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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.242 Lisboa mar. 2022  Epub 31-Mar-2022

https://doi.org/10.31447/as00032573.2022242.10 

Recensão

Recensão: El Turismo desde las Ciencias Sociales: Reflexiones, Apropiaciones y Diálogos con América Latina

Magnus Luiz Emmendoerfer1 
http://orcid.org/0000-0002-4264-8644

Marcos Eduardo Knupp2 
http://orcid.org/0000-0002-1892-1866

1 Universidade Federal de Viçosa, Av. Peter Henry Rolfs, s/n, Campus Universitário - CEP 36570--900, Viçosa, Minas Gerais, Brasil. magnus@ufv.br

2 Universidade Federal de Ouro Preto, R. Diogo de Vasconcelos, 122, Nossa Sra. do Pilar - CEP 35400-000, Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil. marcosknupp@ufop.edu.br

Pimentel, T. D.; Dachary, A. A.; Korstanje, M.. (orgs.), El Turismo desde las Ciencias Sociales: Reflexiones, Apropiaciones y Diálogos con América Latina. ,, Salvador, Salvador da Bahia: ,, Editora Motres, ,, 2020. ,, 275 ppp. . ISBN, ISBN: 9786555130782.


Desde a chegada dos portugueses e espanhóis às Américas que os fluxos de pessoas e de recursos (não) humanos têm crescido devido às riquezas e atrativos de que esses lugares dispunham e ainda dispõem. A partir do século XIX, à medida que ocorria a independência dos territórios que compõem a chamada América Latina, os governos e os mercados desses novos países passaram a atrair capitais intelectuais, bem como a estimular viajantes e turistas para promoverem o desenvolvimento económico, inclusive através do turismo. Assim, este processo histórico aparenta ter sido conduzido puramente por uma lógica utilitária e pragmática.

Muitos estudos reforçam este processo histórico de apropriação dos territórios por meio do desenvolvimento do turismo em localidades pobres, carentes de políticas socioculturais e economicamente marginalizadas. Porém, é evidente o paradoxo entre a potencialidade da rica história pré-colombiana da América Latina e a sua apropriação pela atividade turística. Ao mesmo tempo que as potencialidades do século XXI são inegáveis, é necessário fazer o contraponto entre a atividade económica do turismo imersa num território com injustiças sociais, recorrentes ocorrências criminais e populações socioculturalmente vulneráveis.

A obra organizada por Pimentel, Dachary e Korstanje gera um debate científico a partir das ciências sociais, revelando outras lógicas de compreensão e (re)interpretações sobre as atividades turísticas envolvendo a América Latina, em termos de apropriações nos territórios e diálogos com outros países. Além da introdução e das considerações finais, o livro é composto por dez capítulos, escritos maioritariamente por investigadores latino-americanos e por alguns de outras nacionalidades (Portugal, incluído), sendo intencionalmente distribuídos em duas partes.

A primeira centra-se na discussão do turismo como objeto de análise conceptual e aplicado, e sustenta-se em enquadramentos teóricos pautados em clássicos e contemporâneos das ciências sociais (Karl Marx, Peter Berger, Thomas Luckmann, Jean Fourastié, Pierre Bourdieu, Boaventura de Sousa Santos, Bruno Latour, entre outros). Os capítulos que compõe esta parte tratam da sociologia do lazer, a matriz científica empregada nos estudos sobre o turismo, a noção sociológica de campo, ação e estruturação das atividades turísticas, a abordagem de redes e sociabilidades no turismo, e questões de cooperativismo e de confronto com a pobreza em contexto turístico.

A segunda parte reflete sobre mudanças, desafios e propostas para o turismo contemporâneo, abordando práticas e efeitos em destinos turísticos envolvendo tecnologias de comunicação e informação (TICs), sustentabilidade, patrimónios bioculturais da humanidade, turismo social, sexualidades e políticas públicas. Esses temas são analisados em termos teóricos e epistemológicos com carácter prospetivo, tendo em vista a sua possível aplicação prática em vérios contextos sociais.

Esta obra constitui um importante contributo para os académicos, para a agenda global e para o desenvolvimento e análise de políticas públicas. Como primeiro alcance, há que destacar o seu intuito de discutir os limites do campo de estudos do turismo, refletindo sobre a conexão com outras áreas de conhecimento, fomentando articulações com as diversas disciplinas deste campo. Buscando debater a expansão ilimitada das fronteiras do turismo e os seus processos massivos de transformação, a obra dialoga com a agenda global, chamando a atenção para a importância de debater mais aprofundadamente as funções do turismo no sistema socioeconómico e cultural.

Tendo em vista os debates emergentes sobre a democracia contemporânea, a deliberação e a legitimidade das ações do Estado por meio dos seus governos, a obra contribui também para o desenvolvimento e análise de políticas públicas, para além da especificidade das políticas de turismo, e explora a necessidade da intersetorialidade, ainda pouco debatida na disciplina em questão. Assim, busca-se transpor o debate imposto pelo pensamento (neo) colonial, abrindo possibilidade de discutir políticas públicas de turismo por meio de uma perspetiva complexa, dinâmica e relacional.

O presente trabalho visa despertar o debate sobre o avanço sem limites do turismo, refletindo sobre a massificação desta atividade que transforma os territórios por meio da (neo)colonização das suas populações, permitindo expandir os olhares para além da globalização do turismo numa perspetiva epistemológica crítica, emancipatória e comprometida com as transformações sociais. Se ao longo dos séculos os intercâmbios sociais, culturais e económicos se intensificaram isso não poderia ser diferente quanto ao intercâmbio académico e técnico-científico. Neste aspecto, El Turismo desde las Ciencias Sociales estabelece um diálogo profundo e profícuo entre teorias sociais clássicas e contemporâneas (maioritariamente europeias), sua receção, aplicação e retroalimentação a partir de perspetivas e objetos latino-americanos. E, ao fazê-lo, contribui também para a modificação, e eventual aprimoramento, de tais teorias.

A despeito de os estudos que integram este livro terem sido escritos antes da pandemia da COVID-19, ela inspira académicos e técnicos interessados no turismo a realizarem análises e ações multidisciplinares mais aprofundadas, assim como novos estudos (pós)pandémicos acerca dos temas expostos que recorram à análise comparativa com outros países, como aqueles com traços culturais mais próximos, como a Espanha e os pertencentes à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Como todas as obras, também esta possui limitações que podem ser colmatadas por futuros trabalhos, sendo impossível abarcar todas as relações entre turismo e ciências sociais. Neste sentido, a diversidade cultural à luz da antropologia é uma das limitações desta obra, pois a compreensão do ser humano frente ao fenómeno do turismo, aplicada às reflexões dos povos da América Latina precisa de ser explorada. Por outro lado, a análise de sistemas políticos, bem como das estruturas e organização das entidades latino-americanas, demonstra ser uma das lacunas que pode ser preenchida com estudos futuros relacionados com os campos do turismo e da ciência política.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Brasil (CNPq), à Fundação de Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG) e à Coordenação para o Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Brasil.

Referências bibliográficas

Pimentel, T. D., Dachary, A. A. e Korstanje, M. (orgs.) El Turismo desde las Ciencias Sociales: Reflexiones, Apropiaciones y Diálogos con América Latina, Salvador, Salvador da Bahia, Editora Motres, 2020 [ Links ]

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