INTRODUÇÃO
Atletas de voleibol de alto rendimento são submetidos a inúmeras sessões de treinos físicos, técnicos e táticos. As rotinas são caracterizadas por movimentos repetitivos como saltos, bem como por ações técnicas realizadas acima do plano de altura do jogador, que podem favorecer um grande estresse mecânico na articulação dos ombros (Seminati & Minetti, 2013; Reitmayer, 2019). Nesse contexto, gerenciar adequadamente as cargas de treinamento, bem como a resposta individual à essas cargas, compreende uma ação importante para maximizar o desempenho e prevenir lesões e overtraining (Gabbett, 2016; Kellmann et al., 2018).
Várias estratégias que contribuem para esse processo vão desde o monitoramento de parâmetros bioquímicos (Lee et al., 2017) como a creatina quinase (CK), nível de cortisol, ferro e ureia, passando por respostas autonômicas como análise da variabilidade da frequência cardíaca (Hernández-Cruze et al., 2017), monitoramento do sono (Bonnar, Bartel, Kakoschke, & Lang, 2018) e do status neuromuscular por meio de testes físicos como o countermovement jump (Claudino et al., 2019). Além disso, recentemente, tem sido proposto uma análise do perfil térmico dos atletas pela termografia infravermelha (TI) (Gómez-Carmona, Fernández-Cuevas, Sillero-Quintana, Arnaiz-Lastras, & Navandar, 2020).
A determinação do perfil térmico do atleta compreende estabelecer o padrão térmico que o atleta apresenta formando uma linha de base. Essa linha varia em função da musculatura e articulação analisada, influenciada ainda pelas cargas de treino ou competições, além do período de recuperação. Isto promove uma onda térmica que é determinada por características individuais. O segundo ponto de análise compreende um monitoramento do nível de assimetria térmica bilateral. Em condições normais, espera-se uma similaridade térmica entre regiões corporais bilaterais e, dessa forma, a técnica é capaz de detectar diferenças entre essas regiões e antecipar um possível surgimento lesivo na musculatura (Marins et al., 2014a; Maior, Leporace, Tannure, & Marocolo, 2017). Os ajustes na carga de treinamento realizados com base no monitoramento de assimetrias térmicas têm se mostrado eficientes em reduzir a incidência de lesões em futebolistas profissionais ao longo de uma temporada (Côrte et al., 2019; Gómez-Carmona et al., 2020). Diante disso, Marins, Fernández-Cuevaz, Arnaiz-Lastras, Fernandes e Sillero-Quintana (2015) propuseram que diferenças térmicas bilaterais ≤ 0,4°C são consideradas normais, ao passo que o surgimento de assimetrias de 0,5 – 0,7°C demanda novas avaliações, e valores com maior magnitude (0,8 – 1°C) requerem ações preventivas ou até mesmo o afastamento temporário do atleta de suas rotinas de treinamento e uma avaliação médica mais precisa.
Ainda que haja classificações gerais de assimetria, é importante analisar o perfil térmico específico por modali-dade, considerando que cada esporte possui sua especifici-dade (Moreira et al., 2021). Nesse sentido, também é possível perceber, a partir dos valores em condições de repouso, as respostas da temperatura da pele (TP) para cada Região Corporal de Interesse (RCI) e, a partir disso, monitorar o seu comportamento de acordo com as necessidades de cada atleta, a fim de analisar alterações térmicas individualmente e, assim, auxiliar na prevenção de lesões (Marins et al., 2014b; Maior et al., 2017; Sanchez, Mejías-Martínez, Valero-Campo, & Bataller-Cervero, 2017). O uso dessa ferramenta no voleibol profissional é de extrema importância pois, embora a média de lesões por esforço repetitivo seja relativamente baixa, Verhage, Beek, Bouter, Bahr, e Mechelen (2004) verificaram que os atletas que permaneceram mais tempo afastados das quadras são justamente os que sofreram esse tipo de trauma, impactando também em aspectos econômicos da equipe.
Portanto, após uma busca na base de dados Pubmed com as palavras-chave “Thermography and volleyball” realizado em treze de Maio de 2020, não ter apresentado nenhum estudo, é indicado expor valores de temperatura expressos em condições de repouso em atletas de voleibol de alto nível para o estabelecimento de um padrão em análises com a técnica termográfica, colaborando assim com o corpo técnico para o uso desta ferramenta como ação preventiva de lesões. Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi traçar o perfil térmico de membro superiores, inferiores e tronco de jogadores de voleibol de alto rendimento, além de avaliar o nível de simetria térmica de RCIs bilaterais. Foi hipotetizado que os atletas apresentariam similaridade térmica nas regiões bilaterais analisadas, e que a TP de RCIs centrais (tronco) seriam mais elevadas que a TP dos membros superiores e inferiores.
MÉTODO
Amostra
Este estudo transversal analisou 14 atletas de voleibol masculino profissional (idade: 19,4± 2,6 anos, massa corporal: 82,4± 13,6 kg, estatura: 190,3± 10,4 cm, gordura corporal: 11,9± 4,4%) vinculados a uma equipe brasileira de primeira divisão da Superliga. No momento da coleta, eles encontravam-se na semana inicial de avaliações da pré-temporada. Os atletas foram esclarecidos sobre os procedimentos e objetivos do estudo e, após concordarem em participar, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ou o Termo de Assentimento (menores de idade e pais ou responsáveis). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade local (CAAE 44856821.0.0000.5.153) e seguiu os critérios da legislação brasileira de acordo com as normas da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.
Alguns fatores que podem interferir na precisão das imagens (Fernández-Cuevas et al., 2015) foram considerados como critérios de exclusão: a) histórico de lesão osteomioarticular nos últimos dois meses; b) ter realizado tratamento dermatológico nas RCIs horas antes da coleta; c) estivesse consumindo medicamentos anti-inflamatórios, antitérmicos ou diuréticos; d) em estado febril nos últimos sete dias; e) estivesse consumindo algum suplemento nutricional que pudesse influenciar na homeostase hídrica ou temperatura corporal nos últimos 15 dias que antecederam a coleta; f) tivesse feito alguma tatuagem nos últimos três meses.
Procedimentos
Os procedimentos de aquisição das imagens térmicas seguiram as recomendações de um consenso sobre avaliação termográfica na área do exercício e medicina do esporte (Moreira et al., 2017). Os participantes não ingeriram bebida alcoólica ou café, não ficaram expostos ao sol e não tomaram banho próximo da avaliação. Além disso, não foi realizada atividade física intensa, treino ou testes físicos nas 48h antes da coleta. A coleta de dados ocorreu entre 15 e 16 h em uma sala climatizada (temperatura: 22,5± 0,3°C, umi-dade relativa: 66,9± 0,8%). A fim de estabilizar a TP, todos participantes cumpriram no mínimo 10 minutos de aclimatação na sala (Marins et al., 2014c). Durante a aclimatação, eles ficaram posicionados sobre uma superfície de madeira, usaram sunga e foram orientados a não cruzarem os braços, não se coçarem, não encostarem em outros. Não houve ventilação direcionada aos participantes nem dispositivos eletrônicos ligados na sala.
Em seguida, foram obtidos quatro termogramas por atleta (membros superiores/tronco e membros inferiores, na visão anterior e posterior) (Figura 1) com uma câmera infravermelha T420 (FLIR®, Estocolmo, Suécia), com faixa de detecção de temperatura entre - 20 e 650°C, precisão de 2%, sensibilidade ≤ 0,05°C, banda de espectral dos infravermelhos de 7,5 a 13 μm, taxa de atualização de 60 Hz, foco automático e resolução de 320 × 240 pixels. A câmera foi ligada com ante-cedência de 15 min para permitir a estabilização do sensor, e foi apoiada em um tripé (WF®, WT 3770, Manaus, Brasil) a 3 m de distância dos avaliados, perpendicular às RCIs. A emissividade foi configurada em 0,98 (Moreira et al., 2017).
Os termogramas foram analisados no software Flir Tools 4.1 (Flir®, Estocolmo, Suécia), onde as RCIs foram delimitadas manualmente. Assim, os valores de TP média e máxima do peitoral, abdômen, dorsal superior, lombar, braço, antebraço, coxa, joelho e perna foram obtidos. Pontos anatômicos utilizados previamente em outros estudos foram adotados como referência para guiar a delimitação das RCIs (Marins et al., 2014a, 2014b; Stroppa et al., 2017). A Figura 1 apresenta termogramas de um participante com as RCIs delimitadas.
Análise estatística
A normalidade dos dados foi verificada a partir do teste de Shapiro-Wilk, e os resultados foram expressos em média (M) e desvio padrão (DP). As diferenças térmicas entre RCIs bilaterais foram calculadas subtraindo a média de temperatura do lado direito pela média do lado esquerdo. O teste T independente foi usado para comparar a TP entre os lados direito e esquerdo de cada RCI, considerando como nível de significância um valor de p≤ 0,05. Além disso, o tamanho do efeito (TE) foi calculado para as diferenças bilaterais com base no d de Cohen, considerando os valores ≤ 0,19, 0,2–0,49, 0,5–0,79 e ≥ 0,8 como os limites para efeitos insignificantes, pequenos, médios e grandes, respectivamente (Cohen, 2013). Por fim, a distribuição percentual das diferenças térmicas bilaterais foi quantificada em cinco zonas de temperatura (≤ 0,49, 0,5–0,79, 0,8–1, 1,1–1,59 e ≥ 1,6°C) para cada RCI (Marins et al., 2014a). Os dados foram analisados no software SPSS (SPSS Inc., Chicago, IL), versão 20.0.
RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta os valores de TP média e máxima das RCI bilaterais, bem como a diferença térmica bilateral. Para os valores médios de temperatura, foi observada uma temperatura estatisticamente similar entre os lados direito e esquerdo em todas as RCIs (p> 0,05). As diferenças térmicas médias variaram de 0 a 0,2°C, e a magnitude das assimetrias foi insignificante ou pequena com base no tamanho do efeito.
Região corporal | TP MÉDIA (°C) | TP MÁXIMA (°C) | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
M | DP | Dif. | p | TE | M | DP | Dif. | p | TE | |
Visão anterior | ||||||||||
Antebraço direito | 31.7 | 0,5 | 0.2 | 0.437 | 0.40 | 32.6 | 0.5 | 0.1 | 0.401 | 0.18 |
Antebraço esquerdo | 31.9 | 0.5 | 32.7 | 0.6 | ||||||
Braço direito | 32.9 | 0.5 | 0.1 | 0.678 | 0.20 | 34.4 | 0.6 | 0.4 | 0.124 | 0.67 |
Braço esquerdo | 32.8 | 0.5 | 34.0 | 0.6 | ||||||
Ombro direito | 33.0 | 0.7 | 0 | 0.909 | 0 | 34.2 | 0.8 | 0.1 | 0674 | 0.12 |
Ombro esquerdo | 33.0 | 0.6 | 34.3 | 0.8 | ||||||
Coxa direita | 31.4 | 0.8 | 0.2 | 0.641 | 0.25 | 32.8 | 1.0 | 0.3 | 0.371 | 0.32 |
Coxa esquerda | 31.2 | 0.8 | 32.5 | 0.9 | ||||||
Joelho direito | 29.0 | 0.7 | 0.1 | 0.873 | 0.12 | 30.9 | 0.9 | 0.1 | 0.670 | 0.09 |
Joelho esquerdo | 29.1 | 0.9 | 31.0 | 1.2 | ||||||
Perna direita | 31.3 | 0.4 | 0.1 | 0.828 | 0.22 | 32.8 | 0.6 | 0.3 | 0.204 | 0.42 |
Perna esquerda | 31.4 | 0.5 | 32.5 | 0.6 | ||||||
Peitoral | 33.2 | 0.8 | − | − | − | 35.2 | 0.6 | − | − | − |
Abdômen | 33.1 | 0.8 | − | − | − | 34.6 | 0.6 | − | − | − |
Visão posterior | ||||||||||
Antebraço direito | 31.3 | 0.7 | 0.2 | 0.836 | 0.27 | 32.3 | 0.7 | 0.2 | 0.329 | 0.27 |
Antebraço esquerdo | 31.5 | 0.8 | 32.5 | 0.8 | ||||||
Braço direito | 30.2 | 0.9 | 0 | 0.935 | 0 | 31.5 | 1.2 | 0.1 | 0.721 | 0.08 |
Braço esquerdo | 30.2 | 0.9 | 31.4 | 1.2 | ||||||
Ombro direito | 32.4 | 1.0 | 0.1 | 0.939 | 0.10 | 33.6 | 0.9 | 0.2 | 0.484 | 0.21 |
Ombro esquerdo | 32.5 | 1.0 | 33.4 | 1.0 | ||||||
Coxa direita | 31.4 | 0.8 | 0 | 0.981 | 0 | 32.6 | 0.7 | 0.1 | 0.617 | 0.15 |
Coxa esquerda | 31.4 | 0.8 | 32.5 | 0.6 | ||||||
Joelho direito | 31.9 | 0.6 | 0.1 | 0.746 | 0.17 | 33.1 | 0.7 | 0.1 | 0.811 | 0.14 |
Joelho esquerdo | 31.8 | 0.6 | 33.0 | 0.6 | ||||||
Perna direita | 31.0 | 0.6 | 0.1 | 0.701 | 0.15 | 32.2 | 0.7 | 0 | 0.904 | 0.0 |
Perna esquerda | 30.9 | 0.7 | 32.2 | 0.8 | ||||||
Dorsal superior | 33.4 | 0.7 | − | − | − | 34.8 | 0.8 | − | − | − |
Lombar | 32.8 | 1.0 | − | − | − | 34.6 | 0.7 | − | − | − |
TP: temperatura da pele; Dif: diferença de da pele entre os lados; *diferença significativa de temperatura entre os lados direito e esquerdo (p≤ 0,05); TE: tamanho do efeito.
Quanto aos resultados de TP máxima, não houve diferença de temperatura entre RCIs bilaterais (p> 0,05). As diferenças térmicas bilaterais foram ≤ 0,3°C com TE entre insignificante e pequeno; com exceção para o braço (visão anterior), onde a magnitude do efeito foi moderada e a assimetria foi de 0,4°C.
As Tabelas 2 e 3 mostram a distribuição percentual referente às diferenças térmicas bilaterais para TP média (Tabela 2) e máxima (Tabela 3). Em todas RCIs, a maioria das assimetrias se concentraram em uma zona de temperatura < 0,49°C, seguida pela zona de 0,5 a 0,79°C. Contudo, para a TP média (visão anterior), houve dois casos de assimetrias de 0,8 a 1°C no antebraço e joelho, um caso na perna, além de um caso > 1,6°C no joelho. Já para a TP máxima, houve casos individuais de assimetrias > 0,8°C no antebraço (visão anterior), braço e ombro (visão posterior), bem como nos membros inferiores (visão anterior e posterior).
Região corporal | Zona de temperatura (°C) | ||||
---|---|---|---|---|---|
≤ 0.49 | 0.5–0.79 | 0.8–1.0 | 1.1–1.59 | ≥ 1.6 | |
Anterior | |||||
Antebraço | 57% | 29% | 14% | 0% | 0% |
Braço | 93% | 7% | 0% | 0% | 0% |
Ombro | 86% | 14% | 0% | 0% | 0% |
Coxa | 93% | 7% | 0% | 0% | 0% |
Joelho | 64% | 14% | 14% | 0% | 7% |
Perna | 64% | 29% | 7% | 0% | 0% |
Posterior | |||||
Antebraço | 79% | 21% | 0% | 0% | 0% |
Braço | 93% | 7% | 0% | 0% | 0% |
Ombro | 86% | 14% | 0% | 0% | 0% |
Coxa | 93% | 7% | 0% | 0% | 0% |
Joelho | 86% | 14% | 0% | 0% | 0% |
Perna | 79% | 21% | 0% | 0% | 0% |
Região corporal | Zona de temperatura (°C) | ||||
---|---|---|---|---|---|
≤ 0.49 | 0.5–0.79 | 0.8–1.0 | 1.1–1.59 | ≥ 1.6 | |
Anterior | |||||
Antebraço | 57% | 29% | 7% | 7% | 0% |
Braço | 57% | 43% | 0% | 0% | 0% |
Ombro | 57% | 43% | 0% | 0% | 0% |
Coxa | 64% | 21% | 7% | 7% | 0% |
Joelho | 50% | 29% | 0% | 14% | 7% |
Perna | 57% | 7% | 21% | 14% | 0% |
Posterior | |||||
Antebraço | 86% | 14% | 0% | 0% | 0% |
Braço | 21% | 50% | 14% | 14% | 0% |
Ombro | 64% | 21% | 14% | 0% | 0% |
Coxa | 71% | 14% | 7% | 7% | 0% |
Joelho | 71% | 21% | 7% | 0% | 0% |
Perna | 29% | 43% | 7% | 21% | 0% |
DISCUSSÃO
O principal achado deste estudo foi a identificação de simetria térmica em RCIs bilaterais de atletas de voleibol de alto rendimento, tanto para valores de TP média quanto para máxima (Tabela 1). Além disso, do ponto de vista clínico, as diferenças bilaterais observadas são consideradas aceitáveis pois foram insignificantes ou pequenas, com base no cálculo do TE, e não excederam em média 0,4°C (Marins et al., 2015). Dessa forma, nossos resultados reforçam e estão em consonância com trabalhos prévios similares realizados em condições de repouso em atletas de base feminino de voleibol (Morais, Araújo, Carvalho, Sousa & Cruz, 2017; Sanchez et al., 2017).
Em relação às RCIs analisadas do tronco (Tabela 3), em maioria, apresentaram valores de TP (média e máxima) maiores do que os membros superiores e inferiores. Tal fato ocorre, pois, na região central do corpo estão localizados órgãos como o coração, fígado, intestino, que necessitam de um maior aporte sanguíneo, e consequentemente produzem uma maior quantidade de calor metabólico se comparado às regiões distais. Esse comportamento também foi visto em outro estudo realizado em adultos saudáveis (Marins et al., 2014a).
Visto que todos os atletas não apresentavam qualquer quadro lesivo, os resultados reforçam que, em condições normais, e com um padrão de referência para avaliação termográfica de jogadores de voleibol de alto rendimento, deve haver simetria térmica entre RCIs contralaterais. Ainda não há um consenso estabelecido para valores de temperatura entre uma RCI e sua região contralateral em indivíduos normais e em atletas. Alguns estudos apresentaram diferentes valores para população de não atletas, chegando a 0,3°C (Brioschi et al., 2009; Marins et al., 2014a); 0,4 (Pichot, 2001) ou 0,5°C (Selfe, Whitaker, & Hardaker, 2008). Para os atletas de alto rendimento, Hildebrandt, Raschner, e Ammer (2010) definiram um valor de 0,7°C como valor máximo aceitável de assimetria, sendo que, mais recentemente, Marins et al. (2015) classificaram como limite de assimetria até 0,4°C.
Desse modo, os valores médios de assimetria presentes nesse estudo estão de acordo com os trabalhos existentes na literatura. No entanto, é necessário ampliar o conhecimento acerca de uma faixa de normalidade de assimetria térmica em atletas de voleibol, visto que nós avaliamos os atletas apenas no momento de retorno de férias, e que os trabalhos existentes foram realizados apenas com o público feminino em categorias de base, avaliando as alterações decorrentes das partidas e treinamentos (Morais et al., 2017; Sanchez et al., 2017). Por outro lado, em algumas modalidades há estudos que estabeleceram um perfil de simetria térmica. No futebol, por exemplo, alguns autores investigaram atletas de categoria de base (Marins et al., 2014b) e profissionais (Maior et al., 2017). Nesse sentido, é importante destacar que o perfil térmico é dependente da modalidade praticada, pois pode sofrer influência de diversos fatores, como o caráter cíclico ou acíclico, a predominância de membros inferiores ou superiores, ou pela utilização excessiva do membro dominante, como são observados em jogadores de futebol (Gómez-Carmona et al., 2020) ou em atletas de judô (Moreira et al., 2021). Nesses casos, a assimetria térmica pode ser considerada como uma característica do esporte, sem associação com risco de lesão.
Vale ressaltar que as RCI podem apresentar um desequilíbrio térmico em relação a sua área contralateral, o qual pode ser visualizado pela termografia a partir de áreas hipotérmicas ou hipertérmicas na pele, indicando a necessidade de uma avaliação mais detalhada para o diagnóstico da causa dessa alteração. Estudos prévios indicam que valores de assimetria térmica maiores que 1°C são fortes indicativos para o possível surgimento de um processo lesivo (Côrte et al., 2019; Gómez-Carmona et al., 2020). No nosso estudo, a amostra não apresentou valores médios de assimetria térmica maiores que 1°C (Tabelas 1 e 2), sendo que, na maioria das RCI analisadas, os valores foram inferiores a 0,5°C. Esse quadro térmico reforça um estado de normalidade térmica e ausência de alterações na TP, e está de acordo com os valores observados em trabalhos realizados com indivíduos não atletas (Marins et al., 2014a).
Entretanto, alterações térmicas acima de 0,8°C na TP média e máxima foram observadas em alguns jogadores. Para a TP média, houve 2 casos de assimetrias de 0,8–1°C no antebraço e joelho anterior, 1 caso na perna anterior, além de 1 caso com assimetria > 1,6°C no joelho anterior. Em relação a TP máxima, foram verificados mais casos se comparado a TP média, retratando casos individuais de assimetrias > 0,8°C no antebraço anterior; braço e ombro posterior. Além disso, para os membros inferiores, foi constatado assimetria térmica de 0,8–1,6°C para vista anterior e posterior. Logo, nós recomendamos que os atletas identificados com assimetrias elevadas sejam reavaliados nos dias seguintes e direcionados para exames complementares como imagem de ressonância magnética, dosagem de marcadores inflamatórios e testes funcionais. Isso ajudaria a identificar se as assimetrias observadas são decorrentes de problemas estruturais ou fisiológicos, ou se são habituais ao atleta em função de fatores como lesão antiga, cirurgia prévia etc.
Nesse sentido, as diversas ações técnicas realizadas ao longo de treinamentos e jogos, como por exemplo, bloqueio ou ataque, tendem a sobrecarregar as articulações dos ombros, assim como os saltos geram um forte estresse aos membros inferiores, pois os mesmos são exigidos tanto na fase de impulsão quanto na de queda (Dos Anjos et al., 2017). Associado a isso, por conta de um quadro constante de fadiga, os jogadores são impactados por um desequilíbrio dos músculos e articulações (Horta, Bara Filho, Coimbra, Werneck, & Miranda, 2019). Tais fatores podem promover lesões do tipo ligamentar (Baugh et al., 2018), luxações (Kilic, Maas, Verhagen, Zwerver, & Gouttebarge, 2017) e tendinites (Pires, Bini, Fernandes, & Setti, 2015), traumas estes, que são perceptíveis e captados pela TI.
Portanto, torna-se sugestivo a implementação da avaliação termográfica no cotidiano de equipes de voleibol profissional, tanto durante a pré-temporada quanto durante o período competitivo. Como já é visto em outras modalidades, essa técnica permite o acompanhamento longitudinal dos atletas, comparando-o com o próprio histórico de imagens, permitindo, se necessário, intervenções que visam prevenir lesões (Gómez-Carmona et al., 2020). No estudo de Côrte et al. (2019), foi verificado uma redução expres-siva no número de lesões de atletas de futebol se comparado à temporada em que não foi utilizado a TI. Além disso, o tempo de afastamento por lesão, incidência de lesão muscular por atleta e o índice de lesão por sessão de treinamento, também diminuíram.
As limitações do estudo foram a falta de realização de exames sanguíneos como o de creatina quinase, além de exames de imagens, como ressonância magnética para analisar a relação entre casos de assimetrias de TIP superiores a 0,7°C com algum problema físico na área. Estudos futuros devem monitorar longitudinalmente a simetria térmica de jogadores de vôlei e analisar o impacto da carga de treinamento e jogos no perfil térmico.
CONCLUSÕES
Atletas de voleibol de alto rendimento apresentam simetria térmica com diferenças na média de TP entre RCI bilaterais iguais ou menores que 0,4°C, além de valores normais de temperatura média e máxima paras as RCIs do tronco. Esse padrão simétrico sugere que os atletas apresentaram uma avaliação termográfica normal. O presente trabalho fornece o primeiro perfil termográfico de jogadores de voleibol de alto nível e poderá servir como ponto de referência para novos estudos e para a prática profissional.