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Political Observer - Revista Portuguesa de Ciência Política

versão impressa ISSN 1647-4090versão On-line ISSN 2184-2078

PO-RPCP vol.16  Lisboa dez. 2021  Epub 02-Mar-2022

https://doi.org/10.33167/2184-2078.rpcp2021.16/pp.49-68 

Artigo Original

Além das Caricaturas: Nazismo, Racismo e Ciências Raciais (1924-1936)

Beyond Caricatures: Nazism, Racism and Racial Sciences (1924-1936)

Henrique Varajidás1  1

1Faculdade de Direito e Ciência Política, Universidade Lusófona do Porto, Portugal; henrique.varajidas@ulp.pt.


Resumo

O artigo aduz, organiza e interpreta uma teia de evidências histórico-empíricas que permitem questionar dois pressupostos historicamente estruturantes dos estudos políticos sobre o Nazismo: o pressuposto segundo o qual a vertente racial da ideologia nazi gozava de uma interpretação relativamente monolítica no seio do respectivo movimento; e o pressuposto segundo o qual, após a tomada do poder, o Partido-Estado nazi teria avançado para uma imposição unilateral desse “dogma ideológico”, na teoria e na prática, à Universidade e à sociedade alemãs. No lugar dessas teses, descobrimos uma malha de relações muito mais complexa, dialéctica e dinâmica entre ideologia, pseudociência e ciência racial no seio do movimento e sob o regime nazis.

Palavras-chave: nazismo; racismo; pseudociência; ciência; totalitarismo

Abstract

This article brings forth, organizes and interprets a compound of historical-empirical evidence that allows questioning of two still standing pillars of Nazism political studies: the assumption that the racial aspect of nazi ideology enjoyed a relatively monolithic interpretation within the nazi movement; and the assumption that, after the conquest of power, the nazi Party-State conspired to unilaterally impose such “ideological dogma”, both in theory and practice, on German University and German society. Rather than confirm these oft-repeated conventions, we uncover a much more complex, dialectical and dynamic mesh of relationships involving ideology, pseudoscience and racial science within the nazi movement and under the nazi regime.

Keywords: nazism; racism; pseudoscience; science; totalitarianism

1. Introdução

Este texto explora as relações entre ideologia, pseudociência e ciência em torno da questão racial no seio do movimento e regime nazis por 1924-1936. Para isso, socorre-se do método politológico da análise histórico-contextual. Esse método implica um rastreamento passo-a-passo dos diagnósticos, prescrições e decisões dos agentes relevantes; e das políticas, eventos e resultados com eles, enquanto factores de influência ou consequências, umbilicalmente interligados (Mahoney, 1999; Mahoney & Schensul, 2008).

Para efeitos deste estudo, entenda-se por ideologia uma crítica sistemática das ordens sociais presentes indissociável de um conjunto de prescrições de formas e conteúdos de vida em sociedade alternativos tidos por possíveis, desejáveis e desbloqueáveis por meios políticos; por pseudociência, produção intelectual marginalizada após escrutínio no seio das instituições reguladoras do acesso à chancela de cientificidade por excelência, as instituições académicas; e por ciência, produção intelectual num dado momento resistente a esse escrutínio. Enfatize-se que um dos panos de fundo que trespassam o texto é a natureza problemática destas definições, pela porosidade das fronteiras em causa em cada momento histórico. Assim, a ciência de ontem pode ser a pseudociência de hoje; e a pseudociência de hoje pode inspirar desenvolvimentos reconhecidamente científicos amanhã.

No que aqui importa, desde o final do século XIX que a possibilidade de descobrir critérios “objectivos”, que permitissem hierarquizar o “valor” de indivíduos e comunidades, para guiar a gestão pública da quantidade e qualidade das populações - no fundamental, o objecto de estudo do que à época era comum denominar-se “ciências raciais”- tinha passado a ser objecto de debate intenso e transversal no mundo ocidental, com destaque para países germânicos, escandinavos e anglo-saxónicos. Pelo período entre guerras, esse debate envolvia tanto pensadores marginalizados pelas instituições académicas como cientistas renomados. Tanto militantes políticos extremistas como estadistas estabelecidos. O que o distinguia na Alemanha, mas também nos Estados Unidos, era a concentração na eugenia negativa, ou seja, na busca de critérios para excluir pessoas do corpo social tendo em vista a preservação e regeneração da respectiva “saúde racial”. Assim, enquanto noutros países era hegemónica a eugenia positiva - segundo a qual a gestão activa da população deveria concentrar-se em políticas de natalidade e saúde pública tendencialmente universais -; na Alemanha e nos Estados Unidos, dada a popularidade local de interpretações da Grande Guerra e da Guerra Civil Americana como eventos indutores de uma “selecção anti-natural” favorável aos “velhos, fracos e covardes”, o debate focava-se no questionamento da contribuição para o bem e o progresso comuns de políticas públicas, medicina e caridade que, inspiradas nos preceitos morais convencionais, bloqueavam a reversão desse “viés”. Por exemplo, nesses países a proibição de procriação passível de multiplicar “fardos humanos” (sic), ou seja, pessoas com problemas de saúde à época julgados congénitos e hereditários, mas não adquiridos, com impacto pronunciadamente negativo no valor produtivo e militar, tinha defensores proeminentes tanto entre activistas políticos e pseudocientistas anti-sistema como representantes do establishment político-científico (seguindo essa linha, 32 estados americanos já tinham legislado a possibilidade de esterilização compulsória de alcoólicos disfuncionais e criminosos reincidentes) (Peukert, 1994, pp. 286-290; Burleigh, 2000, pp. 46; Proctor, 2000; Burleigh, 2001, pp. 345-353; Kershaw, 2001, pp. 486-487; Kühl, 2001, pp. 185-200; Mazower, 2001, pp. 77-100; Mazower, 2001, pp. 77-100; Reindl, 2001, pp. 216-218; Gellately, 2002, pp. 94; Steigmann-Gall, 2003, pp. 191-199, 203-204; Hutton, 2005, pp. 10-12, 25-31; Roberts, 2006, pp. 142-149, 202-210, 340-341, 355-360).

2. A Visão do Mundo Völkisch e a Missão Prioritária da Nação Alemã segundo Adolf Hitler, 1924-1928

Por 1924-1928, Adolf Hitler verteu uma reflexão sobre o sentido da sua carreira política num conjunto de escritos programáticos (Mein Kampf, Volumes 1 e 2, e o não publicado Zweites Buch). O objectivo era expender não apenas a sua versão da visão do mundo nacionalista radical (völkisch), mas também uma grande estratégia para libertar a nação alemã da crise existencial em que mergulhara com o colapso do II Império (Kershaw, 2001, pp. 240-250; Ryback, 2010, pp. xi-xiv, 49-115, 121-24, 131-139, 165-167, 181-182, 228-231, 245-246).

Para Hitler, a única visão do mundo natural e saudável era a nacionalista. Ora, desde a tomada do poder por forças “judaico-bolcheviques” no Império Russo, o nacionalismo estaria mergulhado numa luta de vida-ou-morte com um inimigo mortal doravante sediado em Moscovo - a visão do mundo anti-natural e degenerada do “Marxismo” (numa acepção muito mais abrangente que a convencionalmente utilizada para denotar seguidores de Karl Marx). As duas visões eram antitéticas na medida em que os seus princípios constitutivos eram, para Hitler, absolutamente irreconciliáveis. Frente a frente estariam nacionalismo versus internacionalismo; meritocracia versus democracia; e luta versus pacifismo. De acordo com o austro-alemão, todos os seres humanos tinham começado por agir com base no instinto de auto-preservação individual. Milénios de evolução, porém, tinham gerado os sentimentos morais do amor e da solidariedade, dirigidos a um círculo crescente de próximos. Essa evolução teria culminado na forma suprema de comunidade, porque a mais alargada compatível com a ordem natural das coisas: a nação. Ora, advertia o autor, se autorizados a perseguir a utopia anti-natural de uma comunidade artificialmente estendida a toda a Humanidade, os “marxistas” acabariam por destruir o máximo laço identitário permitente de civilização, empurrando a Humanidade de volta a um estádio comparativamente bárbaro (que uma contra-vaga de evolução poderia ou não, no futuro, permitir voltar a superar). Ainda, da óptica de Hitler, todas as comunidades estavam mergulhadas numa luta perpétua por “espaço vital”, isto é, por territórios dotados de recursos capazes de alimentar as formas e conteúdos garantes da sobrevivência e prosperidade de cada comunidade em cada era histórica. As dinâmicas dessa luta seriam, em última análise, benéficas para toda a Humanidade, visto que as comunidades vitoriosas em cada conjuntura tenderiam a ser portadoras das formas e conteúdos civilizacionais de vanguarda, isto é, da centelha de um progresso que mais cedo ou mais tarde chegaria aos restantes seres humanos. Às comunidades portadoras da causa do progresso e da civilização - na contemporaneidade, basicamente, as nações ocidentais (a capaz dos maiores píncaros de excelência a alemã, a mais equilibrada a inglesa) -, Hitler chamava “arianos”. Os “outros”, Hitler dividia em nações “não-arianas” mas úteis ao progresso qua copiadores e divulgadores das obras dos “arianos” (como a nação japonesa); nações “não-arianas” mas úteis ao progresso como mão-de-obra ao serviço dos “arianos” (como as nações africanas); e átomos parasíticos incapazes de reunião em nação e propensos a vampirizar destrutivamente as obras das outras comunidades (basicamente, os judeus). Ora, alertava Hitler, se, em nome da utopia anti-natural da democracia se permitisse aos “marxistas” negar aos indivíduos superiores, isto é, aos principais portadores da centelha do progresso dentro de cada comunidade, o seu “direito natural” a ditar o sentido desse progresso nas respectivas esferas de actividade dentro da sua comunidade; e se, em nome da utopia anti-natural da paz a todo o custo se permitisse aos “marxistas” negar às nações superiores, principais portadoras dessa centelha entre comunidades, o seu “direito natural” a arrebanhar espaço vital suficiente para sobreviver e prosperar em cada era histórica; então, os motores do progresso civilizacional acabariam bloqueados, e a Humanidade seria empurrada de volta a um estádio comparativamente bárbaro (Zitelmann, 1999, pp. 338-343, 387-396, 422-423; Stackelberg e Winkle, 2002, pp. 103-112; Hitler, 2007, pp. 7-9, 13, 28-36, 84-85, 111, 151-153, 232-238; Hitler, 2009, pp. 37-73, 128, 179-182, 195-227, 262-270, 288-289, 301-305).

Pelos anos 20, Hitler estava aterrado com o que entendia o incessante alastramento do poder e influência dos principais portadores e arautos da visão do mundo “marxista” - comunistas, judeus e grandes financeiros cosmopolitas - no seio das “ordens nacionais arianas”. Hitler culpava os “políticos burgueses”, que considerava míopes perante a gravidade do problema e ingénuos no seu combate; mas também os nacionalistas radicais “líricos”, isto é, mais preocupados com utopias raciais do que com a realidade política concreta. Para reverter os efeitos desse alastramento no médio-longo prazo, Hitler recomendava uma nova forma política, o Estado Social Racista, constituída em torno de finalidades sui generis. Esse Estado devotar-se-ia, como prioridades constitutivas, à preservação da “pureza racial” das suas populações “arianas” (antes de mais, blindando-as à miscigenação com “não-arianos”); e à prospecção, multiplicação e promoção a escalões de liderança dos indivíduos superiores entre essas populações - e isso em todas as esferas e independentemente das origens socioeconómicas. Por ora, porém, esse horizonte teria que ser, no essencial, relegado para o médio-longo prazo. Porquê? Porque um tal Estado só poderia desenvolver-se em segurança depois de travada e revertida a expansão mundial do “Marxismo”. Ora, para Hitler, a constelação de circunstâncias alemãs e mundiais dos anos 20 indicava que “a Providência” tinha reservado a liderança dessa tarefa histórica à nação alemã. Porquê? Porque a única forma da nação alemã sobreviver à crise existencial em que estava mergulhada seria reconciliar-se e reerguer-se internamente, o que implicaria exterminar o “Marxismo” no plano doméstico; e mobilizar todos os recursos para uma guerra de conquista do tipo de espaço vital de que usufruíam as potências com condições para prosperar naquela era histórica, como o Império Britânico, o Império Francês e os Estados Unidos - uma guerra que teria que ter por alvo a União Soviética, isto é, o centro de gravidade do “Marxismo” no plano internacional. E isso tanto por razões geográfico-económico-militares, como porque só essa variante de expansionismo alemão seria apaziguável, visto visar uma “ameaça comum”, pelo status quo (Zitelmann, 1999, pp. pp. 93-97, 122-133, 149-155, 177-181, 206-212, 270-285, 299-301, 308-330; Leitz, 2003, pp. 9-12, 32-35, 75-77, 123-126; Hitler, 2007, pp. 10-27, 43-45, 55-58, 104-118, 121, 130-131; Tooze, 2007, pp. xxii-xxvi, 7-12; Hitler, 2009, op. cit., pp. 85-87, 90-91, 98-115, 146-152, 163-165, 186, 248-252, 260-264, 285, 298, 311-312; Browning, 2014, pp. 217-219).

3. A Recepção Crítica às Ideias de Hitler no seio do Movimento Nazi, 1924-1932

Por 1924-1932, a versão de Hitler da ideologia völkisch, e em particular a sua grande estratégia para salvar a nação alemã, enfrentariam críticas mais ou menos veladas no campo político-cultural nacionalista radical. No que à dimensão racial concerne, as críticas provinham de dois nichos extremistas com representação minoritária mas relevante no próprio Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP). Para os críticos, conquistar espaço vital a Leste era secundário - mais urgente era levar a cabo uma “revolução racial” na Alemanha.

O primeiro nicho contestatário poderia denominar-se misticismo racial nórdico. Tratava-se de uma corrente de pensamento que aglomerava políticos e ideólogos proeminentes nos meios völkisch, como Erich Ludendorff, Artur Dinter, Richard Darré ou Alfred Rosenberg. Todos questionavam Hitler por não preconizar, logo após a tomada do poder, uma revolução antropológica com o fito de transformar o povo alemão “racialmente degenerado” do presente num povo “nórdico” (para esses ideólogos, nórdico era sinónimo de excepcional e incomparavelmente puro e elevado em termos físicos e culturais). O misticismo racial nórdico dividia-se em duas alas. A primeira, abarcando Ludendorff, Dinter e Rosenberg, entendia que o motor propulsor dessa revolução teria que ser espiritual. Os três advogavam a supressão imediata de todas as formas e conteúdos de origem judaica e clerical-católica da vida cultural alemã, argumentando que esses elementos “artificiais e alienígenas” bloqueavam há séculos o acesso dos alemães a uma espiritualidade distintivamente nórdica capaz de guiar o “povo escolhido” à conquista do seu “direito natural” à supremacia em todas as esferas. Ludendorff entendia que tal implicaria uma erradicação tout court do Cristianismo, a substituir por uma fé pagã milenar em perfeita sintonia com a Natureza; Dinter e Rosenberg limitavam-se a propor uma Igreja Protestante monopolista, unificada, e purgada de conteúdos judaicos e clericais-católicos (incluindo o Velho Testamento). A segunda ala, dominada por Darré, defendia que o motor da revolução teria que ser biológico. Mais concretamente, que a nação deveria embarcar de imediato num programa de selecção racial orientado para a prospecção, multiplicação e promoção a escalões de liderança, em todas as esferas, de alemães cujos traços físicos, mas também o estilo de vida, indiciassem “nordicismo”. Segundo Darré, décadas de industrialização e urbanização racialmente tóxicas tinham acantonado os nórdicos no campo (Lang, 1979, p. 41; Bollmus, 1993, pp. 184-186; Corni, 1993, pp. 18-21; Smelser e Zitelmann, 1993, p. 4; Zitelmann, 1999, pp. 331-332, 336-337, 375-379; Kershaw, 2001, p. 298; Longerich, 2012, pp. 77-81, 87, 100-103, 110-116, 122-128, 261-262; Steigmann-Gall, 2003, pp. 19-20, 58-66, 86-104, 109-112; Steigmann-Gall, 2005, pp. 91-97; Tooze, 2007, pp. 170-173).

Entretanto, um jovem político em ascensão, Heinrich Himmler, afinava pelo diapasão de Darré. Porém, Himmler distinguia-se de todos os místicos raciais nórdicos por aceitar a circunscrição das suas propostas raciais, bebidas em boa medida de Darré, à embrionária organização paramilitar que lhe tinha cabido liderar, a Esquadrilha de Protecção (de Líderes) do NSDAP (SS). Além disso, Himmler destoava de Darré ao assumir que os elementos nórdicos não deveriam ser procurados apenas, e até sobretudo, nas comunidades camponesas alemãs. Esses elementos deveriam ser procurados entre todos os possuidores, sem reservas em relação à geografia e ocupação, e com preferência mas não exclusividade para os alemães, de uma expressão do rosto, forma do crânio, constituição física, e cor do cabelo e dos olhos “caracteristicamente nórdicos” (Broszat, 1982, pp. 37-39; Ackermann, 1993, pp. 103-109; Corni, 1993, pp. 19-20, 24-26; Tooze, 2007, pp. 170-173; Wildt, 2010, pp. 110-119, 128-131; Longerich, 2012, pp. 89-161, 255, 302-303, 352-378).

Hitler era mordazmente crítico em relação ao misticismo racial nórdico, que considerava intelectualmente esdrúxulo e politicamente contraproducente. Ainda que mais em privado que em público, o austro-alemão escarnecia da ideia de tentar impor aos alemães modernos as “crenças obscuras” e os “processos de selecção superficiais” que, segundo o próprio, tinham condenado as tribos germânicas a vegetar enquanto outros “povos arianos”, como o grego ou o romano, construíam as bases da civilização ocidental; e que tinham condenado os estados alemães a atrasar-se decisivamente no abraço aos desafios da era industrial. Para Hitler, os indivíduos superiores entre os alemães apurar-se-iam no essencial pelo seu contributo para a prossecução do interesse nacional - e não pela ostentação de crenças espirituais ou características físicas específicas (podendo essas variar saudavelmente ao longo de um espectro relativamente alargado). Além disso, para Hitler, qualquer debate sobre a forma e o conteúdo do Estado Social Racista completo e sistemático a construir após a conquista de espaço vital a Leste, por contraposição ao Estado Social Racista rudimentar a improvisar entretanto, deveria ancorar-se no estado da arte científico, em vez de em “dogmas metafísicos” e “fantasias ideológicas” como os cultivados pelos nordicistas. Sintomaticamente, entre 1927 e 1930, face às reacções de alarme que as respectivas ideias tendiam a suscitar entre as elites e o público, o líder do NSDAP não hesitaria em expulsar Ludendorff e Dinter do Partido; e proibir Darré e Rosenberg de reivindicarem para as suas crenças o estatuto de ideologia oficial do Partido (Lang, 1979, p. 41; Ackermann, 1993, pp. 103-109; Bollmus, 1993, pp. 184-186; Smelser e Zitelmann, 1993, p. 4; Zitelmann, 1999, pp. 331-332, 336-337, 375-379; Kershaw, 2001, p. 298; Steigmann-Gall, 2003, pp. 58-66, 86-104; Steigmann-Gall, 2005, pp. 91-97).

O segundo nicho contestatário poderia dizer-se anti-semitismo primário. Os seus defensores advogavam a exclusão imediata, em todas as esferas, de todos os portadores de níveis mesmo que mínimos de “sangue judeu” (o que nesses círculos queria dizer, em regra, indivíduos com pelo menos um bisavô ou bisavó de origem judaica, isto é, “oitavos-judeus”). Apesar de considerar qualquer repulsa anti-semita como expressão de um instinto racial saudável (ainda que, incongruentemente, o próprio sempre tivesse mantido relações cordiais com judeus), Hitler subscrevia uma modalidade de anti-semitismo, auto-intitulada “objectiva-científica”, que considerava que a natureza histérica e violenta do anti-semitismo primário estava fadada a degenerar em excessos que só desacreditariam a causa anti-semita. Em vez de pogroms caóticos, os anti-semitas da corrente de Hitler, popular nos meios académicos e para-militares austro-alemães, recomendavam estudos científicos para determinar o limiar a partir do qual os “arianos” deixariam de ser capazes de assimilar, isto é, neutralizar e eliminar da cadeia hereditária, “sangue judaico” (entendendo-se, em regra, que só “judeus-plenos”, isto é, indivíduos com pelo menos três avôs de origem judaica, deveriam ser de imediato excluídos). Os anti-semitas dessa corrente preconizavam ainda “soluções mais permanentes mas mais civilizadas” para a “questão judaica”. Em particular, a precipitação e organização da emigração em massa de portadores de níveis comprovadamente inassimiláveis de “sangue judaico”. Em todo o caso, o líder do NSDAP estava ciente de que a causa anti-semita estava longe de permitir formar maiorias na Alemanha. Numa relação de forças mais ou menos tripartida, só no campo nacionalista existia uma maioria ostensivamente anti-semita. No campo católico, os anti-semitas eram uma minoria (ainda que substancial). No campo socialista, um resíduo. Além disso, a esmagadora maioria dos anti-semitas alemães perfilhava a modalidade dessa posição dita “cultural”. Tratava-se de anti-semitas na acepção de argumentarem que os judeus estavam sobre-representados nas esferas mais sensíveis da vida nacional (como o funcionalismo público, a economia e as artes); mas também de defenderem que só os judeus que recusassem converter-se à identidade alemã, o que seria possível através do baptismo ou da prestação de serviço militar, deveriam ser excluídos. Assim, a partir de 1928 a propaganda nazi começaria a demarcar-se, embora a ambiguidade fosse nota dominante, da retórica anti-judaica mais violenta (Smelser, 1988, p. 55-62; Smelser e Zitelmann, 1993, pp. 4-5; Zitelmann, 1999, p. 335; Herbert, 2000, pp. 18-22, 24-27; Hutton, 2005, pp. 90-91; Wildt, 2010, pp. 40-47; Stolfi, 2011, p. 100-108; Hürter, 2014, pp. 262-263).

4. Ideologia, Pseudociência e Ciência Racial no Lançamento dos Fundamentos do Estado Social Racista Nazi, 1933-1936

Por meados de Março de 1933, quase dois meses volvidos da tomada do poder, não restavam dúvidas no NSDAP e nas elites próximas do novo governo de que os temas raciais eram para Hitler, afinal, secundários em relação às tarefas prioritárias do lançamento do rearmamento, da supressão dos partidos e sindicatos “marxistas”, e do redireccionamento da política externa num sentido agressivamente revisionista (Kershaw, 1994, pp. 90-91; Kershaw, 2001, pp. 437-461; Tooze, 2007, pp. 37-39, 53-54, 99-101, 207-208).

Porém, por então, o novo Chanceler viu-se forçado a reagir a uma vaga de atrocidades anti-semitas perpetradas a reboque de uma insurreição espontânea no NSDAP contra stati quo estaduais-provinciais e locais que tardavam a reflectir o ascendente nacional do Partido. Primeiro, Hitler tentou domesticar esses impulsos contraproducentes aprovando um “boicote disciplinado” contra lojas detidas por judeus. Quando a iniciativa não travou, mas agravou, os excessos anti-semitas, Hitler, a contragosto, optou por mobilizar os meios do Estado para acalmar o seu Partido. Concretamente, Hitler promulgou uma nova Lei para a Restauração da Função Pública Profissional. Por um lado, a Lei proibia as “conquistas revolucionárias” de cargos públicos. Por outro, decretava uma purga no funcionalismo público não apenas direccionada contra “marxistas”, mas também contra judeus. Num gesto calculadamente apaziguador em relação aos anti-semitas primários, os judeus eram definidos como indivíduos com pelo menos um avô ou avó de origem judaica. Ainda assim, em razão de um generoso “regime de excepções” exigido pelo Presidente Paul von Hindenburg, o total de indivíduos imediatamente visados, entre “marxistas” e judeus, não excederia os 2% (Broszat, 1982, pp. 74-92, 96-112, 133-135, 193-210, 244-245, 262, 280-281, 328-334; Fischer, 1993, pp. 178-179; Kershaw, 1994, pp. 90-91; Zitelmann, 1999, pp. 84-88, 366-368; Herbert, 2000, pp. 21-22; Kershaw, 2001, pp. 461-485, 499-504; Gellately, 2002, pp. 1-33; Rigg, 2002, pp. 6-18, 76-80; Caplan, 2008, pp. 23-24, 35-36; Gellately, 2008, pp. 59-60; Noakes, 2008, pp. 77-82; Wachsmann, 2008, pp. 124-125; Fritzsche, 2009, pp. 11-12, 27-38, 122-124; Thacker, 2010, pp. 144-148; Stolfi, 2011, pp. 286-294; Overy, 2012, pp. 22-29).

Foi só depois desse episódio, mas em linha com as suas pretensões originais em avançar para o improviso de um Estado Social Racista rudimentar assim que possível, que Hitler anunciou aos seus pares de governo a intenção de romper com décadas de conversa fiada sobre novas ciências e políticas de gestão activa da quantidade e qualidade da população; e de avançar para uma série de políticas eugénicas vanguardistas, calculadas para, ao mesmo tempo, recuperar o atraso alemão na matéria; libertar recursos até aí alocados a pessoas incapazes de contribuir para o futuro esforço de guerra; e lançar os fundamentos do futuro Estado (Kershaw, 2001, pp. 486-487; Kühl, 2001, pp. 185-200; Mazower, 2001, pp. 77-100; Roberts, 2006, pp. 142-149, 202-210, 340-341, 355-360; Hitler, 2009, pp. 174-178, 271-298).

Hitler e o NSDAP defendiam ferinamente a eugenia negativa. Mas a sua posição pública sobre o assunto nem era a mais extremista. É verdade que, ao contrário do mainstream moderado representado pelo Vice-Chanceler, o católico Franz von Papen, os nazis estavam dispostos a deixar cair “o dogma do consentimento” nas esterilizações se a prática fosse prescrita por um agente médico-científico devidamente mandatado (conforme caucionado pelo Supremo Tribunal dos Estados Unidos em 1927). Mas contra uma franja eugenista ultra-radical encabeçada pelo psiquiatra Alfred Hoche, Hitler e o NSDAP exigiam um amplo consenso científico e popular antes de qualquer avanço para a “eutanásia” - um eufemismo para assassinato - de doentes incuráveis cuja vida um agente médico-científico devidamente mandatado avalizasse “já não valer a pena ser vivida”. No caso de Hitler, ressalve-se, a posição pública não era totalmente congruente com a posição genuína. Assim, inspirado pelo exemplo dos psiquiatras alemães, que segundo o próprio líder corporativo, Karl Bonhoeffer, tinham deixado morrer 30% dos institucionalizados em asilos, durante 1914-1918, para libertar recursos para o esforço de guerra, Hitler admitia como justificável uma reedição sistemática desse expediente semi-secreto durante o conflito militar vindouro (Peukert, 1994, pp. 286-290; Burleigh, 2000, pp. 46; Proctor, 2000; Burleigh, 2001, pp. 345-353; Kershaw, 2001, pp. 486-487; Kühl, 2001, pp. 185-200; Mazower, 2001, pp. 77-100; Mazower, 2001, pp. 77-100; Reindl, 2001, pp. 216-218; Gellately, 2002, pp. 94; Steigmann-Gall, 2003, pp. 191-199, 203-204; Hutton, 2005, pp. 10-12, 25-31; Roberts, 2006, pp. 142-149, 202-210, 340-341, 355-360).

Pelo final da Primavera de 1933, Hitler deu luz verde à produção de legislação eugénica vanguardista, incumbindo da coordenação do processo Wilhelm Frick, o nazi doutorado em Direito escolhido por Hitler como Ministro do Interior. Frick decidiu alistar um painel heterogéneo de especialistas. Apesar de conter elementos com pedigree científico duvidoso, o painel seria dominado por Alfred Ploetz, Ernst Rüdin e Fritz Lenz, homens das ciências de renome mundial (Evans, 2006, pp. 506-508; Roberts, 2006, pp. 340-341, 355). O resultado, construído em 1933-1934, seriam cinco camadas complementares de políticas eugénicas.

A primeira, plasmada na Lei para a Prevenção da Transmissão de Doenças Hereditárias, previa a esterilização compulsória de portadores de doenças hereditárias potencialmente incapacitantes (calculados em 400 a 500 mil no curto prazo, e 1 a 1,5 milhões no médio-longo prazo). Os visados poderiam ser sinalizados por familiares ou agentes do Partido-Estado envolvidos em funções médicas, previdenciais ou policiais; e deveriam ser portadores de “dança de São Vito”, doença de Huntington, epilepsia hereditária, cegueira hereditária, surdez hereditária, malformações hereditárias, esquizofrenia, insanidade maníaco-depressiva, “retardamento mental”, ou alcoolismo crónico. Cada caso teria que ser avaliado por um painel de três especialistas reunido sob a égide de um Tribunal Hereditário. O painel teria que incluir um médico do sector público e um juiz; e um segundo médico, um antropólogo racial, ou um jurista com conhecimentos e experiência na matéria. O médico do sector público gozaria de direito de veto. Caso o painel prescrevesse a esterilização, o visado poderia recorrer uma vez para um Tribunal de Hereditariedade Superior (Gross, 1938, pp. 41-43; Gütt, 1938, pp. 26-27, 33-40; Bock, 1994, pp. 111-121; Burleigh, 2001, pp. 354-359; Kershaw, 2001, pp. 486-488; Mazower, 2001, p. 99; Gellately, 2002, pp. 93-94; Roberts, 2006, pp. 356-360; Wachsmann, 2008, pp. 133-134; Wagner, 2008, pp. 71-74; Fritzsche, 2009, pp. 88, 113-114).

A segunda camada tinha por objectivo reduzir custos com “fardos” institucionalizados a expensas do Estado (quer sob a tutela directa do sector público, quer sob a tutela de organizações de caridade privadas co-financiadas por dinheiros públicos, como a Caritas católica ou a Missão Interior protestante). Os lares e asilos abrangidos teriam que cortar ao máximo as suas despesas com profissionais de saúde, medicamentos, equipamentos, roupa e alimentação “desperdiçados” em “fardos irrecuperáveis”; e canalizar os recursos remanescentes para “fardos capazes de um mínimo de actividade produtiva em prol do interesse nacional”. Ao contrário de uma maioria de administradores assaz consternados, a nova política foi recebida como um desafio por parte significativa dos profissionais de saúde envolvidos, com destaque para uma nova geração de psiquiatras ansiosos por testar terapias inovadoras supostamente capazes de converter até os “fardos” mais aparentemente “irrecuperáveis” em “elementos produtivos” (Gross, 1938, pp. 41-43; Burleigh, 2000, pp. 45-48, 50-51; Burleigh, 2001, pp. 377-381; Steigmann-Gall, 2003, pp. 191-199).

A terceira camada fitava estimular os casamentos e a procriação entre “elementos valiosos da comunidade nacional”. Os recém-casados munidos de um certificado oficial de saúde reprodutiva passariam a ter direito a crédito bonificado para aquisição de habitação e electrodomésticos. A dívida resultante seria abatida pelo Estado em 25% por cada filho saudável nascido no matrimónio. Por causa da pressão política para reduzir as estatísticas do desemprego, e não de qualquer obsessão ideológica relativamente ao lugar da mulher na sociedade (a condição seria abolida em 1936, ano de atingimento do pleno emprego), só seriam elegíveis casais cujo elemento feminino estivesse disposto a renunciar a um emprego (Gütt, 1938, pp. 26-27, 33-40; Bock, 1994, pp. 121-129; Mazower, 2001, p. 99; Roberts, 2006, pp. 356-360; Stephenson, 2008, pp. 104-106).

A quarta camada pretendia uma redução drástica do contacto de “elementos valiosos da comunidade nacional” com fontes de contaminação da sua “saúde racial”. O governo disponibilizar-se-ia a financiar, com generosidade sem paralelo à escala mundial, projectos de investigação científica sobre os riscos do consumo de álcool, tabaco, e corantes e conservantes artificiais; e sobre os riscos de uma exposição prolongada, em particular na indústria, a substâncias suspeitas de emitirem níveis de toxicidade carcinogéneos. O governo comprometia-se a regulamentar os termos da exposição às substâncias em causa em consonância com os resultados das investigações científicas. Descartados de antemão, porém, estariam “fundamentalismos à americana”, ou seja, proibições cegas que não ponderassem os interesses e agendas dos produtores e consumidores (por exemplo, da indústria tabaqueira e dos fumadores); e as condicionantes geopolíticas (como a ausência de alternativas mais saudáveis no espaço vital disponível à Alemanha) (Proctor, 1999, pp. 13-50, 73-194; Proctor, 2000; Mazower, 2001, pp. 77-79).

A quinta camada visava estimular o tipo de debate genuinamente científico sobre o Estado Social Racista que Hitler sempre tinha almejado induzir.

A sua face mais visível seria uma vaga de investimento público sem precedentes - ainda assim, insignificante em comparação com o alocado a áreas de estudo, como a bioquímica ou a aeronáutica, “úteis” à preparação militar - em estudos raciais (Marschall, 2001, pp. 111-126; Trischler, 2001, pp 79-96; Remmert, 2004, pp. 462-464; Remy, 2014, pp. 21-34).

Pelo Verão de 1933, a disciplina que consensualmente ocupava a vanguarda dos estudos raciais na Alemanha era a Antropologia Racial. Ora, a Antropologia Racial alemã, em linha com a Antropologia Racial um pouco por todo o mundo, estava acoplada a um estado da arte científico assente em três premissas em grande medida desalinhadas com as teorias vulgarmente conotadas com o NSDAP.

Primeiro, para os antropólogos raciais alemães, o conceito científico de “raça” não podia ser confundido nem com o conceito político de “povo”; nem com conceitos linguísticos, ou baseados em associações e especulações sem base factual (como a suposta ligação entre indianos e alemães), como o de “raça ariana”. Na verdade, os antropólogos raciais alemães consideravam um absurdo falar em “raça alemã”, “raça judaica”, ou “raça ariana”. O “povo alemão”, segundo estes estudiosos, resultava da mistura de pelo menos seis raças: nórdica, mediterrânica, dinárica, alpina, báltica e fália. O “povo judeu”, de uma mistura bem mais heterogénea e heteróclita. Ainda assim, ao contrário do que vulgarmente passava, dentro e fora da Alemanha, pelo “racismo nazi”, Hitler e a maioria dos líderes do NSDAP que se interessavam pelo assunto subscreviam a primeira parte desta premissa - a concernente ao povo alemão. Mas em sentido contrário, usavam e abusavam do que os antropólogos raciais alemães consideravam os conceitos pseudo-científicos de “raça judaica” e “raça ariana” (Hitler usava o conceito de “raça ariana”, como vimos, numa acepção ocidentalista genérica) (Zitelmann, 1999, pp. 375-379, 503; Hutton, 2005, pp. 1-31, 35-76, 80-91, 94, 101-155, 183, 198-201, 206-212; Hitler, 2007, pp. 7-9, 13, 28-36, 84-85, 111, 151-153, 232-238).

Segundo, a esmagadora maioria dos antropólogos raciais na Alemanha insistia que não só não existiam actualmente raças puras, como mapeá-las historicamente ou (re)construí-las por “engenharia racial” seria não só impossível como contraproducente - uma vez que todas as raças, incluindo a nórdica, possuíam defeitos constitutivos que só o cruzamento com “raças aparentadas” (o único projecto de engenharia racial cientificamente pertinente) poderia atenuar (por exemplo, tais docentes e investigadores frisavam que génios como Ludwig van Beethoven nunca teriam atingido tais píncaros de excelência caso não os constituísse uma proporção equilibrada entre raças diferentes). Note-se, entretanto, que virtualmente todos os antropólogos raciais alemães advertiam que em caso algum raças como as constituintes do povo alemão e outros povos ocidentais deveriam ser cruzadas com “raças alienígenas”, como as africanas e asiáticas. Tal cruzamento induziria uma dinâmica potencialmente irreversível de degeneração por miscigenação. Uma vez mais, ao contrário do que vulgarmente passava pelo “racismo nazi”, no NSDAP só os místicos raciais nórdicos contestavam tal premissa em bloco - insistindo que seria possível mapear historicamente, e reconstruir por engenharia racial, uma raça nórdica pura. Hitler e a maioria dos líderes nazis que se interessavam pelo assunto não revelavam especial preferência pela raça nórdica, nem preconizavam qualquer projecto de engenharia racial em seu favor. Não obstante, Hitler e a maioria dos líderes do NSDAP exigiam dos estudiosos raciais, como verdade auto-evidente, o reconhecimento da “raça judaica” como raça em geral, e como “raça constitutivamente incompatível com as raças constituintes dos povos ocidentais” em particular (Zitelmann, 1999, pp. 375-379, 503; Hutton, 2005, pp. 1-31, 35-76, 80-91, 94, 101-155, 183, 198-201, 206-212; Hitler, 2007, pp. 7-9, 13, 28-36, 84-85, 111, 151-153, 232-238).

Terceiro, ao contrário do que vulgarmente passava pelo “racismo nazi”, virtualmente todos os antropólogos raciais alemães, mas também virtualmente todos os líderes do NSDAP que se interessavam pelo assunto, incluindo os místicos raciais nórdicos, rejeitavam uma “utilização abusiva” do instrumento heurístico da raça como caução para explicações deterministas sobre comportamentos e realizações individuais (assim, ainda que se devesse tratar de excepções, um indivíduo em que a raça nórdica fosse predominante poderia decair na barbárie, dedicando-se, por exemplo, ao crime; enquanto “até” um indivíduo em que uma raça africana fosse predominante poderia ascender a realizações civilizacionais apreciáveis, dedicando-se, por exemplo, às artes) (Zitelmann, 1999, pp. 375-379, 503; Hutton, 2005, pp. 1-31, 35-76, 80-91, 94, 101-155, 183, 198-201, 206-212; Hitler, 2007, pp. 7-9, 13, 28-36, 84-85, 111, 151-153, 232-238).

Pelo final do Verão de 1933, apesar de tudo, o novo governo exortou a Universidade Alemã a conceder às abordagens associadas à ideologia völkisch uma oportunidade de provar, em igualdade de circunstâncias, o seu hipotético fundamento científico. A justificação? Muita investigação potencialmente frutífera teria sido suprimida e censurada pelo sistema educativo “pró-marxista” da República de Weimar (Paletschek, 2001, pp. 37-52; Szöllösi-Janze, 2001, pp. 1-23; Remmert, 2004, pp. 462-464; Bialas e Rabinbach, 2014, xxxii-xxxix; Bollenbeck, 2014, pp. 3-11; Marchand, 2014, pp. 271-293; Oberkrome, 2014, pp. 207-223; Remy, 2014, pp. 21-34).

A reboque desse apelo, e com o patrocínio político ostensivo dos místicos raciais nórdicos entre os líderes do NSDAP, formou-se uma frente militantemente nordicista no seio da Antropologia Racial alemã. A sua agenda era forçar uma revisão do cânone científico estabelecido num sentido favorável ao nordicismo.

Ora, mau grado a sua aura de protecção política, a frente nordicista nunca conseguiria atrair mais que um punhado de investigadores ligados a uma abordagem racial-antropológica, dita físico-descritiva, tida por ultrapassada e desacreditada pela larguíssima maioria dos antropólogos raciais alemães. Tal abordagem insistia que as raças se exprimiam no mundo empírico, no essencial, através das características físicas dos indivíduos - uma crença que, entre os líderes do NSDAP, só Himmler perfilhava sem reservas. A esmagadora maioria dos antropólogos raciais alemães e dos líderes nazis interessados no assunto, incluindo Hitler, perfilhavam uma abordagem racial-antropológica alternativa, a abordagem cultural-civilizacional. De acordo com essa abordagem, não se negando a relevância de certas características físicas (por exemplo, a cor da pele, ou o formato das orelhas e nariz), as raças exprimiam-se no mundo empírico, no essencial, através das realizações civilizacionais dos seus representantes (num exemplo ilustrativo, as realizações civilizacionais dos egípcios da Antiguidade demonstrariam por si só, independentemente dos traços físicos, ainda em debate, das pessoas em causa, a superioridade da sua “constituição racial”) (Zitelmann, 1999, pp. 375-379; Hutton, 2005, pp. 1-31, 35-76, 80-91, 94, 101-155, 183, 198-201, 206-212; Hitler, 2007, pp. 7-9, 13, 28-36, 84-85, 111, 151-153, 232-238).

5. Ideologia, Pseudociência e Ciência Racial no Embrião de Estado Social Racista Nazi Cristalizado pela Primavera de 1936

Pela Primavera de 1936, a ominosa definição de judeu tinha evoluído num sentido claramente desfavorável às pretensões dos anti-semitas primários. Ilustrativamente, a Comissão Política Central do NSDAP, o órgão representativo desse grupo nas negociações da versão final das Leis de Nuremberga, saíra, em Novembro de 1935, vergada. A Comissão tinha proposto a extensão da categoria dos “elementos racialmente alienígenas” a “membros de raças africanas” e “ciganos”; uma definição de judeu alargada a “oitavos-judeus”; e nenhuma ressalva ou excepção. Porém, por imposição do Ministério do Interior, de jure e de facto a autoridade liderante na matéria (por desinteresse de Hitler), só a primeira proposta da Comissão tinha vingado. A segunda tinha sido rejeitada em favor de uma definição minimalista de judeu que só abrangia indivíduos com três ou mais avós de origem judaica (para os anti-semitas primários, um passo atrás incompreensível em relação à Lei para a Restauração da Função Pública Profissional). E a terceira tinha sido vetada em prol de uma solução segundo a qual, até à emergência de evidências científicas conclusivas sobre as “proporções de sangue judaico inassimiláveis por povos arianos”, os “quartos-judeus” só poderiam ter relações sexuais e casar com “arianos puros”; e os “meios-judeus” só poderiam ter relações sexuais e casar entre si ou com “judeus-plenos”. Para os já casados, tudo se manteria inalterado (Orlow, 1993, pp. 78-79; Kershaw, 1994, p. 92-93; Kershaw, 2001, pp. 571-573; Gellately, 2002, pp. 121-123; Rigg, 2002, pp. 94-99; Gellately, 2008, pp. 60-61; Fritzsche, 2009, pp. 128-130).

Ao mesmo tempo, num clima de crescente e generalizada indiferença em relação ao pavoroso reverso da moeda do “progresso eugénico”, incluindo encómios dentro e fora da Alemanha à insistência cautelosa do regime na delegação da implementação dessas políticas em profissionais qualificados, os fundamentos do Estado Social Racista pareciam a caminho do enraizamento. Sintomaticamente, os índices de banalização da legislação eugénica não paravam de crescer: por 1936, o governo estava a caminhar a passos largos para as 200 mil esterilizações (atingidas em 1937, contra 3 mil esterilizações compulsórias nos Estados Unidos no mesmo período; dois terços das esterilizações na Alemanha seriam por retardamento mental, uma pseudo-patologia amiúde pré-sinalizada por assistentes sociais com base em testes de inteligência e indícios de negligência parental); os custos com “fardos humanos” institucionalizados estavam em queda, graças à prática chocante de abandono à fome e à doença de pessoas nas quais as novas terapias não surtiam efeito; as taxas anuais de natalidade e matrimónios tinham registado crescimentos de 30% e 23%; e a investigação científica e as experiências-piloto em torno da regulamentação da exposição a substâncias nocivas estavam a tornar a Alemanha no líder mundial na matéria (cientistas alemães beneficiários desse impulso seriam os primeiros a demonstrar os malefícios oncológicos do consumo do tabaco e da exposição ao amianto) (Gross, 1938, pp. 41-43; Gütt, 1938, pp. 26-27, 33-40; Bock, 1994, pp. 111-113, 117-121, 126-127; Peukert, 1994, op. cit., pp. 277, 286-290; Burleigh, 2000, pp. 48-52; Proctor, 2000; Burleigh, 2001, pp. 359-367; Kühl, 2001, pp. 199-202; Mazower, 2001, pp. 33-34, 77-79, 99-105; Proctor, 2001, pp. 107-113, 191-198; Gellately, 2002, pp. 93-94, 111-112; Eley, 2003; Steigmann-Gall, 2003, pp. 191-199, 203-204; Evans, 2006, pp. 506-515; Roberts, 2006, pp. 356-360; Stephenson, 2008, pp. 104-106; Wachsmann, 2008, pp. 133-134; Wagner, 2008, pp. 71-74; Fritzsche, 2009, pp. 81-96, 107-110, 113-117; Caplan, 2014, pp. 116-122).

Também no que concernia à quinta camada tudo parecia, do prisma de Hitler, bem encaminhado: longe de ter petrificado em torno de “dogmas e fantasias”, o debate científico sobre o Estado Social Racista do futuro parecia mais vivo e genuinamente científico do que nunca.

Sem surpresa, no que à Antropologia Racial concernia, a evolução estava a revelar-se em gritante desfavor da frente nordicista, cujos cultores tinham estado permanentemente debaixo do fogo dos representantes do establishment. Os segundos acusavam os primeiros de serem pseudo-cientistas que envergonhavam a ciência alemã perante o resto do mundo; e, pior, defensores de posições cuja tradução prática conduziria a consequências tão nefastas quanto as “marxistas” (nomeadamente, um clima de guerra civil racial entre uma maioria de alemães não-nórdicos e uma casta nórdica privilegiada). Significativamente, em razão do pedigree, da hegemonia e da plausibilidade intrínseca dos argumentos dos anti-nordicistas, as principais autoridades do Partido-Estado com jurisdição na área estavam, pela Primavera de 1936, perto de decretar como conclusivamente falhada a chance de provar mérito científico concedida aos nordicistas em 1933. Por exemplo, o Gabinete de Política Racial do NSDAP, o principal censor na matéria, proibira todos os membros do universo organizacional do NSDAP de propagar “conceitos raciais passíveis de gerar cizânia entre o povo alemão” (Hitler confirmaria pessoalmente essa proibição, numa rara intervenção, em Junho de 1936); e o Ministério do Interior interditara “designações não-científicas” como “raça ariana” e “raça nórdica” em documentos oficiais (o termo “ariano” poderia continuar a ser utilizado na negativa, para denotar “não-arianos”). Em troca, as autoridades exigiam que os cientistas não contradissessem publicamente a tese nazi segundo a qual os judeus eram uma “raça constitutivamente incompatível com as raças ocidentais” - uma tese cujo valor científico a maioria dos académicos continuaria a considerar em privado, mas não mais em público, escasso (Hutton, 2005, pp. 1-31, 35-76, 80-98, 101-157, 181-183, 198-201, 206-212).

Contra-intuitivamente, poucas evidências atestam tanto a queda em desgraça da agenda nordicista quanto duas iniciativas exuberantes lançadas, em jeito de contra-ataque, por Himmler e Rosenberg: a conversão de organizações não-académicas sob a sua tutela, a SS (por via da nova Sociedade SS para o Estudo da História Intelectual Primordial e da Herança Ancestral Germânica) e o Gabinete Rosenberg do NSDAP, em santuários para acolher refugiados intelectuais nordicistas alegadamente perseguidos pela ortodoxia inquisitorial anti-nordicista reinante na Academia Alemã. Como os seus mentores reconheceriam amargamente ao longo dos anos seguintes, nenhuma das iniciativas alguma vez aspiraria, no seu sentido original, a mais que uma semi-clandestinidade embaraçosa (Bollmus, 1993; Zitelmann, 1999, pp. 201-204, 331-337, 375-379, 503; Szöllösi-Janze, 2001, pp. 1-17; Steigmann-Gall, 2003, pp. 127-130; Remmert, 2004; Hutton, 2005, pp. 1-21, 31-34, 56-63, 76-80, 89-100, 104-108, 113-114, 119-131 138-212; Evans, 2006, pp. 138-139; Longerich, 2012, pp. 269-286).

Não obstante a queda em desconceito dos nordicistas, o momento estava longe de ser de celebração para os antropólogos raciais alemães. Na verdade, pela Primavera de 1936, a sua disciplina e as abordagens por ela constitutivamente caucionadas tinham passado a estar sistematicamente sob a acusação de - ironia das ironias - carência de credenciais científicas. Na origem das críticas estava uma vaga de novos interessados em estudos raciais radicados em áreas do saber que nada tinham a ver com a Antropologia Racial - em particular, biólogos e médicos ligados à disciplina da genética. Reivindicando a “exactidão” e “frieza” dos seus domínios científicos originários, por contraste com a “especulação” e o “sentimentalismo” que entendiam indissociáveis da Antropologia Racial (em virtude da sua filiação matricial nas Humanidades), esses docentes e investigadores argumentavam que o fundamento científico dos conceitos, taxinomias e perspectivas de políticas públicas defendidos pela esmagadora maioria dos antropólogos raciais alemães era residual: muito concretamente, o conceito de raça não passaria de um termo pré-científico para denotar constituição físico-psicológica (ou seja, pseudociência); e a única modalidade de engenharia racial cientificamente justificada seria o apuramento progressivo da constituição físico-psicológica do povo alemão através da prospecção e remoção do seu seio dos elementos mais “geneticamente defeituosos” (Hutton, 2005, pp. 1-31, 35-76, 80-98, 101-157, 181-183, 198-201, 206-212).

Seria a estes últimos “cientistas duros”, e não aos ideólogos e antropólogos de antanho vulgarmente conotados com o “racismo nazi”, que o Partido-Estado progressivamente confiaria o essencial dos estudos e políticas raciais. Até Himmler, ainda que empenhado em salvar programas de investigação extravagantes - sobre a cosmogonia do mundo gelado, as origens da “raça ariana-nórdica”, ou o mundo perdido das tribos germânicas lendárias -, rapidamente sucumbiria à tentação politicamente expedita de recrutar em massa entre essa facção científica. As atrocidades perpetradas por esses elementos sob a égide da SS contribuiriam decisivamente para fazer do Nazismo, até hoje, a mais abominada das ideologias (Longerich, 2012, pp. 269-286).

6. Conclusão

Três ilações emergentes desta investigação merecem ser destacadas. Primeiro, a prioridade das prioridades para Hitler não era de todo a construção de um Estado Social Racista, mas a preparação para uma guerra de conquista a Leste. Segundo, no seu coração racista, a ideologia nazi nunca foi nem propendeu a tornar-se dogmática ou monolítica, abarcando sempre uma variedade dinâmica de abordagens ligadas a diferentes prioridades e opções políticas. O único dogma inegociável do racismo nazi era o anti-semitismo, mas até a sua definição concreta, isto é, as fronteiras do “judaísmo racial”, continuaria sob debate científico. Terceiro, no que viesse a depender de Hitler e das autoridades com jurisdição na matéria pela Primavera de 1936, o Estado Social Racista do futuro não seria fundado em apriorismos nem construído e operado por “líricos” ou “amadores”. Seria, antes, fundado no estado da arte de um conhecimento científico em permanente evolução; e construído e operado, no contexto de uma relação sinérgica e não unilateral com as autoridades políticas, por cientistas internacionalmente renomados.

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1. HENRIQUE VARAJIDÁS Professor Auxiliar na Faculdade de Direito e Ciência Política da Universidade Lusófona do Porto. Doutorado em Ciência Política e Relações Internacionais pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa. Licenciado em Ciência Política e Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Área de investigação preferencial: regimes totalitários.

2. HENRIQUE VARAJIDÁS Assistant Professor at the Faculty of Law and Political Science of Lusófona’s University of Porto. PhD in Political Science and International Relations from the Institute for Political Studies of the Catholic University of Portugal. Licentiate degree in Political Science and International Relations from the Faculty of Human and Social Sciences of the New University of Lisbon. Main area of research: totalitarian regimes.

Recebido: 11 de Abril de 2021; Aceito: 23 de Dezembro de 2021

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