A Economia Azul tem sido priorizada por Estados e instituições multilaterais como um tema emergente aquando da conceção de estratégias ao nível das políticas públicas. Uma tal priorização baseia-se numa lógica de compatibilização entre competitividade económica e sustentabilidade ambiental, associada ao desenvolvimento dos recursos marinhos e costeiros. Em África, a importância das zonas oceânicas e costeiras é fundamental para os chamados Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (PEID), que incluem a Guiné-Bissau. A Guiné-Bissau possui uma plataforma continental alargada, que expressa a vocação marítima do país, podendo criar valor económico à volta das atividades associadas à economia marítima; neste contexto, o objetivo deste paper será o de analisar o potencial da Guiné-Bissau para a Economia Azul, com base numa análise dos setores das (1) pescas e aquacultura, (2) energia marítima e (3) turismo sustentável. Para o efeito, desenvolver-se-á como caso-de-estudo as Ilhas Bijagós, propondo recomendações para otimizar a gestão dos recursos marítimos da Guiné-Bissau.
1. Contexto socioeconómico da Guiné-Bissau
A Guiné-Bissau é um país localizado na África Ocidental, que faz fronteira com o Senegal ao norte e a Guiné ao sul e leste. A língua oficial é o português, embora o crioulo seja amplamente falado. O país tem uma população de aproximadamente 1,9 milhões de pessoas. A economia é maioritariamente baseada na agricultura, sendo a castanha de caju um dos principais produtos exportados. A pesca é também uma indústria relevante, com as Ilhas Bijagós ao largo da costa sendo um destino popular para essa prática.
Relativamente à estrutura económica do país, de acordo com dados da Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA, 2014), 14% do PIB Per Capita baseia-se em ajuda externa ao desenvolvimento, e apenas 1% do PIB corresponde a investimento estrangeiro direto. A nível de remessas, estas constituem 6% do PIB. O desenvolvimento da economia azul pode, assim, ser um nicho de mercado relevante para a Guiné-Bissau superar a necessidade de ajuda externa ao desenvolvimento.
Devido à sua estrutura geográfica e socioeconómica, a Guiné-Bissau é considerada pelas Nações Unidas como um Pequeno Estado Insular em Desenvolvimento, o qual é parte de um grupo de países caraterizados pelo seu tamanho reduzido, recursos limitados e vulnerabilidade a choques externos, como desastres naturais e mudanças climáticas. Estes países estão geralmente localizados nos trópicos e são compostos por pequenas ilhas ou áreas costeiras de baixa altitude. Os PEID enfrentam uma série de desafios únicos relacionados ao seu tamanho e isolamento, incluindo um acesso limitado aos mercados, elevados custos de transporte e falta de economias de escala. Apesar destes desafios, muitos destes países têm tradições culturais plurais e ambientes naturais únicos que os tornam destinos turísticos atraentes
No que concerne ao enquadramento da Guiné-Bissau nos PEID, este é um país com um elevado potencial para a Economia Azul, e que pode ser explorado por diversos setores, desde a energia ao turismo. Duas variáveis ajudam a explorar uma tal estratégia de desenvolvimento da Economia Azul: (1) a Guiné-Bissau ser dos Estados PEID que contém uma maior população e (2) ser o Estado PEID com a maior área geográfica.
2. Análise dos principais setores de Economia Azul na Guiné-Bissau
2.1. Área das Pescas
A Guiné-Bissau possui uma das maiores biodiversidades de espécies marinhas, explicada em parte por ter uma das maiores Zonas Económicas Exclusivas (ZEE) da região. Assim, a Guiné-Bissau tem reunidas as condições para promover um sistema de pesca sustentável, garantindo a conservação dos recursos pesqueiros e a gestão adequada das atividades pesqueiras para o benefício das comunidades locais e do país como um todo. Para tal, deve-se promover a boa governação do sector das pescas, através da melhoria do conhecimento sobre o estado dos recursos pesqueiros, o controlo das águas sob jurisdição nacional e a criação de um ambiente favorável à exportação dos produtos pesqueiros.
De modo a maximizar o potencial das pescas na Economia Azul da Guiné-Bissau, é também importante promover-se o desenvolvimento da pesca industrial, através da construção de infraestruturas adequadas, bem como de uma rede de frio e de distribuição nacional dos produtos das pescas. É ainda relevante fomentar-se o desenvolvimento da pesca artesanal e da aquacultura para garantir a segurança alimentar, promovendo a criação de empregos.
Similarmente, deve-se promover a formação contínua de quadros qualificados do setor pesqueiro, criar programas de aprendizagem ao longo da vida, e incentivar ao desenvolvimento de parcerias para implementação de programas profissionais.
De acordo com as Nações Unidas, não existe literatura específica sobre o tema da aquacultura na Guiné-Bissau, assumindo-se que não existe aquacultura neste país, devido às dificuldades logísticas de implementação das técnicas requeridas. Todavia, conhecem-se algumas iniciativas de empreendedorismo criadas por jovens nesse sentido; tais iniciativas são de grande potencial para alcançar a segurança alimentar na região.
2.2. Portos e Infraestruturas
Os portos marítimos assumem-se como infraestruturas críticas para o desenvolvimento económico, e também assumem um papel de extrema relevância na área do comércio internacional, uma vez que criam emprego, geram riqueza e contribuem para o PIB nacional. Além disto, os portos promovem a expansão das cidades costeiras, assim como as indústrias que aí se localizam. De acordo com a Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA, 2014), o transporte marítimo equivale a 80% do volume total de comércio global, demonstrando-se assim a relevância estatística desta atividade na economia global.
A expansão do comércio marítimo implica investimentos em tecnologias que permitam uma gestão eficiente dos serviços alfandegários, através da construção de portos maiores que permitam embarcações maiores. No entanto, nos países considerados como PEID, os desafios em relação a esta matéria relacionam-se com a falta de recursos económicos, que faz com que não seja possível criar portos maiores, o que conduz a uma concentração de um número elevado de barcos e serviços alfandegários em portos menores. No caso da Guiné-Bissau, existem 2 portos, os quais são de dimensões pequenas, e estão ambos localizados em contexto de rio, ao invés da costa marítima. No contexto guineense, estes portos estão mais vulneráveis ao impacto de alterações climáticas, tal como um aumento do nível das águas do mar ou uma frequência elevada de tempestades.
O Porto de Bissau tem um papel crucial na Guiné, uma vez que possibilita 80 % do total das transações do país em matéria de transações internacionais (UNECA, 2014). No entanto, o Porto apresenta necessidade de melhoria de condições, e sofre forte competitividade dos Portos dos países vizinhos, nomeadamente da Guiné e do Senegal. Aliado a estes problemas, existem também problemas a nível do fornecimento de energia, que colocam em causa a competitividade do país, e que dificultam a exportação da castanha de caju, o principal produto de exportação.
De forma a potencializar-se a logística dos transportes marítimos na Guiné-Bissau, torna-se assim necessário incentivar-se à reabilitação e melhoria dos serviços do Porto de Bissau., assim como melhorar a eficiência geral dos serviços e diminuir o tempo de espera dos navios. Outra recomendação estratégica é a de mobilizar-se recursos para a construção do Porto de Buba e do Porto de Pikil, de forma a possibilitar-se o funcionamento de uma rede de transporte marítimo nacional e regional.
2.3. Energia marítima fóssil e energias renováveis
Em relação à energia marítima, tanto a energia marítima fóssil, como as energias renováveis apresentam oportunidades estratégicas para a Guiné-Bissau. A exploração de petróleo e de gás natural pode impulsionar a economia, desde que sejam estabelecidas medidas eficazes para a proteção ambiental. Além disso, o país possui um grande potencial para a gestão de energia renovável, a partir de fontes como a energia das ondas, marés e correntes.
Têm existido iniciativas irregulares na Guiné-Bissau para explorar as reservas de gás e um número significativo de empresas internacionais têm estado envoltas nesta exploração durante os últimos 40 anos.
A nível da exploração do gás, ocorreram conflitos a nível do estabelecimento de fronteiras das zonas a explorar com o Senegal até 1995, ano no qual foi assinado um tratado de cooperação entre os dois países nesta área, e que dividiram a área a ser explorada num ratio de 85 para o Senegal e 15 para a Guiné-Bissau (UNECA, 2014).
Estudos na área das reservas do petróleo da Guiné-Bissau por empresas independentes permitiram concluir que existe um potencial significativo de exploração de petróleo com custos atrativos do ponto de vista comercial, o que poderá no futuro.
Relativamente à exploração de novas formas de energia renovável, existe um potencial de várias formas de energia, como o caso da energia eólica. Na Guiné-Bissau, apenas uma proporção pequena da população tem acesso a eletricidade pública, primariamente na capital, Bissau.
O país está completamente dependente de produtos petrolíferos, embora tenha um elevado potencial energético, principalmente em termos de poder de hidroeletricidade; a velocidade média do vento na costa e em algumas ilhas apresenta também um potencial promissor. Outra fonte de energia renovável importante é a energia obtida a partir das marés, a qual pode ser definida como energia obtida a partir da alteração dos níveis do mar. A eletricidade é produzida através da captura da energia contida no movimento da água; a obtenção de uma tal energia requer investimentos significativos, mas pode ser benéfica no longo-termo. Dos seis países considerados como PEID, apenas a Guiné-Bissau teria o potencial para um projeto energético nesta área, pois possui as melhores condições para o efeito ao longo da costa oeste africana, de acordo com a Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA, 2014).
A energia obtida a partir da força das marés é ainda amplamente desconhecida em projetos de Investigação & Desenvolvimento. Uma dificuldade adicional é que projetos com base na energia das marés representam as mesmas ameaças que grandes barragens, modificando a hidrologia e a salinidade e afetando negativamente os mamíferos marinhos da região.
2.4. O turismo na Guiné-Bissau - o caso das Ilhas Bijagós
A Guiné-Bissau é um país com grande potencialidade para um setor de turismo que possibilite funcionar como motor de crescimento da economia nacional. Tal potencialidade origina-se a partir da biodiversidade do país, assim como das suas paisagens naturais. A diversidade de paisagens costeiras, a presença de ecossistemas únicos e a rica cultura local oferecem um enorme potencial para o turismo sustentável. A Guiné-Bissau pode atrair visitantes interessados em explorar a beleza natural das ilhas e contribuir para o desenvolvimento socioeconômico do país. No entanto, a comunicação internacional associada à Guiné-Bissau como destino turístico é praticamente inexistente. Dois dos principais fatores que afetam uma potencial estratégia de turismo é a falta de uma estratégia de comunicação de imagem e a falta de infraestruturas adequadas; por outro lado, a falta de infraestruturas de transporte e de acolhimento tornam o destino dispendioso.
O Governo da Guiné-Bissau tem desenvolvido uma estratégia de expansão do setor do turismo para incluir o turismo cultural e ecoturismo. Das diversas regiões da Guiné-Bissau com potencial para a Economia Azul, destaca-se o Arquipélago das Bijagós constituído por cerca de 80 ilhas tropicais. Desde 1996 que este conjunto de ilhas é considerado uma área protegida de reserva mundial da biosfera pela UNESCO. Com uma rica biodiversidade marinha e terrestre, as Ilhas Bijagós representam o ex-líbris do capital natural da Guiné-Bissau. O desenvolvimento sustentável desta região pode ser alcançado por meio da implementação de práticas de turismo e pesca responsáveis, aliadas à conservação ambiental. O Estado deve proteger a biodiversidade das ilhas, implementando medidas de proteção dos ecossistemas marinhos, incluindo áreas protegidas de conservação marítima.
O objetivo no setor do turismo é o de tornar o Arquipélago dos Bijagós um destino de ecoturismo conhecido internacionalmente e criar as condições para o desenvolvimento de uma oferta turística de qualidade. Para tal, é importante fomentar-se a construção de infraestruturas e serviços de apoio para a oferta de um turismo de qualidade, através da construção de um hospital de referência no Arquipélago dos Bijagós, e da melhoria dos acessos via aérea e marítima às ilhas. Também seria importante assegurar-se melhores infraestruturas de transportes que permitam uma ligação mais acessível entre as diversas ilhas. Outro aspeto relevante é o de criar-se uma estratégia de comunicação que dissemine uma imagem positiva da Guiné-Bissau junto de potenciais mercados turísticos no estrangeiro.
O desenvolvimento de atividades turísticas sustentáveis, como o turismo de natureza ou o turismo de aventura, aliada ao respeito pelas tradições e culturas locais, assim como o envolvimento da comunidade local das Ilhas Bijagós pode também ser uma iniciativa relevante. A comunidade pode ser envolvida em atividades de envolvimento cívico, mas também investimento na sua formação em áreas ligadas à gestão do setor turístico.
Em síntese, as Ilhas Bijagós constituem-se enquanto o destino paradigmático para o turismo desenvolvido no âmbito da Economia Azul, devendo por isso serem protegidas e desenvolvidas.
Conclusão
A Guiné-Bissau apresenta um potencial significativo para a Economia Azul, especialmente nas Ilhas Bijagós. O país possui recursos marítimos diversificados que podem impulsionar o desenvolvimento socioeconómico de forma sustentável. É necessário estabelecer-se políticas e estratégias adequadas para otimizar a utilização prudente destes recursos. Investimentos em infraestrutura, capacitação, gestão sustentável e conservação ambiental são fundamentais para se maximizar o potencial da Economia Azul na Guiné-Bissau. Através destas medidas, o país poderá tornar-se um dos principais atores africanos nesta área e contribuir para o desenvolvimento sustentável da região.