INTRODUÇÃO
As pneumoconioses são das doenças profissionais mais frequentes. A Silicose é causada pela inalação de Sílica respirável (1) (2). As doenças pulmonares justificam cerca de 70% da mortalidade associada ao trabalho (3).
O termo Silicose foi utilizado pela primeira vez em 1870 por Vinconti (4) (5), ainda que esta já tenha sido descrita em algumas múmias do antigo Egito e Grécia; talvez Hipócrates também a tenha mencionado em indivíduos que trabalhavam com metais no século XVI e nos que cortavam pedra no século XVIII (5). Outros defendem que os primeiros relatos sobre Silicose foram em 1556, por Agricola, médico alemão, tendo lhe chamado "asma dos mineiros" (6). Alguns investigadores consideram-na a doença ocupacional mais antiga (5) (7).
Trata-se de uma patologia pulmonar fibronodular intersticial difusa, causada pela inalação de Sílica cristalina (5) (8); associada ainda ao quartzo, mais frequentemente, bem como à cristobalita, tridimita, stishovita e coesita (5).
Inicialmente ela é assintomática, contudo, geralmente progressiva e sem cura. O diagnóstico fundamenta-se parcialmente na história profissional de exposição. É mais prevalente em países com uma taxa de desemprego considerável e/ou pouca ou nenhuma vigilância da Saúde e Segurança no Trabalho (9).
METODOLOGIA
Em função da metodologia PICo, foram considerados:
-P (population): Trabalhadores com tarefas que impliquem exposição à Sílica.
-I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre as consequências da Silicose e melhor forma de atenuar o problema
-C (context): Saúde Ocupacional nas empresas com postos de trabalho com Sílica
Assim, a pergunta protocolar será: Quais as implicações da Silicose na Saúde do Trabalhador e e na sua Capacidade de Trabalho, bem como que Medidas de Proteção poderão ser tomadas para atenuar o problema?
Foi realizada uma pesquisa em janeiro de 2022, nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados.
CONTEÚDO
Caraterísticas e tipos de Sílica
A Sílica é carcinogénica (10) e é muito prevalente na crosta terrestre (11), nomeadamente nas rochas (12). As partículas respiratórias são tão pequenas que não são visíveis (1).
A Sílica ou o dióxido de silício (SiO2) (4) (11) é constituída por oxigénio e silício. Na natureza existe nas formas amorfa e cristalina (4) (13); contudo, em contacto com metais e óxidos originam silicatos (talco, feldspato, caulino e mica) (4). Outros consideram que a Sílica livre pode ser cristalina, criptocristalina ou amorfa (6). A forma amorfa é menos tóxica que a cristalina e existe em rochas vulcânicas petrificadas, solos com diatomáceas, sílica gel, vidro e lã de vidro (4). A Sílica cristalina representa-se por SiO4. Os exemplos mais frequentes são o alfa e beta-quartzo, alfa e beta-tridimita e alfa e beta-cristobalita (6) (11). Designa-se alfa e beta quando originados através de baixa e alta temperaturas, respetivamente. A maior parte da Sílica cristalina é alfa (quartzo) (11). A cristobalita raramente surge na natureza, mais frequentemente está presente em processos industriais com temperaturas muito elevadas (mais de 800ºC) (12).
Alguns contaminantes podem potenciar a toxicidade da Sílica, nomeadamente ferro, arsénio, cádmio, cobre, cobalto, mercúrio, chumbo e níquel e, com menor gravidade, alumínio; geralmente através da produção de espécies reativas de oxigénio, respetivo stress oxidativo e eventuais fibrose e/ou cancro (11).
IARC
Em 1986 esta instituição publicou que havia evidência de que a Sílica cristalina era carcinogénica em animais; contudo, sem evidência clara para humanos (1997). No entanto, a ATS (American Thoracic Society) considerou, nesse mesmo ano, que esta poderia originar cancro pulmonar, sobretudo em tabagistas (7). Posteriormente a IARC considerou a Sílica cristalina inalada como cancerígena para humanos (grupo I) (3) (11) (13) (14) (15) (16) (17), provavelmente devido ao dado celular, inflamação, stress oxidativo e inibição da clearence. A Sílica amorfa não é considerada cancerígena para humanos (grupo 3) (11).
Locais onde existe sílica
A Sílica é dos agentes mais prevalentes na crosta terrestre. Existe na areia, pedra e solo (1) (17). Ela está incluída na maioria dos minerais, quer na forma livre (quartzo, sílica amorfa), quer conjugada (feldspato, mica, cloritas, olivinas, piroxénios, anfibólios, epídotos) (11). O quartzo é o segundo mineral mais frequente na crosta terrestre; o 1º é o feldspato silicato; as formas cristalinas cristobalita e tridimita são menos prevalentes (18).
A Sílica Cristalina existe na areia (4) (19), rochas e minerais (20) [como o arenito, granito (4) (21), silex (4) e quartzo (4) (21)]; bem como na ardósia (21) e argilas (19). O arenito contém 52 a 90% de Sílica (22) e o quartzo contém Sílica em percentagens superiores a 95% (14). Outros estratificam que a forma cristalina existe no quartzo, cristobalita e tridimita (23).
A Sílica amorfa de origem natural pode surgir em algumas gemas (por exemplo, opala), ao nível biogénico (bactérias, fungos, algas, esponjas ou plantas), terras diatomáceas (por decomposição de organismos unicelulares com carapaça com Sílica), bem como com materiais provenientes de fenómenos vulcânicos ou de meteoritos (11).
De realçar que algumas pedras artificiais têm 90% de Sílica (enquanto que, por vezes, alguns granitos não passam de 30% e algumas mármores de 3%) (24).
As erupções vulcânicas também podem levar à exposição de Sílica (1), como já se mencionou.
Caraterísticas da Silicose
Os riscos médicos da Sílica são conhecidos desde as civilizações egípcia, grega e romana (4).
É a principal causa de invalidez em contexto de patologia respiratória ocupacional e a sexta mais prevalente; em Portugal, especificamente, é a doença respiratória mais notificada. É raro fazer-se o diagnóstico antes da quinta década de vida e é mais frequente no sexo masculino (5), geralmente devido aos postos de trabalho associados (25).
A Silicose é uma das doenças profissionais mais prevalentes mundialmente (9) (26) ou até a mais frequente (2), sobretudo em países menos desenvolvidos; prevenível (1) (3) (9) mas progressiva (11) (13) (14) (24) (27) (28), incurável (1) (3) (9) (11) (13) (14) (21) (24) (27) (28), debilitante (1) (13) e irreversível (11) (18) (24) (27); eventualmente fatal (1). Ela resulta da inalação de Sílica cristalina (dióxido de silício) (14). Mais concretamente, trata-se de uma fibrose pulmonar secundária à inalação de poeira com Sílica (3) (21) (25) (27) (29); causando morbilidade considerável (25); a mortalidade também é razoável, mesmo em países desenvolvidos, ainda que tenha vindo a diminuir (29).
Pontos de corte
Os valores limite em relação à Sílica cristalina foram variando com o tempo, em função da evolução das técnicas de amostragem e análise (11). Os limites considerados hoje diminuem o risco, mas não o eliminam (12). A NIOSH em 1974 defendeu o corte nos 0,05 micrómetros/m3 (7) (11) (14) como TWA (Time-Weighted Average), por 10 horas de trabalho dia e 40 horas semanais (7). A ACGIH (em 2000) considerou o mesmo valor e, em 2004, 0,025 micrómetros/m3 (11) (16). Em 2016 o PEL (Permissible Exposure Limit) da OSHA diminuiu de 100 para 50 microgramas/m3) (13) (30). Na legislação norte-americana o limite para a Sílica é de 0,05 micrómetros/m3 (cristobalita) e 0,01 (quartzo) (6). Em Itália o limite é de 0,025 (27). Por sua vez, na Irlanda, Reino Unido (19) e Nova Zelândia é de 0,1 (16).
Incidência/prevalência
A Silicose existe em todos os países, mas é mais prevalente nos menos desenvolvidos, mesmo percebendo-se que a incidência real deverá ser superior à oficial, devido à situação, neste contexto, estar sub-reportada (1) (13). Nos países mais desenvolvidos a incidência/prevalência de Silicose tem diminuído, devido à melhoria das condições de trabalho (18).
Estima-se uma exposição de cerca de 5,3 e 1,7 milhões de trabalhadores na Europa e nos EUA, respetivamente (22). Outros autores publicaram que nos EUA existam cerca de 2,2 milhões de trabalhadores expostos à Sílica, sendo 1,85 milhões no setor da construção (13). Na Grã-Bretanha consideram-se 590.000 trabalhadores expostos e várias centenas de cancros do pulmão (associados a este contexto) (20). Nos EUA, por exemplo, estimaram-se 4313 mortes entre 1979 e 1990 ou cerca de 15.000 mortos em 1968 e 1994, parte dos quais em indivíduos muito jovens (4). No Brasil, já em 1978, quantificaram-se cerca de 25.000 a 30.000 casos (11), por exemplo.
Fisiopatologia
A exposição é relevante via inalatória; vias cutânea e digestiva não têm geralmente consequências importantes (17).
O risco para a saúde varia com a concentração (4) (11) (24) (31), dimensão das partículas (1) (4) (11) (31)- diâmetro, superfície e forma (11) (mais perigosas se mais pequenas) (4) (31), tempo de exposição (1) (4) (11) (13) (24) (31), tipo de Sílica (4) (11) (31) (a cristalina, tridimita e a cristobalita são as mais lesivas, ainda que mais raras) (4), densidade, solubilidade em água e lípidos, reatividade química, carater higroscópico e eletrostático, temperatura, velocidade do ar e atividade física do funcionário. Por sua vez, neste último, destacam-se o género, área corporal, idade, estado geral de Saúde, patologias prévias e tabagismo (11); ou seja, a suscetibilidade individual (24) (31).
As partículas podem ser inaláveis, torácicas ou respiráveis (estas últimas conseguem se depositar nos pulmões) (23). A forma, tamanho e densidade das poeiras irão condicionar o comportamento e penetração no aparelho respiratório. A fração respirável é constituída por partículas com menos de 10 micrómetros, ou seja, podendo atingir a zona onde se efetua a troca gasosa (11) (13) (15) (24); maiores que isso, geralmente ficam depositadas na região nasal e torácica (11). As nanopartículas com Sílica são menores que 100 nanómetros e podem chegar à circulação sanguínea (23).
Após a inalação, as partículas de Sílica depositam-se sobretudo nos bronquíolos e alvéolos; se a clearence mucociliar não for suficiente, surge inflamação (4) (18) (21) (alveolite), que poderá levar a fibrose (4) (13) e cancro (21) (13). A ativação dos macrófagos origina radicais livres/espécies reativas de oxigénio, que nem sempre são atenuados pelas defesas antioxidantes (4) (18) (21). A exposição continuada potencia a libertação de citoquinas que, por sua vez, ativam mais macrófagos, neutrófilos e linfócitos; a produção aumentada de colagénio levará então à dita fibrose (4) (21), diminuindo a rentabilidade e eficácia pulmonares; ou seja, diminuindo as trocas gasosas; sendo que a fibrose pode também pode atingir a pleura (7).
A Sílica cristalina é carcinogénica, acreditando-se que são necessários pelo menos quinze anos de exposição para se atingir este patamar; o risco depende do subtipo de Sílica cristalina, superfície da partícula e da presença de outras condições (18).
A eliminação das partículas a nível respiratório processa-se através do sistema mucociliar (sobretudo nas vias respiratórias superiores; o fluido é tamponante, antioxidante e bactericida) e dos macrófagos alveolares, com posterior drenagem linfática. O movimento dos cílios leva o muco até à orofaringe, eliminando os produtos através da tosse e deglutição (11). O tabagismo potencia o risco de Silicose, devido às alterações de clearence (9).
A Sílica alveolar atrai macrófagos para realizarem a fagocitose; estes libertam substâncias que induzem mais recrutamento de células inflamatórias, formando-se nódulos com colagénio, que poderá servir como antígeno primário que levará a reações nas células pulmonares. Estes nódulos têm geralmente um núcleo central com fibrose hialina, rodeado por células e exsudado inflamatório (6).
A altitude mais elevada também pode potenciar o desenvolvimento de pneumoconioses por aumento do volume inspiratório, para compensar a alteração de concentração de oxigénio (32).
A doença pode progredir mesmo após a interrupção da exposição (5) (18). A função pulmonar apenas fica comprometida em fases muito avançadas (6).
Classificação
Existem três tipos de Silicose:
Na versão clássica ou crónica os nódulos são geralmente pequenos (menos de um centímetro de diâmetro) e mais nas zonas apicais; com a progressão, os nódulos podem coalescer e fibrosar (8) (11) e/ou originar enfizema (8). Exemplo de um setor profissional onde este subtipo ocorre com alguma frequência é o da cerâmica (11).
Na versão subaguda os nódulos podem ficar conglomerados, por vezes com grandes opacidades; os sintomas podem ser precoces e limitantes. Ocorre, por exemplo, nas atividades de perfuração do solo para poços e minas de ouro (11).
A aguda não costuma ocorrer em países desenvolvidos (8). Uma das atividades profissionais que se pode associar é a dos jatos de areia (11) e escavação de poços (6); pode surgir proteinose alveolar e infiltrado inflamatório intersticial; a nível de sintomas pode eventualmente ocorrer dispneia incapacitante e até morte por insuficiência respiratória (11); nesta há maior risco de fibrose pulmonar maciça (14).
Setores profissionais mais relevantes
Há exposição à poeira de Sílica em diversos setores, nomeadamente:
-extração e acabamentos de algumas pedras (1) (4) (5) (6) (7) (9) (15) (16) (18) (19) (24) (33) (34) [por exemplo granito (4-7) (11), mármore ou arenito (7)]; as pedras mais problemáticas são a silestone, granito, arenitos e quartzos (11); ou seja, o setor da produção de pedras artificiais também poderá estar envolvido (21) (24)
-mineração (1) (2) (4-7) (10-13) (15) (17) (26) (27) (31): ouro (4) (5) (7), arsénio (4) (5), estanho (4) (7) e pedras preciosas (4) (26) (31) [por exemplo, a ágata é constituída por óxido de silício (31) (33), tal como a ametista (31)]; bem como carvão, chumbo, cobre, prata (7)
-extração de areia (4) (7) (26) (30) (34) ou processos produtivos onde esta esteja envolvida (2) (5) (15) (18) (26) (28) (30) (34)- como produção de tintas e plásticos, bem como combustíveis (líquidos e gasosos) que usem areia como uma das matérias primas (12) (30) ou através de jatos (6) (7)- técnica esta proibida em alguns países (8)
-demolições (18)
-produção de alguns materiais de construção (4) (5) (13) (15) (16) (18) (24) [como tijolos,cimento (9) (11) (24) (27), areia e vidro(1) (4) (5) (7) (9) (11-13) (17) (18) (21) (24) (27) (30)]
-cerâmica (1) (2) (4-7) (9) (11-13) (15) (17-19) (21) (24) (26) (27)
-indústria do talco (4)
-fundições/metalúrgicas (1) (2) (4) (5) (7) (12) (13) (17) (18) (26)
-construção de fornos (7)
-manutenção/limpeza de fornos e/ou moinhos e/ou filtros (4) (5)
-escultura (1)
-reparação automóvel (1)
-marcenaria (18) e
-produção de instrumentos elétricos (com cristais de quartzo) (12).
No setor da mineração/extração de pedra, no final do século anterior houve uma melhoria nas máquinas utilizadas que, no entanto, possibilitou um ritmo mais intenso de trabalho e a produção de mais poeiras, contribuindo tal para um aumento do número de casos de Silicose (11).
No setor da produção de pedra artificial, a exposição costuma ser intensa (21) (24), pelo que a patologia pode se desenvolver por períodos de latência entre quatro e dez anos; a exposição é mais significativa no corte, polimento e montagem/acabamentos (24). A pedra artificial pode conter cerca de 90% de Sílica; enquanto o mármore 3% e o granito 30% (21), como já se mencionou.
Exames auxiliares de diagnóstico
Quanto mais cedo se fizer o diagnóstico e se conseguir interromper a exposição, melhor será o prognóstico (4). Contudo, a maioria não é diagnosticada numa fase inicial (1) (34), devido ao seu caráter assintomático. Recomendam-se por isso os exames de imagem, pelo menos uma vez por ano (1).
O diagnóstico surge com a anamnese (2) (4) (5) [historial de exposição (2)], exame físico (2) (18) e as alterações no Rx (1) (4) (5) (7) (18), como cicatrizes e nódulos (2) (7), de dimensão variável, de contornos regulares ou irregulares (6)- contudo, a patologia tem de estar razoavelmente avançada para que seja detetada neste exame. Podem ser visualizadas pequenas opacidades; a forma, tamanho e número destas irá refletir a gravidade da situação (1). Os nódulos estão com maior frequência localizados mais apical e posteriormente (2) ou nos lobos médio e superior (34) podendo coalescer e formar opacidades na fibrose maciça progressiva (2).
A ILO (International Labour Organization) publicou critérios para a leitura das alterações no Rx; ainda que a OSHA aponte com clareza para a superioridade da Tomografia Axial Computadorizada (TAC), apesar de ambas implicarem a exposição a radiações, por vezes, em doses elevadas (13). A TAC (1) (18) consegue visualizar as alterações mais precoces (1) (13) [coalescência de nódulos (4) (6) e enfizema]. Também podem ser visualizadas consolidações e calcificações, bem como nódulos de "vidro fosco" centrolobulares e confluentes, tal como aumento dos nódulos linfáticos hilares e mediastinais, com eventual calcificação (8) e fibrose (6). Na realidade, a TAC é considerada a melhor opção, mas nem sempre está disponível (1). A apresentação radiológica típica são opacidades entre 1 a 10 milímetros, mais nas zonas apicais; geralmente em ambos os pulmões e de forma simétrica; por vezes estas estruturas têm uma calcificação periférica (designada por "casca de ovo") (13).
A biópsia (18) só deverá ser feita quando as imagens são sugestivas, mas não há historial de exposição (4); geralmente esta não tem indicação para o diagnóstico (5).
A espirometria não tem utilidade para o diagnóstico, servindo apenas avaliar a evolução (1) (4).
Alguns investigadores também mencionaram a execução de biomarcadores, de citologia da saliva e testes tuberculínicos. Os biomarcadores poderão estar associados à deteção de stress oxidativo; ou seja, substâncias que tentam quantificar a coordenação entre a ação dos radicais livres e as defesas antioxidantes; o stress oxidativo está relacionado com a gravidade da Silicose; contudo, existem limitações. Alguns investigadores também mencionam neste contexto o "exhaled breath condensate" que quantifica macromoléculas voláteis e não voláteis, por vezes até detetando partículas de Sílica cristalina diretamente. Outro doseamento proposto é o óxido nítrico exalado, mas sem consenso (ainda que fácil tecnicamente e económico) (1).
Semiologia
A semiologia depende da intensidade e duração da exposição (5), bem como da fase e gravidade (1). Numa fase inicial (não complicada) pode ser assintomática (1) (6); daí que o diagnóstico geralmente surja numa fase mais avançada, como já se descreveu. Quando os sintomas aparecem geralmente incluem a tosse (3) (6) (8) (27) (33) com expetoração (7) e dispneia (3) (7) (27) (33) progressiva (8) (6) e eventualmente incapacitante (6), bem como toracalgia opressiva (3) (6) (27), astenia (3) (8), anorexia (6), febre (8) e emagrecimento (6) (8); podem surgir insuficiências cardíaca e respiratória. Ao exame físico podem existir crepitações e dedos em baqueta de tambor (6).
Pode ser globalmente estratificada em aguda ou Silicoproteinose, Silicose acelerada ou Silicose crónica (simples ou complicada) (5):
-a fase aguda ou proteinose alveolar Silicótica, ocorre meses ou anos após o início da exposição: além de conseguir justificar morte precoce (4), pode cursar com dispneia grave (4) (5) progressiva (5), astenia, emagrecimento (4) (5), hipoxemia (4) e tosse (5); o Rx pode apresentar infiltrado alveolar bilateral difuso e a TAC "opacidades de vidro fosco" e espessamento septal; podendo existir ou não granulomas (4). Surge entre alguns meses a cinco anos de exposição maciça a Sílica livre (sobretudo nas tarefas com jatos de areia); a evolução costuma ser galopante, com insuficiência respiratória e morte (a sobrevida é de cerca de dez anos). Os sintomas podem anteceder as alterações radiológicas (infiltrado alveolar bilateral difuso) e na TAC (opacidade em vidro despolido, espessamento septal e condensações) (5).
-a fase acelerada, ou seja, entre a aguda e a crónica; os exames de imagem são semelhantes aos da forma crónica; podem existir granulomas ou nódulos silicóticos (4); por sua vez, outros autores consideram que esta é semelhante à fase aguda, aos níveis de sintomas e alterações em exames de imagem, bem como alterações histológicas (5).
-fase crónica é mais prevalente; inicialmente pode ser assintomática, mas depois pode surgir dispneia progressivamente agravada (4) (5) e tosse crónica, inicialmente sem expetoração (5); os Exames Auxiliares de Diagnóstico de imagem podem apresentar inflitrado micronodular bilateral (mais apicalmente); com o tempo os nódulos podem se aglomerar constituindo opacidades que poderão atingir dimensões relevantes (fibrose maciça progressiva); a aumento dos hilos mediastinais podem originar as calcificações designadas por "casca de ovo"; na TAC poderão existir micronódulos centrolobulares e subpleurais, mais apicalmente e eventualmente enfizema; a alteração típica é o nódulo Silicótico à volta dos bronquíolos ou vasos, áreas subpleurais, pleura visceral e/ou nódulos linfáticos; nestes nódulos existe uma estrutura central hialina, constituída por tecido fibroso, calcificado ou não, rodeado por fibras de colagénio (4). Outros autores descrevem os nódulos Silicóticos como sendo constituídos por camadas concentradas de tecido conjuntivo, com área central acelular, com Sílica e colagénio, que pode necrosar ou calcificar; mais nas zonas apicais, com adenopatias hilares e mediastínicas com aspeto de casca de ovo em 5%. A Silicose crónica complicada geralmente apresenta-se com coalescência dos nódulos em grandes massas- fibrose maciça progressiva; os nódulos podem cavitar ou associar-se a pneumotórax. Se a lesão for unilateral facilmente se confundirá com patologia cancerígena (5).
À medida que a doença evolui, podem surgir alterações obstrutivas, restritivas ou mistas (4) (5);
Com a fibrose avançada e/ou enfizema a difusão de monóxido de carbono pode ficar comprometida (4). No subtipo agudo é mais usual a versão restritiva; na crónica já é mais prevalente a obstrução (4) (5), pouco atenuada pelos broncodilatadores, mas nem sempre há correlação entre os sintomas e as alterações nos exames de imagem; estas questões pulmonares podem sobrecarregar o coração, originando eventualmente uma insuficiência cardíaca (7).
Na maioria dos casos são necessários dez a vinte anos de exposição para se atingir um patamar sintomático (dispneia, tosse) (18). Contudo, geralmente até atingir uma fibrose relevante, é usualmente assintomática (10). Os sintomas podem surgir anos após a exposição ter terminado (13). A sobrevida média é de cerca de quarenta anos (5).
Doenças associadas
As doenças relacionadas à Silicose são:
-Tuberculose (1) (2) (4) (5) (7) (11) (14) (18) (19) (24) (33), apenas pela exposição à Sílica, com ou sem Silicose, com risco cerca de três (7) ou 13,4 vezes superior (14). A tuberculose em contexto de silicose é geralmente muito grave e implica fibrose com progressão rápida, provavelmente pela alteração na atividade macrofágica (11)- Silicotuberculose (1)
-Cancro do Pulmonar (1) (2) (4) (5) (7) (11) (12) (16) (18-20) (23) (24) (30) (33)
-DPCO (Doença Pulmonar Crónica Obstrutiva) (1) (2) (4) (5) (9) (12) (14-18) (20) (24) nomeadamente Bronquite Crónica (4) (15) e/ou Enfizema (4) (7) (11) (15)
-Insuficiência Pulmonar (6)
-Pneumotórax (2) (5) (6), pouco frequente mas eventualmente fatal (2)
-alterações renais (12) (13) (15-19) (23) (24) (30) ou até Insuficiência Renal Crónica (4) (5) (7), por glomerulonefrite (2) (4) ou nefrite intersticial (4).
-doenças autoimunes (1) (2) (4) (11) (12) (14) (17) (24) podem ser cerca de cinco vezes mais frequentes- a resposta imune intensa poderá justificar tal (13); destacam-se a esclerodermia (1) (4) (7), artrite reumatoide (1) (2) (4) (11) (12) (16-19) e lúpus eritematoso sistémico (4) (7) (11) (12) (16) (17), síndroma de Sjogren (16) e vasculite (4) (12) (17) (em contexto renal- risco de 6,5 a 14 vezes mais frequente) (4).
-doenças do colagénio (11) (esclerose sistémica progressiva (5) (11) e artrite reumatoide (11)- Síndrome de Caplan (6)), provavelmente também devido à estimulação imunitária contínua em organismos suscetíveis (11)
-alterações hepáticas (7)
-cancro gástrico (19) e
-granulomas cutâneos (7).
Orientação terapêutica
A nível de tratamento são utilizados corticoides, tetandrina, inalação de pó de alumínio (4), bem como lavagem broncolaveolar, mas sem consenso (4) (5). Em situações específicas poderá ser ponderado o transplante pulmonar (4), geralmente como última opção (5).
Medidas de proteção coletiva (MPC)
Nos países desenvolvidos foram criadas MPC que atenuam a incidência/prevalência e gravidade da Silicose; nos restantes a situação é mais grave (11). Empresas pequenas cumprem menos as normas de segurança; incluindo MPCs e individuais (21). A doença é mais provável em trabalhadores com menor nível cultural, eventualmente devido às menores perceção de risco e adesão às medidas de proteção (32).
Neste contexto podem ser consideradas:
-humidificação (5) (11) (13) (15) (18) (28) (sendo vista por alguns como a medida mais eficaz); ainda que mais dispendiosa na aquisição, é mais barata na manutenção; as técnicas a seco são geralmente muito lesivas (11).
-potenciação da ventilação/extração (5) (13) (15) (18) (21), com o valor mínimo de 17 a 21m/s (22)
-evitar tarefas com jatos de areia (18)
-troca da Sílica por outros produtos menos tóxicos, se possível (6)
-aperfeiçoamento dos equipamentos (15) e/ou uso de máquinas de CNC e/ou pontes, ainda que dispendiosas (28)
-formação (6) (13) (14) (24) (de salientar que parte dos trabalhadores nunca dela usufruiu a este nível (24)).
-sinalização (13) e
-vigilância médica (13).
Medidas de proteção individual (MPI)
As MPIs devem ser utilizadas após se ter explorado devidamente as MPCs (5)- ambas devem ser proporcionadas pelo empregador (13). Ainda hoje em dia nem todas as empresas providenciam EPIs- Equipamentos de Proteção Individual (nomeadamente máscara). Parte dos trabalhadores, mesmo com acesso, não usa ou não o faz corretamente (21) (22) (24), mesmo em países desenvolvidos. A máscara é o EPI mais relevante (18), deverá possuir um filtro adequado e, se necessário, fornecer uma fonte de ar respirável (4).
Implicações na aptidão/limitações laborais
Na consulta de Medicina do Trabalho recomenda-se o seguimento anual através da anamnese, exame físico, teste tuberculínico, Rx de tórax e Espirometria. Se existir suspeita de Silicose, o indivíduo deverá ser retirado do posto onde exista Sílica e novos doseamentos ambientais deverão ser realizados. A situação pode continuar a progredir mesmo com interrupção da exposição, variável com a duração e intensidade do contato (13).
A Silicose geralmente diminuiu a capacidade pulmonar e a aptidão cardiovascular para realizar atividade física (26).
DISCUSSÃO/CONCLUSÃO
Apesar dos avanços proporcionados por um sistema de Saúde e Segurança cada vez mais eficaz, ainda assim a Silicose constitui um problema em alguns contextos, pelo que é necessário que os profissionais a exercer nestas equipas tenham conhecimentos razoáveis relativos aos setores/tarefas onde esta pode ocorrer, exames auxiliares de diagnóstico e restantes parâmetros da vigilância, medidas de proteção coletivas e individuais, bem como eventuais implicações para a classificação de aptidão.
Seria relevante conhecer melhor o panorama nacional, através da divulgação de investigações efetuadas neste contexto.