Introdução
Este estudo foi desenvolvido no âmbito da Escola de Verão “Mentores em ação”, numa Instituição de Ensino Superior, atividade financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), a qual teve como propósito a criação de um Plano de Mentoria para ser implementado em todas as unidades orgânicas da Instituição de Ensino Superior, a partir de setembro de 2020, no seguimento do projeto piloto de mentoria levado a cabo no ano letivo de 2019-2020, em apenas duas unidades orgânicas dessa instituição de ensino superior.
Reconhecendo a enorme importância e a responsabilidade das instituições do ensino superior (IES) pelos processos de acolhimento dos novos estudantes, o Programa de Mentoria tem como principal objetivo promover a partilha de experiências de mentoria e proporcionar um ambiente solidário e saudável de vivência nas IES, contribuindo para a inclusão de todos os estudantes.
Com vista a melhorar todo o processo e conseguir implementar o Programa de Mentoria, o nosso estudo baseou-se nos dados já recolhidos no âmbito do projeto piloto de mentoria - “Práticas Inclusivas na instituição: Perceções sobre a implementação de um Programa de Mentoria”, tendo sido desenvolvida uma análise a toda a informação constante da base de dados existente, com o objetivo de sistematizar e compreender os principais constrangimentos resultantes da experiência de mentoria, de modo a identificar os principais facilitadores e obstáculos vivenciados pelos estudantes ao longo do percurso académico. Na discussão de resultados apresentaremos possíveis soluções a implementar no futuro, de modo a atenuar os constrangimentos sentidos ou, até mesmo, eliminá-los por completo.
1. Enquadramento teórico
A introdução de modelos progressivos de financiamento, como bolsas de estudo, serviu para ampliar o acesso e a participação dos estudantes no ensino superior. A par deste desenvolvimento surgiu um novo desafio, o insucesso/abandono no ensino superior. Esta problemática tem vindo a ganhar visibilidade a nível político e social, ganhando destaque na comunidade científica e nas instituições do ensino superior (Ferreira & Fernandes, 2015).
A transição do ensino secundário para o superior é uma etapa crucial na trajetória escolar e pode significar um período crítico para o desenvolvimento e ajustamento académico dos estudantes. Vários autores referem que é extremamente importante acolher e cuidar da entrada dos estudantes nas IES e de toda a fase de integração na vida académica (Ferreira & Fernandes, 2015). Neste seguimento, surgiu a aplicação de programas de mentoria em contexto escolar, dando resposta às preocupações das instituições e reunindo esforços para que seja possível lidar com estes desafios académicos (Silva & Freire, 2014).
O termo mentoria é um termo cada vez mais utilizado nos dias de hoje, contudo a origem do conceito remete-nos para a Grécia Antiga, sendo utilizado ao longo dos séculos pelos mais diversos pedagogos até chegar ao nosso vocabulário atual (Girão, 2013; Neto & Souza-Silva, 2017) Invalid source specified.. Segundo Scandura e Wiliams (2001) mentor define-se como “um indivíduo influente no seu ambiente de trabalho, com experiência e conhecimento mais avançados e que está empenhado em proporcionar apoio e mobilidade ascendente” ao mentorado. Já Baldoni (2003) apresenta mentor como “um amigo, um colega, um conselheiro, todos num só”. Na mesma linha, Daloz (1999) define o papel de mentor como um guia de confiança, sublinhando o papel dos mentores no crescimento global dos respetivos mentorados. Pode-se assim concluir que o termo mentoria é difícil de definir devido à sua ambiguidade e ao facto de ser uma tarefa multifacetada e que se altera consoante o contexto em que é aplicada (Girão, 2013).
Contudo existem considerações comuns como: (1) o requisito de existir uma relação entre duas pessoas, uma mais experiente e outra menos experiente; (2) tem que haver a ajuda dada por uma pessoa a outra na realização de transições significativas de contexto; (3) é também comum a vários autores a consideração de que a mentoria deve ser flexível e interativa, havendo partilha de conhecimento entre o mentor e o mentorado; (4) por fim, definem que a relação estabelecida é limitada no tempo, pois o seu objetivo é tornar o jovem capaz de agir de forma independente (Girão, 2013).
A mentoria pode ser transportada para contextos diversos. De um ponto de vista institucional, a mentoria trata-se de uma relação entre um indivíduo que frequenta a instituição há mais tempo, sendo este o mentor, e outro indivíduo que não se encontra familiarizado com a instituição, sendo este o mentorado. O principal objetivo deste tipo de mentoria é fomentar o desenvolvimento do mentorado, auxiliar o mesmo na tomada de decisões precoces dentro da instituição e que durante o processo este vá adquirindo competências como autoconfiança, devida ao apoio psicossocial resultante da mentoria, e conhecimento da instituição e das práticas intrínsecas (Câmara de Comércio e Indústria do Centro, 2014; Neto & Souza-Silva, 2017).
A mentoria é considerada de fundamental importância para o sucesso profissional do mentorado. É benéfica para a aquisição de conhecimentos, melhoria das competências, da competência comportamental, planeamento e realização de objetivos, ganhos de maior autoconsciência, maior visibilidade, melhor entendimento da própria política organizacional, clareza de objetivos pessoais, maior confiança e desafio intelectual. Além disso, o mesmo autor refere que a Mentoria permite que os estudantes compreendam a sua comunidade académica, as relações internas e as suas próprias responsabilidades perante essa comunidade e a sociedade em geral. Apoiado em estudos, o mesmo autor menciona que os estudantes mais incluídos no planeamento de toda a estrutura escolar relatam maiores benefícios psicológicos. Assim, a Mentoria democratiza o ensino superior através de um suporte aprimorado de aprendizagens e desenvolvimento dos estudantes (Mladenovic, 2012).
A inclusão é outro conceito fundamental a explorar e um fator determinante na forma como os estudantes se inserem nas IES. Inclusão tem como objetivo prestar apoio a todos os indivíduos e implica que todas pessoas aprendam e adquiram conhecimento e se desenvolvam enquanto seres humanos (Amaro, 2011).
A inclusão continua a ser o modo mais digno de abordar a diversidade, pois é o paradigma que mais respeita as características individuais e que as pode promover através do diálogo intercultural e da compreensão das características e necessidades de cada um. Para isso, é necessário desenvolver uma consciência epistemológica nos diferentes agentes educativos que os leve a aceitar e (con)viver com os diversos tipos de intervenientes, a saber potencializar as características de cada indivíduo e a partilhar experiências bem conseguidas. É necessária uma formação de professores, inicial e contínua, que os prepare para o que é a população escolar: diversa, com estudantes singulares e com necessidades muito variadas (César, Machado, & Ventura, 2014).
O desenvolvimento do processo de inclusão é uma peça fundamental no combate aos mecanismos de discriminação e exclusão. O conceito de Educação Inclusiva reconhece as diferenças como normais e fomenta a aprendizagem centrada nas potencialidades, ao invés de impor ritmos e práticas pedagógicas preestabelecidas. Assim, a Educação Inclusiva assume-se como respeitadora das culturas, das capacidades e das possibilidades de evolução de todos os estudantes (Silva R. , 2016).
A inclusão não se atinge sem distribuição de poder, sem equidade no acesso às diversas oportunidades que permitem traçar uma trajetória de participação ao longo da vida que permita ao indivíduo sentir-se realizado (Freire, 2008; Silva R. , 2016).
2. Métodos
Estudo descritivo e exploratório, de natureza qualitativa. Como já referimos, o nosso estudo terá como ponto de partida a análise dos dados recolhidos no projeto piloto “Práticas Inclusivas numa Instituição de Ensino Superior: Perceções sobre a implementação de um Programa de Mentoria”, desenvolvido em duas Unidades Orgânicas de uma Instituição de Ensino Superior. A análise dos dados foi realizada através do método do ePortfólio e focalizada em 2 grupos do universo representado: mentores e mentorados, de acordo com as diferentes funções que cada grupo exerceu na implementação do Programa piloto de mentoria, de modo a identificar e caracterizar os principais constrangimentos mencionados. Foi também desenvolvido um trabalho de revisão bibliográfica sobre a temática “Mentoria no Ensino Superior e os seus principais constrangimentos”, em que procurámos sistematizar os constrangimentos e as dificuldades identificados em experiências similares, no nosso país. A estrutura do nosso ePortfólio tem essencialmente os seguintes tópicos: (1) introdução - enquadramento do projeto de investigação; (2) apresentação dos elementos da equipa de investigação; (3) compreensão da importância da mentoria no Ensino Superior - análise de conceitos relacionados com o tema e estudo de programas de mentoria já existentes noutras Instituições; (4) análise e discussão dos principais constrangimentos inerentes à mentoria obtidos durante o projeto piloto; (5) reflexão sobre o projeto de investigação e formulação de propostas de melhoria, procurando responder à questão de partida.
Num portefólio em formato digital ou e-portefólio, todos os documentos estão em formato digital e são ficheiros que se encontram armazenados em diferentes pastas, consoante a organização do seu autor. Deste modo, o e-portefólio permite incluir uma infinidade de hiperligações que, por sua vez, poderão relacionar as competências adquiridas com as evidências e reflexões que as suportam. O e-portefólio, comparativamente ao tradicional portefólio em papel, propicia a oportunidade do desenvolvimento da capacidade de pensar, exprimir ideias, trabalhar em equipa e alcançar aprendizagens. Possibilita ao estudante contemplar o conhecimento de um outro nível ou perspetiva, com a vantagem de usufruir, ao mesmo tempo, das inúmeras potencialidades das novas tecnologias. Saliente-se que nenhum dossier, por mais completo ou volumoso que seja, é capaz de aglomerar a diversidade de informações e formatos que se poderá incluir num e-portefólio. Por outro lado, permite uma construção mais contínua e menos estática (Gouveia, 2011). O e-portefólio consiste, então, na transformação de um portefólio tradicional num portefólio digital, pois apresenta funcionalidades acrescidas e novas potencialidades relativamente ao portefólio em formato papel (Resende, 2016).
A amostra é constituída por 98 participantes. Através de entrevista semi-estruturada participaram 10 mentorados (estudantes do primeiro ano), 10 mentores (5 estudantes do segundo ano), 1 tutor, todos pertencentes à UO1, 5 mentorados (estudantes do 1.º ano), 5 mentores (estudantes do 2.º ano) e 1 tutor, pertencentes à UO2. Entraram, ainda, na amostra outros 66 participantes, sob a forma de narrativas, aplicadas (através de Google Forms) a estudantes das turmas dos 1º e 2º anos e a tutores da UO1 e UO2.
No final da análise e discussão de resultados, pretendeu-se contribuir para a construção e implementação de um Programa de Mentoria em todas as unidades orgânicas da Instituição de Ensino Superior, a partir do início do ano letivo 2020-2021, apesar de todas as limitações existentes devido ao momento de pandemia que atravessamos, com ajustamentos nessa implementação, a fim de respeitar todas as diretrizes da Direção Geral da Saúde.
3. Resultados
Tendo em conta todas as fontes internas e externas analisadas, foram encontrados vários tipos de constrangimentos na implementação de um Programa de Mentoria, mencionados quer pelas IES estudadas, quer no projeto piloto da Instituição de Ensino Superior em estudo. Os dados obtidos foram resultado da interpretação de testemunhos de participantes em programas de mentoria nas seguintes instituições: Universidade do Porto; Universidade de Aveiro; Escola Superior de Enfermagem de Coimbra; Universidade do Minho; além da nossa própria IES.
Estes resultados pretendem dar resposta aos objetivos: sistematizar as principais restrições à mentoria; e compreender os principais constrangimentos resultantes da experiência de mentoria, de modo a identificar os principais fatores facilitadores e obstáculos vivenciados pelos estudantes ao longo do percurso académico, em IES, para atenuar os constrangimentos sentidos ou, até mesmo, eliminá-los por completo.
De acordo com a análise da tabela 1, a Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto foi a instituição que apresentou mais obstáculos na implementação do programa (nove constrangimentos). A Universidade de Aveiro detetou seis constrangimentos, a Escola Superior de Enfermagem de Coimbra relatou quatro tipos de dificuldades e, por fim, a Universidade do Minho foi a instituição que detetou menos barreiras, referindo três adversidades inerentes ao programa. De acordo com as instituições analisadas, foram encontrados dezanove exemplares de constrangimentos na totalidade.
Constrangimentos | Instituições do Ensino Superior Português | |||
---|---|---|---|---|
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (Torres, 2016) | Administração e Gestão Pública - Universidade de Aveiro (Fernandes, 2013) | Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (Rodrigues & Baía, 2012) | Escola de Psicologia - Universidade do Minho (Silva & Freire, 2014) | |
Não definição de um limite saudável de contacto | x | x | ||
Relação demasiado paternalista | x | |||
Problemática da separação | x | |||
Indisponibilidade para atividades do programa | x | |||
Falta de motivação para desempenhar a função | x | x | ||
Incompatibilidade de personalidades | x | |||
Timidez | x | |||
Não resposta ao tipo de apoio que os mentorados procuram | x | x | ||
Bloqueio e pânico inicial por parte do mentorado | x | |||
Falta disponibilidade para formação dos mentores dentro do plano curricular | x | |||
Falta de divulgação e o não reconhecimento institucionais | x | |||
Sobreposição das atividades curriculares e de mentoria | x | |||
Falta de organização atempada e eficiente das ações | x | |||
Não existência de políticas institucionais de compromisso | x | |||
Excessiva burocracia | x | |||
Não gestão correta de tempo e espaço | x | |||
Falta de formação dos intervenientes | x | |||
Pouca proximidade | x | |||
Reduzida duração global do programa | x |
Na Universidade do Porto, em conformidade com Torres (2016), os constrangimentos encontrados na implementação de um Programa de Mentoria foram: “não definição de um limite saudável de contacto”; “relação demasiado paternalista”; “problemática da separação”; “indisponibilidade para as atividades do programa”; “falta de motivação para desempenhar a função”; “incompatibilidade de personalidades”; “timidez”; “não resposta ao tipo de apoio que os mentorados procuram”; “bloqueio e pânico inicial por parte do mentorado”.
De acordo com Fernandes (2013), na Universidade de Aveiro, as dificuldades obtidas foram: “falta de motivação para desempenhar a função”; “não resposta ao tipo de apoio que os mentorados procuram”; “falta de disponibilidade para a formação dos mentores dentro do plano curricular”; “falta de divulgação e o não reconhecimento institucionais”; “sobreposição das atividades curriculares e de mentoria”; “falta de organização atempada e eficiente das ações”.
Segundo Rodrigues & Baía (2012), na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, “não existirem políticas institucionais de compromisso”, “excessiva burocracia”, “Não gestão correta de tempo e espaço” e “falta de formação dos intervenientes” foram algumas das barreiras encontradas à implementação do Programa de Mentoria.
Na Universidade do Minho, Silva & Freire (2014) referiram que a “não definição de um limite saudável de contacto”, “pouca proximidade” e “reduzida duração global do programa” foram obstáculos encontrados na implementação do Programa de Mentoria.
Foram observados constrangimentos em comum, em diferentes instituições. As Universidades do Porto e do Minho apontaram a “não definição de um limite saudável de contacto”. Constatámos também que a “falta de motivação para desempenhar a função” e a “não resposta ao tipo de apoio que os mentorados procuram” foram dois aspetos apontados, em comum, pela Universidade do Porto e pela Universidade de Aveiro.
4. Discussão
Neste capítulo serão discutidos e comparados os resultados do presente estudo com os dados obtidos no projeto piloto “Práticas Inclusivas na instituição: Perceções sobre a Implementação de um Programa de Mentoria”.
Apresentamos os constrangimentos identificados, de acordo com as seguintes dezanove subcategorias: “não definição de um limite saudável de contacto”; “relação demasiado paternalista”; “problemática da separação”; “indisponibilidade para as atividades do programa”; “falta de motivação para desempenhar a função”; “incompatibilidade de personalidades”; “timidez”; “não resposta ao tipo de apoio que os mentorados procuram”; “bloqueio e pânico inicial por parte do mentorado”; “falta de disponibilidade para a formação dos mentores dentro do plano curricular”; “falta de divulgação e o não reconhecimento institucionais”; “sobreposição das atividades curriculares e de mentoria”; “falta de organização atempada e eficiente das ações”; “não existirem políticas institucionais de compromisso”, “excessiva burocracia”, “Não gestão correta de tempo e espaço”; “falta de formação dos intervenientes”; “pouca proximidade” e “reduzida duração global do programa”.
No referente ao projeto piloto, a categoria “Constrangimentos decorrentes do Programa de Mentoria implementado” foi formada por cinco subcategorias, nomeadamente: “Desorganização na implementação do Programa” que deu origem a especificações, das quais as mais referenciadas foram: “Ausência de uma apresentação inicial entre mentores e mentorados”; “Falta de formação prévia na área da Mentoria”, e; “Início tardio do Programa de Mentoria”. Outra subcategoria que emergiu foi a “Falta de adesão por parte dos participantes”, ou seja, “Por parte dos mentores” e “Por parte dos mentorados”. Os participantes também apontaram como constrangimentos o “Desconhecimento do papel do mentor”, “Dificuldades de comunicação” e “Horários incompatíveis”.
De acordo com o projeto citado, uma das subcategorias de constrangimentos encontradas foi “indefinição de número mínimo de encontros entre mentor e mentorado”, a qual também se pôde verificar na Universidade do Porto e do Minho. Torres (2016), referiu que na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto foi encontrada a barreira “indisponibilidade para as atividades do programa”, o que pode corresponder ao facto de os estudantes terem “horários incompatíveis”, tal como foi referenciado no projeto piloto.
Torres (2016) referiu ainda que um dos constrangimentos encontrados foi uma “relação demasiado paternalista”, o que pode ter como origem o “desconhecimento do papel do mentor” e a “falta de formação prévia na área de mentoria”, encontrados no projeto piloto da instituição.
No trabalho “Práticas Inclusivas na instituição: Perceções sobre a Implementação de um Programa de Mentoria”, foi encontrado o constrangimento da falta de comunicação, o que pode desencadear a “timidez” e o “bloqueio e pânico inicial por parte do mentorado” encontrados por Torres (2016), na Universidade do Porto.
Os constrangimentos “falta de disponibilidade para a formação dos mentores dentro do plano curricular”, “falta de divulgação e o não reconhecimento institucionais”, “sobreposição das atividades curriculares e de mentoria”, e “falta de organização atempada e eficiente das ações”, referidas por Fernandes (2013) na Universidade de Aveiro, foram ao encontro dos apresentados no projeto piloto na subcategoria “Desorganização na implementação do programa”, onde se pôde constatar a “Falta de formação prévia na área de mentoria” e a “Falta de informação e divulgação” do programa de mentoria.
Rodrigues & Baía (2012) referiram que na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra foram verificados os seguintes obstáculos: “Não gestão correta de tempo e espaço” e “falta de formação dos intervenientes”, que foram também encontradas no projeto como “horários incompatíveis”, “falta de formação prévia na área de mentoria. Silva & Freire (2014) verificaram a existência de “pouca proximidade” nas relações de mentoria estabelecidas na Universidade do Minho, o que também se verificou na instituição, através da “ausência de uma apresentação inicial entre mentores e mentorados” e pela “falta de adesão dos participantes”.
Estes constrangimentos contrariam o que deve ser um Programa de Mentoria ideal, pois este deve processar-se num relacionamento didático, face a face entre uma pessoa mais experiente e uma pessoa inexperiente num campo específico, o que implica que o mentor tenha formação para desempenhar esse papel e, simultaneamente, tem de se estabelecer, tal como já referido anteriormente, desde o seu início, um clima de empatia, o que está em conformidade com Mladenovic (2012). Este autor defende que a mentoria é fundamental para o sucesso académico e profissional do mentorado. É também benéfica para a aquisição de conhecimentos, melhoria de competências, inclusive da competência comportamental, planeamento e realização de objetivos, ganhos de maior autoconsciência, maior visibilidade, melhor entendimento da própria política organizacional, clareza de objetivos pessoais, maior confiança e desafio intelectual.
Neste sentido e de modo a combater estas barreiras, propomos que a IES responsável deverá efetuar uma apresentação do Programa de Mentoria a todos os estudantes e docentes, demonstrando quais os objetivos e os desafios inerentes à função de mentorado e de mentor. Estes intervenientes estabelecem, deste modo, um primeiro contacto com a natureza do projeto e do envolvimento que será requerido aos participantes. Outro ponto fundamental para o sucesso do projeto é a definição de um início e um fim, além do estabelecimento de objetivos claros e realistas para os intervenientes e de metas flexíveis, ajustáveis às situações emergentes da evolução do processo ao longo do tempo. Para responder a potenciais necessidades dos novos estudantes do ensino superior, os mentores deverão participar em formações de preparação e coordenação. Outra ilação resultante deste estudo é que o momento de matching interpares é fulcral, havendo que atender ao perfil dos participantes; um programa de mentoria tem mais possibilidades de sucesso se as duas pessoas tiverem experiências ou interesses comuns e os mesmos assuntos de conversa. O fator idade também é importante, pelo que devem ser selecionadas pessoas com as mesmas prioridades e os mesmos ritmos de vida. À semelhança do que já foi mencionado deverá também existir um encerramento da mentoria, momento que irá permitir uma reflexão sobre a experiência vivenciada, fazer um ponto de situação em relação aos objetivos estabelecidos e elencar as competências desenvolvidas.
Conclusão
De acordo com literatura existente, o abandono do ensino superior é uma problemática com bastante importância e de preocupação social e académica. Neste contexto, surge a mentoria e a inclusão como conceitos fundamentais e fatores determinantes do envolvimento dos estudantes nas IES. O Programa de Mentoria na instituição é um programa institucional de inclusão, acolhimento e vivência solidárias no ensino superior, tendo como principal objetivo fazer com que os novos estudantes se sintam melhor integrados a nível académico, pessoal e social, promovendo assim o sucesso escolar, o desenvolvimento de competências transversais e a prevenção do abandono e insucesso académico.
Executou-se um estudo de análise de um projeto piloto “Práticas Inclusivas na instituição: Perceções sobre a implementação de um Programa de Mentoria” e uma revisão bibliográfica da temática “Mentoria no Ensino Superior e os seus principais constrangimentos”, aplicando o método e-portfólio. Este estudo permitiu sistematizar e compreender os principais constrangimentos identificados por algumas IES portuguesas. Os resultados, obtidos subjetiva e empiricamente, permitiram concluir que emergiram dezanove subcategorias: “não definição de um limite saudável de contacto”; “relação demasiado paternalista”; “problemática da separação”; “indisponibilidade para as atividades do programa”; “falta de motivação para desempenhar a função”; “incompatibilidade de personalidades”; “timidez”; “não resposta ao tipo de apoio que os mentorados procuram”; “bloqueio e pânico inicial por parte do mentorado”; “falta de disponibilidade para a formação dos mentores dentro do plano curricular”; “falta de divulgação e o não reconhecimento institucionais”; “sobreposição das atividades curriculares e de mentoria”; “falta de organização atempada e eficiente das ações”; “não existirem políticas institucionais de compromisso”, “excessiva burocracia”, “não gestão correta de tempo e espaço”; “falta de formação dos intervenientes”; “pouca proximidade” e “reduzida duração global do programa”.
Este trabalho de investigação proporcionou uma abordagem crítica à mentoria quanto à forma e ao estilo. Não devem, contudo, restar dúvidas de que a mentoria é sempre um instrumento para a inclusão de todos os estudantes, independentemente das suas características individuais, devendo o mentor ser solidário, uma fonte de apoio, um suporte, não assumindo protagonismos, pois o centro do Programa de Mentoria são os estudantes e a sua plena inclusão no universo institucional e académico. O mentor deve transmitir conhecimentos, orientações e estabelecer objetivos, de acordo com o conteúdo do Programa, em parceria com o mentorado. A Mentoria deve basear-se na reciprocidade, na colaboração, na partilha e num clima empático, onde prevaleça o saber ouvir e o saber escutar, porque esta é uma ação que deve ser desenvolvida por mentor e mentorado.
Iremos aproveitar os constrangimentos identificados ao longo deste projeto para edificar uma prática mais consistente da Mentoria, de modo a que estes se reflitam em melhorias a serem implementadas.