer, 2013) e o Elder Abuse Risk Assessment and Evaluation (Dauenhauer e outros, 2017). Esta dificuldade leva os profissionais a usar mais o seu juízo profissional e/ou clínico para determinar o risco e definir estratégias com vista à sua prevenção (Douglas e Skeem, 2005; Heilbrun, Yasuhara e Shah, 2010), o que é considerado como pouco fiável e até antiético devido à falta de transparência no processo de tomada de decisão. Por esta razão, a investigação continua a trabalhar no desenvolvimento de ferramentas de avaliação estruturada do risco de violência contra pessoas mais velhas (Douglas e outros, 2013). De qualquer modo, a identificação da maioria dos casos de abusos, e com exceção dos casos mais extremos, está sempre muito dependente da vontade da vítima em divulgar a sua experiência, independentemente do instrumento usado.

Outro tópico que tem merecido discussão na literatura está ligado às características dos ofensores e das vítimas como preditores dos tipos de abusos infligidos. Os estudos sugerem que as características associadas tanto às vítimas quanto aos perpetradores desempenham um papel crítico na prevalência de abuso de idosos, pelo que não podemos mais ignorar o papel dos agressores (Doerner e Lab, 2012). Ao mesmo tempo, também é importante analisar as diferenças na prevalência dos tipos de abuso em função da relação perpetrador-vítima. Estudos que avaliam familiares e não familiares como potenciais perpetradores constatam que os membros da família (amplamente definidos) são os perpetradores mais comuns de abuso de idosos. No entanto, a prevalência do tipo de abuso difere em função da relação perpetrador-vítima (Naughton e outros, 2012).

No caso da negligência, os estudos referem que geralmente são os filhos adultos os perpetradores mais frequentes (Lithwick e outros, 1999), seguidos pelos prestadores de cuidados domésticos pagos, cônjuges/parceiros íntimos, netos, conhecidos e outros parentes (Acierno e outros, 2010). O abuso físico é mais perpetrado pelos parceiros íntimos e outros membros da família (O’Keeffe e outros, 2007; Acierno e outros, 2010). Já para o abuso financeiro O’Keeffe e outros (2007) encontraram resultados mistos, ou seja, neste caso surgem primeiro outros membros da família (e.g., filhos adultos, netos), os prestadores de cuidados e menos os parceiros íntimos (Lowenstein, 2009). Contudo, os parceiros íntimos surgem com maior prevalência na prática de abuso psicológico e verbal (Laumann, Leitsch, e Waite, 2008; Acierno e outros, 2010). Apesar de o abuso sexual ser o menos estudado, também neste caso os parceiros íntimos surgem com mais frequência no papel de ofensores, seguidos por pessoas conhecidas e estranhos (Acierno e outros, 2010; Amstadter e outros, 2010).

A literatura mostra assim que o tipo de abuso perpetrado varia consoante o tipo de relação entre a vítima e o ofensor. Ou seja, os estudos revelam que os familiares (e.g., parceiros íntimos, filhos adultos) são mais propensos a infligir abuso físico, psicológico e negligência aos seus membros mais velhos, enquanto os prestadores de cuidados e os estranhos surgem com mais frequência na prática de negligência, abuso financeiro e sexual (Jackson, 2016).

Este tipo de evidência leva-nos a retomar uma questão que permanece como um ponto de discórdia na literatura e que é central neste artigo: para ser abuso é preciso o ofensor ter uma relação de confiança com a vítima ou ele também pode ser infligido por pessoas estranhas aos idosos? (Jackson, 2016). De acordo com as definições de abuso de idosos mais comuns (WHO, 2002; Castle, Ferguson-Rome e Teresi, 2015; Gholipour, Khalili e Abbasian, 2020), o abuso é frequentemente perpetrado por uma pessoa que mantém uma relação de confiança com a vítima, ficando assim de fora a violência infligida por desconhecidos (Goergen e Beaulieu, 2010).

Com efeito, entre os anos 1970 e 2000, a definição de abuso de idosos expandiu-se. Do conceito de granny battering, granny bashing, elder mistreatment até ao de elder abuse fez-se um caminho de forma a que outros tipos de abusos (além do físico) e novos elementos pudessem ser considerados (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2013). Esta expansão permitiu, por exemplo, distinguir os maus-tratos a idosos infligidos por familiares/amigos, os que são cometidos em contexto de relacionamento profissional e os crimes perpetrados por um estranho. Ainda assim, no centro da definição continua a estar a relação de confiança que é traída quando alguém, por exemplo, parceiros íntimos, filhos, genros, noras, netos, irmãos, amigos, vizinhos, conhecidos, cuidador formal/profissional de saúde, empregada doméstica, comete abusos e violência sobre pessoas mais velhas (WHO, 2002).

A Organização Mundial de Saúde (WHO, 2002) ao considerar o abuso de idosos como um ato único ou repetido ou falta de ação, que ocorre dentro de qualquer relacionamento onde há uma expectativa de confiança e que causa dano ou angústia a uma pessoa idosa, em vez de detalhar diferentes formas de abuso, ampliou o contexto abrangido pelo problema (Brammer e Biggs, 1998). Ou seja, permitiu a inclusão de uma gama mais ampla de comportamentos abusivos havendo, deste modo, um menor risco de exclusão desnecessária. Todavia, ao mesmo tempo, aumentou a possibilidade de falsos positivos (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2013).

A breve revisão da literatura sobre os fatores de risco associados às vítimas e aos ofensores, assim como a questão da (in)definição do conceito, mostra-nos, por um lado, que um melhor conhecimento dos referidos fatores permite uma gestão mais adequada da ocorrência de violência e, por outro lado, que a comunidade científica e profissional deve prestar ainda mais atenção ao conceito de abuso de idosos, dado ser uma questão que não pode ser facilmente resolvida. Apesar das limitações, as definições existentes, em particular a que está na origem do estudo apresentado neste artigo (WHO, 2002), conduziu a uma compreensão mais clara do problema, ajudou a diferenciar os comportamentos abusivos e os fatores de risco. Permitiu, igualmente, enquadrar o fenómeno no contexto de relações de confiança, mas também atender ao contexto cultural, institucional e social onde os abusos ocorrem (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2013; Brammer e Biggs, 1998).

Metodologia

Neste artigo dá-se conta de parte dos resultados decorrentes do estudo Harmed (Dias e outros, 2022). Este estudo desenvolveu-se através de uma abordagem metodológica mista, com a aplicação sequencial de técnicas quantitativas e qualitativas. Assim, na primeira fase do estudo, foi administrado um questionário a 677 participantes com mais de 60 anos, que fazem parte da coorte de base populacional - EPIPorto (Ramos, Lopes e Barros, 2004), que acompanha desde o ano de 1999, 2485 residentes na cidade do Porto em Portugal. Na segunda fase, foi desenvolvido um estudo qualitativo realizado em 2018 (entre abril e maio), através da aplicação de entrevistas em profundidade com o objetivo de compreender os significados atribuídos pelos participantes às diferentes formas de violência infligidas sobre eles próprios e as pessoas mais velhas em geral.

Neste artigo, dão-se a conhecer, complementarmente, alguns dos resultados de ambos os estudos relativamente às perceções dos entrevistados sobre as formas de violência mais frequentes na idade avançada, quem são os agressores, os fatores de risco, as reações à violência e a gestão desta situação. Trata-se, aqui, de desenvolver uma abordagem mais compreensiva (Hackert e outros, 2019) e integrada deste problema social e de saúde pública, e perceber simultaneamente a variabilidade dos abusos em função do tipo de relação existente entre vítima e agressor, mas também como é que os entrevistados percecionam e processam as experiências de violência na velhice (Mysyuk, Westendorp, e Lindenberg, 2016).

Inquérito por questionário

Na primeira fase do estudo foi administrado um questionário a 677 participantes com mais de 60 anos, que fazem parte da coorte populacional EPIPorto (Ramos, Lopes e Barros, 2004).

O questionário foi aplicado por entrevistadores experientes, presencialmente, através do método CAPI (Computer Assisted Personal Interviewing). Foi recolhida informação sociodemográfica geral acerca dos participantes, experiência de eventos traumáticos e variáveis relacionadas com o estado de saúde e qualidade de vida. Os abusos e violência foram medidos a partir de 52 questões baseadas na Conflict Tactic Scales 2 (CTS 2) (Straus e outros, 1996), e no inquérito britânico sobre abuso/negligência de idosos (O’Keeffe e outros, 2007). Mais concretamente, o abuso psicológico foi medido a partir de 11 questões; o abuso físico foi medido através de 17 questões; o abuso físico com lesão foi avaliado em sete questões; o abuso sexual foi medido em oito questões e o abuso financeiro envolveu a resposta a nove questões.

Foi avaliada a ocorrência de cada tipo de abuso através das seguintes categorias: nunca, uma vez, duas vezes, 3-5, 6-10, 11-20 ou mais de 20 vezes nos últimos 12 meses. Também era apresentada a hipótese de não terem ocorrido nos últimos 12 meses. Para cada um dos comportamentos abusivos respondidos positivamente, foi solicitado aos participantes que indicassem pelo menos um agressor, que podia incluir o cônjuge/companheiro(a), filhos(as), netos(as), genros e noras, outros membros da família, vizinhos, amigos, colegas de trabalho, profissionais dos sectores médico e social, outros profissionais remunerados ou ainda outras pessoas.

Entrevistas em profundidade

Tendo em conta a diversidade de perfis de abuso identificados no inquérito por questionário supramencionado, foi construída uma amostra intencional para a aplicação das entrevistas em profundidade. Esta amostra é composta por 45 pessoas idosas, com e sem experiência de abuso, sendo 25 do género feminino e 20 do género masculino e com idades entre os 60 e os 85 anos.

Os participantes nas entrevistas em profundidade foram contactados segundo o protocolo da coorte populacional EPIPorto (Ramos, Lopes e Barros, 2004). Primeiro foi-lhes enviada uma carta a apresentar o estudo Harmed e os critérios de elegibilidade para a entrevista, sendo-lhes garantido, ao mesmo tempo, o anonimato e a confidencialidade da informação recolhida. Foram ainda informados que a sua participação era completamente voluntária, e que poderiam desistir do estudo a qualquer momento sem que daí decorresse qualquer risco ou privação de cuidados médico-sociais.

As entrevistas também foram realizadas presencialmente por investigadores experientes e foram gravadas com a autorização dos entrevistados.

Apesar de terem ocorrido em momentos temporais diferentes, quer os inquéritos, quer as entrevistas foram administrados nas instalações da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto / Centro Hospitalar de São João, situado na cidade do Porto, em Portugal, exceto no caso dos participantes com dificuldades de mobilidade, em que os inquéritos foram aplicados nas suas casas (n = 71). Em ambos os casos, antes era lida a informação sobre o estudo e assinado o consentimento informado pelos participantes.

O estudo Harmed foi aprovado pela Comissão de Ética do Centro Hospitalar de São João / Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (CES-320/2016). O protocolo do estudo seguiu as orientações da Organização Mundial da Saúde relativo à investigação sobre a violência doméstica (WHO Department of Gender Women and Health, 2001).

Análise de dados

Os dados quantitativos foram analisados através de técnicas descritivas (e.g., médias, percentagem) e de análise estatística multivariada. Foi usado o qui-quadrado para comparar proporções. Foram também calculados os odds ratio brutos e os valores do risco relativo. As diferenças para variáveis contínuas foram avaliadas com recurso a testes de hipóteses paramétricos ou com os equivalentes não paramétricos quando os pressupostos dos primeiros não foram verificados. A análise foi realizada com o recurso ao SPSS v. 26.

No estudo qualitativo foi aplicada uma análise de conteúdo temática às 45 entrevistas realizadas. Depois de gravadas, todas as entrevistas foram transcritas integralmente, sendo, de seguida, organizadas com o apoio do software NVivo (versão 12) para análise de dados qualitativos. Com base numa abordagem indutiva das entrevistas, partiu-se, primeiro, para a identificação de códigos e categorias, seguindo-se, a procura de grandes temas com vista a clarificar e conhecer as narrativas dos entrevistados sobre os abusos de pessoas mais velhas (Braun e Clarke, 2006).

Assim, através de uma abordagem metodológica mista, foi possível uma análise integrada dos dados recolhidos através dos inquéritos e das entrevistas. Ou seja, foi possível identificar padrões de abuso e fatores de risco e ter acesso, ao mesmo tempo, aos pontos de vista dos entrevistados sobre os agressores e as dinâmicas de violência que afetam as pessoas mais velhas.

Resultados

Nesta secção do artigo são apresentados alguns dados estatísticos de natureza descritiva com vista a enquadrar os testemunhos e as narrativas dos participantes nas entrevistas acerca do abuso de idosos. Para reforçar a anonimização dos excertos das entrevistas usamos o escalão etário e não a idade exata dos participantes à data de realização da entrevista. Os dados são apresentados complementarmente.

Características dos participantes e experiência de abusos

Como foi referido na secção anterior, participaram no estudo Harmed 677 indivíduos com mais de 60 anos. Entre estes, 249 (36,8%) são do género masculino e 428 (63,1%) do género feminino. Predomina o grupo dos participantes com idades entre os 60 e os 69 anos de idade (n = 306; 45,1%), seguido dos que têm entre 70 a 79 anos (n = 244; 36,0%). A maioria é casada (n = 417; 61,5%) ou tem o estado civil de viúvo (n = 154; 22,7%); tem filhos (n = 610; 90,1%); vive apenas com cônjuge/companheiro (n = 320; 47,3%) ou sozinho (n = 153; 22,6%); tem um nível de educação que oscila entre o alto (n = 272; 40,2%) e o baixo (n = 248; 36,6%), e encontra-se na reforma (n = 509; 75,1%).

Relativamente à experiência de abusos no estudo quantitativo, 23,9% (n = 162) dos participantes reportaram terem sido vítimas de qualquer tipo de abuso, destacando-se as mulheres com uma prevalência de 26,2% (n = 112) e os homens com 20,1% (n = 50). As mulheres destacam-se em todos os tipos de abuso, em particular no abuso psicológico (22,7%). Embora em menor proporção, este tipo de abuso também é infligido sobre os homens (15,3%), seguido do abuso financeiro (6,4%) (quadro 1).

Quadro 1 Prevalência dos diferentes tipos de abuso (Harmed - Estudo quantitativo, n = 677) 

Fonte: Dias e outros (2020).

Os participantes do estudo qualitativo acompanham estas características gerais, nomeadamente foram entrevistados 20 homens (44,4%) e 25 mulheres (55,6%) com idades entre os 60 e os 87 anos de idade e com um nível de educação alto ( 9 anos) (n = 17; 37,8%), médio (5-9 anos) (n = 12; 26,7%) e baixo (5 anos) (n = 16; 35,6%). São, na maioria, casados (n = 33; 73,3%) ou viúvos (n = 9; 20,0%) e encontram-se reformados do trabalho (n = 35; 77,8%).

Dos 45 participantes nas entrevistas, 60,0% reportaram terem tido experiência de vitimização por tipo de abuso nos últimos 12 meses, para 40,0% que não reportaram experiência de vitimização. No universo dos que disseram ter tido experiência de abuso (n = 27), destaca-se, de novo, a ocorrência do abuso psicológico (77,8%), seguido da exploração financeira (33,3%) (quadro 2).

Quadro 2 Descrição dos entrevistados de acordo com a experiência de abuso (Harmed - Estudo qualitativo, n = 45) 

Fonte: Dias e outros (2020).

Nos seguintes subpontos do artigo analisamos as perspetivas dos entrevistados sobre as suas próprias experiências de vitimação, mas também as representações dos entrevistados não vítimas, as quais são enquadradas pelos dados gerais do estudo quantitativo.

Os agressores: os laços de (des)confiança

A análise quantitativa prévia permitiu-nos identificar os cônjuges/parceiros íntimos como os principais ofensores dos participantes que são vítimas de vários tipos de abusos. Depois como principais agressores surgem outros indivíduos, que corresponde a uma opção de resposta em que o agressor é uma pessoa desconhecida da vítima (quadro 3).

Quadro 3 Agressores por tipo de abuso (Harmed - Estudo quantitativo, n = 677) 

* Existe 1 caso que corresponde à resposta: “recusa”.

Tabela com respostas a uma questão de escolha múltipla.

Fonte: Dias e outros (2020).

A linha de género masculino dos agressores mantém-se com o filho da vítima a surgir como perpetrador de abuso físico (18,8%), psicológico (13,4%) e financeiro (7,4%). O irmão da vítima destaca-se no abuso financeiro (7,9%) e psicológico (5,2%), e o genro no abuso psicológico (2,2%). As filhas das vítimas surgem como perpetradoras de abuso psicológico (9,7%) e físico (6,3%). As irmãs infligem sobretudo abuso financeiro (13,2%) e psicológico (9,0%), seguindo-se neste último caso as noras (1,5%).

Os amigos e vizinhos destacam-se como ofensores de abuso sexual (15,4%), assim como os conhecidos/colegas (7,7%). Com menos prevalência é igualmente indicada a mulher-a-dias / empregada doméstica (2,6%) na prática de abuso financeiro.

A cadeia de agressores: dos familiares aos desconhecidos

Os agressores acima mencionados também são referidos nos discursos dos entrevistados. Os maridos/parceiros íntimos e os filhos ocupam um lugar de destaque nos testemunhos das mulheres vítimas de abuso, mas também dos entrevistados sem experiência de vitimação.

O meu marido era aquele género, por exemplo, ele dava um chuto numa cadeira, num banco e eu não lhe podia dizer nada porque se eu dissesse ele vinha logo com a agressão! [Entrevista 1, mulher, 75-84 anos, vítima de abuso]

Ele [marido] pega por tudo e por nada, não me deixa tomar banho dentro de casa, não me deixa usar luz, nem a água. Desde que veio para casa com a reforma deu-me cabo da cabeça. […] Em novembro do ano passado ou dezembro, fiz queixa dele, estava a levar porrada, a empregada do condomínio ouviu, bateu à porta, pediu para ele não me bater, ele foi agressivo para a empregada, depois ela pediu auxílio a uma vizinha minha para chamar a polícia. […] Prontos, mandou-me uma cabeçada, espalhou-me no chão, fui fazer queixa dele e depois fui para a Medicina Legal. […] Ele também está a roubar-me a reforma. [Entrevista 37, mulher, 65-74 anos, vítima]

Os primeiros agressores são os filhos. Pode haver atenuantes, mas os filhos têm obrigação moral, ética, social, familiar de apoiar os pais, de sustentar os pais. Quando não têm condições põem-nos fora de casa, mas também no lar as coisas custam caro! Quer dizer, há aqui uma cadeia de agressões, a começar pelos próprios filhos. [Entrevista 33, homem, 75-84 anos, não vítima]

Para além dos familiares diretos, os entrevistados também referem como agressores os vizinhos e pessoas estranhas ou desconhecidas.

Eu fui agredido três vezes por um irmão meu. Da primeira vez fui à polícia e ao Instituto de Medicina Legal e o juiz mandou arquivar por falta de provas. Da terceira vez, por acaso uma vizinha ouviu a discussão e viu-me com sangue e o que é que ela fez? Pega no telemóvel e liga para a polícia. Foi a minha salvação! Ele foi condenado. [Entrevista 3, homem, 65-74 anos, vítima]

Por exemplo, há violência de filhos a pais, de netos a avós, mas às vezes na rua também, até a falar, assim de maneira desrespeitosa, também acho que é uma violência feita por estranhos, portanto, nesse caso não tem que ser família. […] Quando é familiar a gravidade ainda é maior, são os filhos, netos, noras, mas também os vizinhos. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, não vítima]

A violência perpetrada por pessoas desconhecidas sobre os idosos é alvo de grande preocupação no discurso de alguns entrevistados.

Eu própria já fui assaltada e estávamos todos a dormir em casa. Ser assaltada afeta, porque eu hoje fecho tudo e mais alguma coisa. Eu fecho a porta da rua, fecho a porta da entrada, depois fecho a porta da cozinha, fecho tudo antes de me deitar. [Entrevista 4, mulher, 60-64 anos, vítima]

Já fui assaltada! Tentaram tirar-me a carteira, não conseguiram, eu consegui segurá-la. […] Outra vez fui perseguida por um indivíduo que ia a passar à frente na caixa do supermercado e eu disse: “Eu estou à sua frente”. Eu avancei e ele não perdoou. Depois veio atrás de mim com uma garrafa de água a deitar água para cima de mim, eu atravessei para o outro lado da rua, ele atravessou também, a perseguir-me e dizia: “O que te vale é que eu hoje estou bem disposto”. E eu caladinha […] depois encostei-me a uma senhora e disse: “Não se importa que eu fique aqui um bocadinho?” “Porquê? A senhora está a ser perseguida?”, “Estou”. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

Os trabalhadores dos lares: um depósito para morrer

Apesar de os cuidadores formais, isto é, os profissionais pagos que trabalham em estruturas residenciais para pessoas mais velhas não serem referidos no quadro 3, no plano das representações sociais, para os entrevistados, estas instituições surgem como um espaço onde os abusos podem ocorrer, principalmente, por falta de preparação e competências técnicas dos profissionais.

São maltratados [os mais velhos] primeiro pelos filhos porque egoisticamente os entregam aos lares e são poucos os lares de terceira idade devidamente equipados e estruturados com técnicos capazes de dar uma qualidade de vida àquela gente até ao final. Vão para um depósito para morrer e evidentemente que o Estado tem uma função não só de subsidiar, mas também de fiscalizar. [Entrevista 33, homem, 75-84 anos, não vítima]

Às vezes nos lares, não há propriamente agressões, mas no lar existe uma exploração não só económica, mas também emocional por parte dos responsáveis do lar, principalmente relativamente àquelas pessoas que não têm autonomia. Porque quem tem autonomia, enfim, sai, vai dar uma volta, vai tomar um café e depois regressa. Relativamente a outras pessoas que lá estão, a maioria fica ali sentada a olhar para a televisão, a ver tudo o que a televisão dá. [Entrevista 6, homem, 60-64 anos, vítima]

Há lares que têm apoio financeiro do Estado, se fossem em quantidade suficiente e todos muito bem apetrechados e os idosos fossem todos muito bem tratados, então o Estado daria a proteção necessária, mas às vezes parece que não são! [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

Os fatores de risco: do machismo à cultura idadista das sociedades contemporâneas

Nesta secção descrevemos a perceção dos entrevistados, vítimas e não vítimas, acerca dos fatores de risco de abuso de idosos. Assim, para além da prevalência de uma cultura misógina que ainda marca as relações de intimidade desta geração (mais de 60 anos), os participantes referem igualmente como fatores de risco a doença mental, o consumo de álcool e de estupefacientes pelos agressores, a dependência mútua entre a vítima e o agressor, a pobreza e dificuldades económicas, a vulnerabilidade dos mais velhos e o isolamento social, bem como a falta de competências dos cuidadores formais, como se mostra de seguida.

A prevalência do machismo e da cultura patriarcal:

Os idosos de agora são pessoas de uma geração em que a mulher era muito sujeita à autoridade masculina e ao respeito masculino. Hoje, essa mentalidade mantém-se e então a mulher subjuga-se com mais facilidade ou sujeita-se. O homem que é mais bruto por natureza e, se calhar, durante toda a sua vida exerceu autoridade sobre a família, alguns até de uma forma violenta em demasia, quando chega a velho é mais chato, porque acha que ainda tem os mesmos direitos e que ainda pode falar alto. [Entrevista 35, homem, 65-74 anos, não vítima]

Eu tenho uma amiga que foi muito maltratada pelo marido, porque ele era mauzinho, era ciumento, era possessivo. […] Ninguém desconfiava porque ele era um fingido, tratava-a mal e na rua punha-lhe a mão em cima do ombro, sempre com um ar muito simpático, parecia que era um excelente marido, de facto não era. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, não vítima]

O homem, por ser homem, pensa que manda em tudo e em todos, tem aquele poder, não é? [Entrevista 37, mulher, 65-74 anos, vítima]

A doença mental e os comportamentos aditivos dos agressores:

Porque eu tenho um problema em casa. Tenho um filho que é esquizofrénico e é um problema muito difícil de resolver. Portanto, é uma nuvem negra que está ali em cima. [Entrevista 3, homem, 65-74 anos, vítima]

Os idosos têm filhos que querem dinheiro para a droga, querem dinheiro para se embebedarem e tudo, os pais, coitados, os velhotes, dizem que não dão e depois matam. [Entrevista 37, mulher, 65-74 anos, vítima]

Por aquilo que vou ouvindo, para além do álcool, que pode contribuir para isso, numa família às vezes a droga também provoca situações destas. Eles querem do idoso uma ajuda financeira que ele não pode dar e isso pode ser o suficiente para se insurgir e tratar mal o idoso. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

A mútua dependência entre vítimas e agressores:

Há filhos que cuidam dos pais e dos avós, há filhos que não. Alguns até matam, querem dinheiro dos avós ou a mãe não dá dinheiro, matam as mães. [Entrevista 37, mulher, 65-74 anos, vítima]

Uma pessoa que é vítima numa casa em que é acolhida por um filho ou pela filha e é agredida, enfim, como é que se vai queixar? Vai-se embora? Não vai porque não tem dinheiro. Está ali porque tem necessidade de estar ali. [Entrevista 33, homem, 75-84 anos, não vítima]

A pobreza e as desigualdades sociais:

Eu acho que há violência talvez nas famílias mais carenciadas financeiramente. Onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão. Não quer dizer que em famílias mais abastadas não possa haver também alguns casos de abusos, mas acho que não será tão frequente. […] Há zonas onde a polícia vai de vez em quando para ver se não há problemas, se falta qualquer coisa, mas a gente às vezes vê as casas tão degradadas e nota-se que há pessoas que vivem com tantas dificuldades, com tanta pobreza! Embora a polícia vá lá protegê-lo [ao idoso] não sei se isso será o suficiente. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

É sempre o mesmo problema, a questão económica essencialmente. Faltando dinheiro tudo se deteriora, as pessoas perdem a cabeça, tudo serve para uma pessoa se zangar e lá está também é a despesa que o idoso traz. Porque a reforma do idoso, ou não tem ou se a tem é pequeníssima e não dá para sustentá-lo a ele próprio. Muito menos para os remédios que ele precisa de tomar e essas coisas. Portanto, é sempre um problema, a questão económica. [Entrevista 35, mulher, 65-74 anos, não vítima]

A vulnerabilidade das pessoas idosas e o isolamento social:

Os idosos são mais frágeis e mais isolados. […] As pessoas estão isoladas porque não têm mais ninguém consigo, estão sozinhas em casa, estão numa zona, até estou a pensar nos assaltos, onde não vive mais ninguém, às vezes o casal são ambos agredidos. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

A falta de preparação e de competências técnicas dos profissionais que trabalham em estruturas residenciais para idosos:

Quando se abre um lar e qualquer pessoa assume a direção do lar e não tem preparação técnica nenhuma para o efeito, o que é se que espera? É a violência, é a força: “Não vais?” “Amarramos-te ali à cadeira”. […] Porque repare se um lar está equipado com psicólogos, psiquiatras, médicos, sacerdotes, quem quer que seja, com quem eu possa ter uma conversa, manifestar o meu estado de espírito, como é que eu estou, como me sinto, isto pode ajudar a que aquela pessoa que me ouve vá à direção e diga atenção: “Passa-se isto e não sei que mais”. Se eu não tenho um interlocutor, se eu só tenho a pessoa que me faz a limpeza, que ralha comigo porque eu deixei cair o talher no chão, ou que a sopa caiu, ou que me sujei ou que não sei que mais, vou-me queixar a quem? O idoso, o velho, precisa de carinho, precisa de ternura e de amor e é aquilo que não há neste mundo. [Entrevista 33, homem, 75-84 anos, não vítima]

A insegurança no espaço público:

Tenho a porta fechada à chave, sempre. Também não abro a qualquer pessoa, nomeadamente a porta da rua, que eu vivo num andar! Na rua, se vejo, por exemplo, uma discussão um bocado mais acesa, afasto-me imediatamente, sou capaz de atravessar a rua para o outro lado. Enfim, tento estar atenta. […] Ter cuidado na rua, não andar com muito dinheiro, ou até se calhar sem dinheiro. Os idosos se precisarem de sair à rua que não vão sozinhos. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

A cultura idadista da sociedade ocidental:

Talvez seja da nossa cultura, não só da portuguesa, como ocidental, acho que as pessoas idosas são um bocado descartadas. [Entrevista 6, homem, 60-64 anos, vítima]

Os velhos hoje são tratados como lixo. São pessoas que não prestam, que não servem para nada. Não têm poder de organização, não têm poder reivindicativo, não são aproveitados. Estão para ali [nos lares] a consumirem comprimidos! [Entrevista 6, homem, 65-74 anos, vítima]

Reações à violência e gestão da situação

No quadro 4 apresentamos as reações dos participantes no inquérito às situações de abuso. A reação verbal ao abuso é a resposta mais comum dos inquiridos ao abuso em geral (56,5%), mas também em todos os tipos de abuso. A percentagem dos que referiram que simplesmente não reagiram à situação de violência é superior (37,3%) àqueles que decidiram denunciar (26,1%). É também nas vítimas de abuso psicológico que se encontram mais inquiridos que não reagiram a este tipo de violência (38,8%). Já as vítimas de abuso financeiro são as que relatam mais o incidente (41,0%). Por seu turno, as vítimas de abuso físico para além da reação verbal (47,1%), emocional e física, pedem mais ajuda e saem de casa, em comparação com as vítimas dos restantes tipos de abusos.

Quadro 4 Reações à situação de violência por tipo de abuso (Harmed - Estudo quantitativo, n = 677) 

A Existe 1 caso que corresponde à resposta: “recusa”.

Tabela com respostas a uma questão de escolha múltipla.

Fonte: Dias e outros (2020).

Complementarmente, a análise das entrevistas permitiu-nos compreender que as reações das vítimas são sempre mediadas por vários fatores, nomeadamente o contexto onde ocorrem os abusos, o tipo de relação entre a vítima e o agressor, a existência ou ausência de suporte social e familiar, a perceção da resposta da polícia, das organizações de apoio às vítimas e da comunidade, o sentimento de insegurança, a trajetória de vitimação, entre outros, a partir dos quais as vítimas atribuem significado às suas experiências e pensam as estratégias de ocultação ou de libertação (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg 2016).

No quadro 5 apresenta-se informação qualitativa sobre as reações das vítimas descritas nas entrevistas, tendo sido possível identificar 11 perfis de reação e, simultaneamente, de gestão da situação de violência pessoal.

Quadro 5 Reações à violência e gestão da situação (Harmed - Estudo qualitativo, n = 45) 

Fonte: Dias e outros (2020)

O quadro 5 mostra que entre as vítimas idosas estão presentes as reações e sentimentos que frequentemente encontramos nas vítimas com menos idade, em geral. A culpa, o medo, vergonha, problemas de saúde mental, ideias suicidárias, desculpabilização do agressor e esperança na mudança do seu comportamento, perdoar e não denunciar são as atitudes desenvolvidas pelas entrevistadas para gerirem as situações de violência. O enfrentamento do agressor nesta fase da vida continua a ser menos comum.

Por último, os inquiridos que pedem ajuda, aconselhamento ou orientação recorrem sobretudo aos profissionais de saúde (28,6%), ao advogado (23,8%), seguidos das autoridades policiais, dos filhos/filhas, amigos, outras pessoas ou familiares, todos com 19,0% (quadro 6).

Quadro 6 A quem a vítima pediu ajuda, aconselhamento/orientação (Harmed - Estudo quantitativo, n = 677) 

Fonte: Dias e outros (2020).

As narrativas presentes nas entrevistas reforçam o papel importante dos profissionais de saúde, da família, vizinhos, polícia, da justiça e das organizações não governamentais na gestão da situação de violência, mas também na sua responsabilização caso a assistência falhe.

Há a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), que ajuda e a Polícia de Segurança que os velhotes podem ligar. […] Chamar o 112 ou então o médico de família. [Entrevista 4, mulher, 60-64 anos, vítima]

Peço ajuda a quem estiver por perto, vizinhos, se for em casa, na rua, se for alguém, na rua há sempre gente: ajude-me, ajude-me, estão-me a fazer mal. [Entrevista 34, mulher, 65-74 anos, vítima]

O advogado é do apoio social e está a trabalhar para mim, para o divórcio. Quero os meus bens, quero os meus direitos. Ele [marido] agora está castigado. O divórcio se demorar um ano ou dois e meio, ele não pode estar junto comigo. Já devia ter feito isto! [Entrevista 37, mulher, 65-74 anos, vítima]

Os médicos estão numa das linhas da frente. […] Para além da assistência médica da profissão, devem reportar imediatamente à Segurança Social, a quem de direito, à própria polícia. A campainha de alarme tem que soar imediatamente. E se mais tarde se vier a constatar que um idoso morreu ou que isto ou que aquilo, deve-se chamar à responsabilidade toda essa cadeia. [Entrevista 3, homem, 65-74 anos, vítima]

Discussão

Com base no estudo quantitativo e qualitativo, os resultados apresentados neste artigo ilustram, simultaneamente, as experiências e as perceções dos participantes sobre os abusos na velhice, o tipo de relação com o agressor e a reação à violência. Ilustram ainda os fatores de risco que estão presentes nas suas narrativas e a forma como gerem a situação de violência. Discute-se a dimensão de género presente na experiência de vitimação dos participantes, mas também no perfil dos perpetradores; o tipo de relação entre vítima e agressor; a natureza dinâmica dos fatores de risco; as reações à violência, os bloqueios à não denúncia e procura de ajuda na idade avançada, mas também, a necessidade de alargamento do conceito, devido à forte presença, no discurso dos entrevistados, dos estranhos como principais agressores, depois dos cônjuges e parceiros íntimos.

A prevalência de todos os tipos de abuso entre as mulheres participantes no estudo Harmed, em particular do abuso psicológico, demonstra a assimetria de poder e de controlo que se mantém na idade avançada (Vinton, 1999; Zink e outros, 2006a; Spangler e Brandl, 2007), e que é reforçada pelo perfil misógino dos agressores quando estes são os cônjuges ou parceiros íntimos (Vinton, 1999). Este resultado está presente noutros estudos que mostram que a violência infligida pelos cônjuges ou por parceiros íntimos é, igualmente, um problema das mulheres mais velhas que, tal como as mulheres mais novas, são vítimas de abusos físicos, psicológicos, sexuais, controlo do comportamento e ameaças (Zink e outros, 2006a; Zink e outros, 2006b; Harris, 1996).

No nosso estudo, também é evidente que os abusos variam em função do tipo de relação entre a vítima e o ofensor, designadamente os cônjuges, os filhos, irmãos e genros surgem como os perpetradores de abuso físico, psicológico e financeiro. As filhas das vítimas, as irmãs e as noras infligem-lhes sobretudo abuso psicológico, físico e financeiro. Os amigos, os vizinhos, conhecidos e colegas infligem abuso sexual e as empregadas domésticas surgem como praticantes de abuso financeiro. Na mesma linha, os estudos, por exemplo, de O’Keeffe e outros (2007), Acierno e outros (2010) e Laumann, Leitsch, e Waite (2008) referem que os perpetradores de abuso físico, psicológico e verbal são sobretudo os cônjuges e outros familiares. Já o abuso financeiro, é praticado, de acordo com Lowenstein (2009), quer por familiares (por exemplo, filhos, netos, irmãos), quer pelos cuidadores informais e formais, os quais praticam igualmente negligência (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2016; Lemos e outros, 2022). A investigação presente na literatura corrobora, de igual modo, o nosso resultado para a ocorrência de abuso sexual que é praticado pelos parceiros íntimos, conhecidos (e.g., amigos, vizinhos e colegas) ou por pessoas completamente desconhecidas das vítimas (Acierno e outros, 2010; Amstadter e outros, 2010).

Estes resultados mostram, por um lado, a importância de se atender ao tipo de relação existente entre vítimas e agressores e às suas características como preditores de abusos (Naughton e outros, 2012). Por outro lado, contribuem, igualmente, para a discussão acerca da necessidade de alargamento do conceito de abusos, uma vez que mesmo os atos de violência cometidos por estranhos, seja em contexto doméstico (e.g., violação, assalto), seja no espaço público (e.g., furto, perseguição, insultos) são percecionados pelos participantes como abuso de idosos (WHO, 2002; Brammer e Biggs, 1998).

No discurso dos entrevistados está muito presente a identificação dos fatores de risco de abuso ligados às características das vítimas (e.g., dependência do agressor, pobreza, dificuldades financeiras, vulnerabilidade, isolamento social), dos agressores (e.g., doença mental, alcoolismo, consumo de substâncias aditivas, dependência da vítima), mas também ligados à sociedade e às normas culturais (e.g., cultura patriarcal e ideologia idadista). Estes fatores estão amplamente identificados na literatura como sendo de natureza mais dinâmica (Storey, 2020; Pillemer e outros, 2016; Johannesen e LoGiudice, 2013), podendo, por isso, ser preditores de risco de violência sobre pessoas idosas e, ao mesmo tempo, ser alvo de intervenção com vista à sua correção (Storey, 2020).

No caso do idadismo, este alimenta a estereotipia social acerca do papel dos mais velhos nas sociedades atuais (Nelson 2005), legitima os abusos e conduz à interiorização da representação social de que eles são um fardo para a família e a sociedade (Nahmiash, 2002). É também um fator dinâmico passível de intervenção a nível familiar e comunitário (Storey, 2020). Todavia, todos os fatores de risco podem ocorrer cumulativamente, o que aumenta a vulnerabilidade dos idosos à violência. Na mesma linha, Walsh e outros (2010) mostram que a acumulação de fatores de opressão (e.g., sexismo, idadismo, classismo) cria desequilíbrios de poder e aumenta a probabilidade de ocorrência de violência sobre as pessoas mais velhas.

As reações das vítimas à violência e as estratégias de gestão da situação de abusos são similares ao já demonstrado noutros estudos. A maioria das vítimas idosas não denuncia os abusos, contudo, existem, diferenças em função do tipo de abuso. São as vítimas de abuso financeiro que denunciam mais, seguidas das vítimas de abuso físico que pedem mais ajuda e saem de casa. Pelo contrário, as vítimas de abuso psicológico são as que reagem menos. Encontramos, tal como no estudo de Mysyuk, Westendorp e Lindenberg (2016), um sentimento de desânimo aprendido (learned helplessness) que, por força da ocorrência continuada de abusos e a ausência de resposta, faz com que as vítimas se sintam impotentes e desempoderadas para mudar a situação de violência em que vivem (Spangler e Brandl, 2007). Tal é agravado pela situação de dependência face ao agressor (Pillemer e outros, 2016), pelas dificuldades económicas das vítimas (Fraga e outros, 2014), mas também pela perceção negativa que elas têm do papel da polícia e de outras entidades de apoio (Podnieks, 2006). Por isso, ora desenvolvem estratégias de acomodação e desculpabilização dos ofensores, ora desenvolvem quadros de doença mental (e.g. depressão) (Sampaio e outros, 2022; Henriques e outros, 2021), mas também sentimentos de culpa, humilhação e vergonha, principalmente quando os agressores são os parceiros íntimos, os familiares, amigos ou vizinhos e estes lhes infligem, por exemplo, abusos sexuais ou físicos (Pillemer e outros, 2016; Acierno e outros, 2010). Este resultado vem reforçar a necessidade de compreender e analisar as reações das vítimas e a forma como elas lidam com as situações de violência, novamente, em função do tipo de relação que têm com os agressores e do tipo de abuso (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2016). O conhecimento destas dinâmicas permite trabalhar, de forma compreensiva e integrada, as dimensões psicológicas, emocionais e subjetivas do abuso. Permite, ainda, organizar redes de apoio médico-social e grupos de suporte para que as vítimas possam partilhar as suas experiências, as estratégias de sobrevivência mobilizadas e recuperarem das “dores da alma” [entrevista 38, mulher, 65-74 anos, vítima].

Limitações, virtualidades e direções futuras da pesquisa

Os resultados apresentados neste artigo resultam de um projeto mais vasto sobre as determinantes socioeconómicas e de saúde do abuso de pessoas mais velhas, o estudo Harmed (Dias e outros, 2022). As amostras, quantitativa e qualitativa, foram selecionadas numa coorte populacional EPIPorto (Ramos, Lopes e Barros, 2004), que acompanha desde 1999, 2485 residentes na cidade do Porto em Portugal, pelo que refletem as características socioeconómicas e culturais desta população. Por esta razão, não é possível a generalização dos resultados à população portuguesa do mesmo grupo etário.

Apesar de terem sido selecionados apenas os participantes cognitivamente competentes (Folstein, Folstein e McHugh, 1975), é de salientar que o abuso é um tópico sensível, complexo e vivido como algo extremamente íntimo, o que torna difícil o seu autorrelato e partilha com os investigadores e outros profissionais. Dado ter sido pedido aos participantes para autorreportarem tais experiências, estima-se quer um certo viés na seleção dos eventos reportados, quer uma subestimação da prevalência das situações de abuso descritas. Ao mesmo tempo, o facto de cerca de metade da amostra ter uma escolaridade alta e de estar mais informada acerca do fenómeno da violência doméstica em geral, permitiu uma maior identificação das diversas manifestações de abuso, sobretudo do psicológico, o que pode estar relacionado com a sua maior prevalência neste estudo, por comparação com os restantes tipos.

Este estudo também tem algumas forças. Desde logo, analisa a violência sobre os mais velhos, os perfis das vítimas e dos ofensores, cruzando métodos quantitativos e qualitativos. Neste último caso, este artigo mostra a importância de escutar as vozes e experiências das pessoas mais velhas, vítimas e não vítimas, sobre a violência podendo, assim, os profissionais dirigir a atenção para a particularidade das variáveis que estão presentes nas situações de violência e que representam um maior risco, a partir das preocupações manifestadas pelos mais velhos.

Apesar das dificuldades acima mencionadas de subestimação e de viés de seleção dos eventos de violência, é inequívoca a força dos resultados das entrevistas em profundidade realizadas por entrevistadores experientes. As pessoas mais velhas falaram das suas experiências, objetivas e subjetives de abuso, com detalhe suficiente, o que levou a investigação a identificar situações de abuso, que nem sempre cabem na definição formal do próprio conceito, mas que eram descritas e sentidas como tal pelos entrevistados, como foi o caso do abuso sexual. Ao mesmo tempo, a utilização do questionário não só permitiu um adequado enquadramento dos dados qualitativos, como os resultados obtidos através dele servem de suporte ao desenho de políticas sociais, num país em que a violência doméstica é um crime público, e que contempla, igualmente, o abuso de idosos.

Estudos futuros devem continuar a promover o uso de metodologias mistas e a triangulação metodológica dos resultados; incluir amostras mais diversificadas do ponto de vista do género, classe social, etnia, religião e dos contextos sociais e institucionais de origem da população; e integrar pessoas mais velhas que estão internadas em estruturas residenciais ou que frequentam centros de dia e não apenas idosos integrados na comunidade. Devem, de igual modo, envolver os profissionais das diversas áreas científicas com vista a conhecermos melhor as suas perceções sobre este problema, mas também os obstáculos a uma intervenção integrada e em que os mais velhos têm que ser escutados a montante e a jusante.

Conclusões

Neste artigo, os resultados do inquérito por questionário e das entrevistas em profundidade realizadas no estudo Harmed (Dias e outros, 2022), dão conta dos principais tipos de abuso que os participantes ora experienciaram, ora percecionam como sendo os mais frequentemente infligidos sobre as pessoas mais velhas, destacando-se aqui a ocorrência do abuso psicológico e a exploração financeira. O artigo mostra ainda que apesar de os participantes apontarem os estranhos e/ou desconhecidos como potenciais agressores, a relação de confiança entre vítima e ofensor é central para eles considerarem os maus-tratos como abuso, o que continua a suportar a definição teórica proposta pela WHO (2022) e que é por nós utilizada. Revela também que o tipo de abuso perpetrado varia consoante o tipo de agressor, destacando-se neste estudo os familiares (e.g., parceiros íntimos, filhos) como principais perpetradores de abuso físico e psicológico e os vizinhos como perpetradores, por exemplo, de abuso sexual. Este resultado reforça a relevância de se ter em conta na análise e na intervenção o grau de confiança entre vítima e ofensor e o risco de ocorrência de determinado tipo de abuso.

Ao mesmo tempo, o artigo dá conta da importância de escutar as narrativas e explicações das pessoas mais velhas acerca do que é abuso, a descrição que fazem das formas que ele assume e os fatores que colocam os mais velhos em maior risco de vitimação. Assim, nos seus discursos são apontados a cultura machista e idadista, a doença mental, os comportamentos aditivos, a mútua dependência entre vítimas e ofensores, a pobreza e as desigualdades sociais, o isolamento social e o sentimento de insegurança como sendo os principais fatores de risco de violência sobre os adultos mais velhos.

Este artigo, reforça assim o argumento de que dar oportunidade aos mais velhos de explicar, segundo as suas perspetivas, o que é abuso, quem são os ofensores e quais são os fatores de risco é crucial, na medida em que permite uma intervenção mais ajustada ao perfil da vítima, dos agressores e aos contextos familiares e socioinstitucionais em que ocorrem (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2016; Brammer e Biggs, 1998; Jackson, 2016), aumentando, deste modo, a eficácia da prevenção (Storey, 2020). Permite, também compreender de que forma as vítimas mais velhas reagem aos abusos e fazem a gestão das situações de violência.

Mais uma vez, o nosso estudo mostra que as reações dos participantes vítimas de abusos dependem do tipo de relação com os agressores. Assim são comuns reações de medo, vergonha, desculpabilização, ideias suicidárias, não denúncia, o que reforça o sentimento de desempoderamento sentido pelas vítimas, sobretudo, do género feminino. No plano da gestão dos abusos os participantes desenvolvem estratégias, simultaneamente, de ajuda informal (e.g., filhos e outros familiares), e de suporte formal, destacando-se aqui, por exemplo, o profissional de saúde e o advogado. Este resultado é importante porque revela que os profissionais de saúde são uma porta de deteção e diagnóstico a que as vítimas mais velhas recorrem e em quem confiam. Destaca-se, de novo, a importância do elo de confiança, agora entre os prestadores de cuidados e as vítimas como condição para os mais velhos reportarem os abusos e procurarem ajuda. O advogado também é apontado como um profissional ao qual os mais velhos recorrem, pelo que as agências de proteção e prevenção devem incrementar o serviço de apoio e aconselhamento jurídico da população mais velha, mas também de sensibilização para o facto de o abuso de idosos ser um crime público, à semelhança do que sucede em Portugal com a violência doméstica, em geral (Lei n.º 112/2009).2

Por fim, o artigo, na linha de estudos anteriores, mostra que uma maior atenção na identificação dos fatores de risco, tal como são descritos pelos mais velhos, e a sua discussão alargada entre os diversos profissionais que intervêm nesta área, poderá aumentar a eficácia da intervenção e diminuir o sofrimento, angústia e a deterioração da saúde das vítimas (Mysyuk, Westendorp e Lindenberg, 2016; Storey, 2020; Pillemer e outros, 2016).

Financiamento

Este trabalho foi apoiado pelo FEDER através do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização e financiamento nacional da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) no âmbito do Instituto de Sociologia da Universidade do Porto (UIDB/00727/2020) e da Unidade EPIUnit - Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, Portugal (UIDB/04750/2020). É também reconhecido à FCT o contrato de Estímulo ao Emprego Científico (CEECIND/01516/2017).

Referências bibliográficas

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2Diário da República n.º 180/2009, série I de 2009-09-16, pp. 6550-6561.

Recebido: 10 de Dezembro de 2023; Aceito: 09 de Fevereiro de 2024

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