Os processos de gestão editorial das revistas científicas têm vindo a constituir-se como um campo do saber específico e altamente especializado, além da complexidade inerente a cada etapa. Ao longo dos últimos 10 anos, o processo de edição científica tem vindo a ser profissionalizado nas suas etapas, fluxos e procedimentos relacionados com a publicação e divulgação dos artigos científicos. A preocupação com o tema gestão editorial tem vindo a ser abordada nos últimos anos com o foco na adoção de boas práticas e nas inovações tecnológicas e editoriais, debatidas em âmbito nacional e internacional (Marziale, 2017).
A liderança dos editores responsáveis pelas revistas é um elemento condutor neste contínuo processo de mudanças que conjuntamente com a profissionalização das equipes editoriais estão a constituir uma nova cultura do processo de divulgação e comunicação científica. A implantação dos fundamentos da ciência aberta e os seus pressupostos constitui-se como um dos grandes desafios dos editores das principais revistas científicas de enfermagem nos últimos anos (Sousa et al., 2022).
A procura por diretrizes e guidelines de boas práticas editoriais é uma exigência constantemente debatida e recordada pelas equipes editoriais. O Committee on Publication Ethics (COPE) é um órgão internacional que tem vindo a investir na produção destes manuais e, tendo desenvolvido recentemente uma checklist no sentido de direcionar os processos editorais que vão orientar a equipe editorial para adoção de boas práticas com transparência e ética (Committee on Publication Ethics, 2022).
As atribuições do editor-chefe, responsável pela coordenação e liderança da equipe editorial, incluem: coordenação da comissão editorial, supervisão de todas as etapas do processo editorial desde a submissão até a aceitação final do artigo científico, proposição de atividades de educação permanente, atualização e revisão das normas e diretrizes da revista, representação em diferentes instancias (eventos, fóruns, grupos de trabalho, entre outros) da Universidade e externamente, gestão financeira, entre outras demonstrando a importância do desenvolvimento de competências relacionadas com a gestão editorial para o profissional que ocupa este papel estratégico na liderança do periódico.
Uma pesquisa recente, realizada para verificar o conhecimento de enfermeiros-investigadores sobre as tendências em edição científica e as boas práticas em pesquisa, examinou 197 enfermeiros-investigadores brasileiros de diferentes regiões do país identificou um conhecimento limitado sobre a edição científica e as boas práticas em investigação, sinalizando uma preocupação que poderá ter impacto no desenvolvimento da enfermagem brasileira (Sousa et al., 2022).
Uma preocupação premente no mundo da edição científica é o processo de formação de novos editores. É consenso entre as principais revistas e lideranças na área da edição científica que a profissionalização do processo de gestão editorial é um caminho sem volta para o fortalecimento das revistas de enfermagem e para a consolidação da disciplina enquanto ciência com pressupostos epistemológicos e conhecimentos específicos que delimitam o seu saber. A renovação e ampliação da equipe editorial é um tema que ainda é pouco debatido nas instâncias competentes, porém é uma pauta que necessita ser planeada e incorporada nas prioridades do processo de gestão editorial.
Existem algumas escassas iniciativas nos programas de pós-graduação que propõem disciplinas e atividades focadas na formação de revisores e consultores ad hoc, entretanto, a edição científica exige do editor conhecimentos além da sua expertise académica em determinada área do conhecimento. O conhecimento em gestão editorial de todo processo de edição científica necessita ser disseminado na formação dos futuros editores das revistas de enfermagem do Brasil e do mundo.
A maioria dos editores e comissões editoriais das revistas brasileiras de enfermagem pertencem ao quadro permanente de docentes de universidades públicas, as quais têm atividades de ensino de graduação e pós-graduação, de pesquisa, de extensão e de gestão nas diferentes esferas das universidades. Neste contexto é importante destacar que ocorre uma sobreposição de atividades e que a carga horária destinada ao processo de edição científica junto as revistas fica comprometida, considerando que o editor é também um docente e que lhe é exigido o cumprimento pleno das suas atividades inerentes ao cargo. Neste sentido, propõe-se a valorização e o reconhecimento do trabalho do docente que é editor de uma revista pelas instituições a que pertence, com consequente reorganização dos processos de trabalho inerentes às revistas, ou seja, com um planeamento de carga horária compatível com as exigências de trabalho.
Neste cenário, a gestão editorial remete-nos para questões como: o que é necessário para a captação e formação de futuros editores de revistas científicas? Como iniciar um processo de renovação e continuidade na edição científica? Nós arriscamos a afirmar que a valorização/reconhecimento em conjunto com a profissionalização para o exercício da função de editor, são as bases para a sobrevivência da atividade com a qualidade e a excelência académica que é esperada pelos autores, leitores e comunidade científica. É necessário haver um planeamento de carga horária compatível com a exigência de trabalho dos editores, independente da etapa do processo.
Outro aspeto a ser integrado nesta discussão sobre a gestão editorial é a autonomia das revistas e das comissões editoriais para inovar e transformar as atividades de edição científica. O contexto académico tem regras e diretrizes bem definidas e consolidadas há vários anos sobre a qualidade, mérito, impacto, repercussão, e ética das produções científicas que são submetidas às revistas científicas. Estas costumam ser de domínio dos editores por fazerem parte do processo de formação de investigadores durante o curso de doutoramento. Entretanto, nos bastidores da gestão editorial existem regras para o financiamento das revistas, o ingresso e a manutenção nas bases de dados, os indicadores e métricas bibliométricas, o investimento na profissionalização e as iniciativas para internacionalização são elementos que perpassam diferentes instâncias sob as quais as comissões editoriais podem ter limitada interação e intervenção, mas que precisam compreender as suas particularidades. A viabilidade e visibilidade dos periódicos depende da qualidade com que a gestão editorial se processa.
Uma preocupação atual dos periódicos de enfermagem no Brasil é o decréscimo de financiamento que vêm sofrendo nos últimos anos, resultado de cortes de verbas e redução das oportunidades de captação de recursos por editais específicos. As recomendações para uma gestão editorial eficaz têm focado no tripé sustentabilidade, profissionalização e internacionalização de acordo com os critérios da Coleção SciELO Brasil (Packer et al., 2020). A questão que emerge traz principalmente a inquietação com o financiamento, considerando que todo o processo de edição agrega diferentes rubricas para viabilizar um processo de trabalho profissionalizado e com condições de circulação internacional. Os custos para se manter um sistema de gestão editorial reconhecido em diferentes idiomas são elevados, tais como a aquisição de softwares de avaliação de similaridade, captação e formação de banco de pareceristas fidelizados e divulgação do periódico e dos manuscritos publicados em diferentes plataformas, dentre outras necessidades dos periódicos. Condições estas que exigem programação e previsão de gastos para a manutenção regular e produção continuada de uma revista científica.
Portanto, é fundamental mantermos esforços para a formação de novos editores críticos e instrumentalizados com as competências específicas da atividade para haver continuidade nos avanços, progressos e conquistas que as lideranças, editores-chefes e comissões editoriais têm vindo a alcançar nos últimos anos. A gestão editorial das revistas tem como base uma equipe de profissionais altamente qualificada e comprometida no desenvolvimento da enfermagem brasileira, pautada na adoção de boas práticas editoriais com ética e integridade.
O conhecimento sobre gestão editorial precisa ser compartilhado e documentado para que uma nova geração que vem demonstrando interesse pela atividade possam dar seguimento sólido e coerente aos desafios que se lançam no momento atual, destacando a implementação das práticas da ciência aberta, o combate as revistas predatórias, a ampliação das iniciativas de internacionalização das revistas brasileiras, entre outras. Desafios que definem a qualidade da gestão editorial dos periódicos e consequente visibilidade no cenário da produção científica nacional e internacional.