Neli com colegas do IGOT-CEG, Universidade de Lisboa. Salamanca, julho de 2018. 

Neli Aparecida de Mello-Théry (1955-2021), mulher, geógrafa, professora, investigadora, ativista ambiental, marcou ao longo de quatro décadas a geografia brasileira e internacionali.

Professora Titular na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São Paulo (USP), graduou-se em Geografia pela Universidade Federal de Goiás (1978), obteve o grau de mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Brasília (1997) e em Géographie et Pratique du Développement na Université de Paris Ouest-Nanterre-La Defense (1999). Concluiu o doutoramento em Geographie pela Université de Paris Ouest-Nanterre-La Defense (2002) e em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo (2002).

Em 2008 obteve o título de livre docência na Universidade de São Paulo, com uma investigação centrada na Amazónia e, em 2011 obteve a Habilitation a diriger des recherches (HDR) em França pela Université de Rennes-2.

Foi vice-diretora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP (2014-2018) e coordenadora do Grupo de Pesquisa Políticas Públicas, Territorialidades e Sociedade, do Instituto de Estudos Avançados da mesma universidade. Foi professora visitante nas Université de Paris X, Nanterre (2000), Université de Rennes 2 (2005 e 2008) e na Université Paris Sorbonne-Nouvelle (2008), presenças reforçadas pelo pós-doutoramento sobre “Sustentabilidade da produção agrícola e políticas de adaptação às mudanças climáticas no Mato Grosso e na Bretanha” (2012-2013), realizado na Université de Rennes 2.

Neli Aparecida de Mello-Théry foi autora e co-autora de várias obras, das quais destacamos a co-autoria do Atlas do Brasil - Disparidades e Dinâmicas do Território (2005, 2008, 2018), obra cujas atualizações dão a conhecer a realidade do país, evidenciando a importância da geografia como ciência. Neli foi também co-coordenadora editorial da revista franco-brasileira de geografia Confins, desde a sua criação em 2006.

A presença da academia francesa na sua vida profissional e pessoal foi sempre muito evidente, mas Neli era uma geógrafa e uma mulher “do mundo” e em relação “com o mundo”.

Conhecemos a Neli no ano de 2009, em Paris, quando o Centro de Estudos Geográficos (CEG) integrou a equipa do projeto Eurobroadmap, visions of Europe in the world, no âmbito do 7º Programa-Quadro (FP7-SSH-2007-1), projeto com 12 parceiros, estando a USP representada pela Professora Neli e por outros investigadores, dos quais destacamos Hervé Théry, colega de investigação e seu companheiro de vida. Ao longo dos anos que se seguiram, foi possível desenvolver uma parceria frutuosa entre o CEG-IGOT - Universidade de Lisboa e a EACH - Universidade de São Paulo, traduzida em publicações conjuntas, eventos internacionais e colaborações no quadro de júris e orientações de pós-graduações.

O projeto foi o ponto de partida para o início de uma sólida colaboração, destacando-se ultimamente, o convite realizado pela revista Finisterra para a Neli integrar o seu painel de referees. Para além de ser uma das revisoras mais competentes da revista nos últimos anos e uma excelente conselheira na identificação de novos referees, Neli publicou na Finisterra um texto organizado e modificado para a prova de erudição de concurso para professora titular, em 2017 (^{Mello-Théry, 2018}). Recentemente a Professora Neli fez parte da equipa de orientação do doutoramento em Território, Risco e Políticas Públicas e nunca descurou o seu papel de conselheira científica, sendo as suas contribuições e orientações sempre sábias e assertivas, constituindo um suporte essencial à conclusão dos trabalhos.

O trabalho desenvolvido pela Professora Neli marcou especialmente a geografia brasileira não só pela sua qualidade, mas também pela abordagem de novos temas e a introdução de novas perspetivas aos velhos temas. Neli deu corpo à investigação sobre políticas públicas, ordenamento do território e sustentabilidade na geografia brasileira. Ultrapassou os descritivos da geografia crítica, desbravando novos paradigmas, metodologias, e formas de leitura, sem nunca perder o referencial teórico e as etapas do trabalho científico. Passou por várias universidades e faculdades, terminando como Professora Titular da EACH-USP, fazendo continuamente a ponte entre a Geografia e as Políticas Públicas, trabalho fundamental para o reconhecimento científico e institucional da Geografia.

Obstinação e exigência são palavras que definem a Neli, mas a estas juntam-se outras, como negociadora, corajosa e protetora. Mulher de sorriso franco e acolhedor, podemos ainda dizer que trabalhar com ela nunca foi só trabalho; uma pausa para café para saber como estamos hoje; um jantar para partilhar novidades; um mail ou uma mensagem de tempos em tempos para confirmar que estamos bem. Neli foi a orientadora, a colega, a amiga, que admiramos. Partiu no dia 6 abril de 2021, mas a marca da sua obra e a sua personalidade, irá mantê-la viva para sempre.