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Ex aequo
versão impressa ISSN 0874-5560
Ex aequo no.29 Vila Franca de Xira 2014
Rabelo, Amanda, Pereira, Graziela, Reis, Maria Amelia (Org.) (2013), Formação docente em gênero e sexualidade: Entrelaçando teorias, políticas e práticas, Petrópolis, Editora De Petrus et Alii, 256 páginas.
Rui Marques Vieira
Universidade de Aveiro, Departamento de Educação
Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores
Este livro apresenta 12 capítulos, incluindo a apresentação e a introdução, de mais 11 autores e autoras diferentes. Considera-se que, no âmbito das questões de gênero e sexualidade predomina a temática da Formação, com destaque para a do/as docentes, mas incluindo também outros profissionais, como os da área da medicina. Depois destacam-se os estereótipos, as discriminações e as representações ou concepções.
Muito há a dizer sobre esta obra, pois além de preencher um espaço editorial relevante nos países de língua Portuguesa será, se for devidamente divulgada, uma obra de referência, particularmente para quem faz investigação nestes domínios do saber. Isto porque apresenta vários estudos recentes e outros em desenvolvimento, os quais devem ser tidos em conta especialmente para quem faz formação nesta área. Mas, também pelas recomendações e sugestões para, por exemplo, a continuação da investigação neste domínio.
Logo no início desta obra destaca-se um pouco da história da educação sexual, nomeadamente no Brasil e em Portugal, a qual tem quase 100 anos (por exemplo, o Nóbel Egas Moniz escreveu, quase há um século atrás, a sua tese de medicina sobre «Vida Sexual, Fisiologia e Patologia»). A este nível, por marcarem muito da forma como se passou a perspetivar e ainda se vê a sexualidade humana, destacam-se os relatórios Hite que começaram a ser publicados nos finais dos anos 70 do século XX.
Esta é também uma obra plural na escrita e estilos usados, quadros de referência e profundidade de alguns dos assuntos. Estando ligado à investigação sobre a formação de professores não se pode deixar de questionar alguns dos princípios usados, quer na formação inicial, quer na formação continuada e pós- -graduada. É o caso da articulação entre a teoria e a prática nesta formação, como foi destacado na avaliação de formações descritas em diferentes capítulos, por alguns dos formandos. A este nível urge também alargar e articular os impactes da formação nas concepções e práticas dos formadores (esta segunda das práticas em clara desvantagem em relação à primeira das conceções). Como é frisado em alguns dos estudos: «... a educação sexual ainda é pouco abordada nas escolas» (Rabelo e Ferreira, p. 64).
As questões sobre a formação em b-learning ou mesmo a distância (que não pode ser distante!) também não são isentas de controvérsias. Esta área precisa de ser aprofundada e sustentada para se poder avançar (ou não) nesta modalidade de modo suportado, dadas as questões afetivas e emocionais que estão envolvidas também na educação sexual! Um bom contributo pode ser dado pelo estudo que Pereira (pp. 195-210) está a desenvolver com o programa de formação a distância para professores de vários países. Nesta e em todas as modalidades de formação importa questionar, tal como tem sido discutido sobre os valores, «se se ensina educação sexual» (esta foi uma das motivações dos professores para a formação, dado que têm: «Dúvidas sobre o que e como ensinar na área de educação sexual»)?
Além do referido, deste livro destacam-setrês aspetos globais:
- O mesmo resulta de investigação fundamentada e desenvolvida e da qual emanaram recomendações práticas úteis. Evidencia também que o trabalho colaborativo entre investigadores e com os professores e escolas é possível. Deseja-se que este livro seja ainda aproveitado largamente por estes docentes. Mas também pelos pais que ainda não têm conseguido, e tal também não lhes tem sido viabilizado, uma estreita colaboração com toda a restante comunidade educativa.
- Pela diversidade de referenciais e quadros teóricos atuais internacionais nesta obra procura-se fazer um ponto de situação da investigação e formação, acompanhando as tendências de mudança, nomeadamente no que toca ao papel das TIC e de comunidades online de prática e de aprendizagem. As abordagens que se apresentam são elucidativas e procuram ilustrar a relevância desta área de investigação para a formação de cidadãos participativos, informados, emancipados (talvez a caraterística mais referida em diferentes artigos) e que tomam decisões racionais em prol do bem-estar individual e coletivo. Têm que se evitar, como escrevem Yared e Melo, «Práticas que fortalecem a perpetuação desse modelo de sexualidade dito normal, visto que muitas das práticas fora da heteronormatividade, por exemplo, ainda são consideradas como patológicas» (p. 157).
- Os desafios que esta área enfrenta podem parecer acessíveis e de fácil implementação. Todavia exigem: uma formação que vá além das abordagens anatómico-fisiológica e biológica. Obriga a ter em consideração outras áreas como a Didática e a Supervisão e avaliação de Professores e demais formadores. Só desta forma se poderão ter condições para que a formação possa atingir as metas e os parâmetros desejáveis e os estipulados curricularmente nos diferentes países. E a educação sexual humana precisa também da disseminação de boas práticas. Importa também aqui avançar com o «conhecimento do outro» e nas «autobiografias profissionais » partilhadas.
Pese embora do ponto de vista legal terem existido avanços substanciais, ainda há um caminho longo a percorrer para vencer barreiras e obstáculos culturais que a Sexualidade Humana tem suscitado, quer na investigação, quer na formação, como as ligadas aos comportamentos de risco e aos abusos sexuais. Além disso, importa reforçar uma «perspetiva crítico-reflexiva» (Rabelo e Ferreira, p. 66) e «de ética e de responsabilidade social» (Yared e Melo, p. 147). Também os recursos educativos de qualidade e inovadores precisam de ser divulgados como é o caso dos «Guiões de Educação sobre Género e Cidadania», coordenados por Teresa Alvarez Nunes e Teresa Pinto, os quais estão disponíveis gratuitamente no site do governo Português.
Termina-se citando Reis:
«Se a educação é prática que se constrói no interior das relações sociais, portanto com muito pouca autonomia em relação aos condicionantes sócio-econômicos-culturais em que se inscreve, podemos concebê-la como instrumento de reforço das concepções de senso comum e situá-la em terreno semovente em que se movimentam mecanismos que visam manter e reproduzir as desigualdades, não sem resistências» (p. 215).