INTRODUÇÃO
A cultura de kiwi é responsável pela produção de subprodutos como o refugo de frutos de kiwi resultante do processo de calibração e a lenha da poda. As varas resultantes da poda do kiwi são normalmente trituradas e usadas como cobertura de solo. Contudo, a lenha da poda pode contribuir para propagar pragas e doenças. A compostagem dos materiais provenientes de plantas infetadas pode ser uma forma de evitar a propagação dos microrganismos patogénicos (Koski & Jacobi, 2004). A razão C/N da estilha da poda é muito elevada (C/N >60), por isso, decompõe-se muito lentamente e aumenta o tempo necessário para a compostagem. Assim, é necessária uma fonte de N adicional de modo a obter uma compostagem efetiva (Brito, 2017). O objetivo deste trabalho consistiu no estudo do processo de compostagem de lenha da poda do kiwi triturada com refugo de frutos desta cultura, de modo a obter um compostado com qualidade para aplicação nos pomares de kiwis promovendo a economia circular.
MATERIAIS E MÉTODOS
Os materiais utilizados nas pilhas de compostagem incluíram: (i) estilha da poda de kiwi obtida com o auxílio de uma máquina trituradora de recolha de podas acoplada ao trator e (ii) refugo de kiwi resultante do processo de calibragem (Quadro 1).
Construíram-se três pilhas de compostagem com estilha da poda e refugo de kiwi misturados em peso fresco na proporção de 2:1, 1:1 e 1:2 (estilha:kiwi), designadas por pilhas 1, 2 e 3, respetivamente. Os dois materiais foram misturados com o auxílio de uma escavadeira hidráulica com braço oscilante e cobertas com o material TenCate Toptex ® (GEOSIN) de modo a permitir as trocas gasosas e evitar a infiltração da água da chuva no interior das pilhas. O processo de compostagem teve a duração de 260 dias, sendo realizados durante este período revolvimentos nos dias 14, 50, 92 e 144 para arejar e homogeneizar as pilhas. As temperaturas das pilhas foram registadas hora a hora num Data Logger DL2 (Delta Devices). O teor de matéria seca (MS), pH e condutividade elétrica (CE) foram determinados de acordo com as normas europeias (CEN, 1999). O teor de MO foi determinado por incineração de acordo com a norma EN 13039-2011 e o teor de N total pelo método Kjeldahl. O teor de P foi determinado com um espectrofotómetro de UV após digestão com ácido sulfúrico e o teor de K com um espectrofotómetro de absorção atómica após digestão nitro-perclórica. O N mineral foi extraído de amostras frescas com uma solução de 1 M KCl 1:5 e determinado por absorção molecular.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Evolução da compostagem
Todas as pilhas atingiram temperaturas termófilas após 2 dias de compostagem, alcançando-se a máxima temperatura na pilha 1 (50 °C) e na pilha 2 (55 °C) neste dia (Figura 1). A temperatura mais elevada registou-se na pilha 3 (57 °C) aos 24 dias de compostagem, mantendo-se mais elevada nesta pilha, em comparação com as pilhas 1 e 2, devido à maior quantidade de matéria orgânica facilmente biodegradável e menor razão C/N dos frutos em comparação com a estilha (Wang & Schuchardt, 2010). Os requisitos de controlo sanitário, que exigem temperaturas superiores a 55 °C durante um período superior a 15 dias (CCQC, 2001) não foram totalmente alcançados. O que poderá ser explicada pela elevada razão C/N da mistura de materiais no início da compostagem e, principalmente, pelo elevado teor de lenhina e celulose, de lenta decomposição, existente na estilha (Brito, 2017). A redução da razão C/N de valores entre 49 e 59 para valores compreendidos entre 18 e 21 é indicadora de um elevado grau de estabilidade (Zucconi & Bertoldi, 1987). O teor de N total aumentou de valores iniciais entre 9 e 11 g kg-1 para valores entre 22 e 27 g kg-1 no fim da compostagem, o que representa uma vantagem do ponto de vista agronómico (Figura 2).
Qualidade dos compostados finais
A maturação é um dos principais fatores que determinam a qualidade dos compostados (Brito, 2017). A temperatura próxima da temperatura ambiente no fim deste período de compostagem nas 3 pilhas, assim como os valores de N-NH4 + (entre 3,6 e 13,2 mg kg- 1) inferiores a 400 mg kg-1 (Zucconi & Bertoldi, 1987) e a razão N-NH4 +/N-NO3 - nos compostados das pilhas 2 (0,5) e 3 (0,2) inferiores a 1 (Larney & Hao, 2007) são indicadores de compostados bem maturados. O índice de germinação (entre 115% e 131%) superior a 110% recomendado por Raj & Antil (2011) para compostados maturados é igualmente um indicador da maturação dos compostados (Quadro 2).
Os teores de N, P e K aumentaram na pilha 3 em comparação com as pilhas 1 e 2, devido ao maior teor destes nutrientes nos frutos de kiwi, em comparação com a estilha da poda (quadro 3). O elevado teor de MO (entre 853 e 891 g kg-1), o valor de pH (entre 7,3 e 7,6) inferior ao valor limite para comercialização de compostados (Decreto-Lei 103/2015; DR, 2015), o valor da condutividade elétrica (entre 0,52 e 0,84 dS m-1) inferior ao valor limite de 3 dS m-1 recomendado para aplicação ao solo (Soumaré et al., 2002), associados ao elevado grau de maturação são indicadores da qualidade destes compostados.
RSG (%) | RRG (%) | IG (%) | |
Pilha 1 | 96 a | 137 a | 131 a |
Pilha 2 | 102 a | 120 a | 122 a |
Pilha 3 | 94 a | 123 a | 115 a |
IG = TRG x CRR. Valores na mesma coluna seguidos de letras iguais não são significativamente diferentes.
1C | 2C | 3C | ||
pH | 7,4 | 7,6 | 7,3 | |
CE | (dS m-1) | 0,52 | 0,5 | 0,84 |
MO | (g kg-1) | 891 | 891 | 853 |
N | (g kg-1) | 22,7 | 23,0 | 26,7 |
C/N | 22 | 22 | 18 | |
N-NH4 + | (mg kg-1) | 13,2 | 3,6 | 12,1 |
N-NO3 - | (mg kg-1) | 4,6 | 7,9 | 75,7 |
P | (g kg-1) | 2,2 | 2,5 | 2,8 |
K | (g kg-1) | 14,6 | 15,3 | 19,3 |
Os teores de MO, razão C/N e nutrientes NPK totais são referentes à MS. As restantes características incluindo o N mineral são referentes à MF.
CONCLUSÕES
As caraterísticas químicas, o grau de maturação e a ausência de fitotoxicidade dos compostados produzidos com refugo de frutos e estilha de poda de kiwi são indicadores da sua qualidade. A redução da razão C/N e o aumento do teor de N devido ao aumento da proporção de kiwi em comparação com a estilha da poda podem aumentar a disponibilidade de N para as culturas. Recomenda-se uma proporção de frutos superior à da estilha para elevar a temperatura durante a compostagem e aumentar a capacidade do compostado como fertilizante para as culturas.