INTRODUÇÃO
A possibilidade de um jovem ser simultaneamente estudante e atleta foi referida pela primeira vez na Europa no documento White Paper On Sport (European Commission, 2007, p. 6), referindo-se à “carreira dual” (DC), como a possibilidade de um atleta de alto rendimento combinar, sem esforços pessoais desproporcionados, a carreira desportiva com a carreira educativa, de forma flexível, salvaguardando os seus valores, interesses educacionais e profissionais.
No espaço da União Europeia não existe contudo um modelo único de apoio à carreira, existem, sim, tal como referem vários estudos europeus (Aquilina & Henry, 2010; Caput-Jogunica, Curkovic, & Bjelic, 2012; European Commission, 2015; Henry, 2013), diversas abordagens relativamente à carreira dual, que podemos sintetizar em quatro tipos: a) centrada no estado apoiada pela legislação (França, Hungria, Luxemburgo, Polónia, Portugal e Espanha); b) tendo o Estado como um facilitador/patrocinador do processo, promovendo acordos entre a educação e as organizações desportivas (Bélgica, Dinamarca, Estónia, Finlândia, Alemanha, Letónia, Lituânia e Suécia); c) uma abordagem em que as Federações Desportivas representam os atletas em nome individual e são facilitadoras e mediadoras perante as entidades educativas (Grécia e Reino Unido); d) por último, uma abordagem “laissez faire”, onde não há estruturas formais envolvidas no processo de apoio à carreira dual (Malta, Áustria, Chipre, República Checa, Irlanda, Itália, Holanda, Eslováquia e Eslovénia).
Apesar das diversas abordagens, o tema tem suscitado muito interesse na comunidade científica. Desde a primeira referência à carreira dual em 2007 (European Commission, 2007), têm sido conduzidos vários estudos sobre a temática que confirmam a sua pertinência, complexidade e natureza multidisciplinar.
As exigências dos sistemas educativos e desportivos nos diversos países da Europa tornam a conciliação da carreira desportiva com a carreira educativa um verdadeiro desafio. A especialização precoce, a deficiência, a imigração, a conciliação da carreira desportiva com o trabalho, o abandono de uma das carreiras ou o fim da carreira desportiva e a inserção no mercado de trabalho são alguns dos desafios que os alunos-atletas enfrentam diariamente (Bastianon & Ginevra, 2018; Capranica & Guidotti, 2016; Ryba, Kalaja, Selainne, Ronkainen, & Nurmi, 2016; Sorkkila, Aunola, & Ryba, 2017; Wylleman & Lavallee, 2004).
Outras questões, podem, também, pôr em causa o sucesso da carreira dual, nomeadamente lesões, questões psicológicas, psicossociais, assumir responsabilidades individuais, desenvolver novos relacionamentos entre pares ou manter um relacionamento familiar, conduzindo a doenças como o stress, over training ou burnout (Baron-Thiene & Alfermann, 2015; Gustafsson, Kenttä, Hassmén, & Lundqvist, 2007; Ivarsson, Stambulova, & Johnson, 2018; Kristiansen, 2017; Ryba et al., 2016; Stambulova & Wylleman, 2015; Sorkkila et al., 2017).
Contudo, para além dos desafios diários, a carreira dual revela, também, potencialidades e benefícios que devem ser tidos em conta, como os benefícios associados à saúde, através da adoção de um estilo de vida equilibrado por parte dos alunos-atletas, a redução dos níveis de stress ou o aumento do bem-estar, o desenvolvimento de competências sociais e de relacionamento entre pares, uma autonomia financeira, uma melhor adaptação à vida quando termina a carreira desportiva e até uma perspetiva de emprego futuro reforçada (European Commission, 2012; Petitpas, Brewer, & Van Raalte, 2009; Price, Morrison, & Arnold, 2010; Tekavc, Wylleman, & Cecic’ Erpic˘, 2015; Torregrosa, Ramis, Pallarés, Azocar, & Selva, 2015).
Há mais de 10 anos que a União Europeia responsabiliza todas as organizações desportivas e os governos pela promoção da carreira dual e o êxito da mesma (European Union, 2013), mesmo com conceitos diferenciados de alto-rendimento, exigências distintas no acesso a programas de apoio ao alto-rendimento, diferentes abordagens nos vários países, quer no treino de alto rendimento, quer na educação (Capranica & Guidotti, 2016; Lupo, Tessitore, Capranica, Rauter, & Doupona Topic, 2012; Lupo et al., 2015). Sem mecanismos de apoio, os alunos-atletas acabam por abandonar uma das carreiras (Bastianon & Ginevra, 2018; Ryba et al., 2016; Sorkkila et al., 2017).
Apesar das diferentes abordagens, a União Europeia tem implementado algumas políticas que, tendo em consideração as diferenças entre os vários países, políticas e modalidades desportivas (European Commission, 2012), permitem aos alunos-atletas manter o foco no alto-rendimento e na escola ou no alto-rendimento e no trabalho (Stambulova & Wylleman, 2014).
Perante diferentes realidades e abordagens, têm sido desenvolvidos vários modelos que procuram explicar o desenvolvimento da carreira dual e as questões complexas que ela envolve, contribuindo para a melhoria dos processos de conciliação entre ambas as carreiras, nos diversos países.
A proposta apresentada por Wylleman e Lavallee (2004), por exemplo (Figura 1), demonstra a curta duração da carreira dual (entre 15 a 20 anos), as várias fases de desenvolvimento e um conjunto de transições que vão decorrendo ao longo da vida dos alunos-atletas. Segundo os autores, desde a introdução ao desporto que praticam, ao atingir o patamar mais alto da sua prática, o alto rendimento, até ao terminar a carreira desportiva e procurar uma nova carreira no mercado de trabalho, tudo decorre num curto espaço de tempo, de cerca de 15 a 20 anos. No modelo proposto, ao longo das várias transições conseguem-se identificar um conjunto de intervenientes e variáveis que condicionam o tempo de transição entre elas, como por exemplo o tipo de desporto praticado, o género ou a capacidade de cada individuo a nível psicossocial, nível académico/vocacional e um conjunto de variáveis que influenciam o seu desenvolvimento ao longo da vida (European Commission, 2012; Wylleman, Alfermann, & Lavallee, 2004).
Nos últimos seis anos (2015-2021), alguns estudos internacionais sobre a temática “carreira dual” confirmam para além da pertinência do tema e da sua complexidade, preocupações partilhadas por vários países através da cooperação estabelecida para a compreensão do fenómeno “carreira-dual”, uma realidade cada vez mais consolidada por toda a Europa (Picamilho, Saragoça & Teixeira, 2021).
Revisões sistemáticas realizadas sobre a temática (Guidotti, Cortis, & Capranica, 2015; Picamilho et al., 2021; Stambulova & Wylleman, 2019) demonstram claramente a necessidade de mais investigação sobre a carreira dual e sobretudo de mais estudos quantitativos perante a evidente predominância de estudos qualitativos.
Existem lacunas em termos de pesquisa, quer em termos de algumas temáticas pouco estudadas (emigração, os ambientes que envolvem a carreira dual, a saúde mental e bem-estar dos atletas, burnout desportivo, mecanismos de apoio à carreia dual e de apoio ao treino, entre outros), quer em termos das metodologias empregues. Alguns autores sugerem a condução de mais estudos através de métodos mistos de pesquisa e com amostras representativas de estudantes-atletas (Picamilho et al., 2021), referindo que a utilização das amostras não representativas condiciona a análise do fenómeno e a generalização dos resultados (Rosenvinge et al., 2018). Para além das lacunas identificadas, existem poucos instrumentos de pesquisa validados a nível internacional que permitam uma posterior adaptação e replicação em modelos diferentes. A título de exemplo, o estudo Motivation towards dual career of European student-athletes (Lupo et al., 2012; 2015) possibilitou a primeira abordagem para investigar a motivação para a carreira dual na Europa a estudantes-atletas que vivem em países com diferentes políticas de desporto e educação, utilizando o questionário SAMSAQ-EU, desenvolvido a partir do questionário SAMSAQ (Gaston-Gayles, 2005). Apesar das diferenças estruturais identificadas entre os modelos estudados, o SAMSAQ-EU, demonstrou ser uma ferramenta útil para a avaliação da motivação na carreira dual de alunos-atletas europeus, na educação, no desenvolvimento de apoios e incentivos eficazes para alunos-atletas e na promoção do seu desenvolvimento pessoal. Neste estudo efetuado com a participação de seis países europeus e uma amostra heterogénea e limitada, os dados destacaram a necessidade de mais pesquisas para desenvolver um método válido e um instrumento confiável para a avaliação e monitoramento das motivações do aluno-atleta para uma carreira dual em contextos internacionais. O questionário demonstrou ser uma ferramenta preliminar interessante para investigar o desempenho de alunos-atletas europeus. A motivação para uma carreira dupla e a alta sensibilidade para contextos sociais específicos sublinharam a necessidade de mais pesquisas nesta área. Este estudo destacou ainda a relevância de uma linha de pesquisa sobre a compreensão da motivação de alunos-atletas europeus na conciliação da carreira dual (Lupo et al., 2012; 2015).
No estudo desenvolvido mais tarde no projeto Erasmus+ Sport Gold em Educação e Desporto de Elite (De Brant, Wylleman, Torregrossa, Defruyt, & Van Rossem, 2017), 40 investigadores e especialistas em carreira dual de renome internacional, avaliaram as perceções que os alunos-atletas de alto-rendimento de 17 instituições tinham sobre a aquisição de 38 potenciais competências através do questionário, Dual Career Competency Questionnaire for Athletes (DCCQ-A), um dos primeiros instrumentos contruídos para avaliar as perceções dos alunos-atletas, utilizado posteriormente com novas adaptações noutros estudos. Neste estudo, os autores concluíram que os alunos-atletas consideravam quatro competências determinantes para o sucesso da sua carreira dual: a gestão da carreira dual, o planeamento da carreira, a capacidade mental e a inteligência social e adaptabilidade. Estes resultados merecem uma reflexão por parte das entidades com responsabilidades sobre a carreira dual, uma vez que os alunos-atletas diretamente implicados na conciliação de ambas as carreiras identificaram determinadas competências que devem ser consideradas na construção das políticas para o desenvolvimento da carreira-dual.
Mais recentemente, Ryba, Elbe e Darpatova-Hruzewicz (2020), aplicaram o questionário Athlete Adaptation Inventory (AAI), remetendo-nos para questões da emigração, também ela um fenómeno a estudar se considerarmos que o número de competições internacionais tem vindo a aumentar ao longo dos anos e a migração atlética internacional temporária ou de longo prazo se tem generalizado (Capranica & Guidotti, 2016; Stambulova, Ryba, & Henriksen, 2020).
A carreira dual em Portugal, à semelhança de outros países tem sido reforçada pelas recomendações europeias. Está centrada no estado e é suportada pela legislação portuguesa que tem vindo a estabelecer medidas de apoio específicas que permitem a conciliação de uma prática desportiva de alto rendimento com uma escolaridade obrigatória de 12 anos (Lei nº272/2009), abrangendo estudantes entre os 6 e os 18 anos de idade.
O projeto piloto, Unidades de Apoio ao Alto Rendimento na Escola (UAARE) do Ministério da Educação, pelo despacho conjunto n.º 9.386-A/2016, de 21 de julho (2016), coordenado pela Direção-Geral da Educação, em colaboração com o Instituto Português do Desporto e Juventude, I.P., Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares e Agrupamentos de Escolas / Escolas não agrupadas envolvidas, cabendo ao Ministério da Educação a supervisão do mesmo procurou dar resposta a esta necessidade.
Após 3 anos de implementação, este modelo (Figura 2) foi regulamentado através da Portaria n.º 275/2019 de 27 de agosto (Portugal, 2019), com o
objetivo de conciliar, com sucesso, a atividade escolar com a prática desportiva de alunos-atletas do ensino básico e secundário enquadrados no regime de alto rendimento, integrados em seleções nacionais e alunos-atletas com potencial talento desportivo, através da articulação eficaz entre agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas, encarregados de educação, federações desportivas e seus agentes, municípios e outros interessados.
Compreender a conciliação da carreira dual em Portugal é uma necessidade emergente, num modelo recente, mas já com alguns anos de existência e sobre o qual há falta de investigação (Picamilho et al., 2021). Este modelo apresenta um conjunto de indicadores (Tabela 1) que merecem estudo, analise e reflexão.
Ano letivo | Atletas | Modalidades | Escolas | Anos de escolaridade | Desempenho académico médio global | Abandono escolar |
---|---|---|---|---|---|---|
2016/2017 | 67 | 17 | 4 | 7 | 94,7 | 0,2 |
2017/2018 | 171 | 27 | 10 | 7 | 92,67 | 3,51 |
2018/2019 | 360 | 39 | 16 | 8 | 93,47 | 0,2 |
2019/2020 | 697 | 41 | 19 | 8 | 97,15 | 0,43 |
2020/2021 | 700 | 43 | 19 | 8 | 96,89 | 0 |
2021/2022 | 734 | 41 | 19 | 8 | 95,62 | 0 |
2022/2023* decorrer | 1002 | 55 | 23 | 8 | 92,10 | -- |
Fonte: Adaptado de Portugal (2024).
Considerando o desafio permanente e exigente da carreira dual, os indicadores de sucesso do modelo UAARE, o aumento tendencial do número de escolas e de alunos-atletas que integram este modelo desde a sua implementação, considerando ainda, o papel central que os alunos-atletas desempenham neste modelo e reconhecendo a falta de um instrumento validado e fiável em Portugal para avaliar a conciliação entre a carreira desportiva e a carreira escolar, urge construir um instrumento de recolha de dados. Perante o papel central que os alunos-atletas desempenham neste modelo será determinante compreender as suas perceções, a forma como interpretam, processam e entendem a sua carreira dual dentro do modelo que integram.
A existência de um instrumento de recolha de dados poderá, de facto, contribuir para aumentar o conhecimento científico nesta temática e melhorar o modelo existente que envolve diversas entidades com responsabilidades, nomeadamente, Governo, Ministério da Educação, Federações Desportivas, Clubes Desportivos e outros agentes e reforçar as condições da conciliação entre a carreira desportiva e a carreira escolar dos alunos-atletas.
Face a este contexto, o objetivo deste estudo é demonstrar as primeiras evidências de validade dos três instrumentos que desenvolvemos e aplicámos através do Questionário QUAAREpt nas três dimensões que suportam o modelo de conciliação UAARE: gestão desportiva (GD), gestão escolar (GE) e saúde e bem-estar (SBE).
MÉTODOS
Este estudo é um estudo exploratório de natureza descritiva.
Amostra
A amostra foi constituída por 278 alunos-atletas (n= 278) com idades compreendidas entre os 14 e os 19 anos, 126 raparigas e 151 rapazes (M= 16,01± 1,246) oriundos de 22 Agrupamentos de Escolas portuguesas onde o modelo UAARE está implementado. Os alunos-atletas frequentavam a escolaridade obrigatória (entre o 8º ano e o 12º ano de escolaridade). A amostra foi selecionada considerando que os alunos com mais de 14 anos iriam compreender melhor todas as questões do questionário (Tabela 2).
Género | Média | N | Erro Desvio |
---|---|---|---|
Feminino | 15,88 | 126 | 1,204 |
Masculino | 16,12 | 151 | 1,275 |
Não pretendo responder a esta questão | 17,00 | 1 | . |
Total | 16,01 | 278 | 1,246 |
Esta amostra não aleatória, apresenta uma dimensão recomendada para este tipo de investigação. Participaram neste estudo 22 Escolas públicas portuguesas onde está implementado o modelo UAARE: Agrupamento de Escolas de Portela e Moscavide; Agrupamento de Escolas de Mirandela; Agrupamento de Escolas Camilo Castelo Branco; Agrupamento de Escolas Júlio Dantas; Escola Secundária Pedro Nunes; Escola Secundária Martins Sarmento; Escola Secundária de Fonseca Benevides; Escola Secundária Afonso Lopes Vieira; Escola Secundária Dr. Augusto César da Silva Ferreira; Agrupamento de Escolas de Santa Catarina; Agrupamento de Escolas de Rio Arade; Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro; Agrupamento de Escolas de Ponte de Sor; Agrupamento de Escolas Padre António Martins de Oliveira; Agrupamento de Escolas de Montemor-o-Velho; Agrupamento de Escolas João de Meira; Agrupamento de Escolas Gaia Nascente; Agrupamento de Escolas Fontes Pereira de Melo; Agrupamento de Escolas do Castêlo da Maia; Agrupamento de Escolas Coimbra Centro; Agrupamento de Escolas Alberto Sampaio e Agrupamento de Escolas de Alcochete.
Instrumentos
Versão inicial da matriz concetual e do questionário QUAAREpt
Para este estudo desenvolveram-se três instrumentos através do Questionário QUAAREpt, um instrumento para cada uma das três dimensões que suportam o modelo português de conciliação da carreira dual: GD, GE e SBE.
A matriz concetual de suporte ao questionário e o questionário foram construídos de raiz por um grupo de 3 investigadores, especialistas (E1 – professor universitário, Gestor Desportivo, E2 – professor universitário, Sociólogo, E3 – professora do ensino básico e secundário, especialista em treino desportivo.).
Na versão inicial da matriz, definiram-se os objetivos:
Identificar as principais perceções dos alunos nas dimensões: gestão escolar, gestão desportiva, gestão do bem-estar, dimensão social, barreiras e facilitadores à carreira dual no modelo UAARE.
Analisar as perceções dos alunos que podem contribuir para melhorar o modelo UAARE.
Identificar as principais barreiras e facilitadores à carreira dual que podem melhorar o modelo UAARE.
A matriz foi organizada e estruturada a partir de um referencial teórico exaustivo e da legislação que regulamenta o modelo UAARE implementado em Portugal (Brown et al., 2015; European Commission, 2012; Guidotti et al., 2015; Henriksen, Storm, Kuettela, Linnérb, & Stambulova, 2020; Pardal, 2018; 2021; Pavlidis & Gargalianos, 2014; Picamilho et al., 2021; Portugal, 2019; Rodrigues, 2021). Na sua conceção, foi tida em conta a população alvo a inquirir, alunos-atletas dos ensinos básico e secundário (9-18 anos) que frequentam a rede nacional de escolas UAARE. Submeteu-se o projeto de investigação ao Parecer da Comissão de Ética da Universidade de Évora, da qual se obtive parecer positivo.
Deu-se especial atenção à linguagem a utilizar, simples, clara e objetiva, ao formato, forma de aplicação e dimensão do questionário, para que a sua aplicação não fosse demasiado extensa e desmotivadora no seu preenchimento.
A matriz do questionário foi dividida em duas partes. Na primeira parte pretendeu-se caracterizar o perfil sociodemográfico dos alunos-atletas, e recolher dados como: a idade, género, ano de escolaridade, forma de integração na UAARE, contexto de residência em período de aulas, distância entre o local de residência e a UAARE, tempo de deslocação entre a residência e a UAARE, desporto praticado, número de horas de treino semanais despendidas pelos alunos-atletas, número de horas de estudo semanais despendidas pelos alunos-atletas e concelho de localização da UAARE que o aluno-atleta frequenta. Na segunda parte pretendeu-se avaliar as dimensões: gestão desportiva, gestão escolar, gestão da saúde e bem-estar e gestão social, definidas a partir do referencial teórico exaustivo e da legislação que regulamenta o modelo UAARE implementado em Portugal, através de 3 instrumentos construídos para o efeito. Procedeu-se à validação de conteúdo, forma e tipologia de questões entre os especialistas ao longo de várias reuniões de trabalho.
A matriz identificava as questões a colocar aos alunos e a sua tipologia (abertas, fechadas e escolha múltipla). Deu-se primazia à inclusão de questões fechadas.
Relativamente à escala a utilizar, definiu-se uma escala de Likert, para as questões de resposta fechada, com 5 níveis de resposta: 1-Discordo totalmente; 2-Discordo; 3-Não discordo nem concordo; 4-Concordo; 5-Concordo totalmente.
Considerou-se todo o procedimento de recolha de dados, de forma a que cumprisse também os critérios éticos em investigação, e por isso, elaborou-se uma declaração de consentimento inequívoco, informado e esclarecido (introduzida no questionário), facultada numa linguagem clara e acessível onde se deu conhecimento de que os dados recolhidos com o seu preenchimento seriam tratados de forma anónima e confidencial e que se destinavam unicamente para fins de investigação, respeitando o Regulamento Geral de Proteção de Dados (Lei nº 58/2019). Para os alunos-atletas menores de dezoito anos, elaborou-se o documento “Autorização do Encarregado de Educação para Participação em Estudo”, para que os Encarregados de Educação pudessem preencher, em momento prévio ao preenchimento do questionário pelo aluno.
No total, a versão inicial da matriz e do questionário, em consonância com a matriz continha 110 itens para a recolha de dados. Na primeira parte, a recolha de dados sociométricos era concretizada através de 7 questões. Na segunda parte do questionário pretendia-se avaliar 4 dimensões: Gestão Desportiva, Gestão Escolar, Gestão do Bem-Estar e Gestão Social. Na dimensão Gestão Desportiva foram elaboradas 29 questões, na dimensão Gestão Escolar 30 questões, na dimensão Gestão do Bem-Estar 30 questões e na Gestão Social 14 questões.
Considerando o aspeto denso que teria o questionário e as características da população-alvo a inquirir, a versão inicial da matriz e do questionário em versão em papel foram novamente analisadas e redimensionadas pelo grupo antes se serem submetidas a um painel de juízes.
Definiram-se novas versões da matriz e do questionário e validou-se o seu conteúdo para a consulta de um painel de juízes externos. Nesta nova versão redimensionada, a matriz continha 50 itens para recolha de dados (Dados sociométricos 10 questões, na dimensão Gestão Desportiva 17 questões, na dimensão Gestão Escolar 14 questões e na dimensão Gestão da Saúde e Bem-Estar 9 questões.
Definiu-se também o conteúdo do documento, “Autorização do Encarregado de Educação para Participação em Estudo”.
Procedimentos
As novas versões da matriz e do questionário e o documento, “Autorização do Encarregado de Educação para Participação em Estudo” foram submetidas por e-mail à apreciação de um painel de juízes externos, especialistas no modelo UAARE e na temática da carreira dual.
O painel de juízes externos foi constituído por 6 elementos: a Diretora de uma Escola Secundária UAARE, uma professora acompanhante de uma Escola Secundária UAARE, um interlocutor desportivo de um clube desportivo com atletas que frequentam uma UAARE, um encarregado de educação de um aluno-atleta UAARE, uma psicóloga de uma Escola Secundária UAARE e um aluno-atleta que integra o modelo UAARE.
Todos os juízes foram notificados através de e-mail onde puderam analisar e avaliar os documentos que lhe foram remetidos em anexo (Autorização do Encarregado de Educação para Participação em Estudo, Matriz e Questionário) e posteriormente contactados telefonicamente para esclarecer alguma questão.
A consulta deste grupo de peritos, que dominam o contexto UAARE permitiu-nos efetuar a reapreciação e a reformulação dos documentos elaborados. Todos os juízes emitiram o seu parecer por e-mail sobre os documentos que lhe foram submetidos.
Da análise destes juízes resultou a identificação de algumas fragilidades, nomeadamente questões que não se aplicavam aos alunos-atletas e eventuais problemas na compreensão das afirmações, o que contribuiu para um reajuste nas questões definidas, uma nova redação de algumas afirmações e validação do seu conteúdo.
A colaboração do painel de juízes foi determinante para a concretização da versão de teste do questionário criada para o efeito, através da plataforma google forms para uma primeira aplicação a um grupo de 6 alunos-atletas selecionados aleatoriamente de uma Escola Secundária UAARE. Nesta primeira aplicação online pretendeu-se confirmar a compreensão das questões colocadas e a operacionalização do questionário online.
Versão de teste da matriz e do questionário QUAAREpt
Após a integração de algumas sugestões identificadas pelo painel de juízes, tidas em conta pelo grupo de investigação, validou-se o seu conteúdo e desenvolveu-se o questionário, através da ferramenta digital google forms.
O questionário QUAAREpt, semi-estruturado, apresenta uma introdução que contextualiza a sua aplicação e uma declaração de consentimento informado que respeita o Regulamento Geral de Proteção de Dados (Lei nº 58/2019, de 8 de agosto) em vigor em Portugal. Neste consentimento descreve sumariamente o estudo que está a ser levado a cabo, o objetivo do estudo e apela e realça a importância da participação dos alunos-atletas. Informa os alunos-atletas do tempo previsível para o seu preenchimento e das condições da sua participação no estudo.
Na sua estrutura apresenta três tipos de perguntas, perguntas fechadas onde se solicita uma seleção de uma resposta, através de uma lista pré-estabelecida de respostas possíveis, perguntas semi-fechadas que permitem ao aluno responder, de acordo com a sua perceção pessoal. Definiu-se a escala a utilizar para a medição das variáveis em estudo, uma escala de Likert, utilizando 5 níveis de resposta: 1-Discordo totalmente; 2-Discordo parcialmente; 3-Nem concordo nem discordo; 4-Concordo parcialmente e 5-Concordo totalmente.
O questionário foi dividido em duas partes. Na primeira parte pretendeu-se caracterizar o perfil sociodemográfico dos alunos-atletas, e recolher dados como: a idade, género, ano de escolaridade, forma de integração na UAARE, contexto de residência em período de aulas, distância entre o local de residência e a UAARE, tempo de deslocação entre a residência e a UAARE, desporto praticado, número de horas de treino semanais despendidas pelos alunos-atletas, número de horas de estudo semanais despendidas pelos alunos-atletas e concelho de localização da UAARE que o aluno-atleta frequenta.
Na segunda parte pretendeu-se avaliar as três dimensões em que assenta este modelo: a dimensão da gestão desportiva (European Commission, 2012; Henriksen et al., 2020; Pardal, 2018; 2021; Portugal, 2019; Teixeira, Rijo, & Sesinando, 2022), a dimensão gestão escolar (European Commission, 2012; Henriksen et al., 2020; Pardal, 2018; 2021; Portugal, 2019) e a dimensão gestão da saúde e bem-estar, de acordo com as perceções dos alunos-atletas. (European Commission, 2012; Guidotti et al., 2015; Henriksen et al., 2020; Pardal, 2018; 2021; Portugal, 2019).
Na sua versão final o QUAAREpt apresenta um total de 52 questões: 11 questões relativas ao perfil sociodemográfico, 41 questões no total dos três instrumentos construídos para o efeito, nas três dimensões do modelo: gestão desportiva (16), gestão escolar (11), e gestão da saúde e do bem-estar (14).
O pedido de autorização do instrumento de inquirição em meio escolar foi submetido na Plataforma MIME – Sistema de Monitorização de Inquéritos em Meio Escolar, com n.º 0862800001, designação “Unidades de Apoio ao Alto Rendimento na Escola (UAARE). Modelo de Gestão e impactos nas carreiras duais”, registado a 24-12-2022 foi aprovado.
Após a aprovação da Direção Geral da Educação (DGE), as Direções dos Agrupamentos foram contactadas e informadas sobre os objetivos do estudo e foi-lhes solicitada a autorização para a realização do mesmo.
Rececionada a autorização das Direções dos Agrupamentos, o questionário foi disponibilizado aos alunos através dos professores acompanhantes ou da psicóloga da UAARE numa plataforma tecnológica, através de um link de acesso. O seu preenchimento foi em contexto individual, perante um computador que se encontrava na sala de estudo aprender mais da UAARE (SEAM), sob vigilância de um professor acompanhante ou psicólogo, ou em casa sob vigilância do Encarregado de Educação.
Todos os encarregados de educação dos alunos menores envolvidos, foram contatados previamente de modo a recolher a “Autorização para participação em estudo” por escrito para que os seus educandos fizessem parte do estudo.
A recolha de dados decorreu entre o dia 1 de fevereiro e o dia vinte e dois de março de 2023.
Toda a informação foi recolhida de forma anónima e confidencial, respeitando o Regulamento Geral de Proteção de Dados (Lei nº 58/2019, de 8 de agosto).
Análise estatística
Após a recolha de dados, foi efetuada uma análise fatorial exploratória, com extração de componentes principais e analise de confiabilidade, com recurso ao Alfa de Cronbach (α) para confirmar a estrutura subjacente e a coerência interna dos elementos da escala.
Os dados foram testados através do teste Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) em que se consideraram aceitáveis, valores entre 0,5 a 1 (Hair, Anderson, & Tatham, 1987) e do teste de esfericidade de Bartlett, de forma a verificar se poderiam ser sujeitos a uma análise fatorial exploratória (AFE).
Após confirmação, efetuou-se uma análise fatorial exploratória (AFE), com extração de componentes principais, com rotação Varimax, no software JASP (Just Another Statistical Program) para cada instrumento desenvolvido através do questionário QUAAREpt em que classificámos os fatores cujo valor próprio foi superior a 1.
Determinou-se o número de fatores a reter na solução inicial e a percentagem total de variância que esses fatores explicam.
Utilizou-se o gráfico de escarpa para confirmar os fatores iniciais a reter e a variância que esses fatores explicam. Calculou-se o Alfa de Cronbach (α) para verificar a confiabilidade das questões colocadas nos três instrumentos, para níveis de confiança de 95%. Considerou-se o valor de Alfa positivo, variando entre 0 e 1, com as seguintes leituras (Pestana & Gageiro, 2008): superior a 0,9 – consistência muito boa; entre 0,8 e 0,9 – consistência boa; entre 0,7 e 0,8 – consistência razoável; entre 0,6 e 0,7 – consistência fraca e inferior a 0,6 – inadmissível.
Verificámos a correlação entre os fatores a reter na solução inicial.
RESULTADOS
Relativamente ao instrumento referente à Gestão Desportiva, o coeficiente Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) foi 0,757 (Tabela 3), considerado um valor aceitável para uma análise fatorial exploratória.
MSA | |
---|---|
Overall MSA | 0,757 |
Q1 - Frequentares a UAARE permite conciliares a vida escolar com a vida desportiva | 0,853 |
Q3 - Na escola, a equipa UAARE (professores, psicóloga, professores da SEAM) ajuda-te a conciliar a vida escolar com a vida desportiva | 0,810 |
Q5 - No Clube, o teu “interlocutor desportivo” articula com a tua professora acompanhante para conciliares a tua vida escolar com a tua vida desportiva. | 0,836 |
Q6 - Quando integraste a UAARE assinaste um “compromisso de conciliação” com o teu encarregado de educação, o interlocutor desportivo e a escola. | 0,879 |
Q7 - A tua vida escolar já impediu que representasses o teu clube e /ou a seleção nacional num encontro ou competição. | 0,759 |
Q8 - O teu horário escolar está elaborado de modo a permitir a frequência do número de horas de treino que necessitas. | 0,758 |
Q9 - Os teus treinos são ajustados para teres mais tempo para estudar antes dos momentos das avaliações na escola. | 0,784 |
Q10 - O teu tempo de treino é suficiente para teres um bom resultado desportivo. | 0,804 |
Q13 - Estares na UAARE permite uma melhor gestão e justificação das faltas e uma recuperação eficaz das aprendizagens para representares o teu desporto. | 0,884 |
Q16 - Antes de um momento de avaliação na escola o teu rendimento desportivo diminui. | 0,651 |
Q17 - No dia de um momento de avaliação na escola o teu rendimento desportivo diminui. | 0,673 |
Q25 - Existe uma boa comunicação entre a Direção da escola, professores, treinador, tu próprio e a tua família sobre questões relacionadas com a conciliação da tua carreira escolar com a tua carreira desportiva. | 0,836 |
Q28 - Se não frequentasses uma UAARE praticarias o mesmo desporto com a mesma intensidade. | 0,512 |
Q29 - Se não frequentasses uma UAARE terias o mesmo desempenho desportivo. | 0,495 |
Q36 - Já pensaste em abandonar o desporto de alto rendimento por causa da escola. | 0,812 |
Q39 - Sentes-te satisfeito(a) enquanto aluno(a)-atleta em relação à tua prática desportiva de alto rendimento. | 0,848 |
Os resultados do teste de esfericidade (Tabela 4) sugerem que devemos rejeitar h0, aceitando que há correlação suficiente entre variáveis mostrando um indicador adequado para a realização da análise fatorial exploratória (p< 0,001).
A AFE identificou um conjunto de 5 fatores (Tabela 5), com valor próprio superior a 1, que no total explicam 47,9% de variância acumulada.
Factor Characteristics | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|
Unrotated solution | Rotated solution | |||||
SumSq. Loadings | Proportion var. | Cumulative | SumSq. Loadings | Proportion var. | Cumulative | |
Factor 1 | 3,431 | 0,214 | 0,214 | 2,651 | 0,166 | 0,166 |
Factor 2 | 1,827 | 0,114 | 0,329 | 2,210 | 0,138 | 0,304 |
Factor 3 | 1,439 | 0,090 | 0,419 | 1,445 | 0,090 | 0,394 |
Factor 4 | 0,596 | 0,037 | 0,456 | 0,930 | 0,058 | 0,452 |
Factor 5 | 0,377 | 0,024 | 0,479 | 0,416 | 0,026 | 0,478 |
O gráfico de escarpa e a curva de declividade (Figura 3) sugere que é entre os 3º e 4º fator onde se obtém os maiores ganhos de variância explicativa.
Na tabela de fatores rodados (Tabela 6), mostram-se as cargas fatoriais de cada item em cada fator. Utilizou-se a rotação Varimax, para maximizar a relação de cada item ao fator representado.
Factor 1 | Factor 2 | Factor 3 | Factor 4 | Uniqueness | |
---|---|---|---|---|---|
Q3 - Na escola, a equipa UAARE (professores, psicóloga, professores da SEAM) ajuda-te a conciliar a vida escolar com a vida desportiva. | 0,727 | 0,454 | |||
Q1 - Frequentares a UAARE permite conciliares a vida escolar com a vida desportiva. | 0,706 | 0,478 | |||
Q13 -Estares na UAARE permite uma melhor gestão e justificação das faltas e uma recuperação eficaz das aprendizagens para representares o teu desporto. | 0,650 | 0,554 | |||
Q25 - Existe uma boa comunicação entre a Direção da escola, professores, treinador, tu próprio e a tua família sobre questões relacionadas com a conciliação da tua carreira escolar com a tua carreira desportiva. | 0,582 | 0,548 | |||
Q6 - Quando integraste a UAARE assinaste um “compromisso de conciliação” com o teu encarregado de educação, o interlocutor desportivo e a escola. | 0,493 | 0,744 | |||
Q5 - No Clube, o teu “interlocutor desportivo” articula com a tua professora acompanhante para conciliares a tua vida escolar com a tua vida desportiva. | 0,431 | 0,741 | |||
Q16 - Antes de um momento de avaliação na escola o teu rendimento desportivo diminui. | 0,926 | 0,026 | |||
Q17 - No dia de um momento de avaliação na escola o teu rendimento desportivo diminui. | 0,803 | 0,320 | |||
Q36 - Já pensaste em abandonar o desporto de alto rendimento por causa da escola. | 0,613 | 0,428 | |||
Q7 - A tua vida escolar já impediu que representasses o teu clube e /ou a seleção nacional num encontro ou competição. | 0,507 | 0,644 | |||
Q28 - Se não frequentasses uma UAARE praticarias o mesmo desporto com a mesma intensidade. | 0,875 | 0,222 | |||
Q29 - Se não frequentasses uma UAARE terias o mesmo desempenho desportivo. | 0,786 | 0,374 | |||
Q9 - Os teus treinos são ajustados para teres mais tempo para estudar antes dos momentos das avaliações na escola. | 0,639 | 0,524 | |||
Q8 - O teu horário escolar está elaborado de modo a permitir a frequência do número de horas de treino que necessitas. | 0,775 | ||||
Q10 - O teu tempo de treino é suficiente para teres um bom resultado desportivo. | 0,812 | ||||
Q39 - Sentes-te satisfeito(a) enquanto aluno(a)-atleta em relação à tua prática desportiva de alto rendimento. | 0,704 | ||||
Fiabilidade interna (alfa de cronbach) | 0,773 | 0,784 | 0,809 | ------ |
O primeiro fator inclui seis itens, Q3, Q1, Q13, Q25, Q6 e Q5. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0.40), explicando 21,4% da variância. O conteúdo dos itens sugere que este fator corresponde a aspetos de “conciliação”: a existência de uma equipa UAARE (professores, psicóloga, professores da SEAM) disponível para facilitar a conciliação, frequentar a UAARE, a melhor gestão e justificação das faltas para representar o seu desporto, a recuperação das aprendizagens por motivos de ausências para representar o seu desporto, a comunicação entre os vários intervenientes no processo de conciliação (Direção da Escola, professores, treinador, o próprio aluno-atleta e a família), a existência do documento “compromisso de conciliação” e a articulação entre o “interlocutor desportivo” e a “professora acompanhante” pelo que será designado de “conciliação”. O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α), dada a natureza tipo Likert da escala de medida, sugere uma boa consistência interna deste primeiro fator (α= 0,773).
As questões Q16, Q17, Q36 e Q7 estão associadas ao fator 2 classificadas de “alto rendimento”. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0.40), explicando 11,4% da variância. Esta dimensão da gestão desportiva – alto rendimento – apresenta elevada consistência interna (α= 0,784).
As questões Q28 e Q29 estão associadas ao fator 3 classificadas de “frequentar uma UAARE”. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), explicando 9% da variância. Esta dimensão da gestão desportiva – frequentar uma UAARE – apresenta elevada consistência interna (α= 0,809)
Poder-se-ia considerar um quarto fator com a questão Q9 – “Os teus treinos são ajustados para teres mais tempo para estudar antes dos momentos das avaliações na escola”, no entanto, pelo seu conteúdo, considerou-se que estaria também relacionada com a “conciliação”, colocando-se a hipótese de ser integrada no fator 1. Este item apresenta uma carga fatorial 0,290 no primeiro fator e, quando integrado no mesmo, a consistência é de 0,775. Assim, optámos por reter este item no 1º fator, retendo 3 fatores finais nesta dimensão.
Há 3 itens, dos inicialmente formulados, que dadas as baixas cargas fatoriais, foram excluídos desta dimensão. São estes a Q8 – “O teu horário escolar está elaborado de modo a permitir a frequência do número de horas de treino que necessitas”, a Q10 – “O teu tempo de treino é suficiente para teres um bom resultado desportivo” e a Q39 – “Sentes-te satisfeito(a) enquanto aluno(a)-atleta em relação à tua prática desportiva de alto rendimento”.
Fomos observar a distribuição das respostas destes três itens, para compreender a sua exclusão. Os resultados sugerem baixa variabilidade na resposta, sendo que o item 8 apresenta uma média de 3,69, com o 1º quartil no valor 3 e o 3º quartil no valor 5. Os itens 10 e 39 apresentam ainda menor variação de resposta, com médias de resposta de 4,13± 0,911 e 4,09± 0,898), com o 1º quartil no valor 4 e o 3º quartil no valor 5.
Relativamente ao instrumento referente à Gestão Escolar, o coeficiente Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) foi 0,648 (Tabela 7), considerado um valor aceitável para uma análise fatorial exploratória.
MSA | |
---|---|
Overall MSA | 0,648 |
Q4 - Na escola, a sala SEAM, sala de estudo aprender mais ajuda-te a conciliar a vida escolar com a vida desportiva. | 0,680 |
Q11 - Faltas muitas vezes às aulas por causa dos estágios, competições ou representações nacionais. | 0,669 |
Q12 - As tuas ausências por motivos desportivos prejudicam os teus resultados escolares. | 0,693 |
Q14 - O uso de ambientes virtuais de aprendizagem para apoio individualizado síncrono e assíncrono ajudam-te na antecipação ou recuperação de conteúdos/aprendizagens dos períodos de ausência à escola. | 0,695 |
Q18 - Antes de um estágio/representação ou competição o foco na aprendizagem escolar diminui. | 0,582 |
Q19 - Durante um estágio/representação ou competição o foco na aprendizagem escolar diminui. | 0,578 |
Q20 - Durante um estágio/representação ou competição consegues antecipar ou recuperar os conteúdos correspondentes às faltas. | 0,751 |
Q22 - Tens um “Plano pedagógico individual (PPI)” de recuperação onde se faz a recuperação do teu insucesso em todas as disciplinas por motivos de ausências desportivas. | 0,735 |
Q37 - Já pensaste em abandonar a escola por causa da tua prática desportiva de alto rendimento. | 0,620 |
Q40 - Sentes-te satisfeito(a) enquanto aluno(a)-atleta em relação à escola. | 0,730 |
Pelo conteúdo das questões e face às características do modelo UAARE que frequentam, considerou-se que os alunos assumem, à partida, que as questões associadas ao horário escolar dos alunos, assim como o tempo de prática desportiva, ou a própria satisfação que sentem relativamente à sua prática desportiva, são efetivamente asseguradas e daí não apresentam valores cuja variação justifique a sua medição.
Os resultados do teste de esfericidade (Tabela 8) sugerem que devemos rejeitar h0, aceitando que há correlação suficiente entre variáveis mostrando um indicador adequado para a realização da análise fatorial exploratória (p< 0,001). A AFE identificou um conjunto de 3 fatores (Tabela 9), com valor próprio superior a 1, fatores que no total explicam 40,7% da variância acumulada.
Unrotated solution | Rotated solution | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
SumSq. Loadings | Proportion var. | Cumulative | SumSq. Loadings | Proportion var. | Cumulative | |
Factor 1 | 2,122 | 0,212 | 0,212 | 1,528 | 0,153 | 0,153 |
Factor 2 | 1,160 | 0,116 | 0,328 | 1,402 | 0,140 | 0,293 |
Factor 3 | 0,789 | 0,079 | 0,407 | 1,139 | 0,114 | 0,407 |
O gráfico de escarpa e a curva de declividade (Figura 4) sugerem que é até ao 3º fator que se obtém os maiores ganhos de variância explicativa.
Na tabela de fatores rodados (Tabela 10), mostram-se as cargas fatoriais de cada item em cada fator. Utilizou-se a rotação Varimax, para maximizar a relação de cada item ao fator representado.
Factor 1 | Factor 2 | Factor 3 | Uniqueness | |
---|---|---|---|---|
Q18 - Antes de um estágio/representação ou competição o foco na aprendizagem escolar diminui. | 0,910 | 0,111 | ||
Q19 - Durante um estágio/representação ou competição o foco na aprendizagem escolar diminui. | 0,788 | 0,318 | ||
Q14 - O uso de ambientes virtuais de aprendizagem para apoio individualizado síncrono e assíncrono ajudam-te na antecipação ou recuperação de conteúdos/aprendizagens dos períodos de ausência à escola. | 0,605 | 0,631 | ||
Q4 - Na escola, a sala SEAM, sala de estudo aprender mais ajuda-te a conciliar a vida escolar com a vida desportiva. | 0,560 | 0,686 | ||
Q40 - Sentes-te satisfeito(a) enquanto aluno(a)-atleta em relação à escola. | 0,512 | 0,726 | ||
Q22 - Tens um “Plano pedagógico individual (PPI)” de recuperação onde se faz a recuperação do teu insucesso em todas as disciplinas por motivos de ausências desportivas. | 0,477 | 0,760 | ||
Q20 - Durante um estágio/representação ou competição consegues antecipar ou recuperar os conteúdos correspondentes às faltas. | 0,411 | 0,814 | ||
Q12 - As tuas ausências por motivos desportivos prejudicam os teus resultados escolares. | 0,893 | 0,171 | ||
Q11 - Faltas muitas vezes às aulas por causa dos estágios, competições ou representações nacionais. | 0,427 | 0,778 | ||
Q37 - Já pensaste em abandonar a escola por causa da tua prática desportiva de alto rendimento. | 0,938 | |||
Fiabilidade interna (alfa de cronbach) | 0,875 | 0,632 | 0,477 | ------ |
O primeiro fator inclui 2 itens, Q18 e Q19. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), que explicam 21,2% da variância. O conteúdo dos itens sugere que este fator corresponde a um “foco na aprendizagem”. O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α), dada a natureza da escala de medida, sugere uma elevada consistência interna deste primeiro fator (α= 0,875).
As questões Q14, Q4, Q40, Q22 e Q20 constituem o 2º fator, apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), que explicam 11,6% da variância das respostas ao instrumento. O conteúdo dos itens sugere que este fator está associado à “Utilização de ferramentas de aprendizagem”. O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α,) dada a natureza tipo Likert da escala de medida, sugere uma razoável consistência interna deste segundo fator (α= 0,632).
As questões Q11 e Q12 apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), que explicam 7.8% da variância. O conteúdo dos itens levou-nos a classificar este item como “ausências às aulas”
O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α), dada a natureza tipo Likert da escala de medida, sugere uma fraca consistência interna deste terceiro fator (α= 0,477). Pela fraca confiabilidade deste fator sugerimos um estudo futuro, com reteste para aferir o comportamento do instrumento noutras medidas de confiabilidade e validade.
Há 1 item, dos inicialmente formulados, que, dada a baixa carga fatorial que apresenta foi excluído desta dimensão, a questão Q37 – “Já pensaste em abandonar a escola por causa da tua prática desportiva de alto rendimento”, não foi associada a nenhum dos fatores a reter na dimensão Gestão Escolar. Fomos observar a distribuição das respostas neste item. Os resultados sugerem uma baixa variabilidade na resposta. O item 37 apresenta uma média de 2.06, com o 1º quartil no valor 1 e o 3º quartil no valor 3.
Quando analisamos o seu conteúdo, verificamos que a questão está associada ao drop out. Segundo os indicadores de sucesso do modelo UAARE não existe neste modelo implementado em Portugal (Tabela 1).
Relativamente ao instrumento referente à Saúde e Bem-Estar, o coeficiente Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), foi 0,871 (Tabela 11), valor favorável a uma análise fatorial exploratória.
MSA | |
---|---|
Overall MSA | 0,871 |
Q2 - Frequentares a UAARE ajuda-te no teu bem-estar físico completo, mental e social. | 0,925 |
Q15 - O uso de ambientes virtuais de aprendizagem para apoio individualizado síncrono e assíncrono ajudam-te no teu bem-estar físico, mental e social. | 0,896 |
Q21 - Durante um estágio/representação ou competição tens apoio por parte da UAARE. | 0,874 |
Q23 - O teu bem-estar é afetado pelos momentos de avaliação na escola. | 0,623 |
Q24 - O teu bem-estar é afetado pelos estágios/representações, momentos de pré-competição, competição e pós-competição. | 0,613 |
Q26 - Sabes que existem apoios na UAARE que podes utilizar como o psicólogo ou o médico para te ajudar em termos de saúde (bem-estar físico completo, mental e social). | 0,784 |
Q27 - Frequentares uma UAARE permite uma melhor gestão do tempo livre de lazer. | 0,904 |
Q30 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com a família. | 0,951 |
Q31 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os professores. | 0,954 |
Q32 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os teus amigos. | 0,883 |
Q33 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os colegas de turma. | 0,894 |
Q34 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os teus treinadores. | 0,857 |
Q35 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os teus colegas de treino. | 0,858 |
Q38 - 38-Já pensaste em abandonar a carreira dual por falta de bem-estar físico, mental e social. | 0,685 |
Q41 - Sentes-te satisfeito enquanto aluno(a)-atleta em relação ao teu bem-estar físico, mental e social. | 0,838 |
Os resultados do teste de esfericidade (Tabela 12) sugerem que devemos rejeitar h0, aceitando que há correlação suficiente entre variáveis mostrando um indicador adequado para a realização da análise fatorial exploratória (p< 0,001).
A AFE identificou um conjunto de 3 fatores (Tabela 13), com valor próprio superior a 1, fatores que no total explicam 54,8% da variância acumulada.
Unrotated solution | Rotated solution | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
SumSq. Loadings | Proportion var. | Cumulative | SumSq. Loadings | Proportion var. | Cumulative | |
Factor 1 | 5,631 | 0,375 | 0,375 | 4,437 | 0,296 | 0,296 |
Factor 2 | 1,633 | 0,109 | 0,484 | 2,180 | 0,145 | 0,441 |
Factor 3 | 0,954 | 0,064 | 0,548 | 1,581 | 0,105 | 0,547 |
O gráfico de escarpa e a curva de declividade (Figura 5) sugere que é até ao 3º fator que se obtêm os maiores ganhos de variância explicativa, devendo reter-se 3 fatores.
Na tabela de fatores rodados (Tabela 14), mostram-se as cargas fatoriais de cada item em cada fator. Utilizou-se a rotação Varimax, para maximizar a relação de cada item ao fator representado.
Factor 1 | Factor 2 | Factor 3 | Uniqueness | |
---|---|---|---|---|
Q32 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os teus amigos. | 0,889 | 0,137 | ||
Q33 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os colegas de turma. | 0,869 | 0,165 | ||
Q34 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os teus treinadores. | 0,865 | 0,222 | ||
Q35 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os teus colegas de treino. | 0,860 | 0,240 | ||
Q30 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com a família. | 0,778 | 0,300 | ||
Q31 - Frequentares uma UAARE facilita a manutenção de uma boa relação com os professores. | 0,612 | 0,528 | ||
Q27 - Frequentares uma UAARE permite uma melhor gestão do tempo livre de lazer. | 0,686 | 0,432 | ||
Q2 - Frequentares a UAARE ajuda-te no teu bem-estar físico completo, mental e social. | 0,597 | 0,502 | ||
Q26 - Sabes que existem apoios na UAARE que podes utilizar como o psicólogo ou o médico para te ajudar em termos de saúde (bem-estar físico completo, mental e social). | 0,515 | 0,724 | ||
Q41 - Sentes-te satisfeito enquanto aluno(a)-atleta em relação ao teu bem-estar físico, mental e social. | 0,506 | 0,568 | ||
Q15 - O uso de ambientes virtuais de aprendizagem para apoio individualizado síncrono e assíncrono ajudam-te no teu bem-estar físico, mental e social. | 0,491 | 0,622 | ||
Q21 - Durante um estágio/representação ou competição tens apoio por parte da UAARE. | 0,433 | 0,789 | ||
Q23 - O teu bem-estar é afetado pelos momentos de avaliação na escola. | 0,773 | 0,398 | ||
Q24 - O teu bem-estar é afetado pelos estágios/representações, momentos de pré-competição, competição e pós-competição. | 0,685 | 0,523 | ||
Q38 - 38-Já pensaste em abandonar a carreira dual por falta de bem-estar físico, mental e social. | 0,571 | 0,651 | ||
Fiabilidade interna (alfa de cronbach) | 0,939 | 0,763 | 0,703 | ------ |
Note. Applied rotation method is varimax.
O primeiro fator inclui 6 itens, Q32, Q33, Q34, Q35, Q30 e Q31. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), que explicam 37,5% da variância. O conteúdo dos itens sugere que este fator está associado à “Relação com os outros”. O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α), dada a natureza tipo Likert da escala de medida, sugere uma elevada consistência interna deste primeiro fator (α= 0,939).
As questões Q27, Q2, Q26, Q41, Q15 e Q21 estão associadas ao segundo fator. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), que explicam 10,9% da variância. Pelo conteúdo dos itens classificado como “Bem-estar físico completo, mental e social”. O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α), dada a natureza tipo Likert da escala de medida, sugere uma boa consistência interna deste segundo fator (α= 0,763).
As questões Q23, Q24 e Q38 estão associadas ao terceiro fator. As questões apresentam cargas fatoriais significativas (> 0,40), que explicam 6,4% da variância. Pelo conteúdo dos itens classificados como “Ausência de bem-estar físico completo, mental e social”. O valor do teste de fiabilidade interna, utilizando o alfa de Cronbach (α), dada a natureza tipo Likert da escala de medida, sugere uma consistência interna razoável deste terceiro fator (α= 0,703).
DISCUSSÃO
Os resultados mostraram que os instrumentos desenvolvidos com base num referencial teórico exaustivo avaliavam as dimensões: Gestão Desportiva, Gestão Escolar e Saúde e Bem-estar que estão na base do modelo UAARE implementado em Portugal para permitir a conciliação da carreira dual (Portugal, 2019).
Quando se procedeu à AFE, o software agrupou na dimensão Gestão Desportiva 3 fatores a reter: a “conciliação”, “alto rendimento” e “frequentar uma UAARE”. Segundo a literatura, a existência de uma equipa multidisciplinar constituída por diferentes atores, entre eles professores, psicólogos, interlocutores desportivos, entre outros, disponíveis para facilitar a conciliação serão fatores determinantes para o sucesso da carreira dual. A comunicação entre os vários intervenientes no processo de conciliação (Direção da Escola, professores, treinador, o próprio aluno-atleta e a família), a existência de mecanismos de suporte como o documento “compromisso de conciliação” ou a articulação efetiva entre os treinos e a escola, assim como a frequência da UAARE são aspetos considerados a reter nesta dimensão da gestão desportiva (Condello, Capranica, Doupona, Varga, & Burk, 2019; European Commission, 2012; Henriksen et al., 2020; Pardal, 2018; 2021; Portugal, 2019; Teixeira et al., 2022). Nas questões colocadas, há três das inicialmente formuladas, dadas as baixas cargas fatoriais, excluídas desta dimensão: Q8 – “O teu horário escolar está elaborado de modo a permitir a frequência do número de horas de treino que necessitas”, Q10 – “O teu tempo de treino é suficiente para teres um bom resultado desportivo” e Q39 – “Sentes-te satisfeito(a) enquanto aluno(a)-atleta em relação à tua prática desportiva de alto rendimento”. Considerou-se que estas questões estão asseguradas na frequência da UAARE, uma vez que na sua regulamentação estão previstas como questões fundamentais na operacionalização do modelo (Portugal, 2019).
Na dimensão Gestão Escolar (GE) foram agrupados 3 fatores: “foco na aprendizagem”, “utilização de ferramentas de aprendizagem” e “ausências às aulas”. Salienta-se que a exigência dos sistemas educativos e desportivos nos diversos países da Europa tornam a conciliação da carreira desportiva com a carreira educativa um verdadeiro desafio, o que faz com que muitas das vezes o indivíduo tenha de optar por uma das carreiras: ou a de aluno ou a de atleta (Baron-Thiene & Alfermann, 2015; European Commission, 2012; Gustafsson, Hill, Stenling, & Wagnsson, 2015; Ryba et al., 2016; Sorkkila et al., 2017; Wylleman & Reints, 2010).
Apesar das diferentes abordagens, a União Europeia tem implementado algumas políticas que, tendo em consideração as diferenças entre os vários países, políticas e modalidades desportivas (European Commission, 2012), permitem aos alunos-atletas manter o foco no alto-rendimento e na escola ou no alto-rendimento e no trabalho (Stambulova & Wylleman, 2014).
A utilização de ferramentas de aprendizagem que procuram recuperar os conteúdos programáticos e antecipar os conteúdos devido às ausências frequentes que estes alunos-atletas estão intimamente associados à dimensão gestão escolar (European Commission, 2012; Henriksen et al., 2020; Pardal, 2018; 2021; Portugal, 2019).
Nesta dimensão, a questão Q37 – “Já pensaste em abandonar a escola por causa da tua prática desportiva de alto rendimento”, não foi associada a nenhum dos fatores a reter. Os resultados sugeriram uma baixa variabilidade na resposta, o que confirmou os indicadores de sucesso deste modelo (Tabela 1). Não existe drop out neste modelo implementado em Portugal.
Na dimensão gestão da saúde e bem-estar, foram agrupados 3 fatores: “relação com os outros”, “bem-estar físico completo, mental e social” e “ausência de bem-estar completo, mental e social”. As questões associadas à saúde e bem-estar podem, também, pôr em causa o sucesso da carreira dual, nomeadamente lesões, questões psicológicas, psicossociais, assumir responsabilidades individuais, desenvolver novos relacionamentos entre pares ou manter um relacionamento familiar, conduzindo a doenças como o stress, over training ou burnout (Baron-Thiene & Alfermann, 2015; Gustafsson et al., 2007; Ivarsson et al., 2018; Kristiansen, 2017; Ryba et al., 2016; Sheehan, Herring, & Campbell, 2018; Stambulova & Wylleman, 2015; Sorkkila et al., 2017) devem também estar asseguradas pelos modelos de conciliação implementados (European Commission, 2012; Guidotti et al., 2015; Henriksen et al., 2020; Pardal, 2018; 2021; Portugal, 2019).
Os resultados exploratórios deste estudo demonstraram que os instrumentos medem efetivamente o que se pretendia medir, no entanto, talvez a alteração da ordem das questões favorecesse uma melhor interpretação das questões. Algumas questões são semelhantes e poderão gerar dificuldade na sua interpretação ou até induzir à mesma reposta.
Os vários fatores apresentaram uma boa consistência interna entre si.
As questões colocadas nos três instrumentos apresentaram uma boa confiabilidade, demonstrando que poderão ser utilizadas, com um elevado grau de confiança, em futuras investigações sobre este modelo de conciliação da carreira dual em Portugal.
CONCLUSÕES
Os instrumentos desenvolvidos demonstraram ser ferramentas preliminares interessantes para avaliar a carreira dual na perspetiva dos alunos-atletas que a frequenta.
A analise fatorial exploratória efetuada indica-nos que os três instrumentos, Gestão Desportiva, Gestão Escolar e Saúde e Bem-Estar foram desenvolvidos com índices bastante aceitáveis de validade e fiabilidade demonstrando que poderão ser utilizados, com um elevado grau de confiança, em futuras investigações sobre este modelo de conciliação da carreira dual em Portugal.
Os vários fatores apresentaram uma boa consistência interna entre si.
As questões colocadas nos três instrumentos apresentaram uma boa confiabilidade.
O fato dos três instrumentos estarem agrupados no mesmo questionário poderá ter limitado as respostas, uma vez que estamos perante jovens, cujo tempo de concentração será diminuto. Sugerimos uma replicação de cada um dos instrumentos de forma independente, numa versão reduzida eliminando os itens problemáticos e uma posterior análise fatorial exploratória para aferição das respostas dadas nos vários instrumentos.
Estamos perante três instrumentos que poderão ser replicados para promover um maior conhecimento científico conduzir a intervenções, melhorar estruturas, modelos e processos junto das várias entidades com responsabilidades nestas matérias, nomeadamente Governos, Federações Desportivas, Clubes Desportivos entre outros intervenientes com ação direta e indireta sobre a carreira dual.