INTRODUÇÃO
O setor da produção de Cosméticos está em constante evolução, de acordo com as mudanças e exigências crescentes da sociedade em relação à aparência física; contudo, a bibliografia sobre o tema, sobretudo com enfase na Saúde e Segurança Ocupacionais é escassa. Pretendeu-se com esta revisão organizar os principais dados publicados, de forma a ajudar os profissionais da área.
METODOLOGIA
Em função da metodologia PICo, foram considerados:
-P (population): trabalhadores a exercer funções na indústria da produção de cosméticos
-I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre os principais fatores de risco e riscos laborais associados a este setor, entre outras variáveis relacionadas
-C (context): saúde e segurança ocupacionais aplicadas à indústria de produção de cosméticos
Assim, a pergunta protocolar será: Quais os principais fatores de risco e riscos ocupacionais associados à produção de cosméticos, quais as principais medidas de proteção (coletiva e individual), principiais doenças profissionais e sinistralidade?
Foi realizada uma pesquisa em abril de 2024 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
Dado o número de artigos encontrados ser escasso e, ainda assim, dar mais enfase aos Riscos para o consumidor versus trabalhador, optou-se por pesquisar no motor de buscar generalista Google, através da expressão “cosmetic production occupational risks”, da qual surgiram mais alguns artigos descritos na biliografia mas, como a informação era escassa, até se inseriram dados de sites que escreviam sobre o assunto (sem referência bibliográfica no corpo de texto, apenas para esta situação). Para além disso, como alguns artigos e/ou sites mencionavam agentes químicos de forma muito sumária, mas mais desenvolvidos noutros artigos dos mesmos autores, noutros contextos ocupacionais (e com possibilidade de transposição de conclusões médicas), elaborou-se um resumo de tais dados, inseridos num quadro final, ainda que extenso.
No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados. No quadro 2 estão resumidos os tais dados sobre alguns dos agentes químicos utilizados neste setor.
Motor de busca | Password 1 | Password 2 e seguintes, caso existam | Critérios | Nº de documentos obtidos | Nº da pesquisa | Pesquisa efetuada ou não |
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RCAAP | Produção de Cosméticos | - | -título e/ ou assunto |
28 | 1 | Não |
EBSCO (CINALH, Medline, Database of Abstracts and Reviews, Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Nursing & Allied Health Collection e MedicLatina) |
Cosmetics | -2013 a 2023 -acesso a resumo -acesso a texto completo |
14361 | 2 | Não | |
+ production | 1 | 3 | Sim | |||
+ products | 961 | 4 | Não | |||
+ occupational | 25 | 5 | Sim | |||
+ health | 148 | 6 | Sim | |||
+products+ occupational | 91 | 7 | Sim | |||
+ production+ occupational | 4 | 8 | Sim |
Agente quimico |
Artigo(s) | Resumo dos dados mais relevantes |
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Arsénio | Santos M, Almeida A. Danos Ocupacionais associados ao Arsénio, com ênfase no setor da Conservação e Restauro de Obras de Arte. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2019, 8: 1-23. DOI: 10.31252/RPSO.21.12.2019 | Segundo a bibliografia selecionada, os principais riscos associados ao Arsénio distribuem-se por vários órgãos e sistemas, ainda que com consensos diferentes, a nível destressoxidativo; neurologia (neurodesenvolvimento, neurocognição ou até Doença de Alzheimer); cardiovascular (Hipertensão arterial, Aterosclerose, Acidente Vascular Cerebral, Doença Coronária e de Blackfoot); reprodução/ obstetrícia (aborto, baixo peso ao nascer, mais nados-mortos e alterações da fecundidade); pediatria (atraso no crescimento, infeções respiratórias); sistema imune (efeito imunossupressor); nefrologia (proteinuria); oncologia (com destaque para a bexiga, pele, rim, pulmão, mama, fígado e próstata); dermatologia (alterações da pigmentação e hiperqueratose); hematologia (anemia); pneumologia (infeções); otorrinolaringologia (hipoacusia); gastroenterologia (diarreia, alterações hepáticas) e endocrinologia (Hipertensão arterial, Diabetes Mellitus). |
Mercúrio | Santos M, Almeida A. Danos Ocupacionais associados ao Mercúrio, com ênfase no setor da Conservação e Restauro de Obras de Arte. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2019, 8: 1-32. DOI: 10.31252/RPSO.14.12.219 |
Segundo a bibliografia selecionada, os principais riscos associados ao mercúrio distribuem-se por vários órgãos e sistemas, ainda que com consensos diferentes, a nível de:StressOxidativo; Neurologia (atenção, concentração, memória, disartria, tremor ou até Doença de Alzheimer, Parkinson, Esclerose Lateral Amiotrófica e Autismo); Psiquiatria (irritabilidade, depressão, ansiedade, insónia, alucinação); Cardiologia/Síndroma Metabólica (Hipertensão Arterial, Aterosclerose, Dislipidemia, Disritmia, Taquicardia, Diabetes); Reprodução/Obstetrícia (azoospermia, aborto, baixo peso ao nascer, malformações); Pediatria (alterações do desenvolvimento, Autismo); Sistema Imune; Nefrologia (proteinuria, Insuficiência Renal, Necrose Tubular Aguda, Glomerulonefrite, Glomerulosclerose, Síndromas Nefrótico e Nefrítico); Oncologia; Dermatologia (Eczema, Úlcera); Hematologia (anemia, alterações da coagulação); Pneumologia (Bronquite, Fibrose, Pneumonite); Oftalmologia (amaurose); Otorrinolaringologia (hipoacusia); Gastroenterologia (cólica, úlcera, diarreia, anorexia) e Endocrinologia (Hipertensão arterial; Dislipidemia e alterações na Tiroide, Hipófise e/ou Pâncreas). |
Cádmio | Santos M, Almeida A. Danos Ocupacionais associados ao Cádmio, com ênfase no setor da Conservação e Restauro de Obras de Arte. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2020, 9: 1-20. DOI: 10.31252/RPSO.04.01.2020 | Os principais riscos associados ao Cádmio distribuem-se por vários contextos médicos, ainda que com consensos diferentes, a nível da Neurologia (alterações de memória e cognitivas, polineuropatias ou até Doença de Alzheimer); vertente Cardiovascular (Tensão Arterial, Aterosclerose, Doença Arterial Periférica, eventos coronários agudos, Insuficiência Cardíaca, Acidente Vascular Cerebral); Reprodução/Obstetrícia (Pré-eclampsia, alterações da Fertilidade); Pediatria (alterações do neurodesenvolvimento e comportamentais); Nefrologia (Proteinuria, Insuficiência Renal, Glomerulopatias, Litíase); Oncologia (próstata, mama, pâncreas, pulmão, útero, bexiga, rim e pele); Pneumologia (Bronquite, Fibrose); Oftalmologia (degeneração da mácula); Gastroenterologia (alterações hepáticas), Endocrinologia (Diabetes) e Ortopedia/Reumatologia (Osteomalacia, Osteoporose, fratura). |
Chumbo | Santos M, Almeida A. Danos Ocupacionais associados ao Chumbo, com ênfase no setor da Conservação e Restauro de Obras de Arte. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2019, 8: 1-36. DOI: 10.31252/RPSO.07.12.2019 |
Os principais riscos associados ao Chumbo (para todas as faixas etárias e em contexto ocupacional e não ocupacional), descritos na literatura mais recente, ainda que com consensos muito variáveis, podem estar relacionados às áreas destress oxidativo/inflamação, neurologia (quociente de inteligência, doenças degenerativas, alterações de memória/aprendizagem, alterações visuais, descoordenação motora, tremor, aumento do tempo de reação e/ou alterações comportamentais), gastroenterologia (cólicas, anorexia, náusea, hepatotoxicidade), hematologia (anemia, alterações na coagulação), nefrologia, cardiologia (tensão arterial), pneumologia, sistema imune (alergia, infeção, cancro e/ou doença autoimune), obstetrícia (aborto, malformação, pré-eclampsia, hipertensão arterial gestacional), pediatria (problemas auditivos, hiperatividade/deficitde atenção) e interferência reprodutiva (a nível de fertilidade e líbido) |
Crómio | Santos M, Almeida A. Danos Ocupacionais associados ao Crómio, com ênfase no setor da Conservação e Restauro de Obras de Arte. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2020, 9: 1-16- DOI: 10. 31252/RPSO.11.01.2020 | Trata-se de um oligoelemento, ou seja, um agente que participa em funções importantes no organismo, ainda que numa quantidade pequena; nomeadamente a nível do metabolismo dos hidratos de carbono, lípidos e proteínas. Apresenta vários estados de oxidação; a forma mais prevalente nos alimentos e no organismo é a trivalente (CrIII); este é razoavelmente estável e forma complexos com a água, ureia, amónia e ácidos orgânicos; geralmente só é tóxico com concentrações elevadas. Em circunstâncias alcalinas pode transformar-se em Crómio hexavalente (CrVI), que é muito perigoso, nomeadamente a nível de carcinogenicidade (por exemplo pulmonar). As versões mais comuns do crómio são a que ele está no estado oxidativo +3 (CRIII) e +6 (CRVI). A água pode conter níveis elevados de Crómio (Cr) VI, devido ao uso como desinfetante e associado ao cloro; já o Cr III que possa existir neste contexto, será proveniente da corrosão das condutas. A generalidade da população está então exposta ao crómio através dos alimentos e suplementos nutricionais, bem como água, ar e tabaco (neste último caso, sob o formato de CrVI). A nível profissional, é utilizado também na produção de inox, pigmentos e na soldadura de aço inoxidável. A NIOSH (National Institute for Occupational Safety and Health) elaborou normas para este agente, nomeadamente referindo que a concentração atmosférica de Cr VI não deverá ser superior a 1µg/ m3, para tempos de exposição não superiores a 10 horas diárias e 40 horas semanais; contudo, atualmente, em alguns contextos, considera-se 0,2 µg/m3, 8 horas por dia e 40 horas por semana.O crómio tem como principal forma para entrar no organismo as vias inalatória, digestiva, cutânea e ocular; pode competir com o ferro. Pensa-se que o ele possa ser nefro e hepatotóxico. Acredita-se que também possa ser cancerígeno, nomeadamente a nível dos seios perinasais, pulmão e estômago. Um dos artigos selecionados considerou que este agente pode-se associar a ulceração cutânea e dermatite de contato. A nível otorrinolaringológico são mencionadas a perfuração do septo nasal e Laringite; Rinite, epistaxes e ulceração da mucosa; bem como Bronquite Crónica e o Enfizema pulmonar. Há quem defenda também a associação com a diabetes. A nível oftalmológico é possível que ocorra irritação ocular. Por sua vez, a nível hematológico poderão suceder leucocitose/ leucopenia, monocitose e/ ou eosinofilia. |
Tolueno | Santos M, Almeida A, Lopes C, Oliveira T. Toxicidade dos Solventes em Contexto Laboral. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2019, 8: 1-22. DOI: 10.31252/RPSO/05.10.2019 |
É um produto incolor, muito inflamável e volátil, usado na produção de diversos agentes químicos, nomeadamente como constituinte de tintas, diluentes, perfumes, vernizes, borracha, colas, outros agentes de limpeza, cosméticos e como aditivo da gasolina. Contudo, globalmente é usado sobretudo como solvente. Está classificado pela IARC como grupo 3. A absorção ocorre sobretudo via inalatória e cutânea. Causa alterações a nível do SNC (Sistema Nervoso Central), nomeadamente depressão do mesmo, ou seja, confusão, descoordenação motora, síncope; bem como alteração na perceção das cores ou visuais em geral, diminuição do desempenho nos testes neurocomportamentais, alterações na memória, sonolência ou até morte; por exemplo, segundo alguns investigadores, níveis na ordem das 200 ppm por 8h originam geralmente astenia, cefaleia e tontura. Poderá estar associado a baixo peso ao nascer e a teratogenecidade/alterações congénitas e aborto (acima de 100 ppm); tal como parto pré-termo e maior mortalidade infantil. Contudo, as investigações não são consensuais, ainda que se saiba que atravessa rapidamente a placenta e deposita-se no tecido adiposo e cérebro do feto. Apesar de ser considerado fetotóxico, (categoria 3, 2 CLP- Classificação de substâncias perigosas), alguns investigadores defendem que, abaixo dos níveis máximos permitidos, não é necessário trocar por outro agente químico equivalente. Por sua vez, é classificado pelaEuropean Chemical Agencycomo tóxico em contexto de reprodução (categoria 2, ou seja, suspeito de perturbar a fertilidade ou induzir danos no feto). O nível de evidência que associa este agente a maior incidência ou aumento de gravidade da asma ou a outras alterações alérgicas é de pouca qualidade e/ou inconsistente. É, contudo, irritante aos níveis orofaríngeo, cutâneo e ocular. Está publicada a sua ototoxicidade direta, para além de que pode potenciar os danos no ruído, se existir exposição simultânea; tal como a sua geno, hepato e nefrotoxicidade (sobretudo em quantidades muito elevadas). Estão também descritas alterações oftalmológicas e a nível de hipertensão arterial, em alguns dos documentos consultados. |
Benzeno | Santos M, Almeida A, Lopes C, Oliveira T. Biomonitorização de Solventes. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 2019, volume 8, 1-30. DOI: 10.31252/RPSO.12.10.2019 Santos M, Almeida A, Lopes C, Oliveira T. Toxicidade dos Solventes em Contexto Laboral. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional on line. 2019, volume 8, 1-22. DOI: 10.31252/RPSO/05.10.2019 |
O benzeno é volátil, incolor, muito inflamável e com odor adocicado. Ele entra para o organismo via inalatória, cutânea ou oral. A absorção pela primeira via é rápida, sendo neste contexto excretado como fenol, óxido de benzeno, benzoquinona, muconaldeídos, hidroquinona e catecol urinário; após absorção a distribuição é razoavelmente rápida. Em contexto ocupacional, a principal via é a inalatória, ainda que a absorção diminua com o aumento da concentração ambiental, eventualmente devido a saturação; outros, por sua vez, publicaram que as principais vias de contato laborais são a inalatória e a cutânea. Independentemente do contexto laboral ou não, alguns investigadores defendem que a via inalatória é sempre a mais relevante. Enquanto que em alta concentração a toxicidade está bem documentada, o risco para quantidades menores não é tão consensual. Acredita-se que a toxicidade é justificada sobretudo pelos metabolitos- nomeadamente a nível oncológico, com destaque para a benzoquinona e os muconaldeídos e que se baseie no stress oxidativo, danos do DNA, alteração do ciclo celular e da apoptose (morte celular programada). Podem-se gerar espécies reativas de oxigénio e causar danos genéticos (quebras, trocas e/ ou alteração na capacidade de reparo do DNA). O benzeno não metabolizado é excretado na expiração e, em menor escala, também pela urina, sob o formato de fenol conjugado, hidroquinona, catecol e o trihidroxibenzeno. Contudo, à medida que a concentração ambiental aumenta, o sistema fica saturado e maiores quantidades de benzeno são expiradas. A concentração de Benzeno na produção de tintas geralmente é inferior à dos setores em que se utilizam essas mesmas tintas, sobretudo se a ventilação não for a adequada. A exposição mais intensa parece existir então na indústria da pintura; também poderão ser relevantes o setor da produção de borracha, produtos de limpeza, colas, vernizes, produção de calçado e couro, lubrificantes e pesticidas. É um dos constituintes da gasolina- como aditivo; ou seja, é prevalente na indústria petroquímica. Enquanto que noutros contextos o Benzeno foi parcialmente substituído por outras substâncias, nos produtos petrolíferos ele ainda continua muito presente, ou seja, é o principal constituinte do petróleo. Na Europa e nos EUA, os níveis máximos de benzeno na gasolina vão até 1%; em muitos países africanos este valor não existe como definição legal e pode atingir em alguns casos os 5%. Pode estar ainda inserido nos cigarros (pelo que os fumadores apresentam concentrações superiores, mesmo que passivos). Outros autores afirmam que os dois principais setores industriais associados são a produção de benzeno em si e o uso deste na origem de outros agentes químicos. Para além disso, também é razoavelmente prevalente nos setores da aviação, transporte de mercadorias, policiamento, taxistas, pesca e produção de calçado, bem como metalurgia/ siderurgia e atividades com proximidade a impressoras. A gravidade das consequências médicas depende da duração/ frequência da exposição, bem como da dose, para além do estado de saúde global e caraterísticas do indivíduo. A toxicidade está ainda dependente da biotransformação e existe por isso intervariabilidade individual muito significativa. A exposição aguda pode causar tontura, euforia, irritação (respiratória, gastrointestinal, cutânea e ocular), edema pulmonar, convulsões e alterações motoras (paralisia), bem como narcose, neurotoxicidade geral, cefaleia e naúsea, bem como depressão respiratória e eventual morte, ainda que o mecanismo de ação não seja compreendido na totalidade. As principais alterações mielodisplásicas são: mieloma múltiplo, leucemia linfocítica aguda, leucemia linfocítica crónica, leucemia mieloide aguda- LMA, linfoma não Hodgkin, ainda que outros discordam, anemia aplástica, pancitopenia, leucopenia, agranulocitose, anemia com macrocitose (para concentrações elevadas), alterações na contagem de plaquetas, nomeadamente trombocitopenia, eritrocitopenia, aumento do volume corpuscular médio, neutropenia, monocitose, eosinófilia e linfocitose. A IARC classifica-o como cancerígeno grupo 1 (para humanos) desde 1982, baseando-se em casos de leucemia linfocítica aguda e outros síndromes mielodisplásicos. Alguns investigadores publicaram que pode surgir anemia, mas para concentrações superiores a 10 ppm. As alterações nas outras linhagens celulares sanguíneas ocorrem acima de 8 ppm, contudo, o efeito final também depende da duração da exposição. Ou seja, se a exposição cessar numa fase inicial, poderá haver alguma reversibilidade dos danos. Alguns investigadores consideram que a contagem de linfócitos é um dos parâmetros mais sensíveis para detetar a exposição ao benzeno. Acredita-se que este agente consiga induzir quebras no seu DNA e que tal possa servir com um marcador de dano. A anemia aplástica pode ser uma percursora da LMA, ou seja, proliferação descontrolada de células mieloides imaturas. Para além destas questões hematológicas, o benzeno também se associa a: maior prevalência de parto pré-termo, bem como diminuição do diâmetro biparietal; ainda que tal não seja consensual, a evidência que associa a maior incidência ou aumento de gravidade da asma é de pouca qualidade e/ ou inconsistente,reações alérgicas, alterações neurológicas, danos hepáticos (que se refletem nas transaminases, sobretudo a partir de 10 ppm ainda que, para valores inferiores, os resultados tenham sido inconsistentes); o mecanismo pelo qual o benzeno altera a função hepática não é conhecido com clareza, perturbações imunológicas, alterações renais (que se manifestam na creatinina urinária), danos cutâneos (irritabilidade), anormalidades cromossómicas e a nível dos micronúcleos, por exemplo nos linfócitos periféricos, perturbações visuais (em situações de exposição crónica), alterações oncológicas no geral- nomeadamente a nível do pulmão, bexiga e pâncreas, danos reprodutivos (diminuição da fertilidade por alterações cromossómicas, aborto espontâneo, teratogenicidade e malformações, como a espinha bífida), anormalidades endócrinas, alterações cardiovascular e danos respiratórios. |
Sílica | Santos M, Almeida A, Lopes C. Silicose. Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 2022, 13: 1-14. DOI: 10.31252/RPSO.25.06.2022 |
A Sílica ou o dióxido de silício (SiO2) é constituída por oxigénio e silício. Na natureza existe nas formas amorfa e cristalina. A IARC considerou a Sílica cristalina inalada como cancerígena para humanos (grupo 1), provavelmente devido ao dado celular, inflamação,stressoxidativo e inibição daclearence. A Sílica amorfa não é considerada cancerígena para humanos (grupo 3). A Silicose existe em todos os países, mas é mais prevalente nos menos desenvolvidos, mesmo percebendo-se que a incidência real deverá ser superior à oficial, devido à situação estar sub-reportada. Nos países mais desenvolvidos a incidência/prevalência tem diminuído, devido à melhoria das condições de trabalho. A exposição é relevante via inalatória; vias cutânea e digestiva não têm geralmente consequências importantes em contexto laboral. O risco para a saúde varia com a concentração, dimensão das partículas- diâmetro, superfície e forma (mais perigosas se mais pequenas), tempo de exposição, tipo de Sílica (a cristalina, tridimita e a cristobalita são as mais lesivas, ainda que mais raras), densidade, solubilidade em água e lípidos, reatividade química, carater higroscópico e eletrostático, temperatura, velocidade do ar e atividade física do funcionário. Por sua vez, neste último, destacam-se o género, área corporal, idade, estado geral de Saúde, patologias prévias e tabagismo; ou seja, a suscetibilidade individual. As partículas podem ser inaláveis, torácicas ou respiráveis (estas últimas conseguem se depositar nos pulmões). A forma, tamanho e densidade das poeiras irão condicionar o comportamento e penetração no aparelho respiratório. A fração respirável é constituída por partículas com menos de 10 micrómetros, ou seja, com capacidade para atingir a zona onde se efetua a troca gasosa; maiores que isso, geralmente ficam depositadas na região nasal e torácica. As nanopartículas com Sílica menores que 100 nanómetros podem chegar à circulação sanguínea. Após a inalação, as partículas de Sílica depositam-se sobretudo nos bronquíolos e alvéolos; se aclearencemucociliar não for suficiente, surge inflamação (alveolite), que poderá posteriormente levar a fibrose e cancro. A ativação dos macrófagos origina radicais livres/espécies reativas de oxigénio, que nem sempre são atenuados pelas defesas anti-oxidantes. A exposição continuada potencia a libertação de citoquinas que, por sua vez, ativam mais macrófagos, neutrófilos e linfócitos; a produção aumentada de colagénio levará então à dita fibrose, diminuindo a rentabilidade e eficácia pulmonares; ou seja, diminuindo as trocas gasosas; sendo que esta pode também atingir a pleura. |
Metacrilato de metilo | Santos M, Almeida A, Oliveira T. Profissionais a exercer na Medicina Dentária: Principais Fatores de Risco e Riscos Laborais, Doenças Profissionais Associadas e Medidas de Proteção Recomendadas. 2018 |
Há eventual contato com metil-metacrilato (MMA) devido às bases de resina acrílica onde são montados os dentes artificiais; este pode causar irritação ocular e das mucosas, asma, enfizema, alterações no sistema nervoso periférico e alterações hepáticas16. Substâncias adesivas como o BIS-GMA (1:2 bisfenol-A diglicil éter e ácido metacrílico), TEGMA (trietilenoglicoldimetacrilato), HEMA |2-dimetaciloiloxietil-2,2,4 (3,3,5)-trimetil hexametileno dicarbamato| apresentam potencial citotóxico. Em motores de busca generalista também se encontram referências a situações de lipotímia, sonolência, vertigem, cefaleia; alterações cutâneas (edema, prurido, eritema); tosse, rinorreia, rouquidão, odinofagia e alterações oculares (eritema, edema, prurido, lacrimejo e diminuição da acuidade). Os monómeros acrílicos (acrilatos, metacrilatos e acrilato epóxi) são usados neste setor para a elaboração de próteses e reconstrução dentária. Todos estão associados a eczema de contato alérgico. Por exemplo, na Finlândia, concluiu-se que estes eram os principais agentes a conseguir tal entre os profissionais deste setor; a reatividade cruzada não é rara16. |
Nano partículas |
Santos M, Almeida A. Nanotecnologia e Saúde Laboral 2016. |
As caraterísticas físico- químicas dos nanomateriais (como tamanho, superfície, revestimento, forma, solubilidade, carga elétrica e recetores) vão determinar a maior ou menor facilidade com que entram para o organismo; por exemplo, dentro de uma mesma substância, quanto menor for a dimensão, maior será a reatividade (sobretudo quando se atinge o nível nanométrico) e a capacidade de penetração no organismo; o quociente comprimento/ diâmetro também influencia tal. Estas estruturas têm uma grande tendência para a aglomeração, ou seja, para se juntarem através de forças relativamente fracas, cuja ligação pode ser reversível. Ainda assim, acredita-se que estes materiais possam ser mais resistentes que o diamante ou o aço e mais leves que o alumínio As principais vias de entrada no corpo humano são a cutânea, gastrointestinal (por contaminação da comida/ bebida ou por transferência mão-boca), respiratória e ocular. Contudo, a nível laboral a mais importante é a via inalatória. As partículas dispersam-se com muita facilidade e, tendo a capacidade de se manter suspensas, rapidamente entram em contacto com o aparelho respiratório ou com a pele, sobretudo se descoberta. A penetração por via cutânea será também tanto mais intensa quanto menos íntegra estiver a pele (situação essa razoavelmente frequente em algumas profissões de risco); para além disso, quanto maior for a absorção, mais danificada ficará a barreira de proteção que a pele deveria constituir, constituindo-se um ciclo vicioso. As nanopartículas são muito resistentes, pelo que se vão acumulando ao longo da cadeia alimentar. Para além disso, estas partículas não constituem um grupo homogéneo; por exemplo, estima-se a existência de 50.000 tipos diferentes de nanotubos de carbono, entre todos os outros tipos de nanotubos, pelo que elaborarguidelinesgeneralistas que abarquem todos os casos seja muito difícil. Por vezes, alguns nanomateriais podem conter contaminantes que aumentam ainda mais a toxicidade. Após deposição no pulmão (facto esse possível devido às dimensões muito pequenas), estas substâncias facilmente chegam a outras zonas distantes do corpo, através da circulação sanguínea e/ ou linfática (como o cérebro, coração, fígado ou até medula óssea). Deve-se realçar que a deposição pulmonar fica potenciada com a atividade física, que também é frequente em alguns postos de trabalho. O material considerado “estranho” pelo sistema imune é destruído pelos neutrófilos, libertando-se no processo vários mediadores inflamatórios. Estudos em ratos verificaram um aumento da incidência de granulomas e fibrose ou até mesoteliomas, sobretudo com exposições prolongadas e intensas. Alguns autores acreditam que poderá surgir alteração no controlo do ritmo do coração e outras caraterísticas cardíacas funcionais, aumentando assim também o risco de enfarte agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e até episódios de morte súbita; para o qual também certamente contribui o atingimento das placas de aterosclerose. Algumas investigações também alegam como provada a toxicidade renal destes produtos. A nível de Medidas de proteção coletiva, podem ser consideradas a eliminação dos produtos mais tóxicos e/ou troca por outros de menor toxicidade, bem como isolamento das zonas mais problemáticas e/ou aperfeiçoamento da ventilação, pressão negativa e/ou uso de robots; não esquecendo a monitorização ambiental e medidas de organização do trabalho, como turnos rotativos nas tarefas de maior risco. Alguns autores também recomendam que nas áreas de trabalho seja proibida a ingestão de comida e bebida, bem como tabagismo; outros também acrescentam que poderá haver risco até com a aplicação local de cosméticos. A nível de EPI (equipamentos de proteção individual) são destacados o uso de máscara respiratória com filtro, fato, luvas sem pó, óculos, calçado fechado, calças longas, mangas compridas e casaco; alguns autores até sugerem o uso de dois pares de luvas. No armazenamento destas substâncias deve ficar claro bem claro o conteúdo e, mesmo os funcionários de limpeza ou embalamento dever usar os EPI adequados. Aliás, a roupa de trabalho deve ficar separada da que os funcionários usam para a viagem até casa. |
CONTEÚDO
Definição de Produtos Cosméticos
Cosmético poderá ser definido como substância única ou mistura, com a função de melhorar a higiene, odor e/ou aparência (1). Ou seja, é utilizado para limpar, proteger, embelezar, tornar mais saudável e/ou mais jovem, mas sem alterar estruturalmente o organismo (2). O conceito varia entre países, ou seja, sabões e perfumes, por exemplo, não estão uniformemente aqui incluídos (1).
Mais recentemente surgiu o conceito de cosmecêutico (dermocosmético, cosmético funcional ou de desempenho), no sentido de constituírem produtos que têm por objetivo originar alterações positivas e mais duradoiras, na pele, mucosas e/ou couro cabeludo. Tratam-se por isso de substâncias muito diferentes entre si (eventualmente baseados em colagénio, elastina, cafeína, ouro, retinois e estrogénios); por vezes utilizando a nanotecnologia (1).
Distinguem-se dos fármacos porque estes últimos são utilizados em contexto médico e com os objetivos de tratar/prevenir patologias, produtos estes sujeitos a um controlo de qualidade mais rigoroso (2).
Por curiosidade, menciona-se de forma clara que excipiente é o componente mais inerte que acrescenta alguma propriedade ao produto final. Princípio ativo é a substância que consegue produzir alguma alteração (3).
Contextualização histórica
A nível histórico, a palavra "cosmético" deriva de um termo grego, que significa "habilidade em adornar". Existem evidências do uso de produtos com estes objetivos desde 4000 Antes de Cristo. Por exemplo, os egípcios pintavam os olhos com sais de antimónio e usavam loções/cremes com o objetivo de terem proteção solar (baseados em gordura animal e vegetal), bem como produtos com cera de abelhas, mel e leite. Na Bíblia, por sua vez, existem registos de perfumes/óleos para usar no banho. Os gregos e os romanos foram os primeiros a fabricar sabões, a partir de azeite, óleo de pinho e minerais obtidos através da moagem de rochas. Nas peças de teatro destas civilizações, era frequente o uso de maquilhagem (1); por vezes, a situação poderia ser fatal, devido ao chumbo e mercúrio (1) (4). No passado não se conhecia com rigor a composição dos produtos cosméticos e/ou as respetivas consequências médicas; por exemplo, os pós faciais podiam ter chumbo; o rouge (antigo blush) e batons podiam conter mercúrio (4).
Após a queda do império Romano, os banhos passaram a ser menos frequentes, tendo a situação se alterado apenas no império bizantino (daí o termo de "banhos turcos"). Aliás, no século X, o cabelo era lavado com ervas e argila e não com água, até pelo efeito desinfestante. No século XIII os banhos foram proibidos, porque se considera que estes aumentavam o risco de se ser infetado pela peste. Nos quatro séculos seguintes o banho não melhorou muito a sua reputação na Europa, até porque se considerava tal como sacrilégio e lascivo; ou seja, a água quase só era usada para beber e a higiene mínima era realizada com pastas e perfumes. Ao longo do século XIX foram surgindo noções relativas aos benefícios da higiene; o contato com alguns povos fora da europa, com valorização do banho, também pode ter ajudado (1).
No século XX o setor dos cosméticos foi muito desenvolvido, nomeadamente a nível de baton em tubo, desodorizante, produtos para ondular o cabelo, shampoo, tinta de cabelo e pasta de dentes com fluor; posteriormente pó-de-arroz, produtos com proteção solar e antienvelhecimento (1). Como os cosméticos conseguem potenciar a aparência e a atratividade, cada vez têm mais procura a nível internacional, alicerçada por um marketing cada vez mais eficaz (2). Na década de 50 o uso de cosméticos banalizou-se na generalidade da população feminina e, também aí, surgiram as primeiras normas de produção. Posteriormente, as evoluções técnica e científica aperfeiçoaram o setor e mais recentemente surgiu a dimensão nanotecnológica (4).
O uso mais rigoroso do petróleo para a produção de substâncias sintéticas permitiu o desenvolvimento da indústria cosmética, associado à melhoria das condições de vida e maior poder de compra de produtos que satisfaçam para além das necessidades básicas; para além disso, cada vez existem mais preocupações com a higiene e aparência física. Contudo, trata-se de um setor onde coexistem multinacionais e empresas quase artesanais (1).
Exemplos de Produtos Cosméticos
Este tipo de produtos poderá ser dividido nas áreas da higiene, maquilhagem, perfumes e produtos para bebé (1). Outra classificação possível poderá ser dividir em hidratantes, perfumes, batons, glosses, vernizes, maquilhagem facial e ocular, shampoo, tinta de cabelo e desodorizante. Eles podem existir nas versões líquida, semilíquida, sólida, granular e volátil. Os produtos de maquilhagem constituem uma pequena parte do global dos cosméticos (2).
Em todos os países existem cosméticos produzidos localmente e outros importados (2). Entre os produtos cosméticos de produção em pequena escala, o sabonete é um dos mais frequentemente envolvidos. Este, pelo seu baixo teor de água, tem menor risco biológico, sobretudo se se cumprirem com as normas de boas práticas. Em situação oposta está a produção de cremes, bálsamos, loções e óleos que, pela maior concentração de água, apresentam maior risco, são mais complexos e geralmente produzidos em empresas de maior dimensão (3).
O Ph dos desodorizantes é o mais elevado entre os cosméticos, ou seja, cerca de 7; os produtos usados na pele geralmente têm um ph de cerca de 5 (1).
Normas e Controlos de Qualidade
A entidade coordenadora para a produção de cosméticos em alguns contextos é a câmara municipal (3). Em alguns países os cosméticos não têm qualquer controlo de qualidade prévio à inserção no mercado; ou seja, a sua segurança é averiguada à posteriori, de forma mais rigorosa se surgirem queixas de clientes (2).
Principais etapas de produção e estruturação
Este setor inclui as seguintes etapas: avaliação, qualidade, recursos humanos, construção das instalações, higienização, produção, documentação e gestão da distribuição do produto (5).
Genericamente aglutinam-se nos seguintes tipos de postos: produção, controlo de qualidade e avaliação de segurança. A nível de secções deverão existir áreas para armazenamento de matérias-primas, fabrico, armazenamento de produtos intermediários, controlo de qualidade, armazenamento do produto acabado e instalações de apoio (sanitárias e balneárias) (3).
Principais Fatores de Risco e Riscos Laborais
Existem poucos estudos em contexto de saúde e segurança ocupacionais neste setor; de forma escassa alguns investigadores destacaram questões ergonómicas e exposição a agentes químicos/partículas (solventes, nanopartículas) (4). Os principais fatores de risco são químicos (ver de seguida) e físicos (ruído, iluminância, vibração, desconforto térmico e quedas), ergonómicos (postura, movimentos repetitivos e turnos prolongados); ansiedade/stress e risco de incêndio (5).
Uma avaliação de riscos neste setor concluiu que 24% das tarefas apresentavam risco baixo, 71% médio e elevado nos restantes 5%. Neste documento a atividade mais perigosa foi a mistura de várias substâncias em máquinas de dimensão considerável (5).
-agentes químicos
As reações que poderão surgir dividem-se em irritativas (desconforto, prurido cutâneo), sensibilização (imediata ou tardia) e/ou com efeito sistémico (genotóxico, mutagénico e/ou cancerígeno) (4).
As matérias-primas usadas na produção de cosméticos são os corantes/pigmentos, essências, excipientes (abrasivos, repelentes de água, antioxidantes, produtos para controlo da fluidez e/ou de ph, emolientes, emulsificantes, tensoativos, surfactantes, espessantes e/ou estabilizadores) e princípios ativos (bloqueadores de radiação ultravioleta, biocidas, conservantes e/ou agentes anti acne, anticaspa, antitranspirantes). A generalidade das matérias-primas usadas neste setor é inofensiva a nível médico (3). Apenas algumas destas têm valores limite de exposição (4).
As sombras, por exemplo, podem ser constituídas por mica, óxido de ferro e esterato de zinco.
Os produtos novos têm de ser devidamente testados e tal também pode implicar alguns riscos para os funcionários, uma vez que alguns são cancerígenos.
Em algumas etapas existe hidróxido de sódio ("soda cáustica"); os utensílios onde este é armazenado devem ser de material adequada (aço inox, polietileno de alta densidade, polietileno ou polipropileno); alumínio não, pelo risco de originar hidróxido de alumínio (3).
Os produtos para a acne contêm por vezes antibacterianos (por exemplo, enxofre, taninos, quinino e peróxido de benzoílo) (3).
Alguns shampoos podem conter produtos fungicidas (3).
A nível de antioxidantes, utilizam-se por vezes alguns ácidos (cítrico e ascórbico); contudo, com ph seguro. Para corrigir o ph, quando necessário, podem ser usadas bases, igualmente com ph seguro (3).
A nível de essências, por vezes existem na sua composição cetonas, aldeídos e/ou solventes em geral (3). Até alguns agentes usados como aromas podem causar reações alérgicas (4).
Os propelentes (ou seja, agentes com a função de transportar algumas substâncias) podem ser constituídos por solventes; os que são usados nos dias de hoje são geralmente inofensivos, para a saúde e ambiente. Por exemplo, os clorofluorcarbonos (ou CFCs) foram eliminados deste setor no final do século passado (3).
Contudo, a exposição continuada a alguns destes componentes pode originar reações alérgicas (3).
No entanto, como alguns cosméticos podem favorecer o crescimento microbiano, dado serem constituídos por componentes interessantes neste contexto (carbono, sais minerais e água); alguns microrganismos podem originar transformação em novos produtos (como etanol em ácido acético e ureia em amónia). Por sua vez, alguns dos processos de esterilização podem envolver utilização de agentes químicos (como ácidos fracos: citrino e ascórbico). Para além disso, o contato continuado com alguns biocidas pode potenciar a resistência de alguns microrganismos (3).
As normas entre países não são homogéneas, pelo que alguns agentes químicos que estão proibidos nuns locais, continuam a ser utilizados noutros (chumbo, crómio, níquel, mercúrio, arsénio, cádmio, hidroquinona, esteroides, nitrosamida), com introdução deliberada ou como contaminante, com eventuais consequências a nível oncológico, renal, dermatológico e/ou endócrino (2).
Os corticoides, por sua vez, se usados de forma prolongada, poderão levar a acne, formação de estrias, maior risco de infeção, catarata e resistência à insulina/alterações do controlo glicémico, osteoporose, hipertensão arterial, disfunção erétil, amenorreia e retinopatias (2), segundo a bibliografia selecionada.
A hidroquinona, sobretudo se superior a 2%, pode levar a hipo ou hiperpigmentação, bem como alterações da elasticidade da pele. Em países em que a maioria da população tem um tom de pele escuro, geralmente são considerados mais atraentes os que tiverem uma cor mais clara, pelo que o uso de produtos para aclarar está razoavelmente banalizado; por vezes, não se preocupando e/ou não tendo conhecimento das consequências médicas das matérias-primas utilizadas na elaboração destes produtos. Por via oral poderá levar a hiperpigmentação da pele (tom azulado-negro); via cutânea, curiosamente, pode ser usada para aclarar, como já se mencionou, uma vez que consegue diminuir a produção de melanina; contudo, exatamente por isso, também potencia os riscos da radiação ultravioleta. Na União Europeia (UE) está proibida a sua utilização com este objetivo (2).
Os principais metais pesados encontrados neste contexto são o cádmio, chumbo, níquel, mercúrio, manganésio, crómio, arsénio e tálio (2). De realçar que a maioria dos corantes tem componentes metálicos (4).
O arsénio é muito tóxico e existe na água de muitos locais do planeta; mesmo em quantidades muito pequenas, pode ser fatal; é cancerígeno, nomeadamente para a bexiga (2); está também descrito que pode cursar com hiperpigmentação, queratose, alterações vasculares e endócrinas, pulmonares e linfáticas, dermatológicas, renais e hepáticas- foi por isso banido da UE, ainda que ainda possa existir como contaminante em loções faciais, champôs, bases.
O mercúrio já foi usado com alguma regularidade em terapias médicas no passado, agora a utilização é muito restrita, mas ainda existe em alguns procedimentos dentários em alguns países ("chumbar" dentes). A versão timerosal é usada no rymel e em algumas vacinas, como conservante, ainda que com uso cada vez menor. O mercúrio-cromo, por sua vez, ainda é utilizado como antisético tópico em alguns países. A versão cinabar é utilizada na medicina tradicional chinesa. Mesmo na Medicina convencional ainda é usado nos países subdesenvolvidos em produtos como antiséticos, laxantes, para eritema das fraldas e colírios. O mercúrio pode ser absorvido vias cutânea, mucosa e inalatória. Outros descrevem que prejudica a pele e a função renal/hipertensão arterial, pelo que está proibido. Pode originar intoxicação aguda e crónica; na última podem existir alterações cognitivas e do sono, astenia, irritabilidade, perda de memória e depressão; na versão aguda poderá encontrar-se toracalgia, dispneia, tosse, hemoptise e pneumonite (2).
A intoxicação por cádmio carateriza-se por náusea, vómito, diarreia e cefaleia; por via inalatória pode originar tosse, dispneia e broncopneumonia, pode acumular-se no fígado e rim (2). Outros descrevem toxicidade a nível oncológico, renal, neurológico, reprodutor e respiratório- foi banido da UE e Japão, mas ainda existe em produtos como sombras e gloss.
O chumbo apresenta absorção cutânea (2) (4) e inalatória (4) e pode conseguir atingir o SNC (Sistema Nervoso Central) (2) (4). A semiologia de intoxicação aguda pode por isso incluir ataxia, cefaleia, vómito, apatia, alucinação, tremor e convulsão; se crónica: emagrecimento, anemia, lesão renal e perda de memória; este agente pode acumular-se nos ossos e dentes (2). Pode estar presente em tinta de cabelo e/ou baton (4).
O contato cutâneo com o níquel pode levar a eczema; com ingestão poderá ocorrer depressão do SNC; por inalação poderá ser cancerígeno para os seios perinasais- na classificação da IARC (International Agency for Research on Cancer) está como potencialmente cancerígeno para humanos (2).
O crómio também é cancerígeno (pulmão) e eventualmente corrosivo a nível cutâneo (2). Estão também descrita as toxicidades hematológica, hepática, renal e ocular- foi banido da UE. Poderá ser encontrado em produtos como sombra e gloss.
A inalação de manganésio pode levar a alterações do SNC ("manganismo") (2).
90% das nitrosaminas são cancerígenas, com destaque para os níveis esofágico e gástrico (2).
A amónia, por sua vez, pode estar presente em tinta de cabelo; pode irritar a pele e/ou o aparelho respiratório (4).
Os parabenos funcionam como conservantes devido às propriedades antimicrobianas; contudo, alguns investigadores descrevem que podem ser potencialmente cancerígenos e/ou causar alterações endócrinas/reprodutivas (4).
O formaldeído pode causar irritabilidade ocular, orofaríngea, respiratória e nasal; também é considerado carcinogénico (em contexto de nasofaringe e/ou leucemia); a 0,2% atua como conservante. É usado em produtos de alisamento de cabelo e endurecedor ungueal (4), bem como verniz, rímel, champô e blush- foi banido da UE e Japão.
O alcatrão de carvão ou de hulha também é considerado cancerígeno e é usado em tinta de cabelo (4). Está publicada toxicidade pulmonar, vesical, renal e digestiva- foi também banido da UE. Poderá ainda assim ser doseado em produtos como tinta de cabelo, champô, tratamentos capilares e para a rosácea.
A cocamida DEA também é vista como cancinogénica; apresenta absorção cutânea (4).
O tolueno é considerado muito tóxico (4); como qualquer solvente pode causar alterações respiratórias, dermatológicas e até cancerígenas.
A oxibenzona pode justificar reações alérgicas com a exposição solar; levar a mutações e alterações endócrinas. Existe em alguns produtos para proteção solar (4), curiosamente.
O ácido bórico é um ácido fraco antissético; suavemente bacteriostático e fungostático; pode causar irritabilidade ocular e do sistema respiratório. Existe em vernizes e cremes para a pele (4); poderá apresentar neurotoxicidade se em concentração mais elevada.
O sulfato de sódio pode originar reações alérgicas. Poderá estar inserido em champôs e removedores de maquilhagem, sais de banho e pastas de dentes (2). Sulfatos em geral estão descritos como eventualmente associados a eczema ou até hepatotoxicidade.
Os ftalatos podem causar alterações endócrinas/reprodutivas, irritabilidade cutânea e/ou até efeito carcinogénico. Podem estar inseridos em vernizes, perfumes, sabonetes, champôs e sprays capilares (4).
As nanopartículas, existentes em inúmeros produtos, podem circular pela corrente sanguínea (4). Estas podem ser cancerígenos e/ou causar alterações respiratórias.
Poderá também ocorrer exposição a matéria particulada neste setor.
Os Compostos Orgânicos Voláteis- COVs- que podem incluir a acetona, benzeno, etanol; existem todos nos vernizes e podem apresentar toxicidade respiratória, ocular, dermatológica e do SNC. O benzeno apresenta toxicidade respiratória, endócrina, hematológica (nomeadamente em contexto de leucemia), ocular e no SNC- foi banido da UE; poderá estar inserido em produtos como amaciador e gel de cabelo. O óxido de etileno pode apresentar toxicidade oncológica: hematológica (nomeadamente em contexto de leucemia), linfática e mama; alterações endócrinas e reprodutivas- banido da UE.
Alguns óleos minerais podem apresentar toxicidades ocular, dermatológica e respiratória. Podem ser encontrados em produtos como sombra, gloss, baton, amaciador, despigmentador, tinta de cabelo, gel de cabelo, blush e corretor.
A fenacetina tem relatos de estar associada a toxicidade renal, hematológica e a nível de cancro de mama. É usada como despigmentante, tinta de cabelo e em alguns produtos de depilação- está banida dos EUA.
A sílica, por usa vez, poderá apresentar, entre outras, toxicidade respiratória e ocular. Neste contexto pode ser encontrada em produtos como baton, gloss, eyeliner, base, proteção solar e champô.
O acetato de etilo pode apresentar toxicidade respiratória e do SNC (manifestada, por exemplo, por cefaleia, confusão, astenia).
Por sua vez, o metacrilato de metilo pode cursar com toxicidade respiratória (sibilos e tosse) e ocular.
O agente polifluoroaquil é considerado por alguns investigadores como cancerígeno.
À fenilenediamina, existente em algumas tintas de cabelo, estão eventualmente associadas alterações dermatológicas e cancro.
O contato com dioxano pode cursar com irritação ocular, nasal, orofaríngea e pulmonar; surgindo eventualmente sintomas como tosse, sonolência, vertigem, cefaleia, vómito e epigastralgia; é possivelmente carcinogénica para humanos.
O agente triclosan, por sua vez, tem propriedades antibacterianas, mas pode gerar alterações endócrinas.
Outros agentes químicos mencionados em sites como sendo utilizados neste setor profissional (mas sem acrescentar detalhes à sua designação apenas) serão o hidróxido de amónio, ácido tioglicocólico, benzoato de sódio, cloreto de potássio, peróxido de hidrogénio, hidróxido de cálcio, monofluorato de sódio, metilcelulose, carbonato de cálcio e silicone.
De forma resumida, segue-se a lista de agentes químicos utilizados neste setor, que deveriam ser banidos dos EUA e já foram todos proibidos na europa: formaldeído; paraformaldeido, metilenoglicol, quartenium 15; mercúrio; ftalatos; parabenos: polifluoroaquil e a fenilenediamina.
-poeiras
Uma das etapas de transformação poderá ser a moagem, onde se produzem pós muito finos (3) (4); tal como nas tarefas de peneiramento, granulação e descarga de matérias-primas (4).
-desconforto térmico e eventual queimadura
Alguns dos processos de esterilização podem envolver temperaturas elevadas. Por sua vez, pode ser necessário baixar muito a temperatura em alguns processos de cristalização (3).
-agentes biológicos
Alguns cosméticos podem favorecer o crescimento microbiano, dado serem constituídos por componentes interessante neste contexto (carbono, sais minerais e água); para além disso, alguns microrganismos podem formar novos produtos (como etanol versus ácido acético e ureia em amónia). O contato continuado com alguns biocidas pode potenciar a resistência de alguns microrganismos (3). Assim, da parte dos trabalhadores, pode haver exposição a bactérias, fungos e vírus (4).
-posturas forçadas/mantidas e/ou movimentos repetitivos
Poderá haver risco músculo-esquelético, eventualmente associado às posturas, ritmos e outras caraterísticas dos turnos.
-ruído
Em algumas tarefas também poderá haver ruído.
Sinistralidade
Os principais acidentes associam-se aos agentes químicos (5). Num estudo russo, por sua vez, além destes, verificou-se que os principais acidentes neste setor estavam associados a contato com eletricidade, queimadura, queda em altura (em contexto de armazém), atracamento/corte com máquinas com peças em movimento e lesões associadas a explosão (6).
Medidas de Proteção
A nível coletivo, em função da bibliografia consultada, existem medidas de organização das técnicas de trabalho que podem minimizar os riscos respiratórios, como a ventilação e controlo da emissão de fumos e/ou outras partículas.
Os Equipamento de Proteção Individuais a considerar neste contexto são a farda, máscara (para vapores, poeiras, gases), luvas de plástico e de borracha (corte, queimadura, abrasão, agentes químicos), óculos (para agentes químicos e poeiras), proteção cefálica e meias (5); bem como aventais (também para agentes químicos e poeiras), macacão (agentes químicos) e calçado de segurança (em contexto de queda e agentes químicos).
DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO
A informação reunida foi escassa, quando comparada com a bibliografia já publicada para a generalidade dos outros setores profissionais; para além de que, ainda assim, é dada maior enfase aos agentes químicos e sempre valorizado mais o risco para o cliente do que para quem elabora o produto, ainda que, na escassez de artigos mais diretos, se tenha tentado extrapolar tal.
Por exemplo, em contexto de Medidas de Proteção Coletiva, poder-se-iam ainda considerar a troca por produtos menos tóxicos, restringir o acesso às zonas mais problemáticas, promover a rotatividade, escalar menos funcionários nos momentos com etapas mais perigosas, sinalizar e proporcionar formação.
Por sua vez, a nível de doenças profissionais, ainda que nenhum tenha sida rotulada como tal pela bibliografia, poderemos mencionar as lesões músculo-esqueléticas, hipoacusia, eczema, alterações da pigmentação cutânea, doenças cancerígenas diversas, bem como renais, hepáticas, endócrinas e/ou reprodutoras.
Seria particularmente relevante que empregadores desta área estivessem motivados a estudar algumas das variáveis descritas na pergunta que originou esta revisão (sobretudo os itens menos desenvolvidos na literatura internacional), de forma a divulgar tal em publicação científica.