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Revista Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

 ISSN 1646-2122

     

 

CASO CLÍNICO

 

Hemangioma intramuscular - uma causa rara de equinismo

 

André RamosI; Francisco Sant' AnnaI; Filipa FreitasI; Nuno LuísI; Robalo CorreiaI; Francisco FloresI

I. Centro Hospitalar de Lisboa Central. Hospital de Dona Estefânia. Lisboa. Portugal.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO

Criança com 5 anos, sexo feminino referenciada à consulta de Ortopedia Infantil por deformidade em equino do tornozelo direito. A ressonância magnética confirmou o diagnóstico de hemangioma intramuscular do gémeo interno. Submetida a excisão radical do músculo atingido, com bons resultados funcionais.Luís

Palavras chave: Hemangioma intramuscular, angioma, equinismo unilateral, excisão radical do gémeo interno.

 

ABSTRACT

5-year-old female, presented for Infantile Orthopaedics Consult with an unilateral equinus ankle. The magnetic resonance confirmed the diagnosis of Intramuscular haemangioma of proximal gastrocnemius. A radical excision of the muscle was performed, with good result.

Key words: Intramuscular hemangioma, angioma, unilateral equinus, radical excision of muscle.

 

INTRODUÇÃO

Os hemangiomas intramusculares são raros, constituindo <1% de todas as lesões vasculares benignas1. O seu diagnóstico é realizado habitualmente na infância, sendo muitas vezes confundidos com lesões malignas devido ao seu rápido crescimento. A evolução deste tumor pode traduzir perda de função do músculo e consequente deformidade, altura em que muitas vezes, principalmente no caso de lesões profundas, é feito o diagnóstico. Relativamente aos tumores superficiais, o diagnóstico é habitualmente mais precoce, precedendo as alterações funcionais.

Sutherland em 1975, e mais recentemente Klemme em 1994, relataram um total de 6 casos de hemangioma intramuscular dos gémeos com deformidade em equino, apresentando bons resultados após tratamento cirúrgico.

Tratando-se de uma patologia rara, com um potencial sequelar funcional importante, considerámos relevante o relato do presente caso clínico.

 

CASO CLÍNICO

C.R., sexo feminino, 5 anos. Recorre à consulta externa de Ortopedia Infantil do Hospital de Dona Estefânia em outubro de 2011 por marcha em equino à direita com 1 ano de evolução, associada a dor gemelar difusa. Sem antecedentes pessoais ou familiares relevantes.

Exame objetivo

Marcha em equino à direita. Teste de Silfverskiold positivo (joelho em extensão: -40º de dorsiflexão; Joelho a 90º de flexão – dorsiflexão plantar neutra). Tumefação generalizada da massa gemelar à direita, com dor difusa à palpação. Sem massas distintas palpáveis. Não eram visíveis alterações cutâneas. Sem alterações ao exame neurológico. O lado contralateral não apresentava alterações ao exame objetivo.

Exames complementares de diagnóstico

Radiograma simples: não revelou alterações, nomeadamente da densidade óssea ou calcificações heterotópicas.

Ressonância Magnética (RM): “Observamos no gémeo interno extensa lesão vascular intramuscular, que no terço superior da perna ocupa praticamente toda a espessura gemelar interna, medindo aproximadamente 69x35x25mm” (Figura 1).

 

 

As características imagiológicas da lesão foram conclusivas, permitindo afirmar o diagnóstico de hemangioma intramuscular.

Tratamento

Submetida a excisão radical do gémeo interno com alongamento do tendão de aquiles e imobilização com tala gessada cruro-podálica (Figura 2).

 

Figura 2

 

Exame histopatológico

Hemangioma intramuscular: “Identifica-se lesão vascular polimórfica, constituída por vasos ectasiados de parede fina, vasos de parede espessa irregular e áreas de tecido mixóide com neovasos.”

Seguimento

Não se registaram complicações no pós-operatório imediato. Manteve a imobilização por um período de 4 semanas, após o qual realizou fisioterapia para recuperação funcional. Foi observada em consulta externa 9 meses após cirurgia, constatando-se marcha plantígrada, sem limitações funcionais ou queixas álgicas.

 

DISCUSSÃO

Os hemangiomas vasculares são os tumores benignos mais frequentes em idade pediátrica, constituindo 7% de todos os tumores benignos. Histologicamente caracterizam-se por uma anormalidade vascular com hiperplasia endotelial e predomínio de mastócitos. Podem estar localizados em tecidos superficiais (cutâneos ou subcutâneos) ou profundos (intramusculares). Os hemangiomas superficiais caracterizam-se por uma massa palpável habitualmente indolor, enquanto os profundos manifestam-se por uma tumefação e dor difusa, exacerbada pela atividade física. A clínica menos exuberante dos hemangiomas intramusculares conduz ao seu diagnóstico tardio, muitas vezes quando já se verifica alteração da função do músculo atingido. O exame complementar de diagnóstico de eleição é a ressonância magnética, sendo habitualmente conclusivo.

A ressecção cirúrgica tumoral é um procedimento eficaz no tratamento dos hemangiomas intramusculares. A taxa de recidiva (≈ 20%) está relacionada principalmente com as margens de segurança tumoral,.

O equinismo unilateral adquirido na infância é uma situação pouco frequente, sendo na maior parte das vezes manifestação de patologia neuromuscular. A invasão tumoral dos gémeos é um causa rara de equinismo, com poucos casos descritos na literatura. Principalmente se considerarmos os hemangiomas intramusculares como entidade etiológica.

Relativamente ao caso em questão, constatou-se ao exame objetivo uma marcha com deformidade em equino unilateral. Sendo o teste de Silfverskiold positivo, concluímos a existência de contractura dos gémeos. A clínica insidiosa (dor difusa e tumefação), assim como a inexistência de outros achados semiológicos, levantou a suspeita de lesão tumoral intramuscular dos gémeos. A realização de RMN confluiu o diagnóstico.

O facto da lesão vascular apresentar uma extensão extracompartimental, envolvendo o tecido adiposo do escavado popliteu, levou-nos a optar pela excisão radical do gémeo interno, de forma a minimizar o risco de recidiva.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Picci P, Sudanese A, Greggi T. Intramuscular Hemangioma in infancy: Diagnostic and Therapeutic Considerations. Journal of Pediatric Orthopaedics. 1989; 9: 72-75        [ Links ]

2. Sutherland AD. Equinus deformity due to haemangioma of calf muscle. J Bone Joint Surg (Br). 1975; 57: 104-105        [ Links ]

3. Klemme WR, Skinner SR. Latent Onset Unilateral Toe-Walking Secondary to Hemangioma of the Gastrocnemius. Journal of Pediatric Orthopaedics. 1994; 14: 773-775        [ Links ]

4. Teo EHJ, Strouse PJ, Hernandez RJ. MR imaging differentiation of soft-tissue hemangiomas from malignant soft-tissues masses. AJR. 2000; 174: 1623-1628        [ Links ]

5. Canavese F, Soo BC, Chia SK. Surgical Outcome in Patients Treated for Hemangioma During Infancy, Childhood, and Adolescence. Journal of Pediatric Orthopaedics. 2008; 28: 381-386        [ Links ]

6. Allen PW, Enzinger FM. Hemangioma of skeletal muscle. Cancer. 1972; 29: 22        [ Links ]

7. Enzinger FM, Sharon WW. Soft tissue tumors. St. Louis: Mosby; 1983.         [ Links ]

 

Conflito de interesse:

Nada a declarar.

 

Endereço para correspondência

André Ramos
Praceta José Gonçalves Jerónimo Aiveca, nº1, 3º Esq
7800-850 Beja
Portugal
a.ramos.leal@gmail.com

 

Data de Submissão: 2013-08-26

Data de Revisão: 2013-11-26

Data de Aceitação: 2013-11-26

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