Mulher, 61 anos, com antecedentes de adenocarcinoma (ADC) gástrico aos 41 anos, submetida a gastrectomia total (pT3N0) e quimioterapia adjuvante, com alta da consulta de Oncologia após 7 anos. Em 2020, desenvolveu lesões cutâneas na parede abdominal, região vulvar e membros inferiores (Fig. 1), inicialmente papulares, hiperemiadas, não pruriginosas, tendo sido medicada com corticoide tópico, sem melhoria.
Posteriormente, as lesões tornaram-se mamilonadas e confluentes e, por persistência, foi submetida a biópsia cutânea, 6 meses depois, com exame anatomopatológico sugestivo de metastização cutânea de ADC gástrico HER2 negativo. O re-estadiamento efetuado mostrou atividade esofágica distal sugestiva de malignidade e alterações subcutâneas na região vulvar e membros inferiores compatíveis com extensa recidiva cutânea. Iniciou quimioterapia paliativa com múltiplas complicações infeciosas (celulites de repetição nos membros inferiores) e instalação progressiva de bicitopénia (anemia e trombocitopenia). Nesse contexto, colocou-se a hipótese diagnóstica de síndrome de ativação macrofágica secundária a neoplasia sólida, dada concomitante hiperferritinémia (11047 ng/mL), hipertrigliceridémia, hipofibrinogenémia e febre persistente, verificando-se benefício discreto sob corticoterapia em alta dose. Foi documentada, em biópsia óssea, necrose dos espaços medulares por provável infiltração neoplásica por metastização óssea extensa. Atendendo a bicitopénia com trombocitopenia grave, suspendeu quimioterapia, tendo realizado um ciclo de imunoterapia off-label com pembrolizumab. No entanto, apresentou evolução desfavorável acabando por falecer na sequência de evento hemorrágico do sistema nervoso central.
A possibilidade de recidiva tardia de ADC deve ser equacionada, mesmo cerca de 20 anos após o diagnóstico, evitando assim atrasos no diagnóstico e terapêutica. Salienta-se, ainda, que a metastização cutânea no ADC gástrico é rara,1 sobretudo na ausência de metastização prévia em órgãos internos, sendo mais comum na presença de neoplasias do pulmão, cólon, mama ou melanomas,2,3e constituindo um sinal de mau prognóstico, tal como verificado no caso descrito.