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Etnográfica

Print version ISSN 0873-6561

Etnográfica vol.28 no.1 Lisboa Apr. 2024  Epub Apr 18, 2024

https://doi.org/10.4000/etnografica/15665 

Artigo original

O mundo existe agora

The world exists now

João Carlos Louçã1  , conceptualização, investigação, redação do rascunho original, redação - revisão e edição
http://orcid.org/0000-0001-9152-7622

1 Centro de Estudos Globais, Universidade Aberta, Portugal, joao.louca@gmail.com


Resumo

Após o fim da Guerra Fria e do bloco soviético, os anos 90 do século passado prometeram a expansão do capitalismo aos mais recônditos cantos do planeta. A globalização era a forma como o liberalismo económico assumia esse propósito garantindo que economias e culturas, estados ou regiões abandonavam particularismos da história para serem protagonistas globais da mudança que se anunciava. Após as crises do modelo neoliberal que inauguraram o século XXI, globalização e desenvolvimento tornaram-se conceitos anacrónicos e incapazes de cumprir projetos de futuro em diferentes escalas. Nessas crises profundas a intolerância e a extrema-direita ganham espaço também ao nível global. A guerra e violência política normalizam-se e constituem-se como ameaças maiores para a vida social. Através da etnografia em dois contextos diferenciados - um urbano no Norte de Portugal e outro nas montanhas dos Pirenéus de Aragão - observamos territórios esquecidos desse processo de globalização e pessoas que optaram por fazer das suas vidas utopias tornadas concretas na reciprocidade e na solidariedade das construções coletivas. É nestes exemplos etnográficos que a antropologia se poderá encontrar na diversidade da experiência social e nos caminhos possíveis que, afinal, não deixaram nunca de ser percorridos no mundo que existe agora.

Palavras-chave: neoliberalismo; globalização; utopias concretas; antropologia

Abstract

After the end of the Cold War and the Soviet bloc, the 1990’s promised the expansion of capitalism to the most remote corners of the planet. Globalization was the way economic liberalism assumed this purpose by ensuring that economies and cultures, states or regions abandoned particularisms of history to be global protagonists of the change that was announced. After the crises of the neoliberal model that inaugurated the 21st century, globalization and development became anachronic concepts and unable to fulfill future projects at different scales. In these deep crises intolerance and the far right also gain space on a global level. War and political violence are normalized and constitute greater threats to social life. Through ethnography in two differentiated contexts - one urban and in the north of Portugal, and the other in the Pyrenees mountains of Aragon - we observe forgotten territories of this process of globalization and people who have chosen to turn their lives into utopias made concrete in the reciprocity and solidarity of collective constructions. It is in these ethnographic examples that anthropology can be found in the diversity of social experience and in the possible paths that, after all, have never ceased to be traversed in the world that exists now.

Keywords: neoliberalism; globalization; concrete utopias; anthropology

“We will work cooperatively toward our regeneration, the birth of communal luxury, future splendours and the Universal Republic.” Manifesto da Federação dos Artistas, Paris, abril de 1871

Talvez que os acontecimentos de janeiro de 2021 no Capitólio, sede do poder legislativo estado-unidense, e em janeiro de 2023 em Brasília se transformem em poderosos sinais de alerta para as democracias ditas “liberais” e os seus agentes institucionais. Em ambos os momentos a encenação orquestrada da fúria popular perante os símbolos máximos dos poderes instituídos parecia desafiar a ordem constitucional, recusando resultados eleitorais e projetando modelos de sociedade que os mais otimistas dirão enterrados pela história. Nos dois casos a visível conivência com significativos setores dos poderes políticos dos respetivos países transformaram estes acontecimentos em sintomas evidentes e reveladores de que algo de maior alcance poderia estar a acontecer. Com efeito, a relação das populações com a ideia de democracia, expressa através do sufrágio universal, dos sistemas políticos de governo baseados na legitimidade que delega através do voto a representação legislativa e importantes níveis de participação política, não é, não foi nunca um dado adquirido com características universais. A própria ideia de democracia, tão propagada quanto amputada de tantos dos seus significados, é absolutamente incompatível com qualquer tentação que a retire dos seus contextos históricos precisos, das ideias e relações sociais de cada tempo e lugares determinados. Quase como caricatura podemos hoje encarar a chamada “democracia ateniense” como verdadeiramente democrática? Como é que uma sociedade escravocrata, onde as mulheres não tinham quaisquer direitos de cidadania e a ausência de propriedade determinava a exclusão da mesma, pode então ser considerada o berço da democracia ou, no mínimo, um relevante antecedente? Nesse necessário exercício de contextualização que fornece espessura às análises retrospetivas sobre os sistemas políticos da antiguidade, a suposta democracia de Atenas fornece um exemplo ímpar de uma participação plural nas coisas públicas, ainda que enormemente limitada, sobretudo se o nosso olhar estiver contaminado (como é muito natural que esteja) com o tempo em que vivemos.

Mas na verdade valerá de muito pouco recorrer à Grécia clássica para pensar as democracias de hoje, de como a própria ideia de sistemas democráticos operam na atualidade e são o pano de fundo de muitos dos conflitos, como aqueles que aconteceram nos janeiros de 2021 e 2023. Como chegámos aqui? Como se tornaram indissociáveis as ideias de capitalismo e democracia e como os momentos revolucionários ficaram associados à perturbação nociva da ordem “natural” e positiva dos sistemas políticos? Josep Fontana (2019) encontra respostas nos antecedentes históricos e atribui à Conferência de Viena de 1814-1815 o marco decisivo em que o capitalismo se impõe perante outras alternativas que então estariam abertas e a disputar o futuro. Elas eram as vias abertas pela Comuna de 1871 e, antes dela, pelos períodos revolucionários na Europa de 1830 e 1848. Mesmo derrotadas, estas experiências revolucionárias não significaram o final definitivo das expectativas que geraram, das hipóteses que tornaram visíveis ou dos conhecimentos que souberam acumular. Elas foram as forças que emergiram em alternativa a esse mundo que se projetou em Viena. Elas fizeram a revolução industrial a partir de baixo, onde artesãos em pequenas oficinas inovavam, inventavam instrumentos para o quotidiano, formas de fazer pioneiras, ao mesmo tempo que consolidavam formas de organização de classe em conselhos camponeses ou em sociedades de ofícios. Fontana situa aqui a enorme expropriação do capitalismo, ajudado pelo Estado, que “se apropriou destes progressos, ao mesmo tempo que falseava a história do que tinha ocorrido, inventando o mito de uma revolução industrial que tinha surgido do impulso combinado da máquina e do empreendedor” (Fontana 2019: 27). Na Europa dos impérios em desagregação, em que as grandes companhias incrementavam a continuidade da exploração colonial, substituindo a escravatura nas colónias por outras formas de trabalho compelido, e a servidão nos territórios metropolitanos pela miséria garantida através do assalariamento de toda a força de trabalho, Fontana argumenta que os mecanismos para o desenvolvimento do comércio mundial, para garantir a disponibilidade da mão-de-obra e a domesticação das classes subalternas, foram em grande medida imposições contrárias ao progresso que se experimentava e se vivia em muitas áreas, quer do ponto de vista tecnológico, quer perante a realidade social onde os indivíduos se emancipavam através do seu trabalho e das formas de organização de classe que ensaiavam.

O historiador catalão argumenta que as crises sistémicas e a desigualdade crescente da atualidade ilustram a “ilegitimidade do movimento neoliberal dominante, atacado por uma esquerda debilitada e, mais eficazmente, por uma extrema-direita que descobriu a importância de contar com o apoio dos prejudicados para disputar o poder” (Fontana 2019: 150-151). Nesse engano, onde democracia parece não poder ter outros alicerces que não os do sistema capitalista, imparável e ao mesmo tempo predador, poderemos procurar, certamente, algumas das enormes contradições dos dias de hoje, como aquelas que aconteceram na praça do Três Poderes de Brasília ou no Capitólio de Washington dois anos antes.

O presente texto, nas secções que se seguem, procura discutir alguns dos elementos da atual crise sistémica do modelo capitalista na sua expressão pós-globalização, para o que mobiliza essencialmente duas obras recentes de investigadores de referência na reflexão teórica perante os desafios do mundo. No fértil cruzamento da antropologia com a política, os diagnósticos do desastre iminente podem encontrar contraponto nas experiências que a etnografia revela, sobretudo aquelas com a capacidade de mostrarem caminhos alternativos à hegemonia do capital nas relações sociais. A experiência humana, considerada em escalas várias, torna-se então matéria para a reflexão indispensável, capaz de devolver ao curso da história perspetivas que resgatem as possibilidades desfocadas na voragem e dimensão trágica dos acontecimentos que marcam a nossa contemporaneidade. Revelar essas possibilidades, trazer para a luz essas experiências é, sem dúvida, responsabilidade da antropologia que se implica no mundo em que vive.

Pensar as alternativas

Um livro que junta três ensaios a propósito dos significados de sistemas económicos, sociais, políticos e culturais reflete o diálogo entre realidades de distintas geografias e também diferentes perceções.1 Perante os confinamentos da pandemia de covid-19 que isolaram grande parte do mundo e nos colocaram perante o medo do desconhecido, dois intelectuais no Brasil e um em Portugal discutiram essencialmente como a extrema-direita ganha espaço e o autoritarismo na política ganha expressão nas sociedades contemporâneas. Boaventura de Sousa Santos, que deu o mote a este diálogo, enquadra historicamente o papel das várias esquerdas anticapitalistas e anticoloniais no século XX que, depois de 1989, com a queda do muro de Berlim e o final da União Soviética nos anos seguintes, passaram a lutar por transformações progressistas dentro do sistema democrático liberal. Processo que não foi simultâneo nem imediato, mas que de uma maneira ou de outra terá acontecido e deixado à direita mais radical o espaço de afirmação antissistémico. Helena Silvestre, escritora afroindígena e feminista da periferia de São Paulo, militante das lutas pela habitação digna e pelo território, nasceu já depois do final da ditadura no seu país, nunca conheceu a repressão por delito de opinião, mas conhece bem “o que significa ser criminalizado, preso e morto por aquilo que se é, pela cor de pele, pelo lugar onde se vive, por ser pobre, por ser transgénero, ou por ser mulher. “Vivi a democracia que não criminaliza formalmente os diferentes modos de pensar, mas que na prática os bloqueia, os impede e elimina na sua manifestação real” (Krenak, Silvestre e Sousa Santos 2021: 48). Lembra ainda que, segundo a Fundação Nacional do Índio, em 2021 existiam 114 registos de povos indígenas isolados na Amazónia que não queriam ser integrados no sistema, “povos que se negam a estabelecer relações com o mundo que os ameaça, povos que decidem estar isolados porque são autossuficientes e reconhecem os riscos a que estão submetidos em caso de integração. Não querem este sistema, não estão dedicados a reformá-lo, não reivindicam ser por ele reconhecidos, apenas querem distância” (idem: 50-51). Para a autora, estes são exemplos vivos e atuais de comunidades antissistema, nos antípodas da afirmação da extrema-direita e quase sempre secundarizadas pelas esquerdas. Decantar as teorias críticas dos espartilhos do pensamento ocidental será considerar todas as alternativas fora do sistema da globalização capitalista que persistem e se afirmam, ainda que a níveis locais. Elas traduzem não só a resistência ao sistema de hierarquização do mundo, mas são portas entreabertas para experiências fora dos contextos hegemónicos e que concretizam a hipótese de comunidades humanas onde o seu desenvolvimento não estará dependente dos benefícios de uns poucos em detrimento da maioria.

Perante a encruzilhada que parecem viver as esquerdas europeias e norte-americanas que, com razão, reagem face à desconfiança nos processos de vacinação onde se afirma a extrema-direita, ou perante as invasões dos espaços de poder legislativo, talvez seja no sul do mundo que podemos ter os melhores exemplos de movimentos sociais que mantêm o norte e não deixaram de querer mudar o sistema. Seja o Movimento dos Sem Terra no Brasil, ou trabalhadores em greve na China, esses são os exemplos de que afinal o sistema que estes poderes representam tem mesmo de ser derrubado. O sistema-mundo, caracterizado por Immanuel Wallerstein na sua tentação de universalidade, só em parte realizada, não garante igual universalidade de desenvolvimento se a este lhe fizermos corresponder bem-estar social e distribuição de recursos. Pelo contrário, assenta na distribuição desigual e na divisão em regiões do mundo em que as periferias transferem valor para os países centrais, aprofundando o fosso das desigualdades e, sem dúvida, ameaçando todos os frágeis equilíbrios entre a ocupação humana do planeta e a reposição dos recursos para que esta permaneça viável.

Na enorme crise de imaginação utópica revelada pelo regime de historicidade que parece querer consolidar-se neste século XXI, a naturalização do capitalismo torna impossível pensar no futuro sem este ser uma sua continuidade, as revoluções do passado tornaram-se sinónimo de violência constituindo-se como advertência contra as tentações utópicas do marxismo. Para o historiador Enzo Traverso, “a melancolia de esquerda”, que dá o nome a um dos seus livros, “não significa o abandono da ideia do socialismo ou da esperança de um futuro melhor; significa repensar socialismo num tempo em que a sua memória está perdida, oculta e esquecida e necessita ser redimida. Essa melancolia não implica lamentar uma utopia perdida, mas antes repensar um projeto revolucionário numa era não-revolucionaria” (Traverso 2019: 55).

Distante de propósitos tão abrangentes, Sousa Santos termina a sua reflexão com algumas das medidas para contrariar os avanços da extrema-direita e propostas que se traduzam em maior igualdade nas relações sociais, em mais equilíbrio nas relações entre regiões do mundo e países. Uma delas é a de julgamento e reposição dos crimes do fascismo e do colonialismo, para assim descolonizar a história e a educação, promover a cidadania plena. Outra trata as condições materiais de vida na dignidade que estas conferem ou retiram, assumindo que não deixam de se constituir na enorme fragilidade das democracias liberais: “Acossada pela ideologia global da extrema-direita, a democracia morrerá facilmente no espaço público se não se traduzir no bem-estar material das famílias e comunidades. Só assim a democracia impedirá que o respeito dê lugar ao ódio e à violência, e a dignidade dê lugar à indignidade e à indiferença” (Krenak, Silvestre e Sousa Santos 2021: 37).

Perante todas as ameaças que o mundo enfrenta hoje, onde as promessas de uma globalização feliz se afundaram com estrondo, os anos 20 do século XXI parecem assemelhar-se perigosamente à mesma década do século passado, aquela que preparou e permitiu, perante a complacência e cumplicidade das democracias de então e de grande parte das “forças do progresso”, o ascenso de Hitler e Mussolini, a permanência de Franco e de Salazar. Entre a tragédia e a farsa, a história não se repete nunca, mas também pode não servir a memória coletiva e ignorar as lições que sempre oferece. Talvez por isso o bom senso nas propostas de reformas tenha já um caráter radical, senão mesmo revolucionário. Conferir dignidade e cidadania plena às pessoas tornou-se um programa de tal maneira afastado da realidade do capitalismo tardio que é bem mais fácil encontrar iniciativas para os negócios de exploração do espaço do que condições de vida e dignidade de quem trabalha nos impérios financeiros que assim se pretendem expandir. A decência básica na consideração de que todos partilhamos um mundo, ainda que este esteja enormemente fragmentado, e que partilhamos inevitavelmente o destino enquanto espécie, pode ser então um programa revolucionário para este tempo. Não temos provavelmente outra alternativa.

Transformação e regressão, movimento e contramovimento

Inspirados pela obra de Karl Polanyi, um conjunto relevante de cientistas sociais juntou-se em 2017 numa edição que pensava a desordem do mundo e ensaiava as respostas possíveis a partir das respetivas áreas de estudo.2

Nesta edição de 2017, sob a responsabilidade de Heinrich Geiselberger, surgida primeiramente na Alemanha, no título mimetizado de Polanyi, transformação dá lugar a regressão, deixando claro que as promessas de desenvolvimento no quadro da globalização neoliberal das últimas décadas tornaram-se incapazes de oferecer projetos de futuro fora do abismo para o qual parecemos caminhar.3

Nesta Grande Regressão, o conjunto de textos está naturalmente marcado pelos temas da atualidade de então e pela reflexão que estes provocavam: as correntes migratórias e o discurso securitário através do qual projetos totalitários ganhavam expressão e peso eleitoral; o Brexit inglês e os seus significados na erosão da União Europeia contaminada pelos nacionalismos e o seu eterno chauvinismo, pesada herança do tempo colonial; a vitória eleitoral de Trump nos EUA - impensável até se ter concretizado; o poder de Modi na Índia, de Orbán na Hungria, de Erdogan na Turquia, Putin na Rússia, a Polónia e as Filipinas, o autoritarismo de estilo populista que parecia ganhar espaço e expressão em todos os cantos do planeta. A crise de 2011-2014, que os mais otimistas chegaram a achar ser uma oportunidade de inversão das políticas que a provocaram, deu lugar ao autoritarismo de líderes providenciais que, em qualquer caso, protagonizaram - protagonizam ainda - a ideia de que o capitalismo do século XXI não só já não precisa como sacode as democracias liberais da sua esfera de afirmação e consolidação. No reverso da medalha da real perda da soberania económica da generalidade dos países, encontra-se o reacender de identidades nacionais, na pueril afirmação da pureza cultural e no resgatar de histórias inventadas através de odisseias e mitos de origem.

Pela mesma altura, andei em trabalho de campo na região do Porto e Pirenéus de Aragão, em investigação para finalidade académica, onde procurava indagar as respostas a partir das redes sociais à situação de crise económica dos anos anteriores.4 Nas experiências desses anos procurei a forma que pode ter a criatividade humana em condições adversas, o significado das estruturas de solidariedade para além do Estado, e a força dos projetos que nascem dos impossíveis e fazem caminho através das utopias concretas. A esperança enquanto projeto político que Ernst Bloch aprofundou foi o guião através do qual procurei indagar o campo que escolhi. Nesse percurso cruzei-me em permanência com quem cultivava a irrelevância para escapar à voragem do turismo que consome a cidade e expulsa os seus habitantes, com gente que me pediu o anonimato dos seus projetos para evitar ser objeto de interesse e proselitismo, com quem habita e circula pelas periferias em grande medida esquecidas da globalização e que nestas encontra refúgio e condição para desenvolver projetos coletivos para uma vida mais livre dos constrangimentos do trabalho assalariado e da condição de exploração que este significa. Apesar de se tratar de contextos bastante diferentes, encontramos a mesma perspetiva nas comunidades indígenas da Amazónia que esperam continuar desconhecidas e assim serem donas dos seus destinos.

Na edição de que falo, o olhar macro de quem nela participou assumia que nas periferias do processo de globalização se encontram pessoas afastadas do mundo conectado, condenadas por uma forma de progresso que em nada as beneficia, descrentes do sistema e sem expetativas de futuro. Elas seriam, pelo menos em parte, responsáveis pelos desastres políticos que se viviam então. O futuro, neste início de milénio, é já um lugar ameaçador na confirmação da barbárie que Rosa Luxemburgo previu há um século. Nesta Grande Regressão, Appadurai designa como “fatiga da democracia o fenómeno que garante o sucesso eleitoral dos líderes que atacam a democracia manipulando a frustração das pessoas (Appadurai 2017: 1-12). Nancy Fraser identifica a vitória eleitoral de Trump como uma forma de “colapso da hegemonia neoliberal” (Fraser 2017: 40). Mais otimista, Donatella della Porta lembra que os contramovimentos, que Polanyi também identificou na reação e resistência à hegemonia do capital, podem ter base em modelos regressivos e plebiscitários, mas também podem significar narrativas progressivas e visões de inclusão participativa (della Porta 2017: 28). Da América do Sul e Central, enormes mobilizações populares conseguiram, nesses anos, abrir espaço a projetos políticos com a solidariedade social no seu centro e afastar governos autoritários e corruptos. Até na América do Norte, consumida pela vitória de Trump, a oposição de Bernie Sanders garantiu que uma parte substancial do eleitorado resistisse à demagogia construída no discurso populista. Na Europa, fechada sobre si mesma, com o Mediterrâneo como enorme sepultura da dignidade humana, a resistência social à destruição dos serviços públicos ditada pela cartilha neoliberal fez caminho e determinou em muitos casos um revés na implementação destas políticas. Mesmo se em 2022 a vitória eleitoral, em Itália, de um partido herdeiro de Mussolini atribuiu, pela primeira vez num país europeu, a primazia governativa à extrema-direita. Uma vez mais o capitalismo, sistema com pretensão não só à universalidade, mas também à eternidade, convive bem com poderes autoritários e visões do mundo que naturalizam lugares de classe e desigualdades de género.

Em 2017, andava eu pelo terreno daquilo que pensava serem os resultados da crise anterior, o mundo balançava e o futuro coletivo da espécie humana permanecia desfocado. Como permanece, talvez mais ainda, após estes anos. Perante a crise energética e a ameaça climática com o seu cortejo de milhões de refugiados, a guerra - todas as guerras e não só aquelas que acontecem no espaço europeu - permanece a resposta na aniquilação das forças produtivas e nos negócios que esta assegura. O irracional apelo às armas garante o sucesso dos líderes mais fragilizados e a generalização dos discursos de ódio ganha a expressão dos consensos fabricados. Perante a pandemia de covid-19, que fechou parte do mundo no medo do contágio, as vacinas ficaram em grande medida reservadas para os países ricos do Norte, da mesma maneira que o privilégio do confinamento protetor excluiu as camadas mais pobres da população, sem outro remédio do que permanecer a trabalhar cruzando as cidades para que estas continuassem a cumprir algumas das suas funções vitais e para que as economias resistissem à intempérie. Pela mesma altura, estava o vírus ainda descontrolado e o contágio permanecia ameaçador, algumas das personagens mais ricas do mundo celebram a sua riqueza em mediatizadas viagens espaciais. O capital não tem outra moral que não a da sua reprodução, sem cuidar do mundo e dos seus habitantes, sem imaginação para saber que sem eles, sem ninguém para ser explorado, naturalmente definharia. A ficção de conquistar mundos intergalácticos como se este estivesse já condenado e sem remédio, Marte como território para os negócios futuros, é talvez o epitáfio mais grotesco destes tempos de ostentação continuada em que prosseguimos.

Na sua obra de referência, A Grande Transformação, que serviu de mote para a reflexão sobre esta regressão, Polanyi reflete sobre as condições da instauração do capitalismo na Europa, lembrando que o trabalho não é mais do que o outro nome da atividade económica que acompanha a vida e que não pode dela ser separado; que a terra não é mais do que o outro nome da natureza; que a moeda é uma criação da banca e da finança dos Estados. Os três elementos, enquanto mercadorias, defende Polanyi, são construções inteiramente fictícias e enquanto tal passíveis de poderem ser alteradas (Polanyi 1983: 122, 123). Trabalho, terra e moeda serão então exemplos maiores de tudo o que a política através da vontade pode transformar. Transformar o que são mercadorias em atividade inerente à vida, bem comum e instrumento de trocas justas pode ser então o programa fundamental para os tempos que correm. Esse programa é já a realidade de muitas comunidades de periferia, fora dos processos de globalização e do rolo compressor da acumulação primitiva, extração de mais-valia, ciclos de crise e recuperação.

Etnografia para revestir a esperança

Regresso à etnografia da cidade do Porto e das montanhas de Aragão na enorme vantagem de registar a capacidade humana para encontrar caminhos perante todos os obstáculos, mesmo aqueles aparentemente intransponíveis. O mundo inevitavelmente comum, de que somos todos responsáveis e que Marina Garcês (2013) nos lembra com desencantada paixão, não será só determinado pelas grandes tendências da política e da economia global. Ele é, será, em primeiro lugar espaço de vida e de concretização de vidas, de encontros e realizações, de sonhos e de esperanças que garantem que a inteligência não é só um atributo individual, mas uma capacidade coletiva de melhorar a vida e as condições em que a vivemos. As gerações futuras, das quais somos responsáveis e perante as quais teremos de justificar o estado do mundo que deixamos, vão saber que o capitalismo tardio tardou demasiado a ser suplantado e que o desenvolvimento que prometia no seu declínio era afinal a guerra, a catástrofe ambiental e o caos da desigualdade em crescimento exponencial.

Na cidade do Porto encontrei redes de pessoas que trocavam bens e serviços com moedas inventadas enquanto promoviam a agricultura local de base ecológica. Conheci casas comunitárias onde o centro da cidade ganhava vida na interceção de pessoas de proveniências diferentes mas com a capacidade de alojarem cantinas sociais, espaços de ensaio para orquestras, ciclo-oficinas na perspetiva de uma mobilidade urbana livre dos combustíveis fósseis. Batuquei em instrumentos de percussão construídos pelas mãos que os aprenderam a tocar nos tempos e lugares de cada tema que a orquestra ensaiava, conheci casas que se abriam a jantares de grupo e dessa maneira eram formas de sustento, andei por hortas urbanas onde se partilhava o trabalho e tudo aquilo que este produzia, cooperativas de artistas que fazem das artes forma de intervenção política, espaços esquecidos da cidade onde o silêncio invoca passados não muito distantes contados por dois arquitetos em tours onde a cidade ganha perspetiva na sua dimensão histórica. No Porto, cruzei-me sempre com as memórias vivas da revolução de 74/75, com as suas enormes realizações no campo da habitação e da participação popular. O 25 de Abril de 1974 foi ainda o momento que serviu de mote para uma ocupação em 2011: a escola da Fontinha foi um processo em que o tempo se dilatou e a intensidade do que ali se viveu alimentou projetos e esperanças para os anos seguintes - o impulso inicial para muito do que eu viria a encontrar no terreno e nas pessoas que entrevistei alguns anos depois.

Nos Pirenéus percorri as ruínas deixadas pelas políticas de desenvolvimento do século XX, que expulsaram uma grande parte das pessoas que viviam nas montanhas e fizeram de terrenos agrícolas desertos de monocultura, que infestaram os rios de albufeiras na produção de eletricidade. Algumas dessas ruínas são agora locais onde se aprende a viver em comunidade e a construir o futuro, resgatando a história e tradições dos povos de montanha sem deixar de pertencer ao mundo contemporâneo, que é nele que o futuro se constrói e ganha espessura. Conheci gente da cidade que ali encontrou uma vida mais saudável, frequentei um festival de cinema etnográfico com enorme projeção internacional, que uma vez por ano traz às montanhas filmes e autores que registam o mundo que existe agora, e nesse registo está toda a força da etnografia e da sétima arte que a torna argumento essencial para esperança e para a certeza de que o tempo que está para vir ainda conta com enormes capacidades na construção coletiva. Com jovens alemães que viviam em árvores para defender uma floresta ameaçada pela mineração, aprendi técnicas de resistência passiva e a capacidade de criar cumplicidades em círculos que se alargam até perder de vista. Conheci um homem de 97 anos, combatente na Brigada Mista do exército republicano, que teve de retirar de Huesca em 1938, e guardou livre o acesso à fronteira para a fuga das populações que assim evitaram que as bombas alemãs e italianas que lhes destruíram as casas causassem a carnificina que pouco tempo depois aconteceria em Guernica. Nesse dia em que nos conhecemos, comemorava-se a República derrotada e essa fuga épica pelas montanhas, assisti com emoção ao encontro deste homem com uma mulher que o acolhia na rede clandestina da resistência que operava naquela fronteira durante a Segunda Guerra Mundial. Perante a barbárie da guerra, a irracionalidade moderna da destruição e morte, a capacidade de resistir e de encontrar cúmplices perante todos os perigos é talvez a lição mais preciosa de todas. No abraço destes dois velhos, fui testemunha da ternura e da coragem de que somos herdeiros, nesses homens e mulheres que foram capazes de fazer bascular a história mais negra da Europa para o terreno da liberdade duramente conquistada.

Das utopias pendentes que o século XX nos deixou, à farsa da globalização capitalista como caminho único para o tempo que vivemos, a grande regressão que em 2017 se desenhava no horizonte foi rapidamente confirmada pelo desastre permanente da guerra, das doenças e da fome, da continuada destruição ambiental, das migrações forçadas e de todos os desalojados pelo clima. Morto e enterrado o pacto social do pós-guerra em que o trabalho pôde ganhar direitos e condições de vida para as pessoas que dele vivem,5 hoje até as condições para a reprodução social estarão no mínimo universalmente ameaçadas. Secas e cheias, frio e calor extremos, subida média da temperatura e incêndios descontrolados, culturas em stress hídrico permanente, rios a secar e oceanos a morrer de contaminação são notícias diárias que alimentam a distopia do tempo presente e parece que nos negam futuro e ameaçam a própria existência.

O Antropoceno é a marca do capital na geologia do planeta e provavelmente sintoma da sua demência. O populismo ameaçador que a edição de Geiselberger procurou escrutinar é provavelmente muito mais consequência do que causa para o estado do mundo. “Mais do que o colapso do capitalismo devemos temer o seu sucesso”, adverte o filósofo César Rendueles no texto que escreveu para esta edição (Rendueles 2017: 154). Diz-nos ainda: “o ideal de autorregulação do mercado é um projeto utópico e autodestrutivo, materialmente incompatível com toda a variedade da vida social humana. O mercado livre nunca existiu e nunca poderá existir” (idem: 145).

No Porto e nos Pirenéus encontrei a paciência impaciente de Daniel Bensaïd (1997) na construção de alternativas de vida que são também elas possibilidades em aberto para todas as encruzilhadas do presente. A história que também permanece em aberto perante as circunstâncias das pessoas que vivem no tempo presente, herdeiras de todas as lutas pela emancipação, as vitoriosas e também as que foram derrotadas. No muro dos Communards de Paris, reside bem mais do que a memória de uma revolução que fracassou, nele está o símbolo da resistência operária e popular de uma cidade, inscrito na pedra dessa parede do Père-Lachaise, o desafio às classes dominantes que, apesar da repressão e do chumbo dos fuzilamentos, permanece vivo.

Perante os enormes desafios do tempo em que vivemos, a antropologia será certamente uma abordagem fundamental para entender a diversidade do mundo e que este não tem nunca caminhos únicos para o desenvolvimento e a vida em sociedade. Procurar essa diversidade é ao mesmo tempo percorrer trilhos que nos conduzem a hipóteses de futuro, a experiências que existem hoje de forma localizada e que podem constituir-se património de toda a humanidade nesse registo sem fim dos resultados comuns e simultaneamente variados da seleção cultural de três milhões de anos que a nossa evolução biológica se viu conformada a seguir (Sahlins 2009). Na co-implicação que esta antropologia sugere não há qualquer contradição entre os mais rigorosos métodos da disciplina e, procurar nos terrenos de pesquisa a dignidade dos subalternos, assim como a poderosa imaginação dos oprimidos que nunca deixam de lutar por uma vida melhor. Em recolha de histórias de vida entre as mulheres do Movimento dos Sem Terra do Ceará, Paula Godinho não hesita no campo que escolhe, para através dele inquirir as formas possíveis de um futuro que já deixa rasto no presente e que pode bem ser antídoto para os discursos de catástrofe e para a necrose social que identifica. “Não é preciso distorcer o visível para obter o imaginado, razão pela qual o manto diáfano das aparências tem de ser erguido, seja ele o tratamento preconceituoso ou a cobertura enviesada da mídia. Nada melhor do que encarar a realidade, e percebê-la em processo, através das vozes das mulheres, como agentes sociais concretas.” (Godinho, Gonçalves e Vicente 2020: 21). A co-implicação que Paula Godinho utiliza nos seus trabalhos é escolha metodológica e enquadramento teórico, confunde-se com a própria disciplina sempre que esta assume sem complexos a igualdade na diversidade e a emancipação plena como propósito e fundamento. Não está sozinha neste caminho que encontra na empatia (com outros, com os terrenos de estudo, com o mundo…), foco metodológico da análise científica, seja a “sociologia das micro-utopias” proposta por Graeber (2011) para conseguir encontrar relações sociais livres da alienação e da reprodução de desigualdades, seja a “antropologia militante” de Nancy Scheper-Hughes (1995), seja a insistência renovada nas questões éticas e morais colocadas pelo trabalho dos e das antropólogas.

“Poder contar mais uma história” é a terapia recomendada por Ailton Krenak para adiar o fim do mundo, ideia que utiliza como provocação retórica. Em palestra proferida no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa em março de 2019, este ativista e protagonista dos direitos dos povos da floresta na Amazónia, pensador incontornável para revelar o campo de possibilidades que alimentam a esperança, lembra-nos que o tempo que vivemos, apesar de ser especialista em criar ausências, “está cheio de pequenas constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta, faz chover” (Krenak 2019: 26). No Porto disseram-me que ocupar os espaços da vida onde o capitalismo não chega é estratégia para o tornar irrelevante. Nos Pirenéus, um vulcanólogo dedicado à permacultura e preservação da fauna selvagem revelou-me que é o sentido da roda que precisa de ser invertido. E, entretanto, são já muitos os paus metidos na engrenagem.

Em todas estas realidades, em todas as pessoas de carne e osso que transportam consigo a força material das ideias, no mundo que existe agora, estará o melhor argumento para que o futuro deixe de ser uma sombra ameaçadora. “Poder contar mais uma história”! Haverá melhor definição para as etnografias que ainda poderemos fazer?

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3Na nota de abertura, Heinrich Geiselberger coloca os objetivos da edição, “This book sets out to pick up the threads of the globalization debate of the 1990’s and to take it forward. In it, scholars and public intellectuals respond to urgent questions: how have we ended up in this situation? Where will we be in five, ten or twenty years’ time? How can we stop the global regression and achieve a turnaround?” (Geiselberger 2017: xiv).

4O trabalho de campo decorreu entre 2014 e 2018, em frequentes estadias intensivas, onde o contacto com o terreno foi concretizado na participação em iniciativas e encontros, nos movimentos de ocupação rural (no caso dos Pirenéus) e experiências comunitárias de vida e partilha de recursos económicos (no Porto).

5Helena Silvestre lembra que “Podemos analisar um longo período de tempo e compreender que os países liberais, sobretudo a partir de 1945, baixaram a tensão entre democracia e capitalismo, realizando concessões inimagináveis às classes trabalhadoras (que se foram convertendo em classes médias). Mas precisamos em pensar em como foram produzidas essas concessões. Porque, se elas significaram os ‘30 anos gloriosos’ em alguma parte do mundo, em outras, como no Brasil, parte do período correspondente foi vivida como os ‘20 anos de ditadura’ (1964-1984)” (Krenak, Silvestre e Sousa Santos 2021: 45).

Recebido: 02 de Maio de 2023; Revisado: 22 de Agosto de 2023; Aceito: 22 de Setembro de 2023

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