A perspetiva do desenvolvimento positivo vai para além de uma visão negativa e com foco nos défices, comummente associada à infância e adolescência. Esta perspetiva considera as crianças e adolescentes como agentes ativos do seu próprio desenvolvimento saudável e bem-sucedido. Além disso, reconhece que possuem pontos fortes e competências que podem ser desenvolvidos de forma positiva, através dos seus contextos, relações e interações que constituem a vida diária, sobretudo se os seus pontos fortes e competências estiverem alinhados com os recursos necessários para um desenvolvimento saudável nos vários contextos de vida em que vivem e interagem (Lerner et al., 2009; Zarrett & Lerner, 2008).
O conceito de bem-estar subjetivo é definido como sendo uma avaliação individual dos aspetos da vida em geral, traduzindo-se na presença de afeto positivo, na ausência de afeto negativo e numa satisfação com a vida, sendo associado ao prazer imediato (Diener, 1984; Freire & Tavares, 2011). Park (2004) encontrou que o bem-estar subjetivo tem um papel importante no desenvolvimento positivo, sendo considerado, além de um preditor e um indicador chave do desenvolvimento positivo, um fator facilitador que fomenta e mantém a saúde mental.
A hospitalização pode afetar o desenvolvimento positivo e bem-estar das crianças e adolescentes, como consequência da permanência num ambiente desconhecido, à privação das atividades diárias (incluindo o brincar), à perda de controlo e autonomia, à separação de familiares e amigos, à interrupção de rotinas tais como a escola e atividades desportivas e ao desconforto provocado pela doença e pelos procedimentos médicos invasivos (Carney et al., 2003; Crnkovic et al., 2009; Eisen et al., 2008; Figueiredo et al., 2015). Os efeitos da hospitalização dependem de vários fatores, tais como as diferenças individuais de cada criança e adolescente, a idade e temperamento, a natureza e gravidade da doença, a duração da hospitalização, as características e organização do hospital e experiências prévias de hospitalização (Lerwick, 2013; Lizasoain & Polaino, 1995). No entanto, em relação a este último fator, mais recentemente, a literatura sugere que a hospitalização é uma experiência stressante para as crianças, quer tenham tido ou não, experiência prévia de internamento, isto é, a familiaridade com o hospital e/ou rotinas pode não necessariamente eliminar ou diminuir a reação à hospitalização (Carney et al., 2003; Li et al., 2016).
Os doentes pediátricos deparam-se com várias alterações, principalmente comportamentais e atencionais, como são a regressão e a agressividade, as alterações na alimentação e no sono; a falta de atenção e as dificuldades de concentração (Lizasoain & Polaino, 1995; Mula-Fuentes et al., 2017). Além destas alterações comportamentais, experienciam ainda diversos estados emocionais como ansiedade (Mula-Fuentes et al., 2017), stresse, depressão, tristeza e falta de interesse (Lizasoain & Polaino, 1995; Santos et al., 2018); angústia, problemas de adaptação (Hall, 1987); nervosismo, preocupação ou medo do impacto da hospitalização na sua qualidade de vida (González-Gil et al., 2008; González-Gil et al., 2011). Estudos prévios têm vindo a evidenciar uma estreita relação entre os estados emocionais experienciados e a qualidade de vida percebida (González-Gil et al., 2008; González-Gil et al., 2011).
Considerando que a hospitalização pode afetar o desenvolvimento positivo das crianças e adolescentes e que a literatura existente sublinha a importância do bem-estar na qualidade de vida geral (Park, 2004), torna-se premente promover o bem-estar no contexto hospitalar. Estudos anteriores têm revelado que as emoções positivas, forças de caráter e gratidão estão associadas positivamente ao bem-estar (Duckworth et al., 2005; Gillham et al., 2011; Wood et al., 2010).
Pelo sobredito, desenvolveu-se a intervenção psicológica “Bem-Me-Quero” em que são abordadas e trabalhadas as emoções positivas, as forças do caráter e a gratidão. Neste estudo considera-se emoções como sendo um “padrão de reação complexo, envolvendo elementos experienciais, comportamentais e fisiológicos, através dos quais um indivíduo tenta lidar com um evento significativo” (American Psychological Association, n.d.), em que o conceito de felicidade é definido como “uma emoção de alegria, satisfação e bem-estar” (American Psychological Association, n.d.). Abordar as emoções positivas traz benefícios para o bem-estar geral, dado que a promoção de emoções positivas pode ajudar tanto direta como indiretamente, a aliviar o sofrimento e a minimizar as suas causas de base (Duckworth et al., 2005) além de minimizar os efeitos das emoções negativas (Fredrickson, 1998, 2001). A literatura aponta que estados emocionais negativos comprometem o funcionamento fisiológico, verificando-se uma menor atividade imunológica, enquanto estados emocionais positivos estão associados a padrões de resposta mais saudáveis tanto a nível da atividade cardiovascular como do sistema imunológico (Maia, 2002; Salovey et al., 2000). Assim, promover emoções positivas pode contribuir para a recuperação da saúde física dos doentes, por exemplo, através do fortalecimento do sistema imunológico (Salovey et al., 2000).
Identificar os pontos fortes/forças de caráter e utilizá-los pode influenciar positivamente o bem-estar hedónico e eudaimónico (Donaldson et al., 2015). Gillham e colaboradores (2011) comprovaram que as forças de caráter predizem o bem-estar subsequente dos adolescentes. Froh e colaboradores (2008) relataram que a indução de gratidão em pré-adolescentes relaciona-se com a melhoria do bem-estar, gratidão e menor afeto negativo. Os adolescentes com um humor de gratidão apresentam maior bem-estar subjetivo, otimismo, comportamento pró-social e gratidão em resposta à ajuda e suporte social (Froh et al., 2008). Em pré-adolescentes, o humor de gratidão esteve relacionado com benefícios sociais, emocionais e físicos. Perante isto, é provável que a gratidão seja um ingrediente importante para o desenvolvimento positivo dos adolescentes (Froh et al., 2009), dado que aumentar a gratidão pode, por consequência, melhorar o bem-estar (Wood et al., 2010).
O bem-estar das crianças e adolescentes em internamento hospitalar pode também ser comprometido pela privação das atividades lúdicas. O brincar é essencial para o desenvolvimento positivo da criança, pois contribui para o bem-estar cognitivo, físico, social e emocional das crianças e jovens (Healey & Mendelsohn, 2018; Koukourikos et al., 2015). No contexto hospitalar, o brincar pode contribuir para o seu bem-estar físico e emocional, permitindo a redução da intensidade dos sentimentos negativos que tendem a acompanhar o internamento. A capacidade de uma criança brincar no hospital restaura a descontinuidade resultante na sua vida devido ao internamento e através do uso do jogo tem a oportunidade de transformar a hospitalização numa experiência positiva (Koukourikos et al., 2015; Li et al., 2016). Embora as crianças tendam a apresentar sintomatologia ansiosa associada à experiência de hospitalização, também referem aspetos positivos durante a hospitalização, tais como a melhoria na sua saúde e o brincar com as outras crianças internadas (Luís & Freire, 2018; Wilson et al., 2010). Mais importante ainda, o envolvimento em atividades lúdicas durante a permanência no hospital pode resultar na melhoria das suas competências de coping contribuindo para um melhor ajustamento psicossocial tanto à sua doença/saúde como à própria hospitalização. Assim, a intervenção “Bem-Me-Quero” segue uma abordagem em grupo tendo por base a premissa de que as interações com os pares são fundamentais para o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes, pois a interação entre os indivíduos permite a descoberta de pontos em comum, possibilitando a existência de uma rede social de suporte (Rhee et al., 2008), durante o internamento no contexto hospitalar.
Na literatura, mais recentemente, têm surgido mais estudos que investigam os efeitos de intervenções no bem-estar psicológico dos doentes pediátricos. Contudo, considera-se que, atualmente, ainda existem lacunas na investigação de intervenções baseadas nas emoções positivas, forças de caráter e gratidão no contexto hospitalar, especificamente, durante o internamento pediátrico de breve duração. Em geral, as investigações reportam que a hospitalização pode afetar o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes, uma vez que influencia o seu bem-estar (Carney et al., 2003; Crnkovic et al., 2009; Eisen et al., 2008; Figueiredo et al., 2015; Rosa et al., 2021). Tal como supramencionado, as emoções positivas, as forças de caráter e a gratidão estão associados a níveis mais elevados de bem-estar, sendo consideradas, neste estudo, condições fundamentais para a promoção do bem-estar no contexto hospitalar.
Assim, o presente estudo piloto pretende apresentar uma intervenção psicológica breve em grupo construída e intitulada “Bem-Me-Quero” e a sua implementação em contexto hospitalar pediátrico. Destaca-se, portanto, o caráter inovador inerente a esta linha de investigação iniciada neste estudo piloto, e a contribuição que a mesma pode ter na intervenção clínica neste contexto, atuando como um complemento à promoção de saúde em crianças e adolescentes.
Método
Participantes
Participaram 11 crianças e adolescentes, maioritariamente do sexo masculino (63,6%), com idades compreendidas entre os 10 e os 17 anos de idade (M=14,09, DP=2,74), em internamento no serviço de Pediatria em dois hospitais públicos do norte do país (54,5% e 45,5%, respetivamente).
Procedimento
A amostra deste estudo foi recolhida no período entre janeiro e fevereiro de 2019, em dois hospitais públicos. De modo a constituir a amostra e implementar a intervenção foi requerida autorização por parte da Comissão de Ética para a Saúde de ambos os hospitais (referência nº 140/2015 e referência nº 4/2019, respetivamente). Após esta autorização, contactaram-se as Diretoras do Serviço de Pediatria dos hospitais para dar conhecimento da intervenção a implementar. Seguidamente foi solicitada a indicação dos doentes pediátricos que cumpriam os critérios de inclusão no estudo e a respetiva permissão, por parte da responsável do internamento, para abordar as crianças e adolescentes em internamento. Os critérios de inclusão foram os seguintes: estar em internamento há pelo menos vinte e quatro horas no Serviço de Pediatria e ter idade igual ou superior a 10 anos. Estes critérios foram confirmados através do registo de doentes internados e pela Enfermeira responsável. Foram ainda cumpridos os critérios éticos e deontológicos, requerendo a autorização dos pais/cuidadores para a participação da criança/adolescente no estudo, através do consentimento informado para os pais e para a criança/adolescente. Após aceitação dos participantes e respetivos responsáveis, procedeu-se à avaliação pré-intervenção a que se seguiu a intervenção. Após o seu término, procedeu-se à avaliação pós-intervenção. Aos participantes foi garantida a confidencialidade da participação bem como a possibilidade de desistirem a qualquer momento sem quaisquer repercussões. Para uma maior caracterização dos participantes deste estudo, no Quadro 1 pode observar-se as informações clínicas e dados relativos ao internamento.
“Bem-Me-Quero”: Uma intervenção breve
A intervenção breve em grupo “Bem-Me-Quero” visa a promoção de uma experiência positiva de hospitalização. Esta intervenção é na forma de jogo de tabuleiro, em que são abordadas e trabalhadas as emoções positivas, as forças do caráter e a gratidão. Estes três tópicos surgem na literatura como estando associados a níveis mais elevados de bem-estar, contribuindo para o desenvolvimento positivo. Deste modo, ao propiciar uma experiência de hospitalização positiva, promovendo emoções positivas e o uso de recursos como as forças de caráter (Zarrett & Lerner, 2008), pode-se fomentar o bem-estar e facilitar um desenvolvimento positivo, no contexto hospitalar. Uma vez que o internamento breve dura em média cerca de 2 a 3 dias, estabeleceu-se o limite mínimo de 24 horas de permanência no hospital para a participação nesta intervenção breve. Por esta razão também, a intervenção é realizada num só momento. Previamente à implementação da intervenção, a fim de se obter a versão final da intervenção, realizou-se uma reflexão falada dos itens (Almeida & Freire, 2008) para averiguar a compreensão do seu conteúdo, com uma criança e um adolescente de 12 e 17 anos, respetivamente. Foram efetuadas alterações na linguagem, tornando-a acessível para a faixa etária em estudo. A intervenção encontra-se descrita no Quadro 2. Durante o jogo de tabuleiro, os participantes têm várias etapas. A cada etapa corresponde um objetivo específico explicitado no Quadro 3.
Material
Questionário sociodemográfico e dados clínicos. Este questionário, construído pelas autoras do presente artigo, é composto por questões relativas à identificação das crianças e adolescentes (e.g., sexo, idade, ano de escolaridade) e ao processo clínico (e.g., data de admissão, motivo do internamento).
Questão desenvolvida especificamente para o estudo. Item único de resposta aberta acerca da experiência de internamento. (“Descreve a tua experiência de internamento em 3 palavras…”). Os participantes responderam a este item em dois momentos de avaliação, que ocorreram imediatamente antes e pós-intervenção.
Questionário de avaliação da intervenção breve. Este questionário foi construído pelas autoras da intervenção. É composto por um conjunto de questões de resposta aberta para avaliação da intervenção em relação a aspetos como: o que os participantes mais gostaram e menos sobre a intervenção (“Em geral, o que mais gostei foi...” e “Em geral, o que eu menos gostei foi ...”); o que consideram que aprenderam através da intervenção (“Nesta intervenção aprendi ...”). Os participantes responderam imediatamente após o término da intervenção, tendo-se optado por perguntas de resposta aberta de forma a captar todas as possibilidades de resposta.
Análise de dados
Procedeu-se a uma análise qualitativa exploratória, seguindo uma abordagem de análise temática para averiguar (a) como os doentes pediátricos descreviam a experiência de internamento, através das respostas à questão “Descreve a tua experiência de internamento em 3 palavras…”; (b) o que os participantes mais e menos gostaram da intervenção, através das respostas às questões “Em geral, o que mais gostei foi...” e “Em geral, o que eu menos gostei foi...”; e (c) o que aprenderam com a participação na intervenção, através das respostas à questão “Nesta intervenção aprendi...”. Assim, procedeu-se a uma análise de conteúdo das respostas dadas pelos participantes, seguido de um processo de codificação que originou as categorias em estudo. De salientar que no processo de codificação existiu acordo entre os três codificadores independentes relativamente à codificação final das categorias. A análise temática das respostas teve como base as unidades de registo, tal como referidas nas respetivas tabelas (cf. Quadros 4, 5 e 6).
Posteriormente, realizou-se uma análise quantitativa referente às respostas dos participantes, tendo sido quantificadas através da percentagem de frequência de respostas em cada categoria em estudo. Relativamente à experiência de internamento, as respostas foram quantificadas e analisadas em relação à percentagem de frequência de respostas em cada categoria, nos momentos pré e pós-intervenção. No que concerne à apreciação da intervenção breve “Bem-Me-Quero”, as respostas relativas ao que os participantes mais e menos gostaram na intervenção e as aprendizagens realizadas foram quantificadas através da percentagem de frequência de respostas em cada categoria.
Resultados
Descrição Qualitativa
Relativamente às respostas sobre a experiência de internamento, emergiram as seguintes categorias (a) Características Estruturais - aglomera aspetos do espaço físico do internamento e dos procedimentos médicos; (b) Perceção subjetiva da Experiência de Internamento Positiva - engloba a perceção individual de dimensões psicológicas positivas associadas ao internamento e (c) Perceção subjetiva da Experiência de Internamento Negativa - abrange a perceção individual de dimensões psicológicas negativas relativas ao internamento e (d) Outros - refere-se a características psicológicas ambíguas, i.e., que podem ter uma conotação positiva ou negativa (e.g., “diferente”; “saudade”), cf. Quadro 4.
As respostas à questão sobre o que mais gostaram na intervenção codificaram-se nas categorias (a) Desenvolvimento Pessoal - compreende a melhoria de características psicológicas e desenvolvimento de estratégias de coping positivas; (b) Conhecimento Pessoal - inclui aprendizagens relativas ao próprio indivíduo; (c) Atividades Realizadas - engloba as atividades do jogo de tabuleiro; (d) Recordação de Experiências Positivas - abrange recordações individuais positivas (e) Vários - aglomera todos os aspetos da intervenção. Os participantes mencionaram que o que mais gostaram na intervenção foi o brincar e o jogar. As respostas referentes ao que menos gostaram na intervenção foram codificadas nas categorias (a) Características das Atividades - engloba as atividades do jogo de tabuleiro; (b) Nada - refere-se à inexistência de aspetos que não gostaram; (c) Recordação de Experiências Negativas - abrange recordações individuais negativas e (d) Reflexão autorrealizada - inclui reflexões individuais sobre experiências pessoais passadas. A categorização das respostas referentes ao que mais e menos gostaram na intervenção é apresentada no Quadro 5.
Relativamente ao que aprenderam com a intervenção, as respostas codificadas originaram as categorias (a) Mudança Pessoal - aprendizagens que produzem mudanças individuais positivas a nível cognitivo, emocional e comportamental e (b) Conhecimento Pessoal - inclui aprendizagens relativas ao próprio indivíduo, cf. Quadro 6.
Descrição Quantitativa
Relativamente ao momento pré-avaliação as respostas concentraram-se nas categorias de Perceção subjetiva Positiva da Experiência (48,1%) e Perceção subjetiva Negativa da Experiência (25,9%). No momento pós-avaliação, as respostas centraram-se na categoria de Perceção subjetiva Positiva da Experiência (75,0%) (Figura 1).
A frequência de respostas dadas em cada categoria foi ainda analisada de acordo com o número de dias em que os doentes estavam em internamento e tendo em conta se era a primeira vez em internamento. Estes resultados podem ser observados no Quadro 7.
Nota. Frequência de respostas dadas pelos participantes em cada categoria, de acordo com o número de dias que se encontravam em internamento e a existência de internamentos anteriores, nos momentos de avaliação pré e pós-intervenção.
Face ao que os participantes mais gostaram na intervenção breve “Bem-Me-Quero”, referiram, maioritariamente, as atividades realizadas (41,7%) (e.g., “Jogar”) e o desenvolvimento pessoal (25,0%) (e.g., “Termos abordado temas que muitas vezes nos amedrontam com outras pessoas”) (Figura 2).
No que concerne ao que menos gostaram na intervenção foi mencionado sobretudo, as características das atividades (45,4%) (e.g., “Termos de escrever muito, pois eu não gosto de escrever”), e Nada (36,4%) (e.g., “Gostei de tudo”) (Figura 3).
Por fim, em relação ao que aprenderam com a sua participação na intervenção foram referidos aspetos alusivos à mudança pessoal (72,7%) (e.g., “Que nem sempre estamos tão mal quanto parece e podemos sempre superar os nossos defeitos/desafios”) e ao conhecimento pessoal (27,3%) (e.g., “Que as nossas características positivas são forças que existem dentro de nós e que nos ajudam a ultrapassar desafios”).
O livro Bem-Te-Quero
No que respeita às mensagens escritas no pequeno livro Bem-Te-Quero, todos os participantes desejaram escrever uma mensagem positiva direcionada aos futuros doentes pediátricos. De seguida, a título de exemplo, podem ler-se duas das mensagens escritas, uma de cada hospital deste estudo.
“A todos os meninos e meninas que passarem por este hospital desejo as melhoras de saúde e desejo muita força, coragem e amor. Mesmo que às vezes uma coisa pareça difícil ou mesmo impossível eu sei que vocês são capazes de a superar.” (P1, 17 anos) “Sempre que te sentires triste, lembra-te das coisas boas que te aconteceram.” (P2, 10 anos)
Discussão
O presente estudo pretendeu contribuir para a realização de intervenções psicológicas durante o internamento breve, apresentando concretamente a intervenção intitulada “Bem-Me-Quero”. Esta intervenção tem como propósito a promoção de uma experiência de hospitalização positiva em crianças e adolescentes hospitalizados. A intervenção breve “Bem-Me-Quero” é na forma de jogo de tabuleiro, em que são abordadas as emoções positivas, as forças do caráter e a gratidão. De forma geral, a apreciação pelos participantes, relativamente à intervenção breve “Bem-Me-Quero” foi bastante positiva, tendo sido apontado que gostaram do jogo de tabuleiro e das atividades realizadas durante o jogo.
Este estudo permitiu ainda corroborar que a experiência da hospitalização não é considerada invariavelmente como negativa e stressante. Os doentes pediátricos também referem aspetos positivos (Luís & Freire, 2018; Wilson et al., 2010), contudo, verifica-se a presença de uma perceção negativa quer tenha existido ou não experiência prévia de internamento (Carney et al., 2003; Li et al., 2016). Adicionalmente, os dados deste estudo indicam que a perceção negativa face à experiência de internamento tende a ser mais evidente nos primeiros dias de internamento.
Assim, a intervenção “Bem-Me-Quero” parece contribuir para a diminuição da perceção subjetiva negativa dos doentes e para o aumento da perceção subjetiva positiva, independentemente da duração do internamento e se tiveram experiências de internamentos anteriores. Esta intervenção, ao promover o uso de recursos individuais como as forças de caráter e uma oportunidade de as crianças e adolescentes vivenciarem experiências e aprendizagens positivas, pode contribuir para o desenvolvimento positivo das crianças e adolescentes (Zarrett & Lerner, 2008). Em conclusão, a intervenção, como um instrumento lúdico, pode promover uma experiência de internamento mais positiva.
Este estudo piloto apresenta algumas limitações e sugestões a serem consideradas em estudos futuros. Primeiramente, o número reduzido de participantes que condiciona o tipo de análises estatísticas passíveis de serem utilizadas. Adicionalmente, sugere-se a realização de um estudo controlado randomizado com um grupo de controlo e consequente aleatorização dos participantes pelos grupos, bem como a adição de um momento de follow-up, de forma a avaliar a eficácia desta intervenção. Após a experiência da implementação piloto desta intervenção, considera-se ainda fundamental definir um protocolo de implementação do jogo, para que sejam mantidas as mesmas condições de aplicação no âmbito da intervenção psicológica.
Em suma, este estudo piloto revela que a intervenção breve parece responder ao seu objetivo principal de promover uma experiência de hospitalização positiva. Este estudo confirma ainda, a importância deste tipo de intervenção em contexto hospitalar pediátrico.
Contribuição dos autores
Gabriela Santana: Concetualização, Análise formal, Investigação, Metodologia, Redação do rascunho original, Redação - revisão e edição
Teresa Freire: Concetualização, Administração do projeto, Supervisão, Redação - revisão e edição
Gabriela Ferreira: Concetualização, Redação - revisão e edição