Introdução
O envelhecimento da população surge como tema de grande atualidade a nível mundial e em Portugal, uma vez que temos assistido a um aumento da população idosa e com prognóstico de um crescimento nos próximos anos. A Organização das Nações Unidas (ONU) refere que em 2018, pela primeira vez existiam mais pessoas idosas do que crianças com menos de cinco anos (ONU News, 2019).
De acordo com os resultados das últimas projeções do Instituto Nacional de Estatística (INE), em Portugal prevê-se um aumento da população com mais 65 anos de idade, em que poderá passar de 2,1 para 2,8 milhões de pessoas, entre 2015 e 2080 (INE, 2017).
As famílias alem das mudanças demográficas têm vindo a enfrentar um processo de profundas transformações devido a vários fatores económicos, sociais, políticos e culturais, contribuindo para as alterações na estrutura familiar. O idoso convive com maior número de gerações e em menor quantidade de familiares por geração.
Para um processo de envelhecimento ativo e saudável, é reconhecido o papel fundamental da família no cuidar do idoso. Quanto mais harmonioso e equilibrado for o sistema familiar, melhor é a adaptação do indivíduo às alterações relacionadas ao processo de envelhecimento. Em contrapartida, quando o sistema familiar apresenta dificuldades em aceitar e entender o processo de envelhecimento de um de seus membros, a convivência familiar se torna conflituosa e pode trazer repercussões físicas, emocionais, sociais e económicas para o enfrentar dessa etapa no ciclo de vida familiar (Sousa, 2021).
A família como unidade sistémica com funções sociais, dotada de energia, com capacidade auto-organizativa é um espaço privilegiado e por excelência de suporte à vida e à saúde dos seus membros (Figueiredo, 2012).
Existem outros fatores que interferem na funcionalidade familiar, os quais requerem estruturação e adequação, tais como condições sociais, composição familiar, falta de adaptabilidade às mudanças e papéis de seus membros, além dos aspetos intrínsecos como a idade (Vera et al., 2015).
O contributo dos enfermeiros especialistas para um envelhecimento sustentável é muito importante (Rocha et al., 2022) especificamente os enfermeiros de família que atuam ao longo do ciclo vital na promoção da saúde, na prevenção da doença e reabilitação, prestando cuidados às pessoas doentes, sendo um agente facilitador para que os indivíduos, famílias e grupos desenvolvam competências para um agir consciente, quer em situações de crise, quer em questões de saúde (Regulamento nº367/2015). Um dos objetivos do desenvolvimento sustentável é: “Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades” é essencial para a realização dos outros objetivos do desenvolvimento (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2016).
O Modelo Dinâmico de Avaliação e Intervenção Familiar (MDAIF) (Figueiredo, 2012) constitui uma matriz operativa para o desenvolvimento de práticas direcionadas à família, enquanto alvo de cuidados de enfermagem, no contexto dos Cuidados de Saúde Primários. A sua construção emergiu num percurso de investigação-ação desenvolvido com os enfermeiros que prestavam cuidados à família. Tem como pressupostos o reconhecimento da complexidade do sistema familiar, com uma organização específica, considerando as propriedades de globalidade, equifinalidade e auto-organização. Os cuidados de enfermagem centrados na família, enquanto cliente e unidade de intervenção, pressupõe uma abordagem sistémica, com ênfase no estilo colaborativo, e potencialização das forças, recursos e competências da família. Considerando a família como unidade de cuidados, o foco é tanto na família como um todo, quanto nos seus membros individualmente.
A avaliação Funcional do MDAIF alude aos padrões de interação familiar. Integra duas dimensões do funcionamento da família: a instrumental e a expressiva. A dimensão expressiva realça as interações entre os membros da família visando a identificação de necessidades familiares (Figueiredo, 2012).
Releva-se que, tal como comprovado no estudo efetuado por Silva et al. (2022), as famílias, no seu ambiente interno, possuem mais recursos do que fraquezas.
Um dos instrumentos de avaliação que compõem a dimensão expressiva é o Adaptation, Participation, Growth, Affection, Resolution (APGAR Familiar de Smilkstein) (Figueiredo, 2012).
Um estudo efetuado com Revisão Integrativa da Literatura de forma a sistematizar o conhecimento produzido através da escala do APGAR de Família, na identificação da funcionalidade nas relações familiares de idosos concluiu que todos os artigos analisados descrevem que o APGAR de Família é um instrumento de avaliação da família de fácil aplicação e interpretação e possibilita a deteção precoce da disfunção familiar (Ivania et al., 2015).
No Plano Nacional de Saúde 2030 (DGS, 2022), “Saúde sustentável: de tod@s para tod@s”, de entre os cinco grandes desígnios para Portugal, consta o Promover o desenvolvimento de comportamentos, culturas e comunidades saudáveis, do qual consta o Dinamizar ambientes promotores de saúde. Certamente este desiderato contribui para a obtenção de ganhos em saúde. Este desígnio enfatiza a relevância do ambiente para a saúde ao longo do ciclo de vida individual e das famílias.
Este estudo surgiu pelo fato de se perceber que a Funcionalidade Familiar interfere com a saúde do idoso e segundo Campos et al. (2017) as diversas situações e vivências que o processo de envelhecimento apresenta aos idosos e aos seus familiares podem afetar a Funcionalidade Familiar.
Este estudo é importante para contribuir para o desenvolvimento do conhecimento na área de saúde familiar e despertar para o cuidado com a Família da pessoa idosa, de forma a avaliar, monitorizar e intervir com o propósito dos melhores ganhos em saúde familiar e compreenderem a importância da Funcionalidade Familiar para a promoção do envelhecimento saudável e digno (Ferreira et al., 2019).
O objetivo principal deste estudo de investigação é avaliar a funcionalidade das famílias dos idosos de uma Unidade de Saúde Familiar, do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) da região Norte de Portugal.
Metodologia
Estudo observacional, descritivo e transversal, utilizando uma abordagem quantitativa. Neste estudo de investigação, considerou-se como população alvo a díade família/utente idoso, que satisfez cumulativamente os critérios de inclusão (Fortin, Côté & Filion, 2009). A amostra foi “constituída por indivíduos facilmente acessíveis e que respondam aos critérios de inclusão precisos (…) permitindo escolher indivíduos que estão no local certo e no momento certo” (Fortin et al., 2009, p. 321). Os critérios de inclusão considerados foram: i) Famílias inscritas na Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte, numa Unidade de Saúde Familiar, de um ACES da região Norte de Portugal; ii) Famílias com pelo menos um membro com idade igual ou superior a 65 anos, acompanhadas pela equipa de enfermagem no domicílio. Na Unidade de Saúde Familiar, a população de idosos acompanhados no domicílio perfazia um total 70 pessoas.
A amostra é definida pelos critérios de exclusão que foram: i) Família cujo idoso se encontra ao cuidado de uma instituição (pública ou privada); ii) Família cujo idoso não apresenta condições cognitivas após aplicação do Mini Mental State Examination (Versão portuguesa validada por Guerreiro et al., 1994).
No presente estudo correspondeu aos idosos inscritos na Unidade de Saúde Familiar, que tiveram consulta de enfermagem no domicílio entre dezembro de 2020 e fevereiro de 2021. A amostra final ficou constituída por 60 idosos, cerca de 85,7% da população. O tipo de amostragem foi não probabilístico, por conveniência também chamada acidental (Vilelas, 2020).
Foi aplicado um formulário constituído por variáveis sociodemográficas e pela Escala de APGAR Familiar (Smilkstein, 1982), validada para a população Portuguesa por Agostinho & Rebelo (1988). É uma escala constituída por cinco questões que avalia a perceção do indivíduo inquirido da funcionalidade da relação familiar. Permite caracterizar os componentes fundamentais da função familiar em: Adaptação (Adaptability) intrafamiliar - indica a utilização de recursos dentro e fora da família, para a solução de problemas que interferem no equilíbrio das mesmas durante a crise; Participação/comunicação (Partnership) - diz respeito a partilha na tomada de decisões e responsabilidades pelos membros da família; Crescimento/desenvolvimento (Growth) - refere-se à maturidade física, psíquica, emocional e realização conseguida pelos membros da família através de mútuo acordo e orientação; Afeto (Afecttion) - determina a existência de relações de cuidados ou ternura que ocorrem entre os membros da família; Dedicação ou decisão (Resolver) da família - repercute-se no compromisso tomado de dedicar tempo a outros membros da família, incentivando-os física e emocionalmente, implicando também uma decisão na partilha de bens e espaço. A escala de medida utilizada no nosso estudo é composta por cinco itens cotados de zero (0) a dois (2) pontos. Cada questão tem três possibilidades de resposta e pontuação: “quase nunca” (0); “algumas vezes” (1); “quase sempre” (2). A pontuação final da escala é obtida pela soma das pontuações atribuídas a cada uma das questões, podendo variar entre zero (0) e dez (10) pontos. De sete (7) a dez (10) pontos, corresponde a um entendimento de família altamente funcional; de quatro (4) a seis (6) pontos, família moderadamente funcional; de zero (0) a três (3) pontos, família com disfunção acentuada.
O formulário foi submetido a um pré-teste. Esta etapa é de todo indispensável e permite corrigir ou modificar, resolver problemas e imprevistos e verificar a redação e a ordem das questões. O pré-teste foi realizado a dez utentes de outra Unidade de Saúde Familiar do mesmo ACES, com caraterísticas muito semelhantes às da amostra em estudo. As perguntas não suscitaram dúvidas pelo que não foram efetuadas alterações.
Os dados foram recolhidos pelos investigadores e pelo enfermeiro de família, aquando da visita domiciliaria, após verificação dos critérios de exclusão e explicado o teor e os objetivos da investigação, salvaguardando a confidencialidade. Os enfermeiros de família foram instruídos relativamente ao procedimento de recolha de dados, com vista à uniformização do método de colheita de dados, perspetivando um mínimo de enviesamento. A aplicação dos instrumentos foi realizada nos domicílios dos idosos, em ambiente isolado e, preferencialmente, sem a presença de familiares. A recolha de dados ocorreu apenas num momento, no período de dezembro a fevereiro de 2021, aquando da consulta de enfermagem em ambiente domiciliário pela equipa de enfermagem da Unidade de Saúde Familiar do ACES contexto deste estudo, pertencente à (Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN).
Durante o trabalho de investigação foram salvaguardados todos os requisitos éticos em que se baseiam os padrões de conduta ética aplicados em investigação, nomeadamente, a beneficência, respeito pela dignidade humana e justiça de acordo com a Declaração de Helsínquia e a Convenção de Oviedo, adotando os seguintes procedimentos: i) Foi solicitada a autorização para a realização do estudo ao Diretor do ACES da Região Norte de Portugal, onde decorreu o estudo; ii) Foi solicitado o parecer do estudo à Comissão de Ética para a Saúde da Administração Regional de Saúde do Norte, IP que obteve parecer favorável com a referência CE/2020/4; iii) Para efeito de tratamento dos dados os formulários foram identificados através de uma codificação, apenas do conhecimento do investigador, garantindo assim a confidencialidade dos dados; iv) Os participantes foram informados sobre os objetivos, características e condições de realização da investigação, tendo sido garantido o direito de não participação no estudo, de não responder a questões ou desistir do estudo; v) Foi solicitado o consentimento informado a todos os participantes e salvaguardado o seu anonimato, bem como o sigilo e a confidencialidade das informações prestadas.
Foi feita uma análise estatística dos dados. Para tal foi construída uma base de dados no software estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS versão 22), na qual os dados foram inseridos e de seguida tratados e analisados, através da estatística descritiva, utilizando as frequências absolutas e relativas para todas as variáveis. Foram utilizadas medidas de tendência central e determinadas medidas de dispersão, no caso das variáveis de nível de medição rácio (Marôco, 2021).
Resultados
A caraterização sociodemográfica dos idosos foi efetuada quanto ao sexo, grupo etário, estado civil, escolaridade e coabitação.
Do total da amostra (n= 60 idosos) a maioria era do sexo feminino (53,3%), pertencia ao grupo etário dos Idosos Meia-Idade (45%), possuía o estado civil de casado (61,7%), detinha como escolaridade o 1º ciclo (46,7%) e coabitava com o cônjuge (46,2%) (Tabela 1). A média da idade foi de 76,63±6,98 anos, a mediana de 76,52 anos, a moda foi de 68 anos, tendo as idades ficado compreendidas entre os 65 e os 94 anos (Dados que não constam da tabela).
Variáveis | Fa | Fr |
---|---|---|
Sexo | ||
Masculino | 28 | 46,7 |
Feminino | 32 | 53,3 |
Grupo Etário | ||
Idosos Jovens (65-74 anos) | 24 | 40,0 |
Idosos Meia-idade (75-84 anos) | 27 | 45,0 |
Idosos-Idosos (85-99 anos) | 9 | 15,0 |
Estado Civil | ||
Casado | 37 | 61,7 |
Solteiro | 4 | 6,7 |
Viúvo | 18 | 30,0 |
Divorciado | 1 | 1,6 |
Escolaridade | ||
Sem escolaridade | 4 | 10,0 |
Sabe ler e escrever | 16 | 26,7 |
1º ciclo | 28 | 46,7 |
2º Ciclo | 7 | 11,7 |
3º ciclo | 1 | 1,7 |
Ensino Superior | 2 | 3,3 |
Coabitação | ||
Sozinho | 14 | 17,9 |
Cônjuge | 36 | 46,2 |
Filho(s) | 16 | 20,5 |
Netos | 7 | 9,0 |
Irmãos ou cunhados | 2 | 2,6 |
Amigos | 3 | 3,8 |
Legenda: Fa - Frequência absoluta; Fr - Frequência relativa.
Em todos os itens desta escala a maioria dos idosos posicionaram-se na opção de resposta “Quase sempre” com percentuais que variaram entre os 50% (Item 3) e os 75% (Item 1), sendo por isso o Item que apresenta maior positividade de respostas. Por seu lado o item com maior percentagem na opção de resposta “Quase nunca” foi o item 5 (18,3%). Daí que os idosos tenham expressado maior satisfação com a Adaptação (75%), seguida pela Parceria e não tão boa satisfação no caso do Desenvolvimento (50%), Afetividade e Resolução (Tabela 2).
Apgar | Fa | Fr |
---|---|---|
Adaptação | ||
Quase nunca | 3 | 5,0 |
Algumas vezes | 12 | 20,0 |
Quase sempre | 45 | 75,0 |
Parceria | ||
Quase nunca | 5 | 8,3 |
Algumas vezes | 19 | 31,7 |
Quase sempre | 36 | 60,0 |
Desenvolvimento | ||
Quase nunca | 6 | 10,0 |
Algumas vezes | 24 | 40,0 |
Quase sempre | 40 | 30,0 |
Afetividade | ||
Quase nunca | 7 | 11,7 |
Algumas vezes | 20 | 33,3 |
Quase sempre | 33 | 55,0 |
Resolução | ||
Quase nunca | 11 | 18,3 |
Algumas vezes | 14 | 23,3 |
Quase sempre | 35 | 58,3 |
Legenda: Fa - Frequência absoluta; Fr - Frequência relativa.
A pontuação média do índice de Apgar foi de 7,4±2,63 pontos, a mediana foi de 8 pontos, a moda de 10 pontos, sendo o mínimo de 1 e o máximo de 10 pontos (Dados que não constam da tabela).
A maioria dos idosos considerava a sua família altamente funcional (71,7%) e os restantes 28,3% tinham a perceção que a sua família era disfuncional, embora apenas 10% a considerassem como tendo uma disfunção acentuada.
Discussão
No total dos 60 idosos estudados observou-se que a maioria era do sexo feminino. No estudo Campos et al. (2017), com o objetivo de avaliar a funcionalidade familiar de idosos brasileiros e testar a influência de fatores determinantes, com uma amostra de 2052 idosos, observou-se também uma maior prevalência do sexo feminino, embora com um percentual um pouco mais elevado (61,3%). A feminização destas amostras indica uma maior longevidade das mulheres, um aspeto relevante do envelhecimento populacional, no dizer de Oliveira e Silva (2020).
No que diz respeito ao estado civil, obtiveram-se 61,7% idosos casados, sendo os resultados semelhantes ao do estudo de Lima et al. (2020), no qual participaram 604 idosos, na região de Tâmega e Sousa, a Norte de Portugal, com o objetivo de traçar um perfil do estado de saúde do idoso, que obteve um percentual de 67,2% de idosos casados.
Relativamente à escolaridade, 46,7% da população possui 1º ciclo, o que difere do estudo de Lima et al. (2020), no qual 92,7% dos idosos da amostra apresentava um nível de escolaridade de 1ºciclo, valor bastante mais elevado do que o obtido no presente estudo. Esta situação deve-se ao facto da amostra do estudo Lima et al. (2020) ser constituída por idosos a viver predominantemente em meio rural. No entanto, segundo o INE, em 2020, 51,6% dos idosos portugueses possuíam o 1ºciclo, um percentual mais próximo do obtido no presente estudo.
Quanto à coabitação, a maioria (46,2%) vivia com o conjugue. Este percentual é ligeiramente inferior ao do estudo de Maia et al. (2016) realizado com 306 idosos, que teve por objetivo caracterizar a funcionalidade das pessoas idosas e relacionar a funcionalidade com os determinantes do envelhecimento ativo, tendo os autores constatado que 58% dos idosos também viviam com o conjugue. Por seu lado no nosso estudo 17,9% vivia sozinho. Esta situação é natural na sociedade portuguesa atual, devido à maior longevidade do sexo feminino e na opinião de Perseguino et al (2017) dá a noção de liberdade para o idoso e família. Segundo estes autores parece haver um afastamento dos demais familiares, que respeitam a decisão do idoso em morar sozinho.
Na caraterização da funcionalidade familiar da amostra em estudo, obteve-se uma prevalência de famílias altamente funcionais de 71,7%, sendo semelhante à percentagem do estudo de Campos et al. (2017), que obteve 76,3%. No estudo de Ferreira et al. (2019), com o objetivo de analisar a funcionalidade familiar de idosos dependentes residentes, no interior da região Nordeste do Brasil, foram inquiridos 117 idosos, cadastrados nas Unidades de Saúde da Família. Os autores verificaram que 26,5% dos idosos apresentaram boa funcionalidade familiar, percentual bastante inferior ao do presente estudo, resultado que poderá explicar-se pelas diferenças culturais entre as amostras e por se tratar de uma amostra de idosos dependentes. No estudo de Elias et al. (2018) com o objetivo de verificar a associação da funcionalidade familiar com o arranjo domiciliar, no qual participaram 637 idosos, da área urbana de um município mineiro, constatou-se que 87,8% consideraram possuir boa funcionalidade familiar, percentual um pouco mais elevado do que o do nosso estudo, mas que está na mesma direção. Os 10% de famílias deste estudo, que têm uma perceção de uma família com disfunção acentuada deverão ter uma avaliação diagnóstica atenta por parte do(a) enfermeiro(a) de família, procurando identificar quais as razões que levaram estes membros da família a ter esta perceção, devendo ser referenciados para outros técnicos como profissionais na área da Assistência Social e Psicologia.
O mesmo não se verificou no estudo de Martins et al. (2015), realizado na cidade de Ourém, com uma amostra de 66 idosos, que pretendia identificar a satisfação com a vida em Idosos com apoio Domiciliário e sua relação com variáveis sociodemográficas e psicossociais, o qual verificou que os percentuais mais elevados estavam associados a famílias moderadamente funcionais (54,5%) e de seguida a famílias altamente funcionais (36,4%). Este achado pode explicar-se por se tratar de uma amostra de utentes que beneficiavam dos serviços de apoio domiciliário, situações que de maneira geral se encontram associadas a doenças cronicas e que geram stresse nas famílias.
É importante referir a existência de 10% de disfuncionalidade acentuada das famílias. Esta pode ser explicada pelas constantes mudanças da sociedade, que têm provocado modificações na sua estrutura, com alteração do convívio entre as diferentes gerações, por conta do aumento da expectativa de vida e dos distintos papéis entre seus membros (Brito et al., 2019).
No que diz respeito aos itens do índice de APGAR familiar, no nosso estudo, o item que obteve maior satisfação dos respondentes foi a adaptação com 75%. Já no estudo de Oliveira e Silva (2020), no qual participaram 30 idosos, que se propunha analisar o APGAR familiar de idosos com dependências sobre a funcionalidade dos seus respetivos sistemas familiares, através de prontuários de um centro-dia, a adaptação teve um valor percentual de 47%, valor bastante inferior ao do presente estudo. Este diferencial poderá explicar-se pelo facto de os idosos serem utentes de um centro de dia, em que a família delega a terceiros as suas tarefas, na resolução de problemas.
Conclusão
Tendo em conta o tema escolhido a perceção do idoso sobre a funcionalidade familiar, o estudo foi pertinente uma vez que conhecer a funcionalidade familiar é fundamental para o enfermeiro de família cuidar das famílias de idosos em que a longevidade aumenta e existem limitações nas Atividades de Vida Diária e Atividades Instrumentais de Vida Diária. Os itens da Adaptação e da Parceria são indicadores importantes para a saúde dos membros da família e da família, enquanto sistema, pois embora seja um percentual residual (5%) que manifestam que quase nunca se adaptam, essa condição é um forte preditor de surgimento de uma nova doença, bem como a questão da parceria, forte indicador da inexistência de apoio mútuo, quando o membro expressa que quase nunca sente essa parceria. Estes fenómenos deverão ser alvo de uma observação atenta do(a) enfermeiro(a) de família, para que possa intervir, na prevenção de problemas de saúde de cada um dos subsistemas familiares ou na sua identificação precoce.
O perfil sociodemográfico dos nossos idosos carateriza-se por ser um idoso do sexo feminino, muito idoso (85 e mais anos), casado, possuir o 1º ciclo e coabitar com o cônjuge.
A perceção dos idosos acerca da funcionalidade familiar é muito positiva, estando a maioria dos mesmos satisfeitos com a sua família, no mesmo sentido de outros estudos. Essa satisfação é mais acentuada no item da Adaptação.
As principais limitações deste estudo estão relacionadas com o facto da dimensão da amostra ser relativamente reduzida e por se tratar de uma amostra não aleatória, o que poderá ter afetado a representatividade da mesma.
As implicações que este estudo poderá ter para a prática profissional na área da Enfermagem de Saúde familiar residem nos resultados obtidos que serão fornecidos à unidade funcional contexto deste estudo, que permitirão aos enfermeiros de família adequar e dinamizar melhor as suas práticas, melhorando a qualidade dos cuidados de enfermagem prestados e a satisfação dos idosos e das famílias com os mesmos.
Por sua vez, este trabalho poderá sensibilizar os enfermeiros de família para a importância de avaliar a funcionalidade familiar e a independência funcional, que são importantes para o conhecimento da dinâmica familiar, podendo ter repercussões na vida do idoso e no processo de envelhecimento. Estas avaliações poderão ser o ponto de partida para as intervenções de enfermagem e o desenvolver estratégias com o idoso e família para o equilíbrio do sistema familiar, uma vez que a intervenção precoce potencia a promoção, a autonomia e a funcionalidade familiar.
Como sugestão final recomenda-se que futuros estudos possam investigar a funcionalidade familiar de idosos com alterações cognitivas, bem como o apoio de algumas instituições no terreno a estas famílias, abrangendo os diferentes contextos da enfermagem de saúde familiar como as USF/UCSP.