Introdução
Ao longo das últimas décadas o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) têm tido um grande impacto na nossa sociedade, mostrando ter uma grande utilidade em várias tarefas do dia-a-dia (Secades-Villa et al., 2014). E, apesar de facilitar as comunicações interpessoais, criar novos contextos sociais, de trabalho e de desenvolvimento económico, veio, por outro lado, reduzir a natureza rica dos encontros interpessoais face-a-face e a envolvência sensorial que cada indivíduo tem com o mundo. Isto é, existe uma perda progressiva dos contactos sociais fora da Internet (Patrão et al., 2016). Em 2017 existiam em todo o mundo mais de 4 mil milhões de utilizadores de internet, e em Portugal cerca de 7 milhões (Internet World Stats, 2018).
Cada vez mais se utiliza e se recorre à utilização da Internet nas escolas e universidades como ferramenta, nomeadamente para a partilha de materiais e comunicação. No entanto, é necessário que se transmitam os valores inerentes ao bom uso da Internet, principalmente em relação aos adolescentes e jovens adultos (Mendes & Silva, 2017). Segundo a literatura, estes são os grupos mais susceptíveis de desenvolver um uso problemático (Orsal, Orsal, Unsal, & Ozalp, 2013; Rumpf et al., 2014), muito também devido ao facto desta promover o estabelecimento rápido de relações interpessoais e um rápido acesso a uma série de conteúdos (Kirmayer, Raikhel, & Rahimi, 2013).
O uso apropriado da internet (em áreas como, por exemplo, notícias online, fóruns online, aconselhamento ou assessoria online) pode ajudar a promover a auto-eficácia, aumento no sentido de promover um sentimento de poder psicológico, formação contínua e melhor qualidade de vida (Fowler, Gentry, & Reisenwitz, 2015; Lissitsa & Chachashvili-Bolotin, 2016). Por outro lado, uma grande parte dos utilizadores da internet negligencia áreas importantes das suas vidas, tendo posteriormente problemas a vários níveis, nomeadamente a nível académico, relações pessoais disfuncionais ou factores de risco a nível físico como privação do sono e falta de exercício físico (Busch & Leeuw, 2014; Casale, Lecchi, & Fioravanti, 2015; Huan, Ang, & Chye, 2014; Koronczai et al., 2013).
Geralmente, é notado mais facilmente o uso excessivo da internet, ou seja, um gasto de tempo exagerado e de forma descontrolada. No entanto, a adição à internet caracteriza-se por um padrão de uso desadaptativo, podendo levar a danos clinicamente significativos (Elhai, Dvorak, Levine, & Hall, 2016). Assim, parece estar criada uma divisão no mundo do digital entre aqueles que sabem usar a Internet e as TIC e aqueles que não o sabem fazer (Zhou, Fong, & Tan, 2014).
Deste modo, o termo “uso problemático da Internet” (UPI) é caracterizado pela perda de controlo, preocupação com a Internet e a continuação desse uso, apesar das suas consequências negativas (Chong, Chye, Huan, & Ang, 2014). Por sua vez, Weinstein, Feder, Rosenberg, e Dannon (2014), definem o uso problemático da Internet como preocupações ou comportamentos excessivos e pouco controlados em relação à Internet que originam danos a nível psicológico e angústia. Sendo que a maior parte das actividades que envolvem a Internet são realizadas de forma isolada e afastam potenciais relações e actividades sociais, as pessoas que despendem muito tempo na Internet podem desenvolver sentimentos de isolamento social, causando um detrimento nas suas disposições afectivas (humor) (Sagioglou & Greitemeyer, 2014). Efectivamente, a literatura aponta para uma associação positiva entre os altos níveis de uso de internet e a depressão (Banjanin, Banjanin, Dimitrijevic, & Pantic, 2015; Muusses, Finkenauer, Kerkhof, & Billedo, 2014; Orsal et al., 2013) e stresse (Muusses, et al., 2014; Tan, Chen, Lu, & Li, 2016).
Em 2017, Mendes e Silva verificaram que o uso problemático da Internet estava positivamente associado a sintomas clínicos de depressão, ansiedade e stresse. Também na Índia, um estudo demonstrou uma correlação positiva entre a adição à Internet nos estudantes e sintomas de depressão, ansiedade e stresse (Yadav, Banwari, Parmar, & Maniar, 2013). Isto parece acontecer devido ao facto de que cada vez mais o sentimento de felicidade por parte de quem utiliza a Internet ser menor. Em 2015, um estudo verificou que o uso de redes sociais diminui o sentido de bem-estar, nomeadamente de felicidade (Brooks, 2015), tal como o UPI, que parece ir diminuído este bem-estar ao longo do tempo, ou seja, quanto mais problemático e excessivo for o uso da internet maiores serão os sintomas de depressão e stresse e menor será o sentimento de felicidade (Muusses et al., 2014).
De facto, maiores níveis de uso de internet parecem estar positivamente correlacionados com maiores níveis de sintomas depressivos e de ansiedade (Della Méa, Biffe, & Ferreira, 2016), sendo a ansiedade social a forma de ansiedade mais prevalente entre os utilizadores problemáticos da Internet (Padrão et al., 2016; Cho, Sung, Shin, Lim, & Shin, 2013). E, apesar de algumas investigações divergirem nos seus resultados, ao não verificarem associações entre o tempo gasto online e sintomas depressivos ou ansiosos, quando se trata do uso desadaptativo da Internet, parece não haver divergência relativamente a esta questão (Moromizado et al., 2017).
Em contrapartida, um estudo de 2014 verificou aspectos interessantes no que respeita ao porquê de querer estar online e a sua relação com o stresse (Park, 2014). Segundo esta investigação, usar a internet ou estar online, por que é divertido e empolgante, está ligado a uma redução no stresse. Porém, usar a internet com o objectivo de aliviar o stresse e esquecer os problemas está associado a níveis mais elevados de stresse. Ou seja, deverá também ser dada uma certa importância ao porquê de usar a internet e não só à quantidade de tempo que os estudantes passam online (Deatherage, Servaty-Seib, & Aksoz, 2014). Isto parece acontecer também nas crianças. Níveis mais elevados de uso de meios electrónicos estão associados a um maior risco de estas virem a ter fracos indicadores de bem-estar (Hinkley et al., 2014). Esta relação entre a depressão e o UPI parece ser uma relação bidireccional (Yang et al., 2014). Por um lado, a depressão é uma das principais patologias associada ao UPI e, no caso dos adolescentes, é provável que leve ao desenvolvimento de outros problemas relacionados com o uso da internet (Spada, 2014). Por outro lado, os jovens que já apresentam sintomatologia depressiva têm um risco aumentado de vir a desenvolver UPI (Cho et al., 2013). E, apesar de a depressão poder ocorrer em qualquer fase da vida, o seu desencadeamento ocorre, geralmente, em jovens adultos (Hengartner et al., 2016), pelo que esta faixa etária constitui um grupo de risco relativamente ao UPI.
Problemas psicossociais (como depressão, ansiedade, stresse e faltade autoestima) parecem também estar associados a vários comportamentos não saudáveis, nomeadamente actividade física insuficiente (Busch & De Leeuw, 2014; Koronczai,, et al., 2013). No entanto, aqui, as investigações parecem divergir. Existe evidência de que passar demasiado tempo online reduz o tempo de actividade física (Peltzer, Pengpid, & Apidechkul, 2014). Porém, em 2016, um estudo demonstra que, contrariamente àquilo que se poderia esperar, passar várias horas semanais em actividade online não foi um factor preditor de os indivíduos se dedicarem ou não à actividade física (Zach & Lissitsa, 2016).
A inactividade física é um dos maiores problemas de saúde pública do século XXI (Trost, Blair, & Khan, 2014), sendo considerado pela OMS como o quarto maior factor de risco no que respeita à mortalidade global (World Health Organization, 2018). Este é um dado preocupante, uma vez que, em Portugal, segundo a OMS, metade da população é fisicamente inactiva (Teixeira, 2017). A inactividade física, juntamente com uma fraca nutrição estão associadas ao UPI (Durkee et al., 2016).
Em 2017, Ferreira, Folgar, Salgado, e Boubeta, verificaram que os adolescentes que praticavam actividade física regularmente dedicavam menos tempo à Internet, não tanto no que se refere à frequência da conexão, mas ao tempo diário despendido nessa conexão. Foi possível verificar que a taxa de uso intensivo (mais de 5 h diárias) era mais do dobro para aqueles que não praticavam actividade física, em relação aos que praticavam desporto regularmente. Também no caso dos estudantes universitários, parece que quanto maior for o nível de actividade física, maiores serão as reduções nos sintomas depressivos, ansiosos e de “distresse” psicológico (Wu, Tao, Zhang, Zhang, & Tao, 2015). Um outro estudo não verificou qualquer associação entre a actividade física na infância e indicadores de saúde psicossocial (Hinkley, Timperio, Salmon, & Hesketh, 2017). No entanto, o mesmo estudo refere que um aumento no uso do computador, por parte das crianças, por muito pouco que seja, está associado a baixas competências interpessoais. Para além disto, verificaram que, um uso “típico” de internet/computador por parte dos mais novos (3-5 anos) está positivamente associado a capacidades de gestão de stresse em idades seguintes (6-8 anos). Por outro lado, outro estudo verificou uma associação negativa entre comportamentos sedentários, nomeadamente o uso da Internet e a actividade física em crianças e adolescentes (Pearson, Braithwaite, Biddle, van Sluijs, & Atkin, 2014). Ainda assim, deve ser dada especial atenção ao uso da Internet por parte das crianças, sendo que, em 2017, 1 em cada 3 utilizadores de internet em todo o mundo era uma criança (UNICEF, 2018).
Assim é legítimo pensar que a prática desportiva pode ter também um papel importante, tendo em conta o impacto positivo que a actividade física tem demonstrado exercer a diversos níveis da saúde (Reigal, Videra, & Gil, 2014). Várias investigações têm mostrado que realizar exercício físico tem efeitos positivos tanto a nível psicológico (Valverde, Guzmán, & Sánchez, 2014; Eime, Young, Harvey, Charity, & Payne, 2013) como social (Eime, et al., 2013), e, por estas razões, constitui-se como um mediador na redução dos eventuais efeitos nefastos do uso problemático da internet.
Deste modo, o principal objectivo do presente estudo é investigar a relação entre o uso da internet e a depressão, ansiedade e stresse, bem como a prática de actividade física (AF). Mais especificamente, comparar o efeito do sexo e da AF sobre as variáveis dependentes (stress, ansiedade e depressão e Dependência da Internet - IAT) e correlacionar as variáveis dependentes.
MÉTODOS
O presente estudo tem um carácter quantitativo e transversal, uma vez que se realiza num único momento do tempo, de carácter comparativo e com um desenho quasi-experimental.
Relativamente às variáveis em estudo, as variáveis sociodemográficas (sexo, meio de residência), a frequência de utilização da Internet (em dias por semana e horas por dia), assim como a prática de actividade física (sim ou não) foram consideradas variáveis independentes. As variáveis dependentes em estudo foram as avaliadas pelos instrumentos utilizados: stresse, ansiedade, depressão e dependência da Internet.
Amostra
A técnica de amostragem aplicada foi a de conveniência, recolhendo-se, assim, uma amostra de 150 estudantes universitários (25 do sexo masculino e 125 do sexo feminino) de uma Universidade do Norte de Portugal. A média de idades da amostra foi de 19.65 anos (DP = 1. 99), numa faixa etária dos 18 aos 30 anos. Um total de 71 pessoas (47.3%) referiu viver num meio rural, enquanto 79 pessoas (52.7%) referiram viver num meio urbano. Relativamente ao estado civil, 148 pessoas (98.7%) referiram ser solteiros e apenas 2 pessoas (1.3%) referiram ser casados. Quanto ao nível socioeconómico familiar, os participantes foram divididos em três grupos: nível socioeconómico alto (n = 2, 1.3%), médio (n = 135, 90.0%) e baixo (n = 13, 8.7%). Também ao nível da escolaridade, os participantes referiram ter o 12ºano (n = 146, 97.3%), licenciatura (n = 3, 2.0%), mestrado ou doutoramento (n = 1, 0.7%). Quando ao curso, os participantes frequentam o curso de Ciências de Comunicação (n = 52, 34.7%), o curso de Enfermagem (n = 27, 18.0%), o curso de gestão (n = 17, 11.3%), o curso Línguas, Literaturas e Culturas (n = 6, 4.0%), o curso de Psicologia (n = 16,10.7%), e o curso de Genética e Biotecnologia (n = 32, 21.3%). Todos os participantes foram informados dos objectivos do estudo e foi fornecido um consentimento informado que foi assinado pelos mesmos.
Instrumentos
Inicialmente, os participantes responderam a um questionário sociodemográfico, que continha questões relativas às características dos participantes nomeadamente: o sexo, idade, meio de residência (rural ou urbano), estado civil, nível socioeconómico familiar (alto, médio e baixo), nível de escolaridade (12º ano, licenciatura, mestrado ou doutoramento), situação profissional e curso. A frequência da utilização da Internet foi avaliada através de duas questões: (“Durante a última semana, quantos dias utilizou a internet?”) e (“Durante a última semana, quantas horas por dia utilizou a internet?”) que foi avaliada entre menos de 1 hora até mais de 5 horas, sendo definido um uso intensivo da Internet quando a utilização desta é superior a 5 horas diárias (Ferreira et al., 2017). Foi ainda utilizada a seguinte questão: (“Para que fins utiliza a internet?”), através de 5 opções de resposta - redes sociais, jogos, fins académicos, pesquisa pessoal e outros. No que se refere à actividade física, esta foi avaliada também através de duas perguntas: (“Na última semana: em quantos dias praticou actividade física durante pelo menos 30 minutos?”, “Numa semana normal, em quantos dias pratica actividade física durante pelo menos 30 minutos?”), sendo que as respostas organizadas numa escala de tipo Likert de 0 a 7.
A versão portuguesa da Escala de Ansiedade, Depressão e Stresse -21 ( DASS-21; Vasconcelos-Raposo, Fernandes, & Teixeira, 2013), foi utilizada a fim de avaliar os níveis de depressão, ansiedade e stresse, sendo que cada um destes três níveis é composto por 7 questões.
Por último, a utilização da Internet foi avaliada através da versão portuguesa do Teste de Dependência de Internet de Young, constituído por 20 itens e que avalia a extensão do envolvimento da pessoa com a Internet. Este teste apresenta boas propriedades psicométricas, estando a sua validade assegurada (r = .82, p < .0001), tal como consistência interna, medida através do α de Cronbach (o indicador de fiabilidade mais comum) (α = .90) (Pontes, Patrão, & Griffiths, 2014). Relativamente à Escala DASS-21, todas as subescalas apresentam valores de α de Cronbach acima de .70, o que indica uma boa consistência interna.
Procedimentos
O primeiro passo para a realização desta investigação consistiu na procura e análise de bibliografia pertinente para o tema em questão nas principais bases de dados (B-on, ScienceDirect, Dialnet, Scielo, entre outras). Após este processo inicial procedeu-se à elaboração do estado de arte, crucial para a construção dos objectivos geral e específicos, bem como para a definição das variáveis independentes e dependentes.
Posteriormente, foi elaborado o questionário sociodemográfico ao qual foram adicionados os restantes instrumentos de recolha de dados. Seguidamente procedeu-se à solicitação da participação informada e voluntária dos participantes, após ter sido dada toda a informação necessária e o consentimento informado, garantindo a confidencialidade e o anonimato.
Após a recolha de dados, estes foram introduzidos numa base de dados do programa SPSS (versão 23.0), onde também foram realizadas todas as análises estatísticas apresentadas na secção dos resultados. A estatística descritiva dos dados foi apresentada como média (M), desvio padrão (DP), e frequência relativa (%). Os coeficientes de assimetria e curtose foram calculados para fins de análise de normalidade univariada, e todos os valores estavam dentro de 2 e 7. Análise multivariada de variância (MANOVA) seguida de análise unidireccional de variância (ANOVA) foi usada para investigar diferenças entre género, meio de residência, frequência de utilização de internet (em dias por semana - 6 ou menos dias - e horas por dia - de 0 a 3, de 3 a 4 e mais de 5 horas diárias) e prática de actividade física (sim ou não) nas dimensões stress, ansiedade, depressão e dependência de Internet. O eta-quadrado parcial (η p ²) foi relatado como uma medida do tamanho do efeito entre os grupos de acordo com a seguinte regra geral: pequena (> .01), média (> .04) e grande (> .14). As associações entre variáveis foram calculadas usando o coeficiente de correlação de Pearson.
RESULTADOS
Estatística descritiva
No quadro 1 estão apresentadas as frequências para a frequência da utilização da Internet, fins para a utilização da internet e prática de AF. Dos 150 participantes, a grande maioria utiliza a Internet 7 dias por semana (n = 138, 92%), e 38.7% (n = 58) despende mais de 5 horas diárias na Internet (uso intensivo).
Quanto à prática de actividade física numa semana normal, 117 pessoas praticam actividade física (AF) (78.0%) e 33 pessoas não praticam actividade física (22.0%).
Quadro de frequências para a frequência da utilização da Internet, fins para a utilização da internet e prática de AF (% e N). | 7 dias por semana | 6 ou menos dias por semana | 0-3 horas por dia | 3-4 horas por dia | Mais de 5 horas por dia | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
92 (n = 138) | 8% (n = 12) | 16% (n = 24) | 45.3% (n = 68) | 38.7% (n = 58) | |||||||
Fins para a utilização da internet | Redes sociais | Jogos | Fins académicos | Pesquisa pessoal | Outros | ||||||
Sim | Não | Sim | Não | Sim | Não | Sim | Não | Sim | Não | ||
94.7 (n = 142) | 5.3 (n = 8) | 24.7% (n = 37) | 75.3% (n = 113) | 87.3% (n = 131) | 12.7% (n = 19) | 69.3% (n = 104) | 30.7% (n = 46) | 18.0% (n = 27) | 82.0% (n = 123) | ||
Prática de atividade física (AF) | 1 dia por semana | 2 dias por semana | 3 dias por semana | 4 ou mais dias por semana | |||||||
Sim | Não | 20% (n = 30) | 16.7% (n = 25) | 22% (n = 33) | 19.3% (n = 29) | ||||||
78.0% (n = 117) | 22% (n = 33) |
O quadro 2 mostra a estatística descritiva (mínimos e máximos, médias e desvios-padrão) e medidas de normalidade univariada (assimetria e curtose) para as variáveis dependentes medidas. O valor médio da dimensão stress é de cerca de 6.21, da dimensão ansiedade cerca de 3.38 e da dimensão depressão cerca de 3.62, numa escala possível de 0 a 21. O valor médio da pontuação total do Teste de Dependência da Internet é de 21.94. Os valores da assimetria e curtose são inferiores a 3 e 7, respectivamente, assegurando, assim, a normalidade dos dados (Curran, West, & Finch, 1996).
Variáveis | Homens M ± Dp | Mulheres M ± Dp | F | P | η p 2 | PO |
Stresse | .811 | 0-20 | 6.21 | 4.63 | .93 | .62 |
Ansiedade | .741 | 0-16 | 3.38 | 3.44 | 1.28 | 1.36 |
Depressão | .851 | 0-21 | 3.62 | 4.19 | 1.83 | 4.00 |
Pontuação total do IAT | .902 | 0-50 | 21.94 | 11.14 | .22 | -.35 |
1 - Vasconcelos-Raposo, Fernandes, Teixeira (2013); 2 - Pontes, Patrão, & Griffiths, 2014
Análise comparativa
Foi realizada uma MANOVA (2 x 2: sexo x meio residencial) para comparar o efeito do sexo sobre as variáveis dependentes (stress, ansiedade, depressão, e pontuação total - IAT). Os resultados (F(4, 143)= 1.956; p = . 104; ηp 2 = .052; Wilks-Lambda = .948; PO = .614.) evidenciam um efeito moderado, tendo-se verificado que no teste de efeitos entre sujeito se constatou que na variável depressão existiu uma diferença significativa (p = .045), mas com um efeito pequeno (ηp 2 = .027). Já nas restantes comparações univariadas constatou-se que na variável sexo apenas na pontuação total se constatou uma diferença (p = .016; ηp 2 = .039) e no meio residencial demonstrou existir diferenças nas variáveis stresse (p = .058; ηp 2 = .024) e depressão (p = .005; ηp 2 = .052). A primeira com um efeito pequeno e a segunda com moderado.
A análise univariada evidenciou existir diferença na pontuação geral do IAT, tal como se observa no quadro 3.
Variáveis | Homens M ± Dp | Mulheres M ± Dp | F | P | η p 2 | PO |
Stress | 5.96±3.78 | 6.26±4.79 | .09 | .765 | .001 | .060 |
Ansiedade | 3.72±2.39 | 3.31±3.61 | .29 | .590 | .002 | .084 |
Depressão | 4.36±4.24 | 3.47±4.18 | .94 | .334 | .006 | .161 |
Pontuação total do IAT | 27.28±11.43 | 20.87±10.81 | 7.18 | .018 | .050 | .759 |
A análise multivariada, a um nível de significância de 5%, por sexo evidenciou existir efeitos moderados (F(4, 145)= 2.39, p = .053, λ de Wilks = .94, PO = .68), sendo que o valor de eta-quadrado sugere um efeito moderado (ηp 2 = .06). Por sua vez, a análise univariada demonstrou que existem efeitos significativos do sexo na pontuação total do IAT (p = .008, ηp 2= .05), testado ao nível de significância de 5%. Assim, verificou-se que, no que se refere à pontuação total do IAT verificou-se que os homens (M = 27.28) apresentam pontuações mais elevadas do que as mulheres (M = 20.87).
Quando comparado o efeito do meio de residência (rural ou urbano) sobre as variáveis dependentes (através de uma MANOVA), não foi encontrado nenhum efeito significativo (p = .186).
Variáveis | Meio Rural M ± Dp | Meio Urbano M ± Dp | F | P | η p 2 | PO |
Stress | 5.25 ± 3.66 | 7.08 ± 5.23 | 5.99 | .016 | .039 | .681 |
Ansiedade | 2.75 ± 3.12 | 3.95 ± 3.63 | 4.70 | .032 | .031 | .577 |
Depressão | 2.90 ± 3.11 | 4.27 ± 4.89 | 4.06 | .046 | .027 | .516 |
Pontuação total do IAT | 21.24 ± 10.64 | 22.57 ± 11.60 | .53 | .467 | .004 | .112 |
Olhando às médias marginais estimadas, relativas à MANOVA sexo x meio residencial, constatámos que as diferenças ocorreram na comparação entre os homens residentes no meio rural (M = 1.70) e os do meio urbano (M = 6.13) em que os últimos apresentam valores mais altos.
Na análise multivariada (Frequência de actividade física vs frequência de utilização da internet) não se verificou qualquer efeito significativo (p ˃ .05). Foram também realizadas análises multivariadas do efeito dos fins para os quais os participantes mais usam a Internet (redes sociais) e uma vez verificada a igualdade das matrizes de covariância (M de Box, p = .016) testado a um nível de significância de 5%. Assim, os resultados evidenciaram não existir um efeito significativo do uso das redes sociais sobre as variáveis dependentes, sendo que, no entanto, os indicadores do tamanho do efeito sugerem um efeito moderado (F(4,145)= 2.01, p = .096, λ de Wilks = .947, ηp 2 = .05, PO = .59), mas tendo por base os valores de P e PO optámos por não rejeitar a hipótese nula.
Correlações
Análises de correlação de Pearson foram realizadas para examinar possíveis associações entre as seguintes variáveis stresse, ansiedade, depressão. Os resultados demonstraram a existência de associações positivas significativas entre o IAT e todas as variáveis da escala DASS-21, ainda que tendo efeitos que variam entre moderado e pequeno: - Stress (r 2 = .034), ansiedade (r 2 = .056) e depressão (r 2 = .064).
DISCUSSÃO
Actualmente o uso da Internet é cada vez mais comum e generalizado, nomeadamente em estudantes universitários, pelo que é de esperar que a dependência da Internet entre estes jovens seja também comum (Orsal et al., 2013). No entanto, no nosso estudo, a pontuação média dos participantes no Teste de Dependência da Internet (IAT) foi de 21.94, o que revela que estes jovens são utilizadores médios da Internet, tendo controlo sobre a sua utilização. Ainda assim, observaram-se ligeiras diferenças entre homens e mulheres em relação ao nível de dependência da internet. Porém, têm sido relatados resultados que divergem. Por um lado, existem estudos que revelam existir este tipo de relação e, por outro, existem investigações em que não se verificaram quaisquer efeitos entre o sexo e o nível de dependência da Internet (Orsal et al., 2013).
Os resultados do nosso estudo indicam que o nível de dependência da Internet está positivamente correlacionado com as variáveis do DASS-21, corroborando os resultados de outros estudos relativamente às variáveis estudadas: stresse e ansiedade (Moromizato et al., 2017; Méa et al., 2016) e depressão (Banjanin et al., 2015; Orsal et al., 2013; Tan et al., 2016). Este tipo de correlação significa que maiores níveis de dependência de Internet correspondem a maiores níveis de sintomas de stresse, ansiedade e depressão. No entanto, esta relação não se verificou entre o uso da internet para aceder às redes sociais e sintomas de depressão. Segundo Banjanin et al, (2015) tem sido difícil provar a conexão entre o uso das redes sociais e sintomas depressivos devido ao seu duplo efeito. Por um lado, o uso da Internet, para melhorar o apoio social (por exemplo, comunicar com familiares que vivem longe), pode ser benéfico para a saúde mental. Por outro lado, o uso excessivo de comunicação através “do ecrã” e comportamentos de adição à Internet, que reduzem o tempo de interacção pessoal cara a cara, pode ser uma das causas dos sintomas de depressão dos utilizadores de Internet.
Enquanto os resultados referentes à relação positiva entre a dependência da Internet e sintomas de stresse, ansiedade e depressão parecem ser consensuais (Mendes & Silva, 2017), já a relação entre o tempo gasto online e estes sintomas parece dar resultados diferentes nos diferentes estudos já publicados. No nosso estudo, a associação entre estes dois factores não foi significativa, o que vai de encontro a outras investigações (Moromizato et al., 2017; Deatherage et al., 2014). Desta forma, o problema parece residir no mau uso da Internet e não na frequência da sua utilização (Moromizato et al., 2017).
A inactividade física é dos maiores problemas de saúde actualmente, podendo ter consequências negativas ao nível psicossocial. No nosso estudo, relativamente à AF, não foi encontrado nenhum efeito entre esta variável e a dependência à Internet. Isto verificou-se de igual forma relativamente aos sintomas de stresse, ansiedade e depressão, contrariamente ao estudo de Park (2014) onde foi encontrada uma relação entre AF e baixos níveis de stresse e AF e dependência à Internet. Os nossos resultados vão também na direcção oposta aos de Wu e colaboradores (2015) que verificaram associações negativas entre a AF e sintomas de depressão e ansiedade. Existem ainda estudos que referem o papel importante de programas de AF na prevenção e redução dos sintomas de stresse, ansiedade e depressão (Nyström et al., 2017). Porém, em 2016, um estudo demonstrou que contrariamente àquilo que se poderia esperar, passar várias horas semanais em actividade online não foi um factor preditor de os indivíduos se dedicarem ou não à actividade física (Zach & Lissitsa, 2016).
Desta forma, pensamos que o papel da educação para um bom e controlado uso da Internet deve ser enfatizado, uma vez que o seu uso disfuncional parece estar a aumentar cada vez mais, podendo trazer consequências a nível psicossocial e emocional negativas. Sugerimos ainda que, apesar de não existir uma elevada convergência quanto aos resultados das investigações acerca do papel da AF sobre as variáveis aqui estudadas, esta seja utilizada de forma a moderar a relação negativa que parece existir entre o uso problemático da Internet e os sintomas de depressão, ansiedade e stresse, nomeadamente através de um estilo de vida mais saudável e do consequente menor tempo que será gasto em frente ao ecrã.
CONCLUSÃO
Em suma, os resultados do presente estudo permitiram perceber que os homens apresentam níveis mais elevados de dependência da Internet em relação às mulheres, ainda que num nível de utilização de internet moderado e controlado. Difícil é explicar a diferenças ao nível da depressão entre os homens residentes em meio urbano e rural. Também foi possível verificar que, ainda que a pontuação do IAT estivesse correlacionada positivamente com os sintomas de stresse, ansiedade e depressão, a frequência do uso de internet não teve qualquer efeito sobre estes sintomas. Assim, parece que o principal problema não reside na quantidade de tempo que os jovens adultos despendem na internet, mas sim, o seu uso desadaptativo. Por fim, a AF não teve efeito nem sobre a dependência da internet nem sobre os sintomas de stresse, ansiedade e depressão.
O nosso estudo apresenta limitações, como o facto de a amostra não ser representativa da população em geral, uma vez que todos os participantes eram jovens universitários. Para além disto, o número de indivíduos por sexo não foi equivalente, visto que, a maioria dos participantes era do sexo feminino sendo apenas 25 indivíduos do sexo masculino. Uma outra limitação que se constatou foi o facto de o número de participantes ser muito discrepante na sua distribuição pelos diferentes níveis do nível socioeconómico familiar.
Futuramente, seria pertinente a realização de estudos com amostras mais representativas e alargadas. Para além disso, e uma vez que a literatura diverge quanto ao papel da AF, seria também importante que se realizassem mais estudos sobre a relação da AF com factores psicossociais, assim como sobre a AF e factores associados ao uso da Internet.