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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.18 no.2 Lisboa ago. 2017

https://doi.org/10.15309/17psd180220 

Análise metodológica sobre literatura em onco-hematologia pediátrica

Methodological analysis regarding pediatric oncohematology papers

Marina Kohlsdorf1,3,* Áderson Luiz Costa Junior2,4

 

1Centro Universitário UniCeub, Brasília DF, Brasil;

2Universidade de Brasília, Brasília DF, Brasil;

3e-mail: marinak@unb.br; 4e-mail: aderson@unb.br

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

Este trabalho se caracteriza como uma revisão de literatura na área de psiconcologia pediátrica e teve como objetivo categorizar, quanto à metodologia utilizada, pesquisas relativas ao estudo do impacto do tratamento onco-hematológico pediátrico para pais. Foram considerados trabalhos publicados nas principais revistas internacionais entre 1996 e 2006, resultando em 11 artigos com metodologia qualitativa, nove estudos com metodologia quantitativa, oito estudos longitudinais e apenas um com metodologia mista. Um número relevante de diferentes instrumentos tem sido utilizado, além do desenvolvimento de escalas e questionários com objetivos específicos à pesquisa na área. Entrevistas também têm proporcionado aos pesquisadores a compreensão de processos, de mudanças e de percepções, por parte dos cuidadores, acerca do diagnóstico e tratamento. São discutidas as vantagens da combinação de metodologias quantitativas e qualitativas para apreensão de vários aspectos do processo saúde-doença durante tratamento pediátrico onco-hematológico. Além disso, estudos longitudinais têm se mostrado bastante úteis para a compreensão das mudanças ao longo do processo de tratamento, que envolve diversas demandas, exigências e dificuldades não apenas para o paciente pediátrico, mas para pais e familiares.

Palavras-chave: câncer infantil, metodologia, revisão de literatura.

 

ABSTRACT

This paper is a literature review in pediatric psychooncology with the aim of analyzing, according to methodology, researches concerning the impact of oncohematological treatment for parents. Papers published in the main international journals between 1996 and 2006 were considered for this review, resulting in 11 papers with qualitative metholodogy, nine studies with quantitative methodology, eight longitudinal researches and only one manuscript with mixed methods. A relevant number of different instruments has been used, besides developing scales and questionnaires with specific goals regarding the research in this field. Interviews have also promoted the understanding of processes, changes, and the caregiver´s perception related to diagnosis and treatment. Advantages concerning the combination of different quantitative and qualitative methodologies are discussed in order to comprehend the several aspects in health related processes during pediatric oncohematological treatment. Besides, longitudinal studies have been very useful the understanding of the changes during the treatment process, which involves several demands, challenges and difficulties not only for the pediatric patients, but for parents and caregivers.

Keywords: childhood cancer, methodology, literature review.

 

O processo de desenvolvimento humano é permeado por eventos de transição ecológica, previstos ou imprevistos, que modificam o modo como o indivíduo se relaciona com seu grupo social e o contexto no qual se encontra inserido (Bronfenbrenner & Ceci, 1994). Tais eventos (como, por exemplo, o nascimento de filhos, a morte de parentes, mudanças cruciais no contexto econômico, diagnóstico de uma enfermidade grave, acidentes naturais, matrimônio, entre outros) exigem uma adaptação e ajustamento psicológico dos indivíduos envolvidos a uma nova situação.

O diagnóstico e o tratamento de enfermidades onco-hematológicas pediátricas (doenças caracterizadas pelo crescimento desordenado de células neoplásicas) podem ter o impacto familiar de um evento ecológico adverso, considerando a exposição a diversas exigências e dificuldades, tais como: vigilância médica prolongada; internações hospitalares freqüentes; exposição a procedimentos médicos invasivos; submissão e controle rígido sobre regimes de medicação e seus efeitos colaterais; alteração nas rotinas social, escolar e profissional; vivências de ansiedades, expectativas, perdas e dúvidas. Esse contexto pode modificar relações conjugais, exigir alterações no sistema de cuidados parentais e reduzir a possibilidade de suporte social adequado ao paciente e seus familiares (Nascimento, Rocha, Hayes, & Lima, 2005).

A forma como os pais de pacientes em tratamento onco-hematológico pediátrico lidam com tais dificuldades do tratamento de seus filhos tem sido bastante investigada pela psiconcologia pediátrica, área de interface entre a oncologia e a psicologia pediátrica que se baseia em modelos de atenção integral à saúde para investigar fatores psicossociais envolvidos na etiologia, tratamento e reabilitação de pacientes com câncer e seus familiares (Gimenes, 1994). Os diversos aspectos (biológicos, sociais, comportamentais) envolvidos no tratamento onco-hematológico pediátrico dificultam a obtenção, a partir de pesquisas na área, de resultados claros que apontem estratégias de intervenção eficazes tanto para o paciente quanto para seus familiares. Contudo, não há registros na literatura de levantamentos acerca do tipo de metodologia que tem sido empregada nos estudos nesta área, aspecto que justifica a relevância do presente manuscrito.

Constituiu objetivo deste estudo investigar como pais de crianças com câncer lidam com as exigências e eventos estressores associados ao contexto de tratamento, a partir de revisão de literatura realizada com estudos internacionais publicados entre 1996 e 2006 e com enfoque na metodologia utilizada.

 

MÉTODO

Foram realizadas buscas sistemáticas nos sítios Scielo, BVS/Saúde e Pepsic/Bireme, além de buscas específicas em duas revistas especializadas no cuidado pediátrico: Journal of Pediatric Oncology Nursing (JOPON) e Journal od Pediatric Psychology (JPP). As palavras-chave empregadas na busca incluíram os termos "childhood cancer", "pediatric cancer", "caregivers" e "parents". Os resumos dos artigos foram selecionados para verificar a abrangência de cada estudo, que deveria obrigatoriamente, de forma exclusiva ou parcial, incluir foco na vivência dos pais e/ou cuidadores familiares de crianças em tratamento.

Foram encontrados ao total 28 estudos publicados entre 1996 e 2006: 11 artigos com metodologia qualitativa, nove com metodologia quantitativa, oito com metodologia mista e apenas um estudo de acompanhamento ao longo do tempo. Considerando o objetivo principal desta revisão, relacionado a focalizar procedimentos metodológicos adotados pelos trabalhos, nenhum artigo foi retirado da seleção inicial e todos os 28 manuscritos encontrados foram analisados.

 

RESULTADOS

Estudos com metodologia qualitativa

O estudo de Untalan et al. (2004) teve como objetivo descrever qualitativamente as características de pacientes pediátricos atendidos em uma clínica no Havaí, serviços de suporte utilizados e dificuldades experienciadas pelas famílias. Para tanto, os autores entrevistaram 17 cuidadores primários a respeito de estressores financeiros, emocionais e culturais, a partir de 26 questões abertas, criadas pela pesquisadora principal especialmente para a pesquisa, relativas a cinco áreas: reação familiar ao diagnóstico; processo médico relatado; fontes de suporte mais necessárias e úteis; enfrentamento adaptativo utilizado pelas famílias; e experiências prévias com doenças, bem como percepções sobre o tratamento em foco. Ao final do trabalho, são apresentados três exemplos das entrevistas, sob formato de estudo de caso.

Sidhu, Passmore e Baker (2005) investigaram a percepção parental sobre preocupações, demandas e necessidades de irmãos de pacientes em tratamento, a partir de grupos focais com oito pais participantes. Os autores identificaram tópicos como universalidade das perdas a partir da experiência de tratamento, mudanças comportamentais e adaptação, comunicação entre pais e filhos, além de possíveis intervenções de suporte.

A pesquisa com grupos focais de Neil-Urban e Jones (2002) teve como objetivo investigar o impacto e percepção do tratamento por parte de pais (ou seja, excluindo-se mães) de pacientes pediátricos. A partir de questionários com perguntas abertas, dois grupos focais de pais (com cinco participantes cada) foram formados para relatar assuntos como o impacto no papel de provedor familiar, impacto emocional, o tratamento como a luta mais importante da vida familiar, dinâmica de cuidados ao paciente, hipervigilância, impacto do hospital e procedimentos invasivos, enfrentamento e adaptação.

Holm, Patterson e Gurney (2003) exploraram as descrições, por parte dos pais, sobre sua participação no cuidado médico da criança em tratamento. Os autores utilizaram sete grupos focais, constituídos por cinco a nove participantes, totalizando 45 pais de crianças que completaram o tratamento onco-hematológico. Os autores apresentam detalhadamente as cinco questões apresentadas para orientar as discussões nos grupos.

O estudo de Liang (2002) utilizou entrevistas com 34 cuidadores e seis profissionais de enfermagem, com o objetivo de investigar temas sobre o conhecimento cultural disponível para promover métodos apropriados de cuidado infantil, bem como a influência de tal conhecimento no processo de tomada de decisão de cuidadores no processo de tratamento.

Clarke, Fletcher e Schneider (2005) investigaram a experiência de mães em relação a atividades caseiras de cuidados com a saúde, tais como administração de medicamentos, proteção contra doenças concorrentes, atenção a efeitos colaterais da medicação, agendamento de consultas e vigilância do tratamento. O estudo utilizou dez grupos focais com uma média de cinco participantes cada um, totalizando 49 mães.

Para explorar e descrever a experiência de ter um filho com câncer numa área rural, Scott-Findlay e Chalmers (2001) utilizaram entrevistas semi-estruturadas acerca dos temas: história do diagnóstico, sinais e sintomas; tipos de tratamento e efeitos colaterais; permanência longe de casa; mudanças de vida, desejos, expectativas, enfrentamento e esperança; suporte social; influência na família como um todo. Sob orientação da abordagem familiar sistêmica, participaram 25 familiares de crianças em diversos estágios de câncer e 12 crianças (entre pacientes e irmãos de pacientes). As autoras relatam que foi realizado um estudo piloto com duas famílias não incluídas na amostra e detalham a aplicação e análise dos dados a partir das entrevistas.

Tarr e Pickier (1999) investigaram o processo pelo qual famílias de crianças com Leucemia Linfocítica Aguda de baixo risco (LLA) “se constituem” ou “vêm a se tornar” usuários de um tratamento médico. Participaram do estudo quatro famílias e três profissionais de saúde, que responderam a entrevistas sobre tentar de viver da forma mais “normal” possível, aceitar que a vida não é mais a mesma, entender o que deve ser feito e aceitar que não é possível mudar aspectos insatisfatórios da vida. Já o estudo de Martinson e Yee (2003) entrevistou 93 pais de crianças com câncer em diversos estágios e mesmo após finalização do tratamento, a fim de identificar conceitos relacionados à restauração da saúde em seus filhos, a partir de práticas alimentares, cuidados domésticos, restrições de atividades e uso de terapias e medicamentos alternativos.

O trabalho de James et al. (2002) teve como objetivo desenvolver um novo instrumento qualitativo para investigar percepções de 151 pais sobre o que os auxilia ou prejudica no papel de cuidadores. A entrevista “Cuidado de meu Filho com Câncer” foi formulada com seis questões abertas: 1) Em geral, como a dificuldade de cuidar de seu filho doente tem impacto em sua habilidade de cuidar de si mesmo? 2) Que tipo de auxílio facilitaria o seu cuidado da criança doente? 3) O que tem auxiliado o cuidado de seu filho doente? 4) Que aspectos não têm auxiliado o cuidado de sua criança? 5) De que você e sua família tiveram que desistir ou abrir mão como resultado da doença de seu filho (exemplos incluem trabalho, cuidado dos filhos, dinheiro, relacionamentos, recreação, férias, efeitos colaterais, tempo de descanso e lazer)? 6) Há mais alguma coisa que você quer nos contar a respeito do cuidado de sua criança doente?

A partir de entrevista semi-estruturada, Enskär, Carlsson, Golsäter, Hamrin e Kreuger (1997a) investigaram o relato de pais sobre problemas relativos ao tratamento de seus filhos e a influência de tais problemas na vida parental. Os 16 participantes do estudo relataram suas percepções sobre mudanças relativas à doença e hospitalização, problemas e inconvenientes relativos ao tratamento e benefícios da enfermidade e da hospitalização.

 

 

Estudos com metodologia quantitativa

O estudo de Chao , Chen, Wang, Wu e Yeh (2003) com 24 pacientes pediátricos (com diagnósticos em sua maioria de leucemias e linfomas) e seus pais utilizou questionários e inventários para investigar o ajustamento psico-social de pais e crianças e também sintomas relativos à depressão nos pacientes. Os questionários de ajustamento psicossocial (em inglês, Psychosocial Adjustment Questionnaires) são organizados segundo quatro seções: (i) características demográficas; (ii) condições de saúde psico-social; (iii) percepção e atribuição sobre a enfermidade; (iv) mudanças psicos-sociais nas famílias. A seção (ii) é composta por itens respondidos em escala Likert de cinco pontos, a respeito da avaliação subjetiva sobre condições físicas, desempenho acadêmico, número de amigos, autoconceito, temperamento e humor do paciente. Os autores ilustram exemplos de itens do instrumento no texto.

A seção (iii) destaca a percepção, causa e atribuição subjetivas da doença como em decorrência de destino, poluição ambiental, mau comportamento, dieta não saudável, hereditariedade, mutação genética, estresse, problemas durante gravidez, infecções anteriores e sem razões particulares. Tal escala, composta por 12 itens respondidos em escala Likert de quatro pontos, parece ser um bom indicador de crenças disfuncionais em relação à enfermidade e tratamento, de acordo com os autores.

A última seção do instrumento consistiu em: (a) dois grupos de cinco questões sobre a visão do paciente acerca das mudanças nas atitudes parentais desde o início do tratamento; (b) sete questões sobre mudanças no relacionamento do paciente com pais e irmãos. Os autores apresentam exemplos de itens, respondidos em escala Likert de três pontos. Para os pais, os instrumentos foram adaptados, a fim de destacar as percepções parentais sobre os mesmos assuntos e aspectos do tratamento.

Outro instrumento utilizado neste estudo foi a versão chinesa do Inventário de Depressão Infantil (do inglês Children Depression Inventory), composto por 27 itens que descrevem condições depressivas em três níveis. Os autores apresentam as propriedades psicométricas dos instrumentos utilizados, assegurando sua pertinência ao estudo.

A pesquisa desenvolvida por Trask et al. (2003) utilizou várias medidas de distress, coping, suporte social e coesão/adaptação familiar para investigar as relações entre ajustamento (parental e de adolescentes), enfrentamento e relações com suporte social e funcionamento familiar. Além de um questionário sócio-demográfico, os participantes responderam o Inventário Breve de Sintomas (do inglês Brief Symptom Inventory – BSI, de Derogatis, 1992), um instrumento de 53 itens com respostas em escala Likert de cinco pontos, para acessar padrões de sintomas psicológicos durante a semana anterior.

Outro instrumento utilizado no mesmo estudo foi a Escala de Auto-relato sobre Comportamentos Juvenis (do inglês Child Behavior Checklist – CBCL – Youth Self-Report, de Achenbach & Edelrock, 1987), um questionário padronizado, com 120 itens, que mostra o quão freqüentemente o adolescente se engaja em diversos tipos de comportamentos. O procedimento descreve ainda o uso da Escala de Suporte Social para Crianças (do inglês Social Support Scale for Children – SSSC, desenvolvida por Harter, 1985). Essa escala, composta por 24 itens, foi utilizada para medir, a partir da escolha de qual item melhor descreve a resposta do respondente para cada item, a percepção de crianças e adolescentes sobre o suporte social e a consideração positiva por parte de pais, professores, colegas de turma e amigos próximos.

Os autores adotaram também as Escalas de Avaliação da Adaptabilidade e Coesão Familiares (do inglês Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scales II – FACES II, de Olson et al., 1989), um instrumento de 30 itens com respostas em escala Likert de cinco pontos para avaliar como a família funciona na atualidade e como o respondente gostaria que a família atuasse. O último questionário utilizado neste estudo foi o Inventário de Estratégias de Enfrentamento (do inglês Coping Strategies Inventory, de Tobin, Holroyd, & Reynolds, 1984), composto por 72 itens, respondidos em escala Likert de cinco pontos, sobre os pensamentos e comportamentos de enfrentamento como resposta a um episódio estressor específico. Todos os instrumentos utilizados neste estudo são descritos em termos de adequadas propriedades psicométricas e os autores apresentam alguns exemplos de itens que compõem os questionários e escalas.

O objetivo do estudo de Santacroce (2002) foi descrever relações entre incerteza, ansiedade e sintomas de estresse pós-traumático em pais de crianças recentemente diagnosticadas com câncer. A incerteza parental foi medida a partir da utilização da Escala de Percepção Parental de Incerteza (do inglês Parental Perception of Uncertainty – PPUS, de Mishel, 1983), respondida em escala Likert de cinco pontos.

A ansiedade foi avaliada a partir do Inventário de Ansiedade Estado-Traço (do inglês State-Trait Anxiety Inventory – STAI, desenvolvido por Spielberger, 1983). O instrumento, formado por 40 itens respondidos em escala Likert, diferencia entre a ansiedade-traço (diferença entre a tendência individual de perceber situações estressoras como perigosas) e ansiedade-estado (sentimentos atuais de tensão, ansiedade, nervosismo e preocupação). Sintomas de estresse pós-traumático foram investigados a partir do Índice de Reação (do inglês Reaction Index, de Pynoos, Frederick, Nader, & Arroyo, 1987), uma escala de auto-relato em 20 itens, respondida em escala Likert de cinco pontos, sobre a presença e freqüência de sintomas indicadores de estresse pós-traumático. A autora relata propriedades psicométricas de todos os instrumentos utilizados, mas apresenta exemplos de itens componentes apenas do Índice de Reação.

O estudo de Sterken (1996) trabalhou com 31 pais de crianças, para avaliar a relação apenas dos pais (portanto excluindo mães) com a enfermidade onco-hematológica de seus filhos. Para tanto, o autor utilizou a Escala de Mishel para Percepção Parental sobre Incerteza (do inglês Mishel´s Parent Perception of Uncertainty Scale, desenvolvida em 1983), composta por 31 itens, respondidos em escala Likert de cinco pontos, relativos à ambigüidade, falta de clareza e informação, além de fatores imprevisíveis, para avaliar a incerteza vivenciada por pais em relação à doença de seus filhos. O autor exemplifica cada um dos fatores, apresentando suas propriedades psicométricas. Além disso, foi utilizada a Escala de Enfrentamento Jalowiec (do inglês Jalowiec Coping Scale), uma lista de 40 comportamentos específicos de enfrentamento que são descritos pelo respondente em termos da freqüência em que ocorrem, segundo uma escala Likert de cinco pontos; as propriedades psicométricas da Escala são também descritas.

O modelo ecológico de desenvolvimento de Bronfenbrenner baseou a pesquisa de Shapiro, Perez e Warden (1998), a respeito das associações entre relações familiares, adaptação pessoal-psicológica do cuidador e habilidade de funcionamento junto ao sistema de saúde (percepção da relação médico-paciente) de 29 mães de pacientes pediátricos com diagnóstico onco-hematológico. O estudo utilizou um questionário com 60 itens para avaliar níveis de depressão, sobrecarga, mudanças em relações familiares e relação médico-paciente, além da Escala de Depressão Auto-Relatada (do inglês CES-D Self Report Depression Scale, desenvolvida por Radloff em 1977), um instrumento de 20 itens com propriedades psicométricas satisfatórias. A sobrecarga das mães, bem como a relação médico-paciente, foram respectivamente investigadas a partir do desenvolvimento estatístico de uma escala composta por quatro e sete itens, respondidos em escala Likert de cinco pontos.

Rodrigues, Rosa, Moura e Baptista (2000) investigaram as estratégias de enfrentamento e a percepção da doença em 30 pais de crianças com câncer, quando comparados a 30 pais de crianças recuperadas. As estratégias de enfrentamento foram avaliadas a partir do questionário Lidar com a Doença (do inglês Dealing with Illness – DWI), um instrumento composto por 47 itens, respondidos em escala Likert de 5 pontos, a respeito de comportamentos (divididos em cognitivo-ativos, ativo-comportamentais e de esquiva) adotados para lidar com a doença. O ajustamento emocional dos participantes foi avaliado a partir do Perfil de Estados de Humor (do inglês Profile of Mood States – POMS, desenvolvido por McNair, Loor, & Droppleman, 1971), um inventário de auto-avaliação composto por 65 adjetivos respondidos em escala Likert de cinco pontos. A percepção cognitiva da doença foi investigada pelo Questionário de Percepção da Doença (do inglês Illness Perception Questionnaire – IPQ), composto por cinco escalas relativas à enfermidade que avaliam sua identidade, crenças a seu respeito, duração, conseqüências e possibilidades de controle; as respostas são dadas em escala Likert de quatro pontos. As autoras descrevem as propriedades psicométricas de cada instrumento, bem como seus objetivos principais.

Para avaliar os níveis sintomáticos de estresse pós-traumático em 162 crianças com câncer e seus pais, Phipps, Larson, Long e Rai (2006) utilizaram cinco instrumentos diferentes. O Índice de Desordem de Estresse Pós-traumático (do inglês UCLA Post-Traumatic Stress Disorder Index for DSM – IV, desenvolvido por Pynoos, Rodrigues, Steinberg, Stuber e Frederick, 1998), com 22 itens, foi respondido tanto por pais quanto por pacientes. Além disso, a Escala de Impacto de Eventos (do inglês Impact of Events Scale – IES, desenvolvida por Horowitz, Wilner, & Alvarez em 1979) em sua versão revisada foi utilizada, com 22 itens respondidos por pais e crianças participantes a respeito de sintomas de estresse pós-traumático.

As crianças participantes do estudo responderam a Escala Infantil de Desejabilidade Social (do inglês Children´s Social desirability Scale – CSD, desenvolvida em 1965 por Crandall, Crandall, & Katkovsky; Phipps & Srivastava, 1997), constituída por 25 itens sobre comportamentos e atitudes, exemplificados pelos autores, que são socialmente desejáveis (ainda que improváveis), além do Inventário Infantil de Ansiedade Estado-Traço (do inglês The State-Trait Anxiety Inventory for Children – STAIC, de Speilberger, 1973), já descrito anteriormente. Pacientes adolescentes e seus pais responderam o Inventário Weinberger de Ajustamento (do inglês The Weinberger Adjustment Inventory – WAI, Weinberger & Schwartz, 1990; Weinberger, 1991), composto por quatro subescalas, totalizando 46 itens.

O estudo de Kazak et al. (2004) teve como objetivo específico desenvolver um método confiável para avaliar as crenças de 119 mães e 56 pais relativas ao câncer de seus filhos, a partir da validação do Inventário de Crenças Familiares sobre Doença (em inglês, Family Illness Beliefs Inventory – FIBI). Tal instrumento é constituído por 41 itens, baseados inicialmente em seis dimensões (afeto, significação, otimismo, auto-eficácia, conexão e crenças específicas sobre a doença) e com número igual de frases para refletir tanto a promoção de adaptação quanto prejuízo à adaptação. Neste estudo de validação, são explicitadas as instruções à administração, bem como tempo gasto para refinar os itens até seu formato final.

Após um estudo piloto com três mães e dois pais de pacientes pediátricos em tratamento oncológico, foi realizada a validação do instrumento com o presente estudo. A tarefa dos participantes foi receber os itens do Inventário, um a um, impressos em um cartão e então escolher em qual pilha colocariam cada um dos cartões: 1) não é verdadeiro para mim; 2) é um pouco verdadeiro para mim; 3) é um tanto verdadeiro para mim; 4) é muito verdadeiro para mim. O tempo de resposta ao Inventário foi aproximadamente 15 minutos e a análise de propriedades psicométricas apontou a adequação do instrumento, além de agrupamento dos itens em cinco fatores: sofrimento relativo ao tratamento (composto por 11 itens), morte e devastação (oito itens), competência do cuidador (nove itens), conexões interpessoais (oito itens) e procura de significados (cinco itens). Os autores apresentam em detalhes as correlações entre todos os itens que compõem o instrumento.

Para a validação do FIBI, muitos outros instrumentos foram também empregados. Para avaliar distress geral, os autores utilizaram o Inventário Breve de Sintomas (do inglês Brief Symptom Inventory – BSI, segundo o trabalho de Derogatis em 1993), já descrito anteriormente. Outro inventário utilizado foi o Inventário de Ansiedade Estado-Traço (do inglês State-Trait Anxiety Inventory – STAI, de Spielberger, 1983), também já detalhado neste trabalho. Além disso, a Escala Beck de Desesperança (do inglês Beck Hopeless Scale – BHS, trabalho de Beck & Steer em 1993), constituída por 20 itens, também foi utilizada.

Os autores apresentam as correlações do FIBI com os outros instrumentos utilizados no estudo, como a Escala Revisada de Impacto do Evento (do inglês Impact of Event Scale – Revised – IES – R, trabalho de Weiss & Marmar, 1997), um questionário de 22 itens respondidos em escala Likert de quatro pontos. Além disso, também foi utilizado o Índice de Reação à Desordem de Estresse Pós-traumático (do inglês Posttraumatic Stress Disorder Reaction Index – PTSD-RI, de Pynoos et al., 1987), já descrito anteriormente e a Ferramenta para Avaliação Familiar (do inglês Family Assessment Device – FAD, de Epstein, Baldwin, & Bishop, 1983), questionário de 60 itens classificados segundo o quanto descrevem a família do respondente.

Outro instrumento utilizado no mesmo estudo foram as Escalas de Vida Familiar (do inglês Family Life Scales – FLS, desenvolvido em 1992 por Fisher et al.), composta por 23 itens respondidos em escala Likert de seis pontos. As crenças espirituais foram avaliadas a partir da Escala de Intervenção Divina (do inglês Divine Intervention Scale – DIS, de Johnson & Meltzer, 2002), composta por oito itens respondidos em escala Likert de cinco pontos e da Escala de Envolvimento e Crenças Espirituais (do inglês Spiritual Involvement and Beliefs Scale – SIBS, de Hatch, Burg, Naberhaus, & Hellmich, 1998), composta por 17 itens respondidos em escala Likert de cinco pontos e sete itens sobre a freqüência com que o participante desenvolve atividades espirituais. O último instrumento utilizado foi a Taxa de Intensidade do Tratamento (do inglês Intensity of Treatment Rating – ITR, utilizada também por Hobbie et al. em 2000 e Kazak et al. em 2004), uma escala de quatro pontos a respeito da intensidade de tratamento da criança: 1 = cirurgia/quimioterapia de curta duração; 2= cirurgia de tumor cerebral ou protocolos de prognóstico padrão; 3= múltiplas modalidades de tratamento e protocolos de alto risco; 4=doença metastásica, transplante de células hematopoiéticas.

O estudo de Hillman (1997) investigou diferenças em práticas de cuidados relatadas por 58 pais de crianças com câncer, quando comparadas às práticas de 58 pais de crianças saudáveis. Para tanto, a autora utilizou o Relato de Práticas de Cuidado Infantil (do inglês Child-Rearing Practices Report – CRPR, de Block, 1965), em formato de questionário, em que os pais escolhiam 91 itens a respeito de comportamentos relativos ao cuidado de seus filhos. São apresentadas a seguir as propriedades psicométricas do instrumento e vários estudos que o utilizaram.

 

 

Análise de estudos longitudinais e de acompanhamento

Best, Streisand, Catania e Kazak (2001) investigaram prospectivamente a associação entre a ansiedade parental durante o tratamento pediátrico em Leucemia e sintomas de estresse pós-traumático após a finalização do tratamento (Best, Streisand, Catania, & Kazak, 2001). Para tanto, 113 pais responderam, durante o tratamento, os seguintes instrumentos: Lista de sintomas de Langner (do inglês Langner Symptom Checklist, uma escala de 22 itens que avalia sintomas de ansiedade, depressão e saúde mental geral – Dohrenwend, Shrout, Egri, & Mendelson, 1980); Questionário de percepção de procedimentos (do inglês Perception of Procedures Questionnaire – PPQ, de Kazak, Penati, Watbel, & Blackall, 1996), constituído por 19 itens, respondidos em escala Likert de sete pontos, sobre a percepção de pais em relação a procedimentos médicos.

Depois de finalizado o tratamento, os mesmos participantes responderam os seguintes instrumentos: Inventário de Ansiedade Traço-estado (do inglês State-Trait Anxiety Inventory, STAI, de Spielberger, 1983), já descrito anteriormente; Instrumento para Avaliação da Reciprocidade e Dimensão da Rede Social (do inglês Social Network Reciprocity and Dimensionality Assessment Tool – SRNDAT, de Kazak, 1987); Escala Revisada do Impacto de Evento (do inglês Impact of Event Scale-Revised, IES-R, de Weiss & Marmar, 1997), constituída por 22 itens, respondidos em escala Likert de quatro pontos, para avaliar a freqüência de sintomas de estresse pós-traumático em relação a um evento específico.

Os pais responderam também ao Inventário de Desenvolvimento Pós-traumático (do inglês Post Traumatic Growth Inventory - PTGI, de Tedeschi & Calhoun, 1996), que avalia a percepção dos pais acerca do quanto mudaram como resultado da doença pediátrica, a partir de 21 itens respondidos em escala Likert de seis pontos; Escala de Ansiedade e Esquiva Pediátricas (do inglês Pediatric Anxiety and Avoidance Scale – PAAS), desenvolvida para o estudo, a fim de avaliar ansiedade e sintomas de esquiva relativos a cuidados médicos em pais de sobreviventes do câncer. A escala é formada por 15 itens em escala Likert de cinco pontos, cujos itens são exemplificados pelos autores. O último instrumento utilizado foi a Escala de Auto-Eficácia do Hospital Pediátrico da Filadélfia (do inglês Children´s Hospital of Philadelphia Self-Efficacy Scale – CHOP-SES, também desenvolvida para o estudo), constituída por 46 itens, exemplificados pelos autores e respondidos em escala Likert de cinco pontos, a fim de avaliar a percepção parental de auto-eficácia em relação a cuidados médicos.

Steele, Long, Reddy, Lurh e Phipps (2003) investigaram mudanças longitudinais relativas ao estresse percebido, distress afetivo e estratégias de cuidado auto-relatadas por 65 mães, ao longo dos seis meses iniciais de diagnóstico e tratamento. Por três vezes (entre semanas 2-5, 12-14 e 22-24 após o diagnóstico), as participantes responderam os seguintes instrumentos: (i) Inventário de Estresse Percebido (do inglês Perceived Stress Inventory, de Cohen, Kamarck, & Mermelstein, 1983), composto por 14 itens sobre o grau em que o respondente considera sua vida imprevisível, incontrolável e sobrecarregada; (ii) Escala de Sobrecarga do Cuidador (do inglês The Caregiver Burden Scale, desenvolvida em 1984 por Poulshock & Deimling), que indica, em 14 itens, a intensidade em que o papel de cuidador se torna fonte de stress; (iii) versão reduzida do Perfil de Estados de Humor (do inglês Profile of Mood States, desenvolvido por McNair, Lorr, & Droppelman em 1971), com 15 itens para avaliar estados negativos de humor; (iv) quatro subescalas (controle, consistência, criação e responsividade) do Inventário de Dimensões Parentais (do inglês Parenting Dimensions Inventory, desenvolvido por Power em 1993).

O estudo de Dahlquist, Czyzewski e Jones (1996) teve como objetivo avaliar o distress emocional, estilo de enfrentamento e ajustamento marital em 84 pais (42 casais) de crianças com câncer, com uma mensuração inicial aos dois meses após diagnóstico e outra mensuração final cerca de 20 meses após o diagnóstico. Para tanto, as autoras utilizaram os seguintes instrumentos: Inventário Spielberger de Ansiedade Traço-Estado (do inglês Spielberger State-Trait Anxiety Inventory – STAI, Spielberger, Gorsuch, Lushene, Vagg, & Jacobs, 1970), composto por 20 itens indicativos da condição transitória e permanente da tensão; Inventário Beck de Depressão (do inglês Beck Depression Inventory, Beck, Ward, Mendelson, Mock, & Erbaugh, 1961), instrumento composto por 21 itens sobre a presença e intensidade de diversos aspectos somáticos, emocionais e cognitivos da depressão; Escala Modificada de Repressão-sensibilização (do inglês Modified Repression-sensbilization Scale, Epstein & Fenz, 1967), formada por 30 itens em resposta verdadeiro/falso para avaliar o estilo de resposta ao stress ao longo da dimensão de repressão-sensibilização; Escala de Ajustamento de Díades (do inglês Dyadic Adjustment Scale – DAS, Spanier, 1989), constituída por 32 itens sobre ajustamento matrimonial, tais como satisfação, coesão, consenso e expressão afetiva.

Winjberg-Williams, Kamps, Klip, & Hoekstra-Weebers (2006) exploraram os efeitos do suporte social no distress psicológico de pais, a partir de estudo longitudinal durante um período de cinco anos. Os participantes responderam (ao diagnóstico, seis meses, 12 meses e cinco anos depois) aos seguintes questionários e escalas: Questionário de Saúde Geral de Goldberg (do inglês General Health Questionnaire, de Goldberg & Williams, 1988), medida de auto-relato sobre sintomas psicológicos, com pontuações de zero a 12; Lista de Interações e Discrepâncias no Suporte Social (do inglês The Social Support List Interactions and Discrepancies, SSL-I and SSL-D, desenvolvido e validado por Van Sonderen, 1993), respondida em escala Likert de quatro pontos e constituída por 34 itens a respeito do suporte social recebido e outros 34 itens sobre a satisfação com o suporte (exemplos de itens são apresentados pelos autores).

Outro estudo prospectivo investigou fenomenologicamente a vivência e experiência de famílias quando uma criança é diagnosticada com câncer (Björk, Wiebe, & Hallström, 2005), a partir de entrevistas com 17 famílias, realizadas em três fases: ao diagnóstico, à metade do tempo previsto de tratamento e após finalização do tratamento.

Sloper (2000) investigou níveis de distress psicológico em pais de crianças com câncer e relações entre distress e medidas de variáveis da doença, recursos psicológicos, estratégias de enfrentamento e valorização da experiência. Participaram do estudo 126 pais, que responderam aos instrumentos seis e 18 meses após a comunicação do diagnóstico. Os instrumentos utilizados no estudo foram: Inventário Malaise (do inglês Malaise Inventory, de Rutter, Tizard, & Whitmore, 1970), composto por 24 itens, respondidos de forma afirmativa ou negativa, para medir o distress psicológico; Subescalas de Expressão e Coesão no Ambiente Familiar (do inglês Cohesion and Expression Subscales in Familiar Environment, de Moos & Moos, 1981), formadas por nove itens julgados como verdadeiros ou falsos.

Além disso, foram utilizadas a Escala de Satisfação com a Rede de Suporte (do inglês Support Network Satisfaction Scale, de Vaux & Harrison, 1985), em escala Likert de quatro pontos, sobre satisfação com orientações e conselhos recebidos e com o suporte emocional, social, prático, financeiro recebido; Escala Breve de Locus de Controle (do inglês Brief Locus of Control Scale, de Lumpkin, 1985), constituída por seis itens respondidos em escala Likert de cinco pontos; Escala de Desejabilidade Social de Marlowe-Crowne (do inglês Marlowe-Crowne Social Desirability Scale, de Strahan e Gerbasi, 1972), composta por dez itens.

Os estressores potenciais incluíram informações sobre o diagnóstico, número de internações, prognósticos e recaídas durante o tratamento. Esses estressores foram avaliados em termos de impacto de eventos recentes, uma lista de 42 itens para avaliar a freqüência de tais eventos e a percepção de pais acerca do impacto (a partir de escala Likert de dez pontos). Além disso, problemas financeiros e empregatícios também foram avaliados.

Medidas de valorização da experiência foram obtidas a partir de uma escala desenvolvida por Thompson et al. (1992), cujo nome específico não foi referido no estudo. Foi também utilizada uma entrevista sobre a percepção sobre o tratamento e o Questionário de Modos de Enfrentamento (do inglês Ways of Coping Questionnaire, de Folkman e Lazarus, 1985), composto por 66 itens respondidos em escala Likert de quatro pontos. Os autores apresentam, em detalhes, os tipos de estratégias reveladas pelo Questionário.

Steele, Dreyer, e Phipps (2004) identificaram padrões de distress entre mães ao longo dos seis meses iniciais de tratamento (com medidas entre duas e cinco semanas após diagnóstico, novamente entre semanas 12 e 14 e finalmente entre semanas 22 a 24), além de examinar tais padrões como preditores de distress infantil somático e emocional. No estudo, 65 mães responderam aos seguintes instrumentos: Escala de Stress Percebido (do inglês The Perceived Stress Scale – PSS, de Cohen, Kamarch, & Mermelstein, 1983), composta por 14 itens para avaliar o quanto os participantes consideram suas vidas imprevisíveis, incontroláveis e sobrecarregadas; Perfil de Estados de Humor (do inglês Profile of Mood States, de McNair, Loor, & Droppleman, 1971), descrito anteriormente.

O nível de distress infantil foi avaliado com o uso da Subescala de Distress Somático e de Humor/Comportamento, formada a partir da Escala de Experiências Comportamentais, Afetivas e Somáticas (respectivamente, do inglês Mood/Behavior and Somatic Distress subscales e Behavioral, Affective, and Somatic Experiences Scale – BASES, de Phipps, Hinds, Channel, & Bell, 1994). A subescala de distress somático, composta por dez itens de sintomas desagradáveis – como febre e mucosites – avaliados em escala Likert de cinco pontos, foi respondido pelas mães e enfermeiras. A subescala de Humor/Comportamento, respondida pelas mães, é composta por 14 itens respondidos em escala Likert de cinco pontos, sobre comportamentos e humor infantis (tais como amigável, triste, otimista etc).

O estudo de Hoekstra-Weebers, Jaspers, Kamps e Klip (2001) teve como objetivo investigar os níveis de suporte e seus efeitos concorrentes e prospectivos no funcionamento psicológico de pais de crianças com câncer. Para tanto, 128 pais responderam a medidas ao diagnóstico, após seis meses de tratamento e depois de 12 meses de tratamento. Os instrumentos utilizados foram: Questionário de Saúde Geral de Goldberg (do inglês Goldberg General Health Questionnaire – GHQ, de Goldberg e Williams, 1988), já descrito anteriormente; Lista de Interações e Discrepâncias no Suporte Social (do inglês The Social Support List Interactions, and Discrepancies, SSL-I and SSL-D, desenvolvido e validado por Van Sonderen, 1993), também já exposto previamente e bastante detalhado no estudo de Hoekstra-Weebers et al. (2001).

 

 

Estudos com metodologia mista

Enskär, Carlsson, Golsäter, Hamrin e Kreuger (1997b) realizaram um estudo com cinco crianças e cinco pais para identificar a experiência das crianças em relação a problemas relativos ao tratamento. Para tanto, uma metodologia mista foi utilizada, com dados de entrevista qualitativa em complemento a dados de medidas quantitativas. A entrevista semi-estruturada focalizou aspectos do tratamento médico e seus efeitos colaterais, isolamento, suporte social, atenção à criança, sentimentos e reações, qualidade do cuidado. Foi também utilizado para os pais um instrumento, criado previamente pelos autores (Enskär et al., 1996), constituído por uma lista de 84 itens, relativos ao tratamento pediátrico e divididos em quatro domínios: físico, psicológico, social e existencial.

 

DISCUSSÃO

A combinação de metodologias (com análises quantitativas e qualitativas) tem proporcionado a obtenção de dados complementares sobre processos psicológicos de pais de crianças em tratamento onco-hematológico. De acordo com Woodgate (2000a), a pesquisa qualitativa possibilita ao pesquisador a oportunidade de aproximar-se da compreensão acerca de perspectivas experienciadas pelos participantes a partir do relato destes, propocionando um entendimento do fenômeno de forma particular, a partir da visão de quem o vivencia. A mesma autora defende que, embora a pesquisa quantitativa seja valiosa ao testar relações e estabelecer contigüidades, a utilização de um único método de coleta de dados pode levar a desvantagens: dependência de medidas padronizadas e geralmente desenvolvidas em comparação a uma população considerada “normal” (fato que leva à discussão sobre definições de um padrão de normalidade); predominância de questões objetivas, que impossibilitam a exploração de respostas e vivências; generalizações impostas a priori, a partir de teorias pré-formuladas; e obtenção de elementos restritos na vivência do participante, induzindo a resultados reducionistas.

Além disso, Woodgate (2000b) argumenta ainda que a pesquisa quantitativa procura responder por que fenômenos acontecem, mas falha em responder como e o que exatamente ocorre. Desta forma, tem-se que a pesquisa qualitativa em psiconcologia pediátrica possibilita a compreensão do processo estudado, não apenas as relações entre variáveis focalizadas. A autora destaca que métodos qualitativos aumentam a obtenção de informações sobre o fenômeno, a partir da perspectiva individual e, portanto, livre de critérios esperados ou de uma “normalidade” pré-concebida. No caso do impacto familiar do tratamento onco-hematológico pediátrico, os pais precisam redefinir o que é “normalidade”, ou seja, precisam adaptar-se a uma nova rotina profissional, escolar, familiar e de cuidados de saúde, envolvendo ansiedade, crenças, expectativas sobre o tratamento; os pais aprendem a lidar com novas dificuldades e a ajustar-se à nova dinâmica (tanto familiar quanto experienciada).

Outro aspecto importante a ser destacado é a relevância de pesquisas longitudinais em Psiconcologia Pediátrica. Holmbeck, Franks-Bruno, & Jandasek (2006) relatam que tais delineamentos permitem o exame de mudanças ao longo do tempo e apresentam muitas vantagens: estudo prospectivo de comportamentos de saúde; investigação da adaptação a contextos aversivos e estratégias de ajustamento; conhecimento sobre continuidade ou descontinuidade do processo de desenvolvimento e do problema comportamental; compreensão de possibilidades preditoras a partir de fatores prévios; estabelecimento de seqüências e trajetórias de desenvolvimento; estudo de como populações em risco negociam e são afetadas em períodos críticos de desenvolvimento; e o estudo da eficácia de intervenções e medidas preventivas em saúde.

Além disso, os mesmos autores destacam que os avanços em cuidados médicos pediátricos têm aumentado muito as taxas de sobrevivência, inclusive em onco-hematologia. Tais modificações têm exigido o estudo de efeitos posteriores da enfermidade, bem como estratégias de adaptação de crianças e familiares a possíveis seqüelas da doença e tratamento. A metodologia longitudinal é a mais adequada para estudar mudanças no curso de desenvolvimento ao longo do tempo, bem como efeitos a longo prazo de eventos significativos no curso de vida; dados longitudinais possibilitam compreender a direção e causalidade de relações entre fatores de risco e adaptação a longo prazo.

De acordo com Best et al. (2001), estudos longitudinais com famílias de crianças em tratamento de câncer têm permitido a identificação de padrões de ajustamento familiar, incluindo a possibilidade de se apontar preditores do desenvolvimento de determinadas estratégias de enfrentamento ao longo do tratamento. Desta forma, delineamentos longitudinais de pesquisa podem proporcionar a implementação de programas mais eficientes de intervenção psicológica para pais e demais familiares, prevenindo efeitos adversos sobre os processos de desenvolvimento e dinâmica familiar.

 

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Endereço para Correspondência

SQS 406 D 206, Brasília - DF - Brasil. Telf.: (61) 8172-9030. E-mail: marinak@unb.br.

 

Recebido em 26 de Junho de 2014

Aceite em 03 de Janeiro de 2017

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