Introdução
O conceito inteligência artificial (IA) surgiu durante a década de 1950 com a teoria simplificada de inteligência humana exibida através de maquinaria (Helm, et al., 2020). Atualmente é reconhecida como uma das ciências da computação de relevo no desenvolvimento tecnológico de sistemas computorizados, que simulam a capacidade humana. São sistemas inteligentes de computação capazes de realizar tarefas sem interferência direta do ser humano. No âmbito da saúde, esta ciência estuda formas de simulação do raciocínio humano e processo de tomada de decisão humano, utilizando algoritmos matemáticos capazes de reconhecer problemas, analisar dados, indicar tarefas e apoiar a tomada de decisão dos profissionais de saúde (Lobo, 2018).
Os sistemas computorizados já existem há algumas décadas, no entanto o que se verifica atualmente é o aumento da velocidade de processamento e armazenamento da informação dos computadores, permitindo analisar grandes volumes de dados em nanossegundos. A IA, aplicada na saúde, analisa bases de dados de taxas de mortalidade, natalidade, hospitalizações, notificação de doenças, prevalência e incidência de doenças, o que torna uma mais-valia na antecipação de surtos pandémicos e aplicação de intervenções preventivas antecipando os problemas e a doença (Lobo, 2018).
A implementação de tecnologias baseadas em IA, mais especificamente na área da saúde, têm causado um efeito transformacional particularmente significativo na prática avançada de enfermagem (Raymond, Castonguay, Doyon, & Paré, 2022). A utilização da IA no âmbito da Enfermagem avançada é pouco explorada, sendo inferida a sua relevância pela utilização na previsão de doenças, classificação e diagnóstico. Beneficiando os utentes, mas também os profissionais de saúde (Jimma, 2023).
A IA tem emergido em diversos contextos de cuidados de saúde, sobretudo nas bases de dados clínicas para a tomada de decisão: o machine learning (ML), algoritmos de Sistemas de Apoio à Decisão Clínica (CDSS’s) com ML e os modelos de análise preditiva, a análise de big data, a visão computacional, processamento de linguagem natural e robótica aprimorada (Raymond, Castonguay, Doyon, & Paré, 2022). O ML é um campo da inteligência artificial que aplica algoritmos em dados absolutos, brutos, para adquirir conhecimento de forma automatizada. O ML é um subdomínio da IA, que pode ser traduzido como Máquina de Aprendizagem Automática. Este domínio permite que os computadores evoluam na aprendizagem e acumulação de informação, sem terem sido programados, através do reconhecimento de padrões (Santos & Campos, 2022).
As técnicas de ML são divididas entre aprendizagem supervisionada e aprendizagem não supervisionada. Na aprendizagem supervisionada, o conjunto de treino compreende os pares de entrada e saída desejados, e o objetivo é aprender um mapeamento entre os espaços de entrada e saída. Quando a saída desejada não faz parte do conjunto de treino e a saída pode devolver respostas incertas, é denominado de aprendizagem não supervisionada (Simeone, 2018).
A gestão da doença crónica representa uma porção significativa dos recursos económicos disponibilizados em saúde. O diagnóstico de uma doença crónica traduz-se pela necessidade de tratamento prolongado para os utentes (Battineni, Sagaro, Chinatalapudi, & Amenta, 2020). Segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS, 2020), sete das dez principais causas de morte a nível global são doenças crónicas não transmissíveis, que estão ligadas a fatores de risco modificáveis e comportamentos. Esta realidade ressalta a importância crucial da prevenção, alinhando-se com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
A disponibilidade de serviços para prevenir, diagnosticar e tratar doenças é fulcral para diminuir mortes e a incapacidade, havendo a necessidade de maior investimento nestas valência (OPAS, 2020) s. Em Portugal, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (2021), mais de quatro em cada dez adultos sofrem de uma doença crónica. Dos portugueses com idade igual ou superior a dezasseis anos, 41% reportaram sofrer de pelo menos uma doença crónica (OCDE, 2021).
Enquanto profissionais de saúde, os enfermeiros têm um papel crucial não só na prestação, mas também na melhoria dos cuidados de saúde à população. No entanto, é desconhecido o conhecimento acerca da natureza, extensão e consequências do seu envolvimento e experiência com ferramentas de IA na saúde (Raymond, Castonguay, Doyon, & Paré, 2022).
Assim, coloca-se a questão de investigação: quais são as ferramentas de Machine Learning disponíveis na literatura para a gestão de doenças crónicas, com relevância para os cuidados de enfermagem?
Dadas as considerações concetuais apresentadas sobre a temática e o valor que a IA pode ter no futuro dos cuidados de Enfermagem, o objetivo é mapear as ferramentas de ML disponíveis na literatura para a gestão de doenças crónicas, com relevância para os cuidados de enfermagem à pessoa com doença crónica, em todos os contextos de saúde.
Procedimentos metodológicos de revisão
Foi realizada uma Scoping Review, segundo a estratégia metodológica do Joanna Briggs Institute para Scoping Reviews (Peters et al., 2022) e foram seguidas as diretrizes do modelo PRISMA-ScR (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses for Scoping Reviews) (Tricco et al., 2018).
A seleção desta metodologia surge da necessidade de explorar e compreender de forma abrangente as ferramentas de ML aplicadas na gestão de doenças crónicas, com especial enfoque nos cuidados de enfermagem. Esta abordagem é ideal para mapear a extensão, variedade e natureza das pesquisas existentes num campo emergente e em rápida evolução, como é o caso da IA na saúde.
Foi elaborado um protocolo da scoping review, que não se encontra publicado.
Recorreu-se à mnemónica PCC (População, Conceito e Contexto) para definir os critérios de elegibilidade (Munn et al., 2018). A população reporta-se a pessoas com doença crónica, o conceito foi o uso de ferramentas de ML, e o contexto centrou-se nos cuidados de enfermagem em qualquer contexto de saúde.
A pesquisa nas bases de dados dos efetuada com os termos DeCS/MeSH®, Machine Learning, Chronic Disease, Nursing, operaciolizados pelo operador booleano “AND”. O termos foram pesquisados no título e resumo.
A estratégia de pesquisa foi realizada em três etapas: (1) Pesquisa inicial na MEDLINE (via PubMed) e CINAHL Complete (via EBSCO) para identificar artigos sobre o tema e analisar as palavras contidas nos títulos e resumos desses artigos, bem como eventuais termos de indexação utilizados (Tabela 1); (2) Pesquisa nas bases de dados de interesse com as palavras-chave identificadas na primeira etapa; (3) Análise da lista de referências bibliográficas de todos os artigos incluídos para extração de dados para encontrar estudos adicionais.
PESQUISA | ESTRATÉGIA | RESULTADOS |
---|---|---|
MEDLINE (PubMed) | ||
#1 | “Machine Learning” | 109536 |
#2 | “Chronic Disease” | 334776 |
#3 | Nursing | 903339 |
#4 | Nurs* | 1154632 |
#5 | “Machine Learning” AND “Chronic Disease” AND Nurs* | 19 |
#5 | "Machine Learning"[Title/Abstract] AND "Chronic Disease"[Title/Abstract] AND Nurs*[Title/Abstract] | 3 |
Os critérios de inclusão foram estudos primários e secundários, qualitativos e quantitativos, que abrangeu estudos experimentais e quase-experimentais, estudos randomizados e não randomizados, bem como estudos e artigos observacionais, analíticos e estudos de coorte. Foram excluídos os resumos de conferências e considerados estudos publicados sem restrição do período de publicação.
A pesquisa foi realizada em 17 de fevereiro de 2023, nas bases de dados MEDLINE Complete via PUBMED, CINAHL Complete via EBSCO e SCOPUS, como fontes de literatura cinzenta a OpenGrey, Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) e DART-Europe.
Foi utilizado o software bibliográfico ZOTERO 5.0.94 (Corporation for Digital Scholarship and Roy Rosenzweig Center for & History and New Media, 2021), para recolher e gerir a pesquisa e remover os duplicados. Posteriormente os títulos e resumos foram analisados por dois revisores independentes, de forma a determinar se reúnem critérios de elegibilidade. As divergências foram resolvidas por um terceiro revisor (Peters et al., 2022).
Para a extração de dados, foi utilizado uma tabela, desenhado de acordo com os objetivos do estudo e os critérios de elegibilidade estabelecidos. Este processo incluiu a análise de elementos fundamentais dos artigos, como o tipo de estudo, os objetivos, a metodologia utilizada, o tipo de ML usado, as características da amostra e os resultados ou indicadores de desempenho.
Resultados
Um total de 16 artigos foram identificados nas bases de dados e um nos repositórios de literatura cinzenta, conforme demonstrado no diagrama do processo de seleção dos artigos (Figura 1). Não foram identificados duplicados. Após a leitura do título foram excluídos três artigos, e um artigo após a leitura do resumo. A leitura completa incluiu 13 artigos, sendo seis artigos excluídos: um relacionado com a população, dois pelo conceito e três pelo contexto.
Os sete artigos incluídos na síntese quantitativa de dados foram publicados entre 2020 e 2022, sendo a maioria nos Estado Unidos da América (EUA) (três) e
China (dois). Na Tabela 2, estão caracterizados os estudos incluídos relativamente aos autores, ano, país, objetivo do estudo e metodologia.
Estudo/País | Objetivo | Metodologia |
(Alzghoul et al., 2020) EUA | Desenvolver um modelo de previsão para ajudar a identificar futuros clientes com embolia pulmonar (EP) e avaliar o impacto da EP aguda nos resultados hospitalares | Estudo de coorte retrospetivo |
(Chatterjee et al., 2020) Noruega | Fornecer uma revisão de vários métodos de ML para identificação de fatores de risco de doenças como obesidade, doenças cardiovasculares (DCV) e diabetes tipo II. | Revisão sistemática e meta análise |
(Du et al., 2021) China | Prever a adequação da diálise | Estudo experimental |
(Nakayama et al., 2021) EUA | Usar as ferramentas de ML para identificar preditores sociodemográficos e clínicos de progressão através da cascata de cuidados para doentes com Vírus da hepatite C (VHC) | Estudo analítico |
(Chan et al., 2022) Singapura | Avaliar a confiabilidade intra e inter-avaliadores sobre a avaliação de ferida através de imagem, baseado em ML | Estudo Transversal |
(Su et al., 2022) China | Métodos de ML combinados com dados longitudinais para prever o risco de desenvolvimento de DRC em 2 anos entre idosos na China. | Estudo de Coorte |
(Jørgensen et al., 2022) EUA | Identificar condições crónicas anteriores à hospitalização e potenciais hospitalizações evitáveis entre beneficiários negros não hispânicos e brancos não hispânicos dos centros de serviços Medicare e Medicaid | Estudo Observacional Transversal |
Os resultados relativos às ferramentas de ML descritas na literatura e usadas no âmbito da gestão da doença crónica encontram-se mapeadas na tabela 3. A doença crónica mais abordada foi a Doença Renal Crónica (DRC), contudo houve aplicação das ferramentas a outras patologias como Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), Hepatite C (HVC), Insuficiência Cardíaca (IC), Insuficiência Venosa Crónica (IVC).
Para uma leitura mais clara e dando resposta ao objetivo da investigação, os resultados foram agrupados em categorias específicas por relevância para a prática de enfermagem. Assim, foram consideradas áreas de intervenção da enfermagem, que se centram na promoção da saúde, prevenção da doença e cuidados durante a doença: (1) Identificação de fatores de risco de desenvolvimento de doenças crónicas; (2) Identificação de fatores de risco de complicações da doença crónica; (3) Monitorização contínua e adequação de tratamentos; (4) Melhoria na assistência em saúde; (5) Apoio à tomada de decisão clínica.
Estudo | Machine Learning | Amostra/ Doença crónica | Resultados/ Indicador | Relevância para a prática de Enfermagem |
(Alzghoul et al., 2020) EUA | ML de random forest com base em variáveis clínicas, modelo de previsão | 758 pessoas internados com exacerbação da asma | Prever a exacerbação da asma com Embolia Pulmonar (EP) e sem EP. Precisão de 88% na classificação do estado de Embolia Pulmonar Aguda | (1) |
(Chatterjee et al., 2020) Noruega | Digital eCoaching - capturar dados relacionados a potenciais fatores de risco | Não aplicável | Risco associado ao desenvolvimento de obesidade/excesso de peso | (2) |
(Du et al., 2021) China | Modelo baseado em gráfico Takagi-Sugeno-Kang Fuzzy System (G-TSKFS) para prever a adequação da diálise | 250 pessoas com DRC dialisados por quatro horas. | Método para prever a adequação da diálise. | (3) (4) (5) |
(Nakayama et al., 2021) EUA | Árvore de decisão e modelos de floresta aleatória (Decision tree and random forest models) (Registo dos cuidados, início de antivirais, tratamento e cura virológica) | Pessoas nascidas entre 1945-1965 no Sul dos Estados Unidos da América com VHC | indica a priorização dos clientes com doenças mais avançadas, doença e/ou complicações, para passar para a próxima etapa do cuidado. | (2) (3) (4) (5) |
(Chan et al., 2022) Singapura | Dispositivo de medições de feridas com sistemas de imagem handheld 3-dimensional infrared wound imaging device (WoundAide [WA] imaging system, Konica Minolta Inc, Tokyo, Japan) | 52 pessoas com IVC com feridas crónicas | Alta a confiabilidade intra e inter-avaliadores obtida para os sistemas de imagem WA. Alta confiabilidade entre avaliadores das medições de WA em relação à medição tradicional. | (3) (4) (5) |
(Su et al., 2022) China | Seis modelos ML, regressão logística (LR), regressão de laço, florestas aleatórias (RF), árvore de decisão com aumento de gradiente (GBDT), máquina de vetor de suporte (SVM) e rede neural profunda (DNN), desenvolvidos para prever a probabilidade de DRC entre os idosos | 925 idosos com DRC | OML model pode capturar com sucesso o linear e não linear das relações de fatores de risco para DRC em idosos. | (2) |
(Jørgensen et al., 2022) EUA | Florestas aleatórias de inferência usadas para Regressão logística multivariada com as três principais doenças crónicas para cada desfecho ajustada para características sociodemográficas foi realizada para quantificar as associações | Dados de 4.993 indivíduos (4.420 NH White e 573 NH Black) com idade ≥ 65 anos DRC, IC, DPOC | Previsão de hospitalização e hospitalização potencialmente evitável. | (1) (3) (4) (5) |
Legenda: (1) Identificação de fatores de risco de desenvolvimento de doenças crónicas; (2) Identificação de fatores de risco de complicações da doença crónica; (3) Monitorização contínua e adequação de tratamentos; (4) Melhoria na assistência em saúde; (5) Apoio à tomada de decisão clínica.
Discussão
A análise dos dados encontrados confirma a importância do desenvolvimento e utilização de algoritmos de ML de forma a criar ferramentas de IA que auxiliem a tomada de decisão e a prática clínica diária dos cuidados de enfermagem. Dificuldades como erros em diagnósticos, tratamentos inadequados, recursos desperdiçados, fluxos de trabalho ineficientes, entre outras, podem ser mitigados através do uso de IA.
Com a utilização de modelos de ML é possível identificar fatores de risco e sintomas que os enfermeiros podem não ter considerado anteriormente, melhorando assim a precisão do diagnóstico e prognóstico (Habehh & Gohel, 2021).
No estudo de Alzghoul et al. (2020) através da técnica de random forest (floresta aleatória) foi desenvolvido um modelo de previsão para prever a exacerbação de doença com 88% de precisão.
A mesma técnica foi utilizada em simultâneo com a regressão logística por Jørgensen et al. (2022) para prever hospitalizações e potencialmente evitar as mesmas.
No que diz respeito à precisão do diagnóstico, Su et al. (2022) demonstrou que um modelo formado por seis algoritmos de ML, regressão logística, regressão de laço, florestas aleatórias, árvore de decisão com aumento de gradiente, máquina de vetor de suporte e rede neural profunda, consegue criar relações com sucesso entre os fatores de risco para a Doença Renal Crónica e a probabilidade de diagnóstico da mesma.
O uso de modelos de ML permite uma avaliação mais precisa dos dados do doente, identificando padrões e fatores de risco ocultos que podem contribuir para um diagnóstico e prognóstico mais preciso da doença crónica. Isso pode levar a uma melhor gestão da doença e a uma melhoria na qualidade de vida do doente (Habehh & Gohel, 2021).
Os enfermeiros assumem um papel de destaque na recolha e interpretação dos dados utilizados nos modelos de ML, enfatizando a necessidade de treino e educação para aproveitar ao máximo as tecnologias disponíveis (Habehh & Gohel, 2021).
A personalização dos cuidados é fundamental na gestão da doença crónica, uma vez que as necessidades dos doentes podem variar amplamente. Os modelos de ML permitem uma abordagem mais personalizada, com base nas características e histórico médico de cada doente (Alzghoul et al., 2020 ; (Chatterjee et al., 2020).
Os modelos de ML podem ser utilizados para analisar grandes quantidades de dados de pessoas com doenças crónicas, permitindo que os profissionais de saúde desenvolvam planos de tratamento mais personalizados (Rajkomar et al., 2019).
O estudo de Du et al. (2021) apresenta um modelo baseado em gráfico Takagi-Sugeno-Kang Fuzzy System (G-TSKFS) para prever a adequação da diálise. Esses modelos podem ser usados para prever a progressão da doença com base em fatores de risco individuais, bem como para ajudar os profissionais de saúde a entender quais os tratamentos que funcionam melhor para doentes específicos com base nos seus históricos médicos e características pessoais. Isso pode levar a uma melhor adesão ao tratamento e a melhores resultados para os doentes (Rajkomar et al., 2019).
No estudo realizado no Sul dos EUA (Nakayama et al., 2021) através da árvore de decisão e modelos de random forest foi possível realizar uma priorização dos clientes com Vírus da hepatite C (VHC), perceber quais estariam em fase mais avançada da doença e/ou complicações e assim definir as etapas seguintes do tratamento, como por exemplo o transplante.
Com a monitorização contínua, os enfermeiros podem monitorizar as condições de saúde dos clientes em tempo real e intervir rapidamente em caso de mudanças nos indicadores de saúde.
Foi o que evidenciou o estudo de Jørrgensen et al., (2022) que conseguiu prever a hospitalização e prevenir potencial hospitalizações em pessoas com DRC, Insuficiência cardíaca (IC) e Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC).
A relevância do ML na monitorização contínua da saúde de clientes com doenças crónicas, permite a identificação precoce de sinais de agravamento da condição e a realização de intervenções oportunas para prevenir complicações. Isso pode ser especialmente importante para enfermeiros que trabalham em ambientes de cuidados domiciliários, onde a monitorização constante é essencial para a segurança e bem-estar dos clientes.
Os modelos de ML podem auxiliar na tomada de decisões clínicas, especialmente em casos complexos de doenças crónicas, fornecendo aos enfermeiros informações relevantes sobre os clientes e as suas condições de saúde, permitindo que possam tomar decisões mais informadas e precisas. Além disso, os modelos de ML podem ser integrados aos sistemas de apoio à decisão clínica, fornecendo recomendações de tratamento com base em evidência e experiências anteriores. Isso pode ajudar a melhorar a eficiência dos cuidados de saúde e reduzir o risco de erros médicos (Liao et al., 2018).
Através de um dispositivo de medições de feridas com sistemas de imagem handheld 3-dimensional infrared wound imaging device WoundAide [WA] foi possível ter uma alta confiabilidade entre avaliadores de feridas mantendo a uniformidade de cuidados e ajudando à tomada de decisão sobre os tratamentos a aplicar (Chan et al., 2022).
Com a ajuda dos modelos de ML, os enfermeiros podem melhorar a qualidade de vida das pessoas com doenças crónicas, proporcionando cuidados personalizados e eficazes, ajudando-os a gerir melhor a sua condição e evitando complicações desnecessárias (Battineni et al., 2020).
Podemos assim adequar tratamentos como por exemplo, técnicas de diálises (Du et al. 2021) adapatadas a casa pessoa, priorizar tratamentos e definir novas atuações (Nakayama et al., 2021), gerindo os recursos humanos e materiais que sabemos ser escassos e finitos, ou até prever hospitalizações e potencialmente evitar as mesmas (Jørgensen et al., 2022), aumentando a qualidade de vida dos doentes.
Foram identificadas algumas limitações na revisão. A pesquisa foi realizada em base de dados específicas, o que pode ter resultado na exclusão de algumas ferramentas de ML disponíveis na literatura. Além disso, a revisão da literatura foi limitada a três idiomas, o que pode ter excluído estudos relevantes em outras línguas.
É importante ressalvar que, embora as ferramentas de ML possam ser promissoras para a prática clínica, sua implementação pode exigir recursos adicionais e treino para os profissionais de saúde, aspetos que não foram abordados nesta revisão.
Conclusão
A revisão da literatura identificou diversas ferramentas de ML voltadas para a gestão da doença crónica que têm potencial para contribuir para a melhoria dos cuidados de enfermagem. As ferramentas identificadas têm como objetivos a identificação de fatores de risco para doenças crónicas, a identificação precoce de exacerbações de doenças crónicas, a melhoria na assistência em saúde, a monitorização contínua e a avaliação da eficácia do tratamento, além do apoio à tomada de decisão clínica.
Com o avanço das ferramentas de ML, os enfermeiros necessitam de estar atualizados sobre as possibilidades oferecidas por essas ferramentas e de que forma elas podem ser aplicadas na sua prática clínica. A utilização destas ferramentas pode contribuir para melhorar a precisão do diagnóstico e prognóstico, personalizar os cuidados de acordo com as necessidades do doente, monitorizar a saúde em tempo real e tomar decisões clínicas baseadas em dados.
Os enfermeiros devem estar cientes dos possíveis desafios associados à utilização de ferramentas de ML, principalmente no âmbito da privacidade e segurança de dados, e garantir que a sua utilização está em conformidade com as regulamentações locais.
Para investigação futura seria relevante avaliar a eficácia e a aceitação dos modelos de ML pelos profissionais de enfermagem e pelas pessoas com doenças crónicas. Seria interessante também avaliar o impacto dessas ferramentas na melhoria dos resultados de saúde dos doentes, comparando com abordagens tradicionais de cuidados. Salienta-se ainda a necessidade de explorar como os modelos de ML podem ser integrados na prática clínica de enfermagem, bem como identificar quais os principais desafios e limitações associados à sua implementação em larga escala.