1. Introdução
Segundo os dados mais recentes referentes ao período letivo de 2023/2024, perto de 50 mil novos estudantes foram admitidos no ensino superior em Portugal, durante a primeira fase do concurso nacional (Portugal.Gov, 2023). Esta massa estudantil apresenta-se cada vez mais heterógena incluindo diferentes gerações e origens socioculturais que têm determinadas expetativas sobre o Ensino Superior (ES) (Farias & Almeida, 2020).
Para muitos estudantes a entrada no ES representa uma fase de mudanças e desafios. No âmbito pessoal, as exigências podem aumentar, especialmente para os estudantes que se deslocam das suas residências. Ao saírem da casa dos pais/familiares, muitos se afastam dos amigos de longa data, enquanto procuram estabelecer novos relacionamentos no contexto atual (Casanova et al., 2020), e ao mesmo tempo gerir o seu novo quotidiano (Chico et al., 2022), com maior autonomia e responsabilidade (Casanova et al., 2020). Com as mudanças mencionadas, é esperado que essa transição tenha um impacto nos estados emocionais dos estudantes, tanto positiva como negativamente. Isso significa que a transição académica pode ser emocionante, mas também um desafio para o bem-estar emocional dos estudantes, podendo resultar em períodos de ansiedade, stress, nervosismo, entre outros.
Importa também destacar o período de pandemia COVID-19 em que os estudantes tiveram de lidar com uma crise inesperada que condicionou a sua forma de aprender e experienciar a vida académica. Fernandes et al. (2022), concluíram que, no grupo inquirido, na generalidade do período pandémico, os medos foram superiores às expectativas, relativamente ao seu futuro. Estes dados podem sugerir a existência de maiores constrangimentos na transição e adaptação ao ES.
Neste contexto, o objetivo deste estudo é analisar as emoções vivenciadas pelos estudantes ao ingressarem no ensino superior, utilizando uma abordagem exploratória e qualitativa, tendo como questão de investigação: Quais são os estados emocionais percebidos pelos estudantes durante a transição para o ensino superior? Desta forma, procura-se obter uma compreensão mais ampla da sua experiência de transição e adaptação académica, por meio de testemunhos dos estudantes, assim como compreender as suas emoções e o significado de estar no ES.
2. Metodologia
2.1. Instrumento e Recolha de dados
Com base nestes pressupostos e atendendo ao objetivo deste estudo, foi elaborado um guião de entrevista de grupo focal, no qual foram consideradas questões de resposta aberta, para debate do grupo, subordinadas ao tema da transição e adaptação académica e fatores socio-emocionais associados a esse período. O guião era composto por quatro domínios: cognitivo, socio-emocional, académico e organizacional, com aproximadamente cinco perguntas por cada domínio.
No entanto, é importante referir que por se tratar de um grupo focal, as questões foram colocadas mediante a condução do debate, e a dinâmica de resposta do grupo. O instrumento de recolha de dados foi validado pela comissão de ética do Instituto Politécnico de Viseu (Parecer N.º 29/SUB/2022).
Para a realização da entrevista partiu-se do recrutamento e seleção de participantes que poderiam contribuir ativamente para a discussão do tema de investigação. Os participantes foram selecionados pelos investigadores, tendo como critério de inclusão estudantes a frequentarem o 1.º ano de diversos cursos de licenciatura de diferentes escolas de uma instituição portuguesa de ensino superior público. O grupo focal contou com um total de nove estudantes, a maioria do sexo feminino. Os cursos em que os estudantes estavam matriculados eram diversos, pertencendo às áreas científicas das ciências sociais, artes e engenharias. Quanto à tipologia do local de proveniência a maioria indicou ser oriundo de meio rural.
Para a condução da entrevista, recorreu-se a um moderador e um observador. Ambos não tinham tido qualquer contacto prévio com os participantes, o que propiciou um discurso fluído e sem constrangimentos. O grupo focal decorreu em abril de 2022, com uma duração aproximada de uma hora, tendo a entrevista sido gravada com o consentimento dos estudantes.
2.2. Procedimento de Análise de Dados
A gravação da entrevista foi transcrita e importada para o software Nvivo 14. Um grupo de três juízes independentes, de três escolas diferentes, reuniu-se para realizar a análise de conteúdo, conforme as indicações de Bardin (2015). Primeiro, procedeu-se à leitura flutuante das respostas associadas aos domínios da transição e adaptação académica e socio-emocional e à constituição do corpus documental. De seguida, efetuou-se a análise categorial a posteriori de onde emergiram oito categorias representativas da perceção de estados emocionais positivos e negativos dos participantes. Depois, realizou-se a discussão dos estados emocionais emergentes, procedendo à sua interpretação de acordo com o contexto teórico. A leitura e tratamento de dados foi feita de uma forma global, uma vez que se trata de grupo focal e não houve intenção de se particularizar nenhum dos participantes.
3. Resultados
Inicialmente decidiu-se verificar as palavras mais repetidas no material codificado. A fim de obter uma análise mais inteligível, algumas palavras foram excluídas da lista, como pronomes, alguns tipos de advérbios e verbos que não se mostraram relevantes. Além disso, foram removidas palavras com frequência de 1. No que se refere ao agrupamento, optou-se por sinónimos e o valor padrão de exibição foi mantido em 1000.
As palavras com maior repetição do material codificado foram professores (14), curso (11) e casa (10).
Salienta-se ainda que o sentimento com maior repetição foi a palavra choque (8). Relativamente à categorização, optou-se por dividir o documento em duas categorias principais, estados emocionais positivos e estados emocionais negativos. Nos estados emocionais positivos emergiram as subcategorias Segurança, Otimismo e Resiliência. Nos estados emocionais negativos identificaram-se as subcategorias Solidão, Dúvida, Desmotivação, Choque e Stress.
Na Figura 1, está patente o peso de cada uma das expressões face ao número de indicadores e na Tabela 1 apresentam-se exemplos de referências textuais.
Na tabela 1, é possível observar que nos estados emocionais negativos emergiram mais subcategorias e um maior número de indicadores, quando comparados com os estados emocionais positivos. As categorias relacionadas a estados emocionais positivos estão associadas ao papel dos professores no acolhimento e na relação com os estudantes durante o processo de adaptação. A subcategoria resiliência demonstra a capacidade do aluno em se adaptar aos novos processos de ensino-aprendizagem e rotinas. No entanto, essa resiliência parece ocorrer após o processo de transição e está mais evidente no período de adaptação académica. Quanto à subcategoria otimismo, observa-se que a entrada no curso pretendido se reflete positivamente no estado emocional dos estudantes.
Na categoria estados emocionais negativos, a subcategoria stress está associada às rotinas e ao desconhecimento do ambiente académico, tanto no que concerne à metodologia de ensino-aprendizagem, como dos novos colegas. Também é referido o processo de mudança de casa e de cidade como fator de stress. Relativamente à subcategoria solidão, esta está associada aos grupos de trabalho, mas também à saída da casa dos pais/familiares e estar longe das antigas amizades. Na subcategoria dúvida, os estudantes demonstram dificuldades de transição para um formato de estudo mais autónomo e no curso escolhido.
Na subcategoria desmotivação verifica-se que os estudantes citam a falta de feedback dos professores, reforçando a importância do seu papel no período de adaptação e transição académica. Para além disso, o não ingresso na primeira opção de curso, também é apontado como fator de desmotivação. Na subcategoria choque os estudantes apontam ideias muito heterógenas. Alguns referem o período de ensino à distância durante a pandemia, como um catalisador para o choque na entrada no ensino superior. Também é referido o contraste de expectativas, associado maioritariamente à saída de casa de pais/familiares.
Para evidenciar graficamente as palavras com maior frequência de cada categoria foram realizadas duas nuvens de palavras representadas nas Figura 2 e 3. Nas nuvens de palavras os termos com maior número de repetições aparecem mais evidenciadas na imagem. Na Figura 2 relativa aos estados emocionais positivos, as palavras com maior frequência foram “professores”, “conhecerem” e “consegui” e na Figura 3 relativa aos estados emocionais negativos as palavras com maior frequência foram “casa”, “curso” e “choque”.
Considerando os resultados, denota-se a presença de diferentes estados emocionais predominantemente negativos durante o período de transição e adaptação académica. Os resultados, expressos na Figura 3, indicam que a categoria estados emocionais negativos foi a mais evidenciada, principalmente na subcategoria choque: “para mim foi assim um choque mesmo”, “acho que para mim foi um choque” “não tive propriamente de sair de casa, eu continuo a morar com os meus pais e mesmo assim notei uma grande diferença porque o ensino superior é logo diferente.” Este choque descrito pode ser demonstrado de acordo com os resultados sob diferentes perspetivas. Ingressar no ES pode ser um momento transformador em que os novos estudantes são movidos por um conjunto de motivações e idealizações que podem, ou não, estar em consonância com a realidade encontrada.
De acordo com Almeida e Vasconcelos (2008), não ver as expectativas criadas concretizadas, pode influenciar a adaptação ao ensino superior, sendo descrito como um "choque de realidade" (p.25), ou seja, quando os estudantes possuem expectativas que vão ao encontro da realidade, poderão ter uma melhor adaptação.
Neste estudo, as expectativas em alguns dos testemunhos aparentemente não se coadunaram com a realidade encontrada: “foi um choque porque não era o que eu queria”; “não estava habituado a estar muito tempo fora da zona de conforto…pensava que ia estar pronto, mas acabei por não estar”. De acordo com estes dados, verifica-se que o choque sentido foi relacionado com o curso, e com a sua falta de preparação para o ES. Este último testemunho reflete o processo de transição para a vida adulta de muitos estudantes quando entram no ES, ganham autonomia e saem da sua residência familiar. Mergal et al. (2019), mencionam um “choque de transição” por parte dos estudantes do primeiro ano do ensino superior, quando confrontados com a nova realidade que é o ES. Esta ideia é também reforçada em: “Ingressei o ano passado (…) na 2.ª a fase e foi um choque tremendo porque eu tive de sair de casa.” Estes dados remetem para a subcategoria solidão: “entrar (…) num ambiente totalmente diferente em que não conhecia pessoas de lado nenhum.” “não estava habituada aos meus colegas, já estavam os grupos feitos, não sabia onde é que me encaixava.” “Às vezes estava em casa (…) sozinho…e começava a pensar, podia estar em casa com os meus irmãos pelo menos estava entretido…e ali em casa estava sozinho muito silêncio (…)”; “(…) perceber que todos estavam longe, isso fez-me um bocado de confusão.”; “(…) eu achava que ia ser mais fácil de fazer amigos…”. Este choque parece igualmente associado à solidão, à mudança de casa e à distância de familiares e amigos, mas também à necessidade de criação de novos laços sociais. A solidão pode eventualmente condicionar outras categorias emergentes, nomeadamente, o stress e a desmotivação. Por outro lado, os estudantes referem que “conheci os professores e os colegas e correu tudo bem. Os professores também estão sempre dispostos a ajudar”. Assim entende-se que, para além da importância do suporte emocional da família e amigos que ficaram na sua anterior residência, as criações de novas relações afetivas no ES são determinantes para a adaptação académica.
Outro aspeto mencionado foi o impacto da pandemia COVID-19, que obrigou grande parte dos estudantes a passar os últimos anos do ensino secundário em aulas online: “Eu acho que também foi um pouco isso…um choque…não pelos mesmos motivos, mas porque eu passei praticamente o 11.º e o 12.º online.” Durante a pandemia, muitos estudantes sofreram debilidades na sua saúde mental, atendendo à conjuntura de crise sanitária e ao seu impacto social e económico (Zhang, 2022). Os resultados do presente estudo sugerem que, eventualmente, consequências do isolamento dos anos letivos anteriores possam ter aumentado o choque na entrada no ES.
A subcategoria desmotivação também obteve vários indicadores. Os testemunhos apontam para o facto de que a desmotivação está frequentemente associada ao curso e ao seu percurso académico: “Foi ali uma situação…comecei a ficar desmotivado, comecei a pensar que se calhar não era o melhor curso, se calhar não era o meu curso foi uma mistura de emoções.”; “(…) há aquelas pessoas que sabem desde sempre o que querem seguir e eu sempre estive assim um bocado à-toa.”; “Eu na 1.ª fase (…), mas era só a minha 4.ª opção. Eu chorei tanto quando saíram as colocações.”.
Os resultados sugerem que a falta de vocação na escolha do curso bem como as expectativas não correspondidas, afetaram a motivação dos estudantes. A própria mudança de contexto académico pode ter tido um impacto negativo na sua motivação geral. Em alguns casos esses sentimentos podem resultar no abandono escolar: “Só chorava todos os dias da minha vida. Cheguei a dezembro e desisti do curso, pensei que não queria isto para a minha vida”. Perceber sentimentos negativos, principalmente quando estão vinculados à instituição de ensino superior, pode eventualmente influenciar as motivações de intenção de evasão escolar (Ferreira et al., 2022).
Outro fator que emergiu na subcategoria desmotivação, mas também noutras subcategorias tais como choque, stress e nos estados emocionais positivos do otimismo e segurança foi a importância do papel do professor. A relação professor-aluno, especialmente no primeiro ano do ensino superior, pode ser crucial para o sucesso académico (Almeida et al., 2016). Em termos negativos, os estudantes indicam “(…) se o professor nem sequer soubesse o nosso nome (…) acho que seria um choque muito grande.” “Eu se olhar só para alguns dos meus professores eu perco o amor todo ao meu curso”. Positivamente, as subcategorias da segurança e otimismo, estão igualmente muito ligadas ao papel do professor no ES. Na nuvem de palavras apresentada na Figura 2, a palavra "professores" é a mais repetida, reforçando esta ideia. Segundo os relatos dos estudantes, a transição e adaptação são facilitadas pelas relações interpessoais professor-aluno. O cuidado, a atenção e a disponibilidade do professor fazem com que os estudantes se sintam acolhidos e confiantes: “(…) somos muito acarinhados pela parte dos professores, têm muito cuidado connosco (...)”; “nós temos essa sorte de os professores conhecerem cada um de nós e o nosso curso também permite isso, porque trabalhamos essa “coisa” de nos conhecermos uns aos outros nas aulas, faz parte do curso”; “temos professores (…) que têm aquela preocupação connosco, como tínhamos antes, foi muito bom”; “(…) conheci os professores e os colegas e correu tudo bem”; “Os professores também estão sempre dispostos a ajudar”. De acordo com Oliveira et al. (2014), a proximidade e preocupação dos professores estão associadas a um processo de adaptação mais favorável. Neste caso, os estudantes percecionam o interesse do professor não só nas aulas, mas também do ponto de vista pessoal contribuindo para a motivação e interesse no seu curso.
Outro fator relevante é referente ao feedback e avaliações: “(…) não sabíamos se estava certo, o que é que podíamos mudar, e isto acabou-me por me desmotivar bastante.”; “No nosso curso, a maior parte dos professores não nos dava uma nota depois de uma apresentação, depois de um trabalho entregue e nós ficávamos no escuro porque depois um professor pedia-nos um artigo, nós entregávamos o artigo. Outro depois pedia nos um artigo, então nós íamos olhar para este novo artigo que tínhamos de fazer só com as experiências do anterior, que não sabíamos se estava certo, o que é que podíamos mudar, e isto acabou-me por me desmotivar bastante”. Estes testemunhos sugerem dificuldades de adaptação a um contexto académico mais autónomo e autodidata. Por outro lado, a ausência de feedback construtivo pode ter consequências na aprendizagem do estudante. A literatura denota a importância do feedback no ES (da Costa Silva et al., 2023), tendo um efeito positivo no seu desempenho (Silva & Carvalho, 2021). Os dados deste estudo sugerem que, além de influenciar a aprendizagem, a falta de feedback e avaliação do trabalho realizado resultaram em desencorajamento e falta de motivação.
O papel do professor e as metodologias de ensino-aprendizagem também são evidenciadas na subcategoria stress. Relativamente aos professores, os estudantes referem, “(…) eu sentia julgamento da outra parte pelas questões que eu estava a colocar (…)”.Oliveira et al. (2014), indicam que uma postura de rigidez e superioridade por parte do docente pode influenciar negativamente a adaptação académica. O stress também se verificou notório na gestão do tempo e estudo: “(…) nas aulas eu entendia e tudo muito bem, mas depois chegava a casa e pensava e agora? Por onde é que começo?”. Esta situação é também refletida na subcategoria dúvida: “Eu cheguei ao fim do 1.º semestre a pensar “eu não sei se é isto…”; “Eu cheguei-me a questionar (…) nos dois primeiros meses mais ou menos se havia de voltar a estudar.”; “(…) achava que não sabia voltar a estudar.”; “Não sabia o que ia fazer, não sabia em que consistia o curso”.
Nos estados emocionais positivos, como já supramencionado, o papel dos professores foi um dos pontos mais importantes referido pelos alunos, como está patente na Figura 2. A relação próxima com os docentes alicerçou a inclusão dos estudantes entrevistados na academia. Nas subcategorias resiliência e otimismo, é demonstrada claramente como a satisfação com o curso se relaciona positivamente com a transição e adaptação académica: “Senti-me bem porque era mesmo uma coisa que eu queria então consegui.”; “(…) apaixonei pelo curso onde estou e por enquanto continuar até ao fim”; “Consegui entrar. Tinha média.” (…) senti-me bem porque era mesmo uma coisa que eu queria então consegui”. No estudo realizado por Soares et al. (2021), foi identificada a importância dos professores na satisfação dos estudantes, reforçando a importância do papel do professor no ES.
Os estados emocionais negativos e positivos que emergiram neste estudo remetem-nos para a reflexão sobre a gestão emocional dos estudantes no ES. Saber gerir relacionamentos e reconhecer os sentimentos, tanto em si mesmos quanto nos outros, designa-se por inteligência emocional (Goleman, 1995), uma vez que isso implica a capacidade de reconhecer os estados emocionais, possibilitando uma melhor compreensão das emoções e autoconhecimento (Sousa et al., 2021). Essa capacitação é fundamental para lidar de maneira adequada com diversas situações na vida, tais como, o ingresso no ES que exige uma rápida adaptação perante as diferentes vicissitudes do novo contexto, onde diferentes estados emocionais se manifestem.
5. Considerações finais
O período de transição e adaptação académica é uma fase repleta de mudanças que podem resultar em diferentes estados emocionais, tanto positivos como negativos. Embora a entrada no ES possa ser vista como um momento empolgante, também é um período de ansiedade e stress, frequentemente associados ao curso, às novas metodologias de ensino-aprendizagem, à saída da casa dos familiares e à nova rotina, tendo já sido comprovado extensivamente noutros estudos na área. Os resultados deste estudo exploratório reforçam a importância do papel do professor no ES, para fazer a ponte entre o ensino secundário e o ensino superior.
O ES comporta vários desafios, é importante um bom acolhimento para o seu sucesso nesta sua nova fase da sua vida (Almeida et al., 2016), seja por meio de uma postura de proximidade, mas também através de feedback construtivo e acompanhamento dos trabalhos realizados. Além disso é importante minimizar a solidão sentida principalmente por aqueles que ingressam na 2.ª fase e 3.ª fase das candidaturas ao ensino superior.
Atendendo aos desafios emocionais identificados pode ser necessária uma abordagem mais personalizada com os estudantes. Outra ressalva está associada ao período de pandemia Covid-19 que poderá ter condicionado a gestão emocional de muitos estudantes relativamente às relações interpessoais, processos avaliativos, metodologias de estudo e capacitação para outros desafios que podem emergir.
Como implicações práticas sugerem-se ações que possam minimizar o choque sentido aquando do ingresso no ES. Sugere-se, primeiramente, ações preventivas no ensino secundário para que os estudantes não sejam tão impactados com as diferenças do ensino superior. Para isto poderão ser aprimoradas ações já existentes relativas às visitas a universidades e politécnicos onde são lecionados cursos de diferentes áreas científicas, assim como pequenas palestras realizadas pelos alunos do ES para os novos estudantes onde poderão ser apresentados os cursos, os trabalhos realizados e os principais desafios. Assim os estudantes poderão ter contacto com relatos na primeira pessoa por outros colegas. Outras ações sugeridas ainda no ensino secundário são a introdução de metodologias de ensino-aprendizagem que lhes permitam mais autonomia para minimizar, posteriormente, o stress e a desmotivação, bem como ações para o desenvolvimento de inteligência emocional fundamental para lidar com os desafios do ensino superior.
Aquando do ingresso no ES, sugere-se reforçar as ações de acolhimento para os estudantes de todas as fases do concurso nacional. É também importante a introdução de uma cultura organizacional, institucional e de ensino mais horizontal e menos hierarquizada para promover a adaptação dos estudantes. Finalmente, são também propostos o reforço de programas de mentoria para minimizar os estados emocionais negativos denotados de choque, desmotivação, dúvida e stress. Também a equipa docente que recebe os estudantes do 1.º ano, primeira vez, deve possuir o perfil adequado com sensibilidade para a importância das questões relacionais e de ambiente emocional no acolhimento e inclusão no ES.
Limitações ao estudo devem ser mencionadas. Uma vez que se trata de um estudo qualitativo existe um elevado grau de subjetividade associado, dependente dos júris independentes que participaram na análise de conteúdo. Para além disso estes dados são muito limitados, uma vez que se trata apenas de um grupo focal com estudantes da mesma instituição, podendo os estados emocionais identificados estar associados a este contexto específico não sendo possível a sua generalização. Como investigação futura seria pertinente tentar colmatar estas limitações, através de metodologias mistas com uma amostra mais alargada e heterógena, aplicando entrevistas semiestruturadas e validação dos dados através de um estudo quantitativo.