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Comunicação e Sociedade

versão impressa ISSN 1645-2089versão On-line ISSN 2183-3575

Comunicação e Sociedade vol.42  Braga dez. 2022  Epub 25-Fev-2023

https://doi.org/10.17231/comsoc.42(2022).3981 

Artigos Temáticos

Violência Online Contra as Mulheres: Relatos a Partir da Experiência da Pandemia da COVID-19

Rita Basílio de Simõesi  ii  , Aquisição de financiamento, administração do projeto, investigação, concetualização, metodologia, curadoria dos dados, análise formal, redação do rascunho original
http://orcid.org/0000-0001-6356-6042

Inês Amarali  iii  , Metodologia, curadoria dos dados, análise formal, concetualização, redação do rascunho original, redação - revisão e edição
http://orcid.org/0000-0003-4929-4866

Sílvio Santosi  iv  , Concetualização, redação do rascunho original, redação - revisão e edição
http://orcid.org/0000-0002-6208-7311

Juliana Alcantarai  , Curadoria dos dados, redação - revisão e edição
http://orcid.org/0000-0002-1416-5194

iDepartamento de Filosofia, Comunicação e Informação, Faculdade de Letras, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal

iiInstituto de Comunicação da NOVA, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, Portugal

iiiCentro de Estudos de Comunicação e Sociedade, Instituto de Ciências Sociais, Universidade do Minho, Braga, Portugal

ivCentro de Estudos Interdisciplinares do Século XX, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal


Resumo

Depois de a pandemia de COVID-19 ter sido declarada pela Organização Mundial de Saúde em março de 2020, um conjunto de medidas sanitárias foram adotadas internacionalmente para controlar a expansão do vírus. De entre estas, os confinamentos e isolamentos tiveram como consequência a adoção generalizada de tecnologias de comunicação como mediadoras em todas as situações quotidianas que implicassem contacto físico, do trabalho ao lazer. Para além das várias situações inéditas que a pandemia trouxe, esta adoção generalizada trouxe um contexto sem precedentes no que diz respeito à violência de género online, com particular enfoque nas mulheres. Este estudo debruça-se sobre a forma como as mulheres experienciam a natureza, a prevalência e os impactos da violência online ocorrida durante a pandemia de COVID-19. Com recurso a uma análise temática crítica, esta abordagem qualitativa resultou de entrevistas em profundidade a 30 mulheres vítimas/sobreviventes de violência online durante a pandemia. Os dados permitiram identificar 10 tipos de modalidades dinâmicas e híbridas de violência online contra mulheres. Os resultados deste estudo contribuem, não só para aprofundar o conhecimento sobre este período específico, mas, sobretudo, para a solidificação e tipificação de um léxico relativo à violência online, ajudando a colmatar uma falha existente em Portugal.

Palavras-chave: violência online genderizada; comportamentos abusivos; vitimologia

Abstract

After the pandemic of COVID-19 was declared by the World Health Organization in March 2020, a set of health measures were adopted internationally to control the spread of the virus. Among these, the lockdowns and isolations resulted in the widespread adoption of communication technologies as mediators in all daily situations involving physical contact, from work to leisure. In addition to the several unprecedented conditions that the pandemic brought, this widespread adoption brought about an unparalleled context regarding online gender violence, focusing on women. This study focuses on how women experience the nature, prevalence, and impacts of online violence during the COVID-19 pandemic. By using critical thematic analysis, this qualitative approach resulted from in-depth interviews with 30 women victims/survivors of online violence during the pandemic. The data enabled the identification of 10 types of dynamic and hybrid modalities of online violence against women. The results of this study contribute to deepening the knowledge about this specific period and, above all, to the solidification and typification of a lexicon related to online violence, helping to fill an existing gap in Portugal.

Keywords: gendered online violence; abusive behavior; victimology

1. Introdução

As novas plataformas digitais que utilizamos diariamente para aceder a informação, comunicar e combater o isolamento físico podem ser altamente emancipadoras (Amaral & Simões, 2021), particularmente, durante a pandemia de COVID-19, que limitou os contactos sociais presenciais. Contudo, a natureza imprópria, tóxica, ofensiva e discriminatória dos comportamentos online colocam em evidência o papel subversivo do ambiente digital. Em particular, os padrões de violência contra as mulheres parecem intensificar-se, ao mesmo tempo que surgem novas modalidades de ofensas.

A pandemia de COVID-19 ofereceu, de certo modo, o primeiro grande teste global à digitalização. As novas plataformas, que passámos a utilizar ainda mais intensamente, muitas vezes numa relação de dependência, para aceder a informação, para comunicar, para trabalhar, para a educação, para a saúde, para combater o isolamento, revelaram-se numa dupla dimensão, enquanto solução e problema. Enquanto foram criando novos espaços tecnossociais de mitigação do isolamento, foram-se, também, intensificando enquanto espaços impróprios, tóxicos, insultuosos, ofensivos, discriminatórios, afetando desproporcionalmente as mulheres (Santos, 2022). Este é o contexto a partir do qual estudamos o problema emergente da violência e da misoginia online.

As evidências recolhidas e analisadas pelo nosso estudo apontam, primeiramente, para a necessidade de ampliar o campo conceptual da violência contra as mulheres, que não pode reduzir-se nem ao maltrato físico no espaço privado, nem ao homicídio cometido por um parceiro íntimo, nem à violência sexual no espaço público. Há já algum tempo que a violência se adaptou, migrou para o ambiente digital e tornou-se frequentemente viral. Simultaneamente, trata-se de um fenómeno cuja natureza genderizada é manifesta, indissociável das normas que sustentam a discriminação e as desigualdades de género, que sempre se adensam em contextos de crise. A violência online contra as mulheres integra o continuum de violência (Kelly, 1987) mais vasto, traduzido em comportamentos que tanto expressam como reproduzem as desigualdades de género.

Em Portugal, não existe um quadro linguístico e cultural comum ao qual recorrer em busca de conhecimentos sobre como nomear, definir e interpretar o que acontece quando as mulheres são alvo de comentários de ódio sexista, retórica misógina, ataques insultuosos recorrentes. O nosso estudo deu bem conta da falta de reconhecimento de comportamentos abusivos online, incluindo a falta de consciencialização da condição de vítima e/ou sobrevivente. A sua pertinência é ainda reafirmada pela própria escassez de dados referentes ao contexto analisado.

Assim, este artigo tem como objetivos conhecer a prevalência, a natureza e o impacto da violência online contra as mulheres durante a pandemia de COVID-19 a partir de uma estratégia metodológica qualitativa, com recurso a 30 entrevistas semiestruturadas em profundidade a mulheres vítimas/sobreviventes de violência online durante esse mesmo período. Neste sentido, a questão de investigação que norteia este estudo empírico é a seguinte: como é que as mulheres vítimas/sobreviventes experienciam a natureza, a prevalência e os impactos da violência online ocorrida durante a pandemia de COVID-19?

O quadro teórico que sustenta este estudo tem dois eixos que se erguem na linha dos estudos feministas da ciência e da tecnologia: a centralidade do uso das plataformas online durante a pandemia e os diversos impactos que esse uso teve no desenvolvimento destas formas de violência. É para uma compreensão mais densa e para uma delimitação mais clara deste contexto ainda por explorar que este trabalho pretende contribuir, partindo para isso de um posicionamento crítico sobre a forma como a internet é um espaço de reprodução e expansão de dinâmicas misóginas offline.

2. Género e Tecnologia

Quase 30 anos decorreram desde que Cynthia Cockburn e Susan Ormrod (1993, p. 1) encapsularam a relação entre género e tecnologia na imagem da mulher automobilista que faz duas tentativas para estacionar, uma situação que implica questões materiais, representações e significados, e que, em última instância, cria uma hierarquia de género face ao aparente domínio da tecnologia. A tecnologia é sempre situada em contextos temporais e espaciais, o que conduz a uma mudança constante no estudo destas dinâmicas materiais e simbólicas. Com efeito, muito mudou em 30 anos. Não obstante, muitas estruturas de poder permanecem no tecido social, tal como este artigo pretende reforçar.

A relação entre género e tecnologia emergiu e estabeleceu-se como campo das ciências sociais no último quartel do século XX. Em lugar central, ainda nos anos 70, adotava-se um foco determinista nos efeitos, particularmente, na tecnologia doméstica e em como os avanços nessa área não tinham permitido à mulher passar menos tempo afastada das tarefas domésticas (Wajcman, 2000, p. 449).

Os anos seguintes contribuem para um deslocamento deste foco, que passaria a implicar um horizonte de maior reciprocidade entre tecnologia e género. Como marco dessa evolução, a partir da década de 80, foi ganhando lugar na literatura uma perceção de que “ideias e artefactos [tecnológicos] são construções sociais, o resultado da negociação entre atores sociais, tanto de indivíduos como de grupos” (Cockburn & Ormrod, 1993, p. 9). As perspetivas teóricas construtivistas, surgidas no final dos anos 80 assumem, precisamente, esse processo de influência mútua entre sociedade e tecnologia. Consequentemente, podemos aprofundar as nossas visões relacionadas com o género através do seu estudo sob o ponto de vista da tecnologia e vice-versa. Ou, como escreveu Cynthia Cockburn (1992), “a tecnologia permeia a identidade de género e ( … ) a própria tecnologia não pode ser bem compreendida sem referência ao género” (p. 29). É nesse contexto dialético que se fala de “coprodução” (Bray, 2007).

Se nos anos 70 muitos estudos feministas traduziam um posicionamento particularmente pessimista acerca do potencial que a tecnologia poderia ter para a igualdade de género, como explica Wajcman (2000, p. 450), os tecno-otimistas que, na passagem do milénio, antecipavam um admirável mundo novo trazido pela internet, situavam-se nos seus antípodas, dando origem a um ciberfeminismo que assumia a tecnologia como meio de empoderamento das mulheres (Wajcman, 2000, p. 460). Porém, fora deste movimento de ciberfeminismo, as obras de referência sobre a nova sociedade da informação pouca ou nenhuma sensibilidade em relação às questões de género aportavam (Corneliussen, 2012; Wajcman, 2000).

Na viragem do milénio a presença dos computadores tinha explodido nos mais diversos contextos. Neste período, o principal desafio,

não era tornar as mulheres interessadas nos computadores, mas garantir que as suas relações com a tecnologia não eram constantemente minadas por imagens de feminilidade, por um lado, ou, por outro, pelas imagens das relações dos homens com a tecnologia. (Corneliussen, 2012, 169)

Esta explosão do uso do computador acabou por ser um dos primeiros e mais decisivos passos em direção aos ambientes virtuais e à permanente conectividade, com todas as implicações que as novas dinâmicas tecnosossocias trouxeram para a perceção e construção da identidade, do corpo e das relações pessoais. Tal como é enfatizado por Wajcman (2000), os trabalhos de Donna Haraway, Sherry Turkle e Allucquere Stone são fundamentais nesse período para perceber como a tecnologia prometia desafiar as expressões e práticas de intimidade, o desejo e as próprias noções de identidade de género: “o ciberespaço fornece-nos novas possibilidades de escolha de uma identidade de género que não depende do corpo material” (p. 459).

Tendo caminhado para um quotidiano permanentemente conectado, no âmbito da pesquisa social germinaram novas perspetivas críticas sobre o uso das tecnologias e dos novos fluxos comunicacionais, das relações de poder e de género. Num apenas aparente paradoxo, a internet, embora também possa ser um espaço promotor de igualdades, não deixa de ser um espelho do passado, isto é, apesar das possibilidades e do espaço que permite ao “feminismo de quarta vaga, essa tecnologia também se presta a comportamentos que constituíam preocupações da segunda vaga feminista: a violência de género” (Walklate, 2017, p. x).

O estudo da violência de género no contexto online demorou algum tempo a sobressair na investigação, devido ao foco nos impactos positivos da internet. No entanto, esse campo tem ganho grande visibilidade nos últimos anos (Pavan, 2017). É nesse sentido que esta dialética entre tecnologia e género que subjaz ao estudo da violência online sobre as mulheres, permite, também, reposicionar a própria visão mainstream sobre a cultura participativa (Jenkins, 2009):

não é que os indivíduos tenham deixado de participar, de criar ou de partilhar; o que estamos a perceber é que tais ações não são necessariamente encorajadoras de um maior envolvimento, em geral, com o mundo, nem são inerentemente mais democráticas ou contribuem para um futuro mais justo e pacífico. (Massanari, 2015, p. 167)

3. A Mediação Tecnológica da Violência

Partindo desta tradição dos estudos feministas sobre tecnologia, a estrutura teórica que suporta este estudo tem duas dimensões prevalentes. Por um lado, as especificidades da mediação tecnológica durante o período pandémico; por outro, as particularidades do contexto online como espaço de continuidade das dinâmicas de violência existentes offline.

Apesar da repentina eclosão de uma guerra na Europa, no início de 2022, ter vindo aniquilar um certo alívio emocional pelo qual se vinha ansiando durante a pandemia, as pessoas estão, paulatinamente, a experimentar um retorno a uma vida com menos restrições. A pandemia foi declarada em março de 2020, precisamente o mês em que, em Portugal, foi decretado o primeiro de vários confinamentos e restrições sociais obrigatórias. Globalmente, a 17 de março de 2022, a Organização Mundial de Saúde registava mais de 6.000.000 de mortes por COVID-19 (um pouco mais de 21.000 em Portugal) e mais de 10.000.000.000 de vacinas administradas (em Portugal 90% com vacinação completa, 60% com reforço; World Health Organization, s.d.).

A experiência da pandemia pode ser considerada um momento de viragem em vários domínios, e em particular em relação ao uso da tecnologia, sobretudo pela magnitude do que aconteceu e das questões que se levantaram.

Globalmente, a tecnologia tornou-se um meio para quase tudo, devido à impossibilidade do contacto físico e das deslocações. A televisão e as fontes online foram significativamente mais utilizadas, contrastando com os jornais, que dependiam da distribuição física (Newman et al., 2020). Meios online, especialmente plataformas sociais, tornaram-se numa fonte preferencial de informações (verdadeiras, falsas ou enganosas), produzidas e espalhadas em quantidades sem precedentes, impactando a formação de discursos globais (Cinelli et al., 2020). As aulas remotas foram amplamente adotadas para mitigar as consequências do encerramento temporário e repetido das escolas em todo o mundo (Garbe et al., 2020; Morgan, 2020). O teletrabalho tornou-se mandatório em vários momentos durante a pandemia, garantindo o necessário distanciamento social e a possibilidade de continuidade das atividades económicas (Belzunegui-Eraso & Erro-Garcés, 2020). As compras online cresceram exponencialmente e as pessoas foram obrigadas a adotar novos comportamentos (Eger et al., 2021). A própria telemedicina foi implementada rapidamente em vários contextos (Wosik et al., 2020). Este período de dependência tecnológica e omnipresença dos ecrãs no quotidiano foi o primeiro vislumbre do que Anderson e colegas chamam de “tele-tudo”, para designar um possível futuro próximo (Anderson et al., 2021).

O uso das plataformas sociais online já era intenso antes da pandemia. Numa primeira abordagem, estas redes são vistas como formas de ultrapassar barreiras espacio-temporais e de responder aos constrangimentos e danos que as vidas intensas provocam nas relações estabelecidas offline (Antoci et al., 2015). No entanto, o período da pandemia, veio alterar esta dinâmica, ao impedir os contactos sociais offline. Neste período, o uso das plataformas sociais teve um aumento enorme (Newman et al., 2020). Singh et al. (2020) refere-se mesmo a um “uso compulsivo de redes sociais online”, em que “o excesso de engajamento” se tornou uma “necessidade psicológica, ao ajudar as pessoas a atender às suas necessidades de interação humana e a lidar com a pandemia” (p. 1). Assim, num primeiro nível, o uso das plataformas sociais durante a pandemia pode ser entendido a partir de uma real necessidade de combater o isolamento social e de se relacionar, interagir e pertencer. Vale a pena convocar a própria teoria de Maslow (1987), que explicava como a existência de necessidades emocionais, quando por satisfazer, era dominante e conduzia ao comportamento que procurava a estabilidade.

No entanto, como mostra o estudo de Boursier et al. (2020, p. 1) a exposição prolongada também aumentou a ansiedade em muitos casos, criando um ciclo difícil de quebrar. Esta dicotomia é, a vários níveis, prevalente nos resultados dos estudos dos impactos do uso das redes sociais. Há sempre enquadramentos complexos, nos quais é preciso ter em conta fatores socioeconómicos e culturais (Bekalu et al., 2019), e onde, inevitavelmente, se identificam simultaneamente virtudes e perigos (Allen et al., 2014; Radovic et al., 2017, entre outros). Os efeitos na saúde mental constituem uma das áreas mais prolíficas, sendo a pesquisa sobre os efeitos dos comportamentos aditivos bastante explorada (Hou et al., 2019; Marino et al., 2018). Não sendo inédita a abordagem, especificamente, durante a pandemia, os pesquisadores mostraram uma associação entre exposição nas redes sociais e saúde mental (Zhang et al., 2021).

A outra linha de pesquisa que é fundamental para o enquadramento deste estudo é a que se debruça, precisamente, sobre os meios online enquanto espaços de violência, particularmente, sobre mulheres, e da perpetuação de desigualdades de género. É nossa convicção, tal como anteriormente referido, que a violência online sobre as mulheres é parte desse mais amplo continuum de violência e subjugação (Kelly, 1987).

Esta não é uma realidade nova, como mostram o trabalho de Barak (2005) sobre assédio online, ou o de Filipovic (2007), sobre a forma como o contexto online das bloggers reproduzia uma dinâmica estrutural. No entanto, só muito mais recentemente, com a omnipresença das redes sociais no quotidiano, esta área se tornou mais prolífica na academia.

Aquando do seu surgimento, a internet trouxe consigo um conjunto de ideias associadas à sua essência livre e aberta, como igualdade, participação e emancipação. Não obstante, os ambientes online não se desenvolveram exclusivamente como fóruns deliberativos promotores da democracia, na linha do que Dahlberg (2001) referia. O trabalho seminal de Papacharissi (2004) acerca da incivility (ou incivilidade) online, um conceito plurissignificante que abarca variadas manifestações, assenta, precisamente, nesse atentado contra os valores nucleares da democracia. Nesta esfera, são incluídos quaisquer comportamentos que, de alguma forma, contribuam para o afastamento das mulheres desse espaço deliberativo, uma vez que o que está aqui em causa são as reais possibilidades de participar e intervir significativamente num espaço sem quaisquer tipos de constrangimentos ou receios (Santos, 2022). Porém, há algum tempo que a internet não é assim. Em 2016, a revista Wired escrevia coletivamente uma carta à internet, precisamente, dizendo que estava na hora de acabar com a dinâmica que se havia gerado nessas 2 décadas: “tu deverias ser o desabrochar de um milhão de vozes. Juntos, íamos democratizar o acesso à informação. Porém alguns dos teus utilizadores tomaram essa liberdade como uma licença para vitimar os outros” (Wired Staff, 2016, para. 2). A chamada à ação feita pela Wired tinha como destinatárias as grandes corporações, uma vez que o discurso oficial e as práticas das plataformas, no que diz respeito às consequências sobre os perpetradores, não são coincidentes. Em rigor, embora as empresas afirmem que tomam muito a sério estas situações de abuso online sobre mulheres (Wired Staff, 2016), há evidências que confirmam que isso nem sempre acontece. Um estudo do Center for Countering Digital Hate (2022), realizado em novembro de 2021, identificou 288 contas que tinham difundido conteúdo misógino ofensivo e violento dirigido a várias mulheres com notoriedade pública. Após 2 meses da denúncia comunicada ao Twitter pelo Center for Countering Digital Hate (2022), 88% destas contas continuavam ativas. Uma análise mais recente a esse segundo grupo dava conta de que cerca de metade dessas contas não bloqueadas inicialmente pelo Twitter, tinham reincidido. Noutra escala, a experiência de Marianna Spring (2021), a principal especialista da BBC em desinformação, é idêntica, após ter denunciado ao Facebook as ameaças que recebia enquanto produzia um documentário sobre o tema. Porém, esta é uma leitura que não passa despercebida às pessoas, que têm consciência disso e são críticas em relação a esta atitude das plataformas, como mostra o estudo do Pew Research Center, referente à realidade norte-americana (Vogels, 2021, p. 5).

Este mesmo estudo fornece um conjunto de resultados que ajudam a tornar concreto o que se passa nos espaços online (particularmente, nas redes sociais), enquanto espaços de violência. Em primeiro lugar, deve referir-se que a percentagem de cidadãos norte-americanos que experienciou qualquer tipo de abuso online não aumentou nos últimos 4 anos, mantendo-se em cerca de 40%. O que se alterou foi a gravidade e a intensidade das situações (Vogels, 2021, p. 4), o que implica outra leitura dos dados: nas categorias mais severas de abuso, as ameaças físicas, a perseguição, o assédio prolongado e o assédio sexual houve uma duplicação de pessoas a reportar terem vivido estas situações desde o estudo realizado em 2014.

O estudo do Pew Research Center (Vogels, 2021), tal como outros, mostra que esta é uma realidade vivida por homens e mulheres. Porém, os resultados também mostram, inequivocamente, que o tipo de violência sofrida é diferente entre géneros: os homens reportam mais frequentemente serem insultados ou fisicamente ameaçados, enquanto as mulheres afirmam ser mais assediadas sexualmente ou perseguidas. Aliás, isso é particularmente evidente nas mulheres mais jovens: um terço das mulheres com menos de 35 anos afirmou ter sido sexualmente assediada online. Estudos mais amplos, porém, desvelam números mais preocupantes: o da Plan International (2020), que cobriu 31 países, tem resultados que dão conta de que mais de metade das jovens (15-25 anos) já sofreu uma situação destas online. O estudo da Amnistia Internacional (Amnesty International, 2017), que envolveu a Dinamarca, a Itália, a Nova Zelândia, a Polónia, a Espanha, a Suécia, o Reino Unido e os Estados Unidos aponta para quase um quarto da amostra (23%), embora o seu grupo etário seja mais amplo (18-55; Amnesty International, 2017).

O manejo das estatísticas pode ser enganoso e, por vezes, estéril, uma vez que há estudos feitos nos mais diversos contextos socioculturais e com os mais diversos desenhos metodológicos. Nesse sentido, é imperativo prosseguir para uma sistematização que possa solidificar quadros de referência para o enquadramento dos resultados.

Institucionalmente, para além das respetivas legislações de cada país e do contributo de diversas organizações não governamentais, encontra-se um enquadramento internacional relevante para estas questões de violência de género através de convenções e resoluções do Conselho da Europa, Nações Unidas e União Europeia, entre muitas outras organizações.

Não obstante, quando nos debruçamos sobre esta realidade, percebemos que não há uma delimitação conceptual estável sobre o que é a violência de género online. Ging e Siapera (2018) abordam esta multiplicidade de situações sob a cobertura mais ampla do conceito de misoginia online, para enfatizar a dimensão cultural do que vai para lá da violência. Aqui, também pretendemos ir para além de qualquer delimitação de ordem legal e, nesse sentido, tal como Amaral e Simões (2021), assumimos que a “violência de género online” abarca um conjunto de manifestações negativas diversas (por vezes até sobreponíveis ou relacionadas) e é, por norma, usada na mesma aceção que outras referências, como abuso online, sendo também enquadrada, por vezes, pela própria esfera da “incivilidade”. Não cabendo neste artigo discutir essas especificidades, assumimos aqui no âmbito da violência ou do abuso online uma série de manifestações diversas, como por exemplo: difamação, falsidade, revenge porn (pornografia de vingança), sextortion (extorsão sexual), doxing (divulgação não autorizada de informações privadas), mensagens sexuais indesejadas, abordagens ofensivas, ameaças, várias formas de discurso odioso, insulto, humilhação, stalking (perseguição), o assédio prolongado, formas de objetificação (Nussbaum, 1995) ou formas verbais passivas (Barak, 2005). Estas práticas, isolada ou articuladamente, refletem uma condição sistémica baseada na descriminação de género.

Para além da enumeração, da qual podem, inadvertidamente, ficar de fora algumas formas, importa aqui considerar duas dimensões, tal como Nadim e Fladmoe (2021) fazem: a primeira compreende o nível de agressividade, que é variável e que pode ir desde “chamar nomes”, a uma ameaça concreta ou comentário odioso; ao passo que a segunda se refere ao alvo do comentário, isto é, ao alvo a que a mensagem se dirige, o que pode ir desde a pessoa singular ao grupo ou ao seu pensamento ou atitude (p. 248). Esta sistematização conduz a uma distinção entre os comentários dirigidos à pessoa (ao que ela é e às suas características) e os que são dirigidos ao que ela pensa ou defende (Nadim & Fladmoe, 2021, p. 248).

Quando a violência online é dirigida a “quem” as pessoas são (quer grupal quer individualmente), a possibilidade de isso resultar num silenciamento é maior do que quando se dirigem ao que elas “pensam”, e este processo é mais evidente nas mulheres (Nadim & Fladmoe, 2021, p. 255). Ora, como mostra o estudo da Amnistia Internacional (Amnesty International, 2017), essa é uma realidade muito comum: 58% das respondentes que tinham sido alvo de assédio online, disseram que havia incluído, racismo, sexismo, homofobia ou transfobia.

Os impactos psicológicos estão identificados e são significativamente mencionados nos vários estudos disponíveis: ansiedade, depressão, ataques de pânico, baixa autoestima e falta de confiança, problemas de sono, incapacidade de concentração, medo, desconforto e insegurança, sentimentos de culpa, vergonha, vulnerabilidade na interação online (Amnesty International, 2017; Plan International, 2020). Em última instância, há um processo de silenciamento, de corrosão de princípios nucleares democráticos e de igualdade: mais de três quartos das mulheres que sofreram situações destas, no estudo da Amnistia Internacional (Amnesty International, 2017), reportaram que mudaram a sua forma de usar as plataformas online, cerca de um terço das mulheres desse grupo deixou de publicar conteúdo que expressasse opinião em determinados tópicos. Este processo de silenciamento é bem explicado por Megarry (2014, p. 46), clarifica como a igualdade não é atingida apenas através de matemática: a igualdade online não depende apenas da possibilidade de ocupar espaço, mas sim de ser capaz de participar em igual medida, de expressar sem medo de ameaças ou violência.

Para este estudo, importa, pois, caracterizar o contexto específico que ocorreu durante a pandemia, com referência a: (a) um aumento do uso de aplicações e redes sociais para a maioria (senão a totalidade) da promoção de contactos pessoais; (b) o uso de plataformas de mediação tecnológica para a manutenção e desenvolvimento de atividades profissionais devido às limitações sociais e profissionais decorrentes dos confinamentos; (c) a excecionalidade de uma situação de calamidade pública, com potenciais impactos emocionais exacerbados pelo prolongamento das medidas, pelos confinamentos obrigatórios, pela imprevisibilidade da situação e pela própria “infodemia”, que grassou pelas redes.

No contexto online, há registo de um aumento das situações de violência de género, durante estes cerca de 2 anos (Berger, 2021). A violência online, enquanto extensão das relações sistémicas de desigualdade de género, reflete, pois, um aumento de situações de violência de género durante a pandemia de COVID-19 (Mittal & Singh, 2020), nomeadamente, violência doméstica (Piquero et al., 2021). Não obstante este pano de fundo, a necessária caracterização do contexto português durante este período não se afigura fácil, uma vez que não existem, à data, indicadores quantitativos sistematizados que respondam à especificidade deste estudo. O contexto é, ainda, construído sobre dados coligidos, parcelarmente, a partir de vários relatórios.

Dados publicados recentemente confirmam que a perceção generalizada é, de facto, a de que a pandemia levou a um aumento da violência física e emocional sobre as mulheres, durante a pandemia. O eurobarómetro do Parlamento Europeu (European Parliament., 2022) mostra que 90% das mulheres em Portugal partilham esta perceção, superando a média europeia, que é de 77%. Especificamente, em Portugal, o recurso a dados quantitativos com expressão estatística é possibilitado pelos relatórios de Segurança Interna, cujas edições mais recentes dão conta de que as ocorrências de violência doméstica registadas pelas forças de segurança em 2020 diminuíram 6,3% em relação ao ano anterior (Sistema de Segurança Interna, 2021) e 4% em 2021, totalizando 26.520 ocorrências nesse ano1 (Sistema de Segurança Interna, 2022). A diminuição de queixas por violência doméstica junto das forças de segurança durante os meses em que vigorou o estado de emergência tem sido explicada pelas várias limitações impostas à mobilidade individual, uma vez que se registou um aumento após o final desse período. A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima tem, ainda, destacado um outro aspeto relevante que ocorreu durante os confinamentos e que os dados das forças policiais não discriminam: o aumento da violência psicológica (Neves, 2021).

Com uma dimensão de género muito vincada, os crimes contra a liberdade e auto-determinação sexual são importantes para este contexto. Aqui se incluem diversas tipologias, entre as quais coação e importunação sexual ou violação. No entanto, não existem dados quantitativos nos relatórios de Segurança Interna que permitam caracterizar as tendências dos últimos anos. Os dados do Centro Nacional de Cibersegurança não estão, igualmente, sistematizados de forma a responder a este contexto específico.

Embora os dados da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima não traduzam números totais do território, a associação tem uma expressividade social e geográfica que valida a sua inclusão. A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (2021) registou um aumento de pedidos de ajuda em 2020 (quando comparados com os do ano anterior). Do total de pedidos de ajuda, 87% foram no contexto da violência doméstica, 61% dos quais em relações de intimidade, sobretudo registando-se ameaças, coação, injúrias e ofensas à integridade física. Os restantes 13% dos pedidos, referentes ao contexto não doméstico, registam entre outros crimes de violência contra mulheres, insultos e crimes sexuais.

Embora tenham existido planos de contingência e intervenção para a pandemia nos mais diversos agentes, o foco aqui é apontado para as respostas institucionais referentes a este período. Destacam-se, aqui, medidas legislativas, como a inclusão das situações de deslocação e circulação durante os estados de emergência e calamidade para o acolhimento de vítimas. Houve ainda uma classificação dos serviços de atendimento e apoio a vítimas como serviços essenciais, o que permitiu um enquadramento de apoio aos e aos/às funcionários/as. Outras respostas incluíram a abertura de estruturas temporárias de acolhimento de emergência e a adoção de planos de contingência no âmbito do apoio à violência doméstica, que passaram pela implementação e reforço de meios remotos de denúncia, apoio e gestão. A Comissão para Igualdade de Género criou, para juntar ao serviço telefónico permanente já existente, um novo endereço eletrónico (violencia.covid@cig.gov.pt) e uma linha SMS 3060, gratuita e confidencial. Foi lançada a App BrightSky, com informações diversas, uma ferramenta de perceção de risco e uma funcionalidade covert mode. Foi também centralizada online a gestão de vagas de acolhimento de vítimas, o que permitiu uma gestão mais ágil dos processos (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2020). Em junho de 2021 foi lançado o Plano de Reforço de Prevenção e Combate à Violência Doméstica, com reforço de campanhas de divulgação, reforço de contactos junto de vítimas sinalizadas e a disponibilização de novas ferramentas para as forças policiais e agentes especializados. Embora não tenha sido uma resposta impulsionada pelo contexto da pandemia, importa mencionar que durante este período começaram a tomar forma várias ações resultantes da aprovação pelo Conselho de Ministros, de uma resolução (n.º 139/2019), e que incluíam, entre outros aspetos formação das forças de segurança, aperfeiçoamento das medidas de proteção e tratamento de dados. Esta resolução teve origem nas “recomendações apresentadas pela Comissão Técnica Multidisciplinar criada em março, após o elevado número de homicídios em contexto de violência doméstica no início deste ano” (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, 2019, para. 2).

4. Metodologia e Questões Críticas

Este estudo enquadra-se num projeto mais amplo cujos objetivos são (a) produzir conhecimento sobre uma temática emergente e muito pouco estudada em Portugal, nomeadamente para conhecer a prevalência, a natureza e o impacto da violência online contra as mulheres durante a pandemia de COVID-19, mapeando as experiências e perceções dessas práticas; (b) promover no terreno a igualdade de género, com ações que sensibilizem para o uso responsável dos média e das tecnologias digitais; e (c) contribuir para orientar as respostas sociais e institucionais dirigidas quer à prevenção quer ao combate à violência e à misoginia em contexto digital. Decorrente destes objetivos, neste artigo procuramos responder à seguinte questão de investigação: como é que as mulheres vítimas/sobreviventes experienciam a natureza, a prevalência e os impactos da violência online ocorrida durante a pandemia de COVID-19?

4.1. Questões Críticas em Tempos Pandémicos: Desafios da Investigação da Violência Online Contra as Mulheres Durante a Crise de COVID-19

Fazer investigação vitimológica durante a pandemia de COVID-19 irá sem dúvida marcar as investigadoras e os investigadores mais experientes. É claro que o trabalho de campo que se concentra em experiências dolorosas é sempre complicado para quem relata essas experiências e para quem as investiga. No entanto, as medidas de isolamento para conter a pandemia de COVID-19 tiveram e têm um impacto complexo e significativo, tanto sobre quem é investigado como sobre quem investiga. Este é sem dúvida o caso, quando se estuda através de métodos qualitativos a violência online contra as mulheres, que se tornou uma pandemia dentro da pandemia de COVID-19.

Neste estudo realizámos entrevistas aprofundadas para compreender como as mulheres visadas por práticas online nocivas durante a pandemia de COVID-19 dão sentido a estas práticas. Passámos vários meses a tentar reunir voluntárias dispostas a participar num projeto de investigação baseado num método de recolha de dados pessoais. Posteriormente, durante cerca de 6 meses, realizámos 30 entrevistas semiestruturadas de 1 hora com vítimas/sobreviventes de violência online, utilizando aplicações de video-conferência. Todas as entrevistas formais foram gravadas, centrando-se nos contextos das participantes, natureza das experiências nocivas vividas, os seus impactos e perceções das suas consequências sociais.

As questões práticas, éticas e jurídicas enfrentadas na adaptação do trabalho de campo à investigação digital foram desafios essenciais. No entanto, também enfrentámos problemas únicos no que respeita à identificação das vítimas com as suas experiências negativas, enquanto alvos de comportamentos desviantes pouco conhecidos em tempos pandémicos. Centenas de interações e conversas informais, principalmente através de redes sociais e plataformas de mensagens instantâneas, precederam estas entrevistas para encontrar potenciais voluntárias: mulheres com 18 anos ou mais anos, residentes em Portugal durante a pandemia e com um historial de experiências negativas online. Estes contactos informais serviram para descrever como se processariam as entrevistas e a compensação não financeira de participação no estudo, nomeadamente contribuindo para uma investigação centrada num problema social emergente.

Em particular, a metodologia qualitativa do projeto, com inquestionável valor na captação das experiências quotidianas das pessoas, é responsável por várias das dificuldades que enfrentámos. Em Portugal, não existe um quadro linguístico e cultural comum a que se possa recorrer em busca de ideias sobre como nomear, definir e interpretar o que acontece quando as mulheres são alvo de comentários de ódio sexista, retórica misógina, abusos ou ameaças de homicídio na rede. Assim, a falta de reconhecimento de comportamentos abusivos em ambientes digitais, incluindo a falta de auto compreensão de ser vítima deles, foi um obstáculo por vezes difícil de ultrapassar. Durante as entrevistas também vimos sobreviventes a lutar para colocar em palavras situações de grande sofrimento não desligadas de questões reconhecidamente mais amplas, mas, ainda assim, distantes da conversa pública e dos imaginários culturais com os quais todos e todas nós fazemos sentido da realidade.

Além disso, ainda que a tecnologia esteja a tornar possível fazer trabalho de campo em tempo real e manter conversas interativas, apesar das exigências de distância social, não favorece as expressões empáticas das investigadoras e dos investigadores para amenizar os riscos de as participantes sentirem emoções negativas. Notavelmente, com a utilização cada vez maior das tecnologias digitais em resposta às medidas de confinamento decretadas pelo governo, continua a não haver qualquer discussão sobre a vaga de questões críticas relacionadas com a tecnologia, que veio consubstanciar novas relações sociais e políticas, aumentando frequentemente o fardo dos grupos mais vulneráveis.

Recordar experiências dolorosas pode causar sofrimento. Acreditamos que foi, principalmente, por isso que muitas voluntárias nos deixaram à espera em vão, sem qualquer justificação, nas videoconferências agendadas. Noutras ocasiões, a justificação veio com o arrependimento de a participante ter consentido a entrevista, ao perceber como a verbalização do que aconteceu a faria reviver o que ela apenas queria esquecer. A ética padrão da investigação, tal como a garantia de que as participantes estavam no controlo e podiam parar a sua participação, visava proteger as sobreviventes. No entanto, há provas de que as sobreviventes que participam em métodos de recolha de dados não anónimos podem beneficiar emocionalmente da partilha das suas histórias (Campbell et al., 2004). Notavelmente, captar as histórias daquelas que sofrem de comportamentos desviantes é uma forma de lhes dar voz e de moldar a questão a ser estudada nos seus próprios termos.

Finalmente, as entrevistas foram também emotivas para a equipa do projeto. Não foi fácil proporcionar às participantes a oportunidade de introduzir tópicos e ideias impactantes quando ouvimos falar: “comecei a mutilar-me a mim própria porque era muito para mim. Queria outro tipo de dor para deixar de sentir o que estava a sentir”. Tivemos dificuldade em assistir às narrativas pessoais das experiências ainda frescas e prejudiciais sem parecermos demasiado condescendentes. Além disso, dadas as limitações pessoais e profissionais decorrentes da pandemia, nem sempre foi possível ter mais do que um(a) investigador(a) para cada entrevista com quem se falasse das emoções sentidas a partir das histórias contadas.

A pandemia de COVID-19 teve e continua a ter impacto na forma como conduzimos a investigação, exigindo velhas preocupações com a participação das sobreviventes do trauma e requerendo novas reflexões éticas relativamente ao consentimento informado e reflexividade, para abordar objetos num contexto de profunda mediatização (Couldry & Hepp, 2018).

4.2. Estratégia Metodológica

A estratégia metodológica mobilizada neste trabalho está ancorada à abordagem fenomenológica feminista (Butler, 1988; De Beauvoir, 1949/2014) e articulada com uma nova perspetiva materialista feminista (Haraway, 2006; Lupton, 2019). Neste sentido, partimos da ideia do ser mulher e da sua estrutura histórica, considerando o seu lugar de fala em múltiplas dimensões que não se focam exclusivamente na biologia. Numa lógica fenomenológica feminista, considerámos as experiências vividas como genderizadas e não neutras articulando-as com a nova perspetiva materialista feminista que sustenta que a dinâmica de envolvimento das pessoas com outras pessoas e objetos através da tecnologia é profundamente produtiva. Daqui decorre que a utilização da tecnologia não promove apenas o consumo de ideologias dominantes, como afeta diretamente a forma como as pessoas estão a sentir e a pensar (Lupton, 2019).

Como referido anteriormente, de outubro de 2020 a março de 2021, conduzimos 30 entrevistas em profundidade com a duração de cerca de 1 hora, utilizando aplicações de videoconferência, a vítimas/sobreviventes de violência online durante a pandemia de COVID-19. Para a análise do corpus, com recurso ao software MAXQDA, lançámos mão de uma análise temática crítica com o propósito de identificar e analisar padrões (Braun & Clarke, 2006). Num primeiro momento, o processo de análise implicou a codificação do texto e a identificação de padrões, discursos repetidos e temas críticos. Numa segunda etapa, a partir das experiências vividas e percecionadas pelas vítimas, e seguindo a proposta de Lawless e Chen (2019), identificámos nos temas críticos e padrões quais as modalidades de violência online sofridas pelas participantes.

4.3. Participantes

As sobreviventes que entrevistámos são mulheres jovens, com idades entre os 18 e os 44 anos, que se dedicam a um leque diversificado de atividades profissionais, incluindo ensino (ni = 2), saúde (ni = 2), tecnologia (ni = 2), arquitetura e artes (ni = 2), serviços administrativos e vendas (ni = 7), estudantes (ni = 6), entre outras profissões (ni = 6). Entre as entrevistas há ainda três pessoas desempregadas. A maioria das vítimas/ sobreviventes tem o ensino secundário completo (ni = 13), grau de licenciatura (ni = 8) ou mestrado (ni = 5). Há também quatro pessoas com outras habilitações. A nível regional, verifica-se uma predominância da área metropolitana de Lisboa (ni = 16) e da zona norte do país (ni = 12). Apenas duas entrevistadas são da zona centro de Portugal.

5. Resultados

Os resultados desta investigação permitem compreender que a violência online é um problema social real que se concretiza em modalidades dinâmicas, frequentemente interligadas, integrando um continuum de violência contra as mulheres (Kelly, 1987) que não pode ser separado do contexto offline. Neste sentido, percebemos que a violência ocorre de forma indiscriminada, afetando mulheres com diferentes contextos e numa lógica multiplataforma. As evidências recolhidas e analisadas pelo nosso estudo apontam desde logo para a necessidade de ampliar o campo definitório da violência contra as mulheres, que não pode reduzir-se nem ao maltrato físico no espaço privado, nem ao homicídio cometido por um parceiro íntimo, nem à violência sexual no espaço público. A violência adaptou-se, migrou para o ambiente digital e tornou-se frequentemente viral. Simultaneamente, trata-se de um fenómeno cuja natureza genderizada é manifesta, indissociável, portanto, das normas que sustentam a discriminação e as desigualdades de género, que sempre se adensam em contextos de crise.

A violência online contra as mulheres integra, por isso, o continuum de violência mais vasto, traduzido em comportamentos que tanto expressam como reproduzem as desigualdades de género de uma sociedade patriarcal assente em papéis de género tradicionais que traduzem como homens e mulheres devem ser e comportar-se. Como mostra a literatura científica, a violência online contra as mulheres é dinâmica e pode encaixar-se num quadro mais vasto de misoginia online (Ging & Siapera, 2018). No entanto, os nossos dados mostram que as modalidades de violência ultrapassam a retórica misógina ou a incivilidade (Papacharissi, 2004), traduzindo-se em comportamentos de abusos variados com consequências nefastas para as vítimas (Amaral & Simões, 2021).

A partir da análise temática crítica efetuada, os dados recolhidos permitiram identificar 10 modalidades de violência online (Figura 1), todas elas integrando alguma diversidade de comportamentos e dinâmicas e, por isso, em constante transformação. Sistematizamo-las de seguida, com o intuito de contribuir para a fixação de um léxico específico para estas situações em Portugal.

Figura 1: Modalidades de violência online 

5.1. Assédio Online

Assédio online contempla um conjunto diversificado de comportamentos abusivos que envolvem a imposição intencional de sofrimento emocional por meio do discurso digital. São exemplos de assédio online: provocações ofensivas nas redes sociais, chats e fóruns; ameaças de violência física e/ou sexual através de email, mensagens de telemóvel ou em plataformas online; discurso de ódio sexista ou com base na identidade de género e noutras características, tais como a nacionalidade e a orientação sexual.

Houve um deles que até me mandou uma imagem de uma mulher toda espancada. A dizer para eu ter cuidado na rua. Quando isso podia me acontecer a mim. Só pelo simples facto de ser uma mulher a dar a minha opinião. (Estudante, 20 anos)

5.2. Perseguição Online

Perseguição online envolve o constrangimento reiterado da liberdade de determinação das vítimas, importunando-as e provocando-lhes sofrimento nas esferas privada, profissional e social. São exemplos de práticas de perseguição online: enviar mensagens de correio eletrónico, mensagens de telemóvel ou mensagens instantâneas reiteradas que ofendam ou ameacem; publicar de forma sistemática e persecutória comentários ofensivos; partilhar de forma repetida fotografias ou vídeos íntimos na Internet ou através de telemóvel.

Eu penso que ele começou a fazer uma pressão que nem ele sabia, tanto que ele no final, na mensagem assim mais agressiva que ele mandou, disse: “Eu não sei o que é que tu tens de especial, mas eu sei que não vou parar de te chatear”. (Desempregada, 30 anos)

5.3. Cyber Mobs

Cyber mobs são práticas online de assédio coletivo que visam atacar uma pessoa em particular, frequentemente em competição com outros grupos online. São exemplos de assédio coletivo a publicação por parte de grupos online de conteúdo ofensivo, humilhante e destrutivo, com o objetivo de criar uma imagem negativa em torno de alguém.

Uns a dizer que eu não tinha lugar na política. Outros a dizer que eu não tinha o direito de estar ali. Também começaram a tirar prints de imagens do meu Twitter e começaram a divulgá-los em grupos. Grupos que são assumidamente de extrema-direita. E agora com as presidenciais isso voltou a acontecer. (Estudante, 20 anos)

5.4. Doxing

Doxing é a expressão usada para designar o furto e a publicação não autorizada de dados privados. São exemplos de doxing o roubo e divulgação online não autorizada de informações pessoais das esferas privada, financeira e familiar.

Foi no Gmail. Estava no spam do Gmail. Fui verificar o meu spam, a caixa do lixo, olhei duas vezes e “O que é isto?”. E eu “Não, não”. Mas, como vi e realmente tinha uma password que tinha sido já minha, fiquei um pouco preocupada. (Educadora, 40 anos)

5.5. Furto de Identidade

Furto de identidade online envolve práticas de apropriação ilegítima da identidade alheia ou de informações pessoais para fins ilícitos e para a prática de crimes. Furtos de identidade online ocorrem frequentemente através da apropriação de perfis online, após furto de dados de login e passwords de correio eletrónico ou de contas em redes sociais, que posteriormente são usados por outra pessoa. O furto de identidade também pode resultar da criação de perfis falsos da vítima, por terceiros.

“Portanto, o que esta pessoa fez foi criar várias contas falsas em meu nome. No Instagram, no LinkedIn, no Facebook e no Tinder. Pelo menos, que eu saiba” (Administrativa, 41 anos).

5.6. Abuso Sexual Através de Imagens

Abuso sexual através de imagens contempla a disseminação não consentida de fotografias ou vídeos íntimos de terceiros. São exemplos de abuso sexual através de imagens a divulgação online não consentida de fotografias ou vídeos que podem ter sido gravados de forma consentida ou capturados de forma não consentida.

Fotos minhas sem o meu consentimento foram espalhadas desde que eu me conheço enquanto mulher, literalmente. Eu tinha 12, 13 anos e eram fotos, posts do meu Instagram, do meu Facebook em outros grupos a perguntar se havia fotos minhas e vídeos meus. Quando mal eu sabia o que era sexo. E os meus amigos é que me vinham dizer, “olha, puseram aqui fotos tuas e estão aqui a falar de ti” ( … ). Agora, desta última vez, foram vídeos meus íntimos. (Desempregada, 23 anos)

5.7. Cyber-flashing

Cyberflashing corresponde à receção de imagens não desejadas de natureza sexual. “Além de assédio a nível de imagens não consentidas, também tinha mensagens nojentas que eu preferia não ler. ( ... ) Ou enviam uma mensagem porca ou, então, uma fotografia que ninguém pediu” (Trabalhadora do sexo, 21 anos).

5.8. Sextortion

Sextortion envolve práticas de extorsão de dinheiro ou outras exigências em troca da não divulgação online de fotografias ou vídeos com conteúdo sexualmente explícito envolvendo a vítima.

A pior coisa que me podem fazer é enviar, como um tal fulano que me mandou um email ( … ), a dizer: “Olhe, ou você me transfere não sei quanto para a minha a conta ou vou enviar para os seus amigos um vídeo ou umas fotografias suas indecentes”. (Educadora, 40 anos)

5.9. Manipulação de Imagens e Deep Fake

Práticas de manipulação sofisticada de imagens de uma pessoa e sua divulgação ilegítima. O termo deep fake refere-se ao uso de tecnologia que manipula fotografias ou vídeos verdadeiros, gerando conteúdos falsos, mas tecnicamente credíveis de uma pessoa, com frequência de natureza sexual. Uma das práticas mais comuns é trocar a face de pessoas envolvidas em práticas sexuais.

“Eu não sei para onde é que aquelas minhas fotografias foram, ah, acabaram por, por ir parar” (Estudante, 20 anos).

5.10. Assédio Laboral em Teletrabalho

Práticas reiteradas de assédio moral ou sexual compatíveis com as situações de assédio no local de trabalho realizadas com a mediação tecnológica das plataformas e ferramentas digitais usadas em contexto de teletrabalho.

“Muitas das pressões são mais por telefone. São mais em videoconferência, que não foi gravada. E acabas por não ter uma prova para avançar” (Administrativa, 39 anos).

6. Discussão

A apresentação desta sistematização de formas de violência online apenas pode ser devidamente compreendida no seu contexto, pelo que importa enquadrá-la no contexto mais amplo fornecido pela análise temática. Acontece, porém, que, em Portugal, não existe um quadro linguístico e cultural comum ao qual recorrer em busca de conhecimentos sobre como nomear, definir e interpretar o que acontece quando as mulheres são alvo de comentários de ódio sexista, retórica misógina, ataques insultuosos recorrentes. Neste sentido, o nosso estudo traz à colação a necessidade de equacionar uma nomenclatura comum para estes comportamentos e fenómenos que, ainda que dinâmicos, se perpetuam e frequentemente se normalizam por ocorrem online.

Os resultados deste estudo sugerem que a violência ocorrida durante a situação pandémica tende a ser normalizada pelas vítimas e desculpabilizada, tendo em conta a utilização massiva das tecnologias e a tendência para extravasar, através destas, frustrações, angústias e outras pressões emocionais desenvolvidas ou agudizadas durante os confinamentos. Um aspeto a sublinhar é o de que o nosso estudo deu bem conta da falta de reconhecimento de comportamentos abusivos online, incluindo da falta de consciencialização da condição de vítima e/ou sobrevivente, que inclusivamente dificultou o envolvimento de mulheres vítimas/sobreviventes no estudo. Particularmente, porque teriam de dar a cara em entrevistas formais para falar de um assunto distante da conversação pública.

Durante a COVID-19, as plataformas digitais mais utilizadas pelas participantes do estudo foram essencialmente redes sociais e os média sociais. As experiências de violência vividas e percecionadas ocorrem indiscriminadamente nestes espaços, sob a forma de mensagens privadas, comentários, partilhas, entre outras práticas. À semelhança do que sucede com a violência doméstica, em que, sem prejuízo da existência de fatores de risco, a vitimação não conhece fronteiras de classe, escolaridade, região de pertença, cor ou credo, haverá que reconhecer também a transversalidade da violência online. A diversidade de perfis socioprofissionais das mulheres vítimas-sobreviventes que entrevistámos é reveladora desse retrato. Mulheres estudantes, desempregadas, administrativas, docentes, profissionais de saúde, das tecnologias, da moda dão conta da prevalência rotineira da violência online nas suas vidas, que nunca é, pois, uma prática isolada e, sim, uma experiência persistente.

Maioritariamente, são identificados perfis masculinos desconhecidos, atuando de forma individual ou em grupos organizados, como os agentes perpetradores de várias modalidades de violência online contra as mulheres. Outros casos relatados por sobreviventes envolvem perfis femininos desconhecidos, integrados em coletivos e grupos organizados, cuja ação é reconhecida pelas vítimas como sendo ampliada pela sensação de anonimato e de impunidade oferecida pela internet.

São também significativas as experiências de violência, vividas ou testemunhadas, que envolvem perpetradores conhecidos, predominantemente homens com quem a vítima manteve no passado mais ou menos recente uma relação de intimidade.

Apenas três situações envolvendo mulheres no papel de agentes perpetradoras conhecidas das vítimas, atuando individualmente, foram relatadas. A maioria das situações que envolvem mulheres no papel de perpetradoras foram descritas como o resultado da ação de coletivos e grupos organizados, como acima referido. A circunstância de existirem perpetradoras mulheres não nega a natureza generalizada do fenómeno. Pelo contrário, mostra que a repetida reprodução de normas que favorecem traços associados à masculinidade e depreciam coisas codificadas como femininas, em particular as mulheres, é uma prática generalizada na sociedade. Os danos causados por esta prática produzem e reproduzem ainda mais a subordinação social e negam ou restringem a igualdade de oportunidades na participação na vida social e política para mulheres e outros grupos marginalizados e estigmatizados.

Para as sobreviventes de violência online, as consequências poderão ser dramáticas, tanto online como offline. Online, o impacto contempla a autocensura, a autodisciplina e silenciamento e até mesmo abandono, ainda que temporário, dos média sociais onde as experiências de violência ocorreram. Offline, a violência online tem igualmente consequências severas, entre elas o stress e a ansiedade, o isolamento, os sentimentos de insegurança, a perda de autoestima ou a automutilação.

7. Notas Finais

A violência online contra as mulheres, nas suas múltiplas expressões, não tem sido suficientemente trabalhada ou discutida, particularmente em Portugal, onde não existe o reconhecimento ético-social generalizado da sua gravidade, nem tampouco um modelo normativo para lhe fazer face. Assim se compreende que as reações das vítimas-sobreviventes que participaram no estudo sejam, esmagadoramente, limitadas à resposta no mesmo espaço onde a violência ocorreu, bloqueando perfis, por exemplo, ou abandonando a plataforma digital, e só minoritariamente passem pela procura de auxílio junto de organizações não governamentais ou de forças de segurança. Importa, pois, enfatizar a necessidade de, a partir da academia, de legisladores e outras organizações e figuras públicas, promover uma consciencialização e um reconhecimento ético-social generalizado desta realidade. Atualmente, face ao tipo de reconhecimento e apoio existente, há que reconhecer que a família e a rede de amigos estão na primeira linha do apoio a estas mulheres.

A situação ocorrida durante a COVID-19 foi excecional, não só pela forma como a tecnologia mediou a quase totalidade das interações sociais nos mais diversos contextos, mas também pela enorme pressão emocional que a incerteza e o isolamento causaram. O que os resultados deste estudo evidenciam em relação à forma como as mulheres experienciam práticas de violência online ilustra bem o continuum de misoginia e violência de género a que estão expostas no seu quotidiano. Esta leitura implica que continuemos a olhar para o espaço online como um espaço de redes de poder e de desigualdades. Ao facilitar o escrutínio e o policiamento do comportamento das mulheres, a violência online tem efeitos inibidores na participação feminina no espaço público, reforçando a injustiça de género. Portanto, a violência online não afeta apenas a dignidade das mulheres, mas também a liberdade de participar em pleno e exprimir opiniões no espaço público sem medo de ser alvo de assédio. Condiciona o direito à liberdade de expressão, limitando as oportunidades profissionais e recriando um espaço de desigualdade que já existe offline. Em última instância, a violência de género online persiste em corroer um pilar da democracia que é o da igualdade e continua a demonstrar que estar presente em igual número, nem sempre implica igualdade.

Agradecimentos

Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto “Violência online contra as mulheres: prevenir e combater a misoginia e a violência em contexto digital a partir da experiência da pandemia de COVID-19” (Gender Research4Covid-19-058). Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto UIDB/00736/2020 (financiamento base) e UIDP/00736/2020 (financiamento programático).

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1Neste contexto, note-se que 85% das queixas são referentes a violência contra companheiro/a, 75% das quais referentes a violência contra mulheres.

2In this context, it should be noted that 85% of complaints refer to violence against a partner, 75% of which refer to violence against women.

Recebido: 24 de Março de 2022; Aceito: 03 de Junho de 2022

Rita Basílio de Simões é professora auxiliar da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, no Departamento de Filosofia, Comunicação e Informação. Doutorada em ciências da comunicação, o seu trabalho tem cruzado a investigação do jornalismo e dos média digitais e os estudos feministas em comunicação. Investigadora integrada do Instituto de Comunicação da Universidade Nova de Lisboa, coordena, desde 2019, o Grupo de Trabalho em Género e Sexualidades da Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação e a participação portuguesa no Global Media Monitoring Project. Tem trabalho publicado em revistas tais como Feminist Media Studies, Journalism Practice e Brazilian Journalism Research. Email: rbasilio@fl.uc.pt Morada: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Largo da Porta Férrea, 3000-370 Coimbra, Portugal

Inês Amaral é professora associada da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Doutorada em ciências da comunicação pela Universidade do Minho, é investigadora integrada do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade e investigadora associada do Centro de Estudos Sociais. Tem desenvolvido investigação sobre sociabilidades nas redes sociais digitais, literacia mediática e digital, tecnologias e envelhecimento, audiências e consumos mediáticos na era digital, género e média. Publicou em revistas como International Journal of Communication, European Journal of Women’s Studies, European Journal for Research on the Education and Learning of Adults ou Lecture Notes in Computer Science. Email: ines.amaral@uc.pt Morada: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Largo da Porta Férrea, 3000-370 Coimbra, Portugal

Sílvio Santos é doutorado em ciências da comunicação. Depois de vários anos a trabalhar no setor dos média, particularmente enquanto realizador da RDP, dedicou-se em exclusivo ao ensino superior, sendo atualmente professor auxiliar da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, onde ocupa também o cargo de diretor do Departamento de Filosofia, Comunicação e Informação. É investigador do Centro de Estudos Interdisciplinares - CEIS20. Tem lecionado, investigado e publicado extensivamente sobre rádio, podcasts e, mais recentemente, sobre desinformação e fake news. Email: silvio.santos@fl.uc.pt Morada: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Largo da Porta Férrea, 3000-370 Coimbra, Portugal

Juliana Alcantara é doutoranda em ciências da comunicação e mestra em jornalismo e comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, tendo realizado mobilidade académica na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Ljubljana, na Eslovénia. Em 2018/2019 recebeu o Prêmio 3% dos Melhores Estudantes da Universidade de Coimbra. É pós-graduada em comunicação empresarial e em docência do ensino superior, bacharel em comunicação social com habilitação em jornalismo e possui mais de 10 anos de experiência profissional como assessora de comunicação e jornalista. Trabalhou nos média brasileiros, incluindo a TV Globo, Jornal O Globo e revista Veja Rio. Os interesses de pesquisa incidem nos tópicos: jornalismo, comunicação e saúde, género e literacia mediática. Email: alc.juli@gmail.com Morada: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Largo da Porta Férrea, 3000-370 Coimbra, Portugal

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