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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.15 no.1 Lisboa mar. 2014

https://doi.org/10.15309/14psd150121 

Qualidade de vida e perceção da doença em pessoas dependentes do álcool

Quality of life and illness perception among people with alcohol dependence syndrome

 

Olga Valentim 1, Célia Santos2, & José Pais Ribeiro3

1ACES Lisboa Norte, UCSP de Benfica, Lisboa, Portugal;

2Escola Superior de Enfermagem do Porto, Porto, Portugal;

3Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, Porto, Portugal

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

O alcoolismo é uma doença crónica, como tal, as condições clínicas têm efeitos previsíveis de degradação do bem-estar e da qualidade de vida. O modo como cada pessoa, em particular, perceciona cognitivamente a sua doença, influencia, entre outros aspetos, a procura de ajuda e a sua qualidade de vida. Neste estudo descritivo e correlacional, participaram 444 pessoas com o diagnóstico de Síndrome de Dependência do Alcoólica (SDA) há pelo menos um ano, com uma média de idades de 45 anos, maioritariamente do sexo masculino, casadas e desempregadas. Os instrumentos utilizados foram, o questionário de caracterização sociodemográfica, de informação clínica, o Questionário de Estado de Saúde (SF-36v2) e o Illness Perception Questionnaire-Revised-versão portuguesa (IPQ-R). Este estudo teve como objetivo contribuir para a compreensão da qualidade de vida e perceção da doença entre pessoas com SDA. Os resultados sugerem que nos diferentes domínios da escala de qualidade de vida, o maior comprometimento ocorreu na saúde mental (M=50,45; DP=23,40) e na vitalidade (M=50,06; DP=22,53). Os participantes com uma identidade moderada da doença mostraram consequências muito negativas para a sua qualidade de vida. Também os que conhecem e compreendem melhor a sintomatologia da doença (identidade), que a compreendem melhor e que têm uma representação emocional mais negativa, apresentaram uma perceção pior da sua qualidade de vida. Verifica-se que em média, as pessoas que frequentam grupos de autoajuda, registam valores mais elevados de qualidade de vida e têm uma representação emocional menos negativa, considerando a doença mais crónica e acreditando mais no seu controlo pessoal.

Palavras-chave- qualidade de vida; perceção da doença; alcoolismo

 

ABSTRACT

Alcoholism is a chronic disease. As such, the clinical conditions have predictable effects of degradation of well-being and quality of life. The way that each person cognitively perceives their disease in particular influences their search for help and their quality of life. This descriptive and correlational study was performed the participation of 444 people who have been diagnosed with Alcohol Dependence Syndrome (ADS) for at least one year, with an average age of 45, mostly male, married and unemployed. The instruments used were the questionnaire of socio-demographic characterization, clinical information, the Health Status Questionnaire (SF-36v2) and the Illness Perception Questionnaire-Revised-Portuguese version (IPQ-R). This study aimed to contribute to the understanding of quality of life and the perception of illness among people with SDA, associating these variables. The results suggest that, in the different areas of the quality of life scale, the greater involvement occurred in mental health (M= 50.45; SD= 23.40) and in vitality (M= 50.06; SD= 22.53). Participants with moderate identity of the disease showed very negative consequences for their quality of life. Those who better know and understand the symptoms of the disease (identity), who understand it better and have a more negative emotional representation and a worse perception of their quality of life. We see that, on average, people who attend self-help groups record higher values of quality of life and have a less negative emotional representation, consider the disease to be more of a chronic nature, and believe more in their personal control.

Keywords- quality of life; perception of illness; alcoholism

 

Entre os determinantes da saúde relacionados com estilos de vida destaca-se o consumo de bebidas alcoólicas. O álcool é a droga mais consumida em todo o mundo. Segundo a World Health Organization [WHO] (2004), sensivelmente dois bilhões de pessoas consomem bebidas alcoólicas. O abuso desta droga é um dos principais fatores que contribui para a diminuição da saúde mundial, sendo responsável por 3,2% de todas as mortes e por 4% de todos os anos perdidos de vida útil.

A União Europeia é a região do mundo que regista maior índice de consumidores de álcool e os maiores níveis de consumo per capita. Em média, cada europeu bebe 12,4 litros de álcool por ano, o equivalente a três bebidas alcoólicas por dia (Anderson, Møller, & Galea, 2012). Ainda, segundo o relatório “Álcool na União Europeia” da Organização Mundial de Saúde, Portugal é um dos países da Europa onde se bebe mais álcool, ocupando o nono lugar entre 34 países da Europa, consumindo os portugueses uma média anual 13,4 litros de álcool. Relativamente à taxa de abstémios, Portugal aparece com uma percentagem de 18,6% dos homens e 32% das mulheres, quando a média europeia se fica pelos 5,6% e 13,5%, respetivamente (Anderson et al., 2012). Estes dados, leva-nos a pensar que os portugueses que consomem bebidas alcoólicas, o fazem em grande quantidade.

O alcoolismo ou Síndrome de Dependência Alcoólica (SDA) é uma doença crónica, cuja influência multifatorial prejudica diversas áreas da vida pessoal e familiar, além de representar um alto custo social. Muitos recursos de saúde têm sido utilizados e mobilizados no tratamento do alcoolismo. Não só a dependência do álcool, mas também o seu uso problemático provocam inúmeros malefícios para a saúde, salientando a relevância de um tratamento precoce (Reid, Fiellin, & O' Connor, 1999).

A Qualidade de Vida (QV) tem sido um tema de especial interesse na área da saúde, porém ainda pouco aprofundado entre as pessoas com SDA. De acordo com a definição da Organização Mundial da Saúde [OMS] (1996), a QVé a perceção do individuo acerca da sua posição na vida, num contexto cultural, de valores e objetivos, expectativas, padrões e preocupações. A QV envolve o seu estado físico e mental, assim como, os relacionamentos sociais e outros aspetos da vida como a saúde, a educação e o poder de compra. A perceção da doença afeta a sua QV, interferindo nas condições de saúde entre outras situações da vida (Brito & Araujo, 2002). Nahas (2010) entende a QV como a perceção de bem-estar resultante de um conjunto de parâmetros individuais e socio-ambientais que caracterizam as condições em que vive o ser humano. Portanto, a perceção da doença influencia inevitavelmente aspetos da saúde e da vida pessoal, assim como a QV.

A perceção da doença é definida pelas experiências individuais e coletivas, nos diferentes aspetos relacionados com a saúde e a doença (Reis & Fradique, 2002). Esta perceção da doença abrange a informação sobre a doença, bem como, os seus sintomas, possíveis causas, duração, evolução e consequências. É unanime que a QV está diretamente relacionada com a perceção da doença e em particular, na própria perceção da dependência alcoólica. A SDA é cada vez mais considerada como um problema de saúde pública, que poderá interferir nas várias dimensões da QV do indivíduo, (familiar, social, profissional, entre outras). Os valores, as crenças, as atitudes, influenciam a perceção de cada pessoa acerca de toda a situação, o que poderá interferir diretamente na forma como esta vê, reflete, julga e assimila toda a informação, podendo, assim, por vezes, dificultar o tratamento e consequentemente a QV.

A necessidade de compreender as limitações e o sofrimento das pessoas dependentes de álcool constitui, por si só, uma forte motivação para a avaliação da sua QV. Com este objetivo, foi desenvolvido um estudo no sentido de procurar conhecer a QV e a perceção da doença entre as pessoas com dependência alcoólica considerando, nomeadamente, algumas características sociodemográficas, a frequência de grupos de autoajuda e as várias dimensões da perceção cognitiva e emocional da doença.

 

MÉTODO

Participantes

Foram inquiridas 444 pessoas com o diagnóstico de dependência alcoólica, tratando-se de uma amostra não probabilística, de conveniência e sequencial. A amostra foi selecionada em serviços e/ou consulta de alcoologia em diferentes sub-regiões do País (Norte, Centro, e Lisboa e Vale do Tejo) e grupos de autoajuda. Foram estabelecidos critérios para a participação neste estudo: idade igual ou superior a 18 anos; diagnóstico clínico de dependência alcoólica há pelo menos um ano; saber ler e escrever e ausência de alterações neurológicas ou cognitivas impeditivas do preenchimento do questionário. Esta participação foi voluntária, tendo sido assegurada a confidencialidade dos dados obtidos.

Material

Questionário de caracterização sociodemográfica, com informação sobre a idade, sexo, anos de escolaridade, situação profissional e conjugal. Questionário de dados clínicos, com informação sobre a idade em que começou a beber, tempo/duração da dependência alcoólica, número de internamentos e de recaídas, assim como, frequência de grupos de autoajuda e, se está ou esteve em tratamento.

O Questionário de Estado de Saúde SF-36v2, é um dos instrumentos de avaliação da QV/estado de saúde mais utilizado internacionalmente, que foi validado para a população portuguesa por Ferreira (2000a, 2000b). É um questionário de autoadministração, com um tempo médio de preenchimento entre cinco a dez minutos. É constituído por 36 itens que avaliam a QV em oito dimensões do estado de saúde: função física (10 itens), desempenho físico (4 itens), dor corporal (2 itens), saúdeem geral (5 itens), vitalidade (4 itens), função social (2 itens), desempenho emocional (3 itens) e saúde mental (5 itens). Os resultados das subescalas e componentes variam entre 0 e 100, sendo que os resultados mais elevados representam um melhor estado de saúde percebida, ou seja, uma melhor QV nas dimensões avaliadas. Nos estudos de validação do instrumento para a população portuguesa, a consistência interna das subescalas situou-se entre a= 0,60 e a= 0,87, sendo que no presente estudo esses valores se situaram entre a = 0,44 e a = 0,90.

lllness Perception Questionnaire Revised (IPQ-R), desenvolvido por Moss-Morris, et al. (2002) e na versão Portuguesa adaptado e aferido por Figueiras, Machado e Alves, (2002), num estudo realizado junto de 31 casais portugueses, em que um dos cônjuges sofria de cefaleias crónicas. O IPQ-R é constituído por nove subescalas, apresentadas em três secções distintas. Na primeira secção surge a subescala identidade da doença, avaliada numa escala dicotómica, em que quanto mais elevado for o número de respostas positivas, maior é a perceção relativamente à identidade da doença. A segunda secção inclui 38 itens distribuídos em sete subescalas, duração (aguda/crónica) (quanto maior o valor, mais crónica é a perceção da doença), consequências (quanto maior o valor, mais grave é a perceção da doença), controlo pessoal (quanto maior o valor, maior é a perceção de controlo da doença por parte do doente), controlo de tratamento (quanto maior o valor, maior é a perceção de controlo do tratamento sobre a doença), coerência da doença (quanto maior o valor, menor é a compreensão da doença pelo doente), duração cíclica (quanto maior o valor, mais periódica é a perceção da doença) e representação emocional (quanto maior o valor, mais negativa é a representação emocional da doença), cotados numa escala tipo Likert de 5 pontos: 1 (discordo completamente), 2 (discordo), 3 (não concordo nem discordo), 4 (concordo) e 5 (concordo completamente). A última secção avalia as Causasda doença. Esta subescala é constituída por 18 itens e é utilizada a mesma escala do tipo Likert. No estudo de validação do instrumento na população portuguesa a consistência interna das subescalas situou-se entre a=0,55 e a=0,83 (Figueiras, Machado, & Alves, 2002), sendo que no presente estudo esses valores se situaram entre a = 0,56 e a = 0,88.

Procedimento

Depois de obtida a autorização, por parte das Unidades de Alcoologia, grupos de autoajuda (Alcoólicos Anónimos), dos autores das respetivas escalas, e do consentimento informado dos participantes neste estudo, foram administrados os questionários. Em alguns casos, os inquiridos pediram ajuda para ler as questões e as possíveis opções de resposta. Respeitámos as normas éticas constantes da declaração de Helsínquia. Desenvolvemos um estudo transversal, com uma metodologia quantitativa, descritiva e correlacional, cujos dados foram recolhidos entre outubro de 2008 e janeiro de 2010. Estes dados foram analisados recorrendo ao programa informático Statistical Program for Social Sciences (SPSS), versão 20.0. Utilizámos a análise exploratória e descritiva dos dados. Para a comparação de dois grupos independentes, recorreu-se ao teste de Mann-Whitney ou ao teste de Kruskal-Wallis (sempre que pelo menos um grupo não apresentava distribuição normal) e ao teste t (sempre que nos dois grupos a variável em estudo apresentava distribuição normal) (Marôco, 2011). A normalidade da distribuição foi avaliada através, dos testes de ajustamento de Kolmogorov-Smirnov (amostras de dimensão superior a 30) ou o teste de Shapiro-Wilk (amostras de dimensão inferior ou igual a 30) (Marôco, 2011). No teste de Kruskal-Wallis, sempre que foram detetadas diferenças estatisticamente significativas, recorreu-se ao teste de comparações múltiplas. Para o estudo da forma e intensidade da relação entre duas variáveis (ambas métricas), recorreu-se ao coeficiente de correlação de Pearson. Os resultados são considerados significativos para um nível de significância de p=0,05.

 

RESULTADOS

A amostra foi constituída por 81,5% (n=362) de homens e 17,1% (n=76) mulheres. Era maioritariamente constituída por indivíduos casados ou que viviam em união de facto (n=188; 42,3%). Existia ainda, um número significativo de solteiros (n=124; 27,9%), e de divorciados (n=115; 25,9%). Entre as pessoas com SDA, 41,9% (n=186) estavam desempregadas, 39,4% (n=175) eram trabalhadoras, 13,3% (n=59) reformadas, 4,1% (n=18) referiram outra situação e, finalmente 0,7% (n=3) eram estudantes.

A média de idades era de 45,35 anos (DP=9,29), oscilando entre os 21 e os 69 anos. A escolaridade (em anos completos) situava-se entre um mínimo de zero anos e um máximo de 19 anos, cuja média é de 7,60 anos (DP= 3,67). Em média, a idade em que as pessoas com SDA começaram a beber, ronda os 17,86 anos (DP=8,11; ampl. 4-55), estando diagnosticadas com SDA em média 7,73 anos (DP=7,17), variando entre 1 e 38 anos. O número de internamentos varia entre nenhum a 21 internamentos, com uma média de 2,01 internamentos (DP= 2,46). A maioria dos inquiridos (57,9%, n=257) já teve recaídas, cuja média ronda as duas recaídas (DP=0,46 e ampl. 1-2). Os resultados foram obtidos maioritariamente em unidades de alcoologia, e conforme esperávamos, a maioria das pessoas com SDA (77,5%) responderam estar em tratamento e abstinentes (88,3%), com uma média de abstinência de cerca de dois anos, variando entre 0 e 43 anos (DP = 5,96). Para sabermos se a pessoa com SDA frequentava algum grupo de autoajuda, colocámos a questão: “Frequenta algum grupo de autoajuda?”. Entre as 444 pessoas com SDA, a maioria (62,8%; n=279) referiu que não frequentava qualquer grupo de autoajuda, os participantes que responderam afirmativamente faziam-no desde uma semana (0,02 anos) a 22 anos, apresentando uma média de 2,25 anos (DP= 4,24).

Da análise do quadro 1, pode dizer-se que, em média, os indivíduos da amostra, apresentavam valores razoáveis de QV para as várias subescalas. A subescala em que apresentam valores mais elevados é o desempenho emocional, o que indica que não apresentam problemas emocionais graves que limitem as suas atividades diárias ou o seu trabalho, como seria de esperar, pois a maioria dos participantes encontram-se desempregados (41,9%). Deve referir-se que nesta subescala, foram sujeitos a avaliação somente 67 indivíduos dos 444, pois os restantes não responderam, a pelo menos, metade dos itens.

 

 

Relativamente à perceção da doença, verificámos que as pessoas com SDA que constituíram a amostra apresentavam uma identidade moderada da doença e conhecem alguma sintomatologia específica, conseguindo identificar entre oito a nove sintomas. Em relação à durabilidade da doença explicam-na como crónica e descrevem até alguma periodicidade, isto é, intercalando fases em que se encontram melhores, embora com algumas recaídas.

Ainda no quadro 1 concluímos que há uma perceção negativa sobre as consequências da SDA. Percecionam um certo controlo pessoal sobre a doença, com a consciência de que os seus comportamentos podem determinar a evolução da mesma e que têm capacidade para melhorar. Também acreditam na eficácia do tratamento para controlar a doença e compreendem-na parcialmente (coerência). Manifestam ainda uma representação emocional negativa sentindo-se deprimidos, ansiosos, preocupados, zangados e com medo.

Em relação às atribuições causais, podemos afirmar que, os inquiridos concordam menos com os fatores de risco genérico (destino ou má sorte, tipo de alimentação, fumar, entre outros), sendo maior a concordância em relação aos aspetos pessoais (o seu comportamento e personalidade) e psicológicos (stresse ou preocupação, o seu estado emocional, problemas familiares e a sua atitude mental). Atribuem assim a causalidade da SDA, a fatores intrínsecos como sejam, os fatores psicológicos e pessoais, difíceis de controlar.

Na comparação da perceção da QV (subescalas do SF-36), entre sexos, detetaram-se diferenças estatisticamente significativas relativamente à função social (U=7899,50, p=0,011) e à saúde mental (U=8634,50, p=0,01), verificando-se que os homens percecionaram maior quantidade e melhor qualidade de atividades sociais com uma Mediana (Md) de 55,00, assim como, melhor saúde mental (Md=50,00), ou seja, eles sentem-se mais felizes, mais calmos e realizam mais atividades sociais sem problemas físicos ou emocionais, relativamente às mulheres (mediana de 50,00 para a função social e mediana de 45,00 para a saúde mental).

Outro fator cuja literatura indica com potencial para influenciar a QV, é a situação conjugal. Para estudar esta influência, comparou-se as subescalas do SF-36 entre as categorias da situação conjugal, detetando-se diferenças estatisticamente significativas relativamente às subescalas desempenho físico (x2kw(3)=7,86; p=0,04), função social (x2kw(3)=8,44; p=0,03), desempenho emocional (x2kw(3)=9,94; p=0,01) e saúde mental (x2kw(3)=23,91; p<0,0001). Quanto à subescala desempenho físico, após as comparações múltiplas, foram detetadas diferenças significativas entre o grupo de participantes viúvos e os divorciados (p=0,03) e entre os viúvos e os casados (p=0,01), apresentando os viúvos valores mais baixos (Md=28,16), do que os divorciados (Md=50,00) e os casados (Md=56,25). Relativamente à subescala função social, os casados diferem dos solteiros (p=0,01), apresentando os primeiros, valores mais elevados (Md=62,50 e Md=50,00 respetivamente). Na subescala desempenho emocional, foram detetadas diferenças entre os indivíduos casados e os viúvos (p=0,03) e casados e solteiros (p=0,03), apresentando os casados valores mais elevados (Md=91,67) do que os solteiros (Md=66,67) e os divorciados (Md=58,33). Finalmente, na subescala saúde mental, foram detetadas diferenças entre casados e divorciados (p<0,0001) e casados e solteiros (p=0,001), apresentando os casados valores mais elevados (Md=60,00), do que os solteiros (Md=45,50) e os divorciados (Md=45,00). Daqui se conclui que a situação conjugal, tem influência nos vários aspetos da QV da pessoa com SDA. A situação conjugal que se destaca entre as subescalas da QV, onde se verificaram diferenças estatisticamente significativas, foi a dos casados. Os casados apresentaram valores mais elevados de QV relativamente às outras categorias em que houve comparações múltiplas.

Observou-se ainda que a situação profissional influenciou efetivamente vários aspetos da QV da pessoa com SDA. Pois, observaram-se diferenças estatisticamente significativas nas subescalas desempenho físico(x2kw(4)=11,72, p=0,02), dor corporal (x2kw(4)=17,15, p=0,002), vitalidade (x2kw(4)=11,22, p=0,02) e saúde mental (x2kw(4)=9,98, p=0,04). Quanto à subescala desempenho físico, após comparações múltiplas, foram detetadas diferenças estatisticamente significativas entre os participantes trabalhadores e os desempregados (p=0,01) e entre os trabalhadores e os estudantes (p=0,02), apresentando os trabalhadores valores mais elevados (Md=62,50), do que os desempregados (Md=50,00) e estudantes (Md=0,00). Relativamente à dor corporal, os estudantes diferem dos trabalhadores (p=0,008), dos desempregados (p=0,01), dos reformados (p=0,01) e de outras profissões (p=0,01), apresentando os estudantes valores mais baixos. Relativamente a ter outra profissão difere dos trabalhadores (p=0,008) e dos reformados (p=0,01), sendo que os participantes com outra profissão registaram valores mais baixos de dor corporal (Md=50,00), isto é, dor mais intensa. Observámos então que os trabalhadores e os reformados apresentam melhores resultados (ambos com medianas de 62,00), ou seja, apresentam dor menos intensa e limitativa, em relação aos desempregados (Md=52,00), aos indivíduos com outra profissão (Md=41,00) e aos estudantes (Md=22,00). Na subescala vitalidade, detetaram-se diferenças entre os trabalhadores e os desempregados (p=0,02), bem como, entre os trabalhadores e os estudantes (p=0,02), apresentando os trabalhadores valores mais elevados (Md=50,50) do que os desempregados (Md=50,00) e os estudantes (Md=18,75). Existem ainda diferenças entre estudantes e reformados (p=0,04), apresentando os reformados valores mais elevados (Md=50,00). Finalmente, quanto à subescala saúde mental foram detetadas diferenças entre os estudantes e os reformados (p=0,04), os trabalhadores e os desempregados (p=0,04) e entre os desempregados e os reformados (p=0,01), apresentando os reformados valores mais elevados (Md=55,00), do que os trabalhadores (Md=50,00), os desempregados (Md=45,00) e os estudantes (Md=30,00).

Estudou-se a QV e a perceção da doença das pessoas com SDA em relação à frequência ou não de grupos de autoajuda.

Da análise do quadro 2, verificámos diferenças estatisticamente significativas entre quem frequenta e quem não frequenta grupos de autoajuda, relativamente à QV nas subescalas: desempenho físico(p=0,002), saúde geral (p=0,01), vitalidade (p=0,01), função social (p=0,006) e saúde mental (p<0,0001), e no IPQ-R nas subescalas duração aguda/crónica (p=0,003), controlo pessoal (p=0,02) e representação emocional (p=0,03).

 

 

Estes resultados indicam que a frequência dos grupos de autoajuda parece proporcionar um melhor desempenho físico, melhor saúde geral, mais vitalidade e melhor função social. Neste sentido, podemos pensar que as pessoas que frequentam os grupos de auto ajuda, não têm problemas na realização do trabalho ou de outras atividades em consequência da saúde física, avaliam a sua saúde como boa, sentem-se mais animadas e com energia, assim como, realizam as atividades sociais normais sem interferências de problemas físicos ou emocionais. Ainda, a frequência de grupos de autoajuda parece proporcionar uma maior consciencialização do carácter crónico da doença um maior controlo pessoal e simultaneamente uma representação emocional menos negativa.

Com o objetivo de conhecer as relações existentes e a força de correlação entre a QV e a representação cognitiva e emocional da doença, calculámos a correlação de Pearson, obtendo a matriz que se apresenta no quadro 3. Podemos observar que existem correlações fracas e outras moderadas entre as várias subescalas. Tendo em conta as correlações moderadas, verificamos que as pessoas com SDA que conhecem melhor a sintomatologia da doença (identidade) apresentam mais limitações devido à dor corporal (r=-0,25, p<0,0001), e pior saúde mental (r=-0,25, p<0,0001). Quanto à coerência da doença, os inquiridos que melhor compreendem a sua doença, têm uma perceção mais negativa da sua QV: saúde em geral (r=-0,28, p<0,0001), desempenho emocional (r=-0,35, p=0,005) e saúde mental (r=-0,27, p<0,0001). As pessoas com SDA que acreditam que a sua doença por vezes melhora e outras piora (duração cíclica) têm menos saúde mental (r=-0,25, p<0,0001). Uma representação emocional mais negativa está relacionada com piores valores de saúde geral (r=-0,39, p<0,0001), vitalidade (r=-0,26, p<0,0001), função social (r=-0,27, p<0,0001), desempenho emocional (r=-0,30, p=0,01) e saúde mental (r=-0,44, p<0,0001).

 

 

Podemos ainda concluir que os fatores etiológicos que mais se relacionam com as dimensões da perceção da Qualidade de Vida são os fatores de risco genéricos e os aspetos psicológicos (quadro 3).

 

DISCUSSÃO

Em termos sociodemográficos estamos perante uma amostra, predominantemente masculina, com uma média de idades próxima dos 45 anos e com baixo nível de escolaridade. Grande parte das pessoas com SDA são casadas ou vivem em união de facto, e já não se encontram profissionalmente ativas. Em termos clínicos, o diagnóstico foi realizado, em média, há cerca de oito anos, e com início do consumo de bebidas alcoólicas cerca de 18 anos. Segundo Balsa (2008) a maioria dos indivíduos tem o seu primeiro contacto com o álcool na adolescência, entre os 15 e os 17 anos. Apesar das consequências esperadas ou expectáveis associadas à doença alcoólica, os participantes tiveram uma razoável perceção da sua QV. As pessoas, aquando uma situação de doença crónica, desenvolvem estratégias que lhes dêem alguma estabilidade física e emocional. Estas estratégias podem ser de coping de aproximação, (procura do apoio de terceiros, apoio social entre outros) ou, por outro lado, de coping de evitamento ou negação (Ogden, 1999).

No atual estudo a perceção das pessoas com SDA poderá ter sido influenciada pela negação da doença ou até mesmo pela existência de problemas relacionados com a SDA, como alterações do funcionamento cognitivo. Com o decorrer dos anos, o consumo abusivo de álcool tem consequências graves para a saúde. Mesmo antes de ser diagnosticada, esta doença pode ter já causado inúmeros malefícios na maior parte dos órgãos vitais, sendo o cérebro o órgão mais vulnerável, podem ocorrer alterações do funcionamento cognitivo, inclusivamente perda da memória (Ferreira-Borges & Filho, 2004; Kirité-Tobor & Bénard, 2007). Ao contrário do que se esperaria, os inquiridos relativamente à QV não mencionam problemas emocionais graves, que limitassem as atividades diárias ou o desempenho profissional (desempenho emocional), embora na perceção da doença apresentassem uma representação emocional negativa, sentindo-se deprimidos, ansiosos, preocupados, zangados e com medo (representação emocional), no entanto esse estado emocional não influencia o seu trabalho ou atividades diárias.

Alguns estudos concluíram que de uma forma geral, os indivíduos do sexo masculino, apresentam valores médios de QV mais elevados do que os do sexo feminino (Ferreira & Santana, 2003; Pais-Ribeiro, 2005; Santana, 1995). Também no presente estudo, os homens com SDA apresentam uma melhor perceção da QV, do que as mulheres, quer em relação à saúde mental como à função social.

O estado civil é referido noutros estudos como um fator que influência o estado de saúde. No estudo desenvolvido por Ferreira e Santana (2003), as pessoas solteiras apresentaram valores de QV mais elevados (mais saudáveis) do que os casados relativamente às dimensões físicas avaliadas, o que não se verificou no nosso estudo, em que os casados, mostraram uma melhor QV. No que diz respeito à dimensão desempenho emocional, as pessoas casadas quando comparadas com as viúvas e com as solteiras, apresentaram menos problemas emocionais que limitassem a realização do seu trabalho. Quanto à dimensão saúde mental, as casadas sentiam-se mais tranquilas e felizes do que as solteiras e divorciadas. O casamento está correlacionado com uma melhor auto perceção de saúde. De acordo com Alves (2004), existe um conjunto de mecanismos causais, constituídos por fatores ambientais, sociais e psicológicos que tornam o estado civil casado mais saudável, também o casamento seleciona indivíduos mais saudáveis tanto física como psicologicamente.

Segundo alguns estudos de Amorim (2007), Anes e Ferreira (2009), as pessoas ativas apresentam melhores médias de QV, quando comparadas com as não ativas. No nosso estudo, e por referência à subescala desempenho físico, os trabalhadores tinham uma melhor QV, com menos limitações físicas, comparados com as outras situações laborais (desempregados e estudantes), e apresentavam ainda mais vitalidade (mais energia) menos limitações devido à dor e percecionavam melhor saúde mental do que os reformados, desempregados e estudantes. O desemprego pode estar relacionado com as limitações de saúde, contudo, não podemos esquecer que as dificuldades e os problemas financeiros decorrentes do desemprego e do próprio alcoolismo, vai naturalmente prejudicar o bem-estar.

O conceito de qualidade de vida está relacionado com o da saúde, este é “visto como um contínuo da crescente complexidade das consequências no doente de fatores biológicos/fisiológicos, sintomas, funções, perceção da saúde em geral e bem-estar geral ou qualidade de vida” (Alves, 2004, p.57).

A QV engloba as representações da doença, os preconceitos, as crenças, convicções pessoais, as emoções, os sintomas e os tratamentos (Pais-Ribeiro, 2002; 2009). O modo como o indivíduo perceciona cognitivamente a sua doença influencia o seu comportamento perante a mesma, logo, a forma como o indivíduo percebe a sua doença pode influenciar os mecanismos individuais para satisfazer as suas necessidades e a procura de ajuda para a sua recuperação, a adesão ao tratamento e, consequentemente, a eficácia da intervenção e qualidade de vida.

As pessoas com SDA apresentaram uma moderada identidade da doença, com alguns sintomas a ela associados. A perceção da doença poderá estar estreitamente relacionada com o aparecimento de sintomatologia (Bishop, 1991). Na realidade, os sintomas da SDA manifestam-se muitas vezes de forma silenciosa, podendo a pessoa por vezes, não se aperceber de que está doente, e não reconhecer que tem um problema de saúde. O consumo de bebidas alcoólicas é percebido pela maioria das pessoas com SDA, como um comportamento normal e inofensivo e com consequências, apenas, a longo prazo. As pessoas com SDA, por vezes, minimizam a importância da sua dependência, recusam a sua própria vulnerabilidade à doença ou, evocam exemplos de pessoas conhecidas que adoeceram sem nunca terem bebido (representações desajustadas acerca do problema). Portanto, o deixar de consumir bebidas alcoólicas continua a ser um algo complicado de ser concretizado, além de representar o passo primordial para as pessoas com SDA viverem mais tempo e melhorarem a sua qualidade de vida. Além disso, diferentes fatores podem alterar a perceção dos sintomas, como a negação do problema ou a presença de outras doenças associadas (Ferreira-Borges, & Filho, 2004; Kiritzé-Topor, & Bénard, 2007). A negação funciona como um mecanismo de defesa que atua a nível do inconsciente e segundo Ferreira-Borges e Filho (2004) é característico das pessoas adictas. Também uma perceção errónea da identidade da doença pode estar relacionada, por um dado por a pessoa com SDA acreditar que o problema (que o fez procurar ajuda) não tem a ver com a substância consumida, e por outro poderá ter um conhecimento deficiente sobre a própria patologia. Estas situações, poderão contribuir para uma perceção irreal da identidade da doença.

Os resultados deste estudo permitem-nos ainda concluir que a dependência alcoólica é encarada como uma doença crónica (duração aguda/crónica), intercalando fases em que a pessoa se sente melhor ou pior com algumas recaídas (duração cíclica). Esta constatação é um passo importante no percurso da adaptação a uma doença crónica (Bennett, 2002; Figueiras, 1999; Figueiras & Alves, 2007).

Os participantes mostraram ainda, uma perceção negativa sobre as consequências da dependência alcoólica, considerando-a uma doença grave que afeta seriamente a sua própria vida e a vida dos que lhe são próximos (consequências). Os efeitos do alcoolismo atingem não apenas a saúde da pessoa com SDA, mas igualmente a comunidade em que vive e, especialmente a família (Adès & Lejoyeux, 2004; Ferreira-Borges, & Filho, 2004; Griffith, Marshall, & Cook, 2005). Embora a dependência alcoólica, seja uma doença crónica e progressiva, com várias recaídas e internamentos, os inquiridos percecionam um certo controlo pessoal e de tratamento sobre a doença, pelo que poderão eles próprios (controlo pessoal) ou os técnicos de saúde (controlo de tratamento) fazer algo para a melhorar. Os participantes compreendem parcialmente a SDA e as suas implicações (coerência da doença) e manifestam uma representação emocional negativa. Um estímulo físico e as mensagens sobre ameaças ao estado de saúde, são processados como representações de perigo e, simultaneamente, como um estado emocional (medo) (Leventhal, 1997; Leventhal, Diefenbach, & Leventhal, 1992). Em relação às atribuições causais, podemos dizer que existe uma elevada crença nos aspetos psicológicos (como stresse ou preocupação, estado emocional, problemas familiares e atitude mental) como causas possíveis da dependência alcoólica. Estes dados vão ao encontro de vários estudos em que fazem referência aos aspetos psicológicos como causa da doença crónica (Figueiras, Machado, & Alves, 2002; Pétrie & Weinman, 1997).

Na generalidade, as pessoas com SDA, que frequentam grupos de autoajuda, apresentam uma melhor QV, nomeadamente no desempenho físico, saúde geral, vitalidade, função social (realizam as suas funções sociais sem dificuldades) e saúde mental, sentindo-se mais felizes e tranquilas. Relativamente à perceção da doença mostram uma representação emocional menos negativa, considerando a SDA uma doença de cariz mais crónico e com maior controlo pessoal. Os grupos de autoajuda reúnem pessoas que vivem uma dificuldade comum. Nas reuniões que desenvolvem, as pessoas descobrem um clima de confiança e apoio, facilitando também a troca de experiências. Alguns estudos mostram que estes grupos são eficazes na ajuda que proporcionam aos seus membros, obtendo maiores níveis de bem-estar e de recuperação (Alcoólicos Anónimos, 2004; Bieling, McCabe, & Antony, 2008; Kyrouz, Humphrey, & Loomis, 2002).

As pessoas com SDA que conhecem melhor a sintomatologia da doença (identidade), apresentam uma pior perceção da sua QV, principalmente em relação, às subescalas desempenho físico, dor corporal, saúde geral, vitalidade, função social e saúde mental. A perceção da doença influencia a QV, interferindo nas questões de saúde e noutros aspetos da vida pessoal. Geralmente, quando são reconhecidos os sintomas da SDA e a necessidade de realizar um tratamento, já passou muito tempo, inclusive com várias perdas pessoais, familiares e sociais, baixando de forma considerável a QV. De notar que a maioria da nossa amostra encontra-se em fase de tratamento.

Os inquiridos que melhor compreendem a sua doença (coerência), têm uma perceção mais negativa da QV em todas as suas dimensões. Quanto mais negativa é a representação emocional piores são os valores de desempenho físico, dor corporal, saúde geral, vitalidade, função social, desempenho emocional e saúde mental. Porém, as pessoas que mostraram uma melhor identidade da doença, percecionando-a como crónica, com consequências negativas, acreditando no controlo pessoal e na eficácia do tratamento (controlo de tratamento), e com pouca compreensão sobre a SDA, percecionaram uma melhor função física (realizam todas as atividades físicas com poucas limitações).

A SDA origina diversos problemas de saúde que comprometem a qualidade/quantidade do trabalho realizado, e vulgarmente limita as atividades do dia-a-dia e do autocuidado. São frequentes as complicações físicas associadas ao consumo de álcool, salientando-se os efeitos patológicos ao nível gastrointestinal em especial ao nível hepático (hepatites tóxicas e cirrose hepática) (Ferreira-Borges, & Filho, 2004). Esta noção de melhor função física percecionada pelos inquiridos, parece-nos estar relacionada com a pouca compreensão da doença, ou ainda, com a própria negação. Verificámos que os fatores etiológicos que mais se relacionam com as dimensões da perceção da QV são os fatores de risco genéricos e os aspetos psicológicos. Estamos perante fatores causais que poderão ser indicadores de um maior ou menor sucesso adaptativo individual face à doença. Contudo, uma situação de insucesso ou insatisfação na QV, pode conduzir ao consumo de bebidas alcoólicas com o objetivo de diminuir o sofrimento. Esta situação pode gerar alguma confusão sobre as causas reais da doença.

A dificuldade de perceção dos sintomas e elaboração de uma identidade para a SDA, influência a procura de ajuda especializada, indispensável para a eficácia do tratamento e recuperação da doença. Vários estudos têm demonstrado que a perceção subjetiva do estado de saúde contribui para a variabilidade das respostas e resultados em saúde, quer a nível físico, quer a nível emocional (Benyamini, Gozlan, & Kokia, 2004; Griva, Jayasena, Davenport, Harrison, & Newman, 2009; Winter, Bouma, Van Dijk, Groenink, Nieuwkerk, & Van der Plas, 2008) e neste caso na QV.

A intervenção terapêutica implica princípios estratégicos, tanto em relação à dependência, como à abstinência do álcool. Muitos indivíduos podem necessitar de vários tipos de intervenção ao longo de um continuum de cuidados. Face a esta complexidade, a resposta ao tratamento deve ser intercalada por intervenções diversas, entre as quais se destacam: as terapias de grupo, grupos de autoajuda, e as intervenções psicofarmacológicas (Ferreira-Borges & Filho, 2004; Griffith et al., 2005). Com esse intuito, destaca-se a vantagem da articulação intersectorial com vários recursos, entre eles, os grupos de autoajuda. Estes grupos de autoajuda são considerados importantes fontes de apoio, pois reúnem pessoas com os mesmos objetivos, dificuldades, necessidades e podem contribuir com o apoio necessário às pessoas com SDA e aos seus familiares.

A dimensão QV tem sido alvo de diversos estudos no âmbito do sistema de cuidados de saúde, apesar de ser ainda insuficiente no âmbito do alcoolismo, havendo um longo caminho a percorrer. O alcoolismo enquanto doença crónica provoca graves problemas de saúde e sociais (absentismo, internamentos de longa duração, incapacidade, reforma precoce, problemas familiares e outros). A forma como a pessoa com SDA perceciona a sua doença, pode influenciar os mecanismos individuais para satisfazer as suas necessidades e a procura de ajuda com vista à sua recuperação, a adesão ao tratamento e consequentemente a eficácia da intervenção e qualidade de vida.

Os dados apresentados sugerem, de um modo geral, uma relação direta entre a perceção da SDA e a qualidade de vida. O estudo da QV nas pessoas com dependência alcoólica, assume uma especial relevância, uma vez que, os progressos nesta área vão reduzir o número de internamentos, a sobrecarga para a família e/ou sistema de saúde e consequentemente a redução dos recursos necessários. Consideramos fundamental desenvolver estudos longitudinais, para avaliação da qualidade de vida entre as pessoas com SDA e, entre familiares, antes, durante e após os tratamentos, avaliando desta forma, a eficácia dos mesmos. Medir a QV torna-se fundamental para avaliar os resultados terapêuticos, incrementar áreas com necessidades de estratégias terapêuticas mais eficazes. A QV pode ser utilizada, ainda como preditor de remissão ou recaída.

O reconhecimento precoce de problemas de consumo alcoólico, a intervenção precoce, o tratamento dos efeitos nocivos do álcool (inclusive sintomas de abstinência e outros problemas médicos), o ensino de novas estratégias para fazer face a situações associadas ao risco de recaída, o ensino à família e a reabilitação são as principais estratégias de efetividade comprovada para o tratamento de problemas relacionados com a dependência de álcool (National Institute on Drug Abuse [NIDA], 2000). A qualidade de vida, assim como, a perceção da doença na ótica da pessoa com SDA, são da maior importância para orientar a avaliação e intervenção dos técnicos de saúde. Propor um tratamento eficaz a longo prazo representa um desafio para a equipe de saúde, pois requer a participação e cooperação da pessoa com SDA, que manifesta grande dificuldade em alterar o seu comportamento e estilo de vida.

 

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Recebido em 9 de Dezembro de 2013/ Aceite em 20 de Março de 2014

 

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