Introdução
A asma é definida como uma doença heterogénea, geralmente caracterizada por inflamação crónica e obstrução das vias aéreas, com hiper-reactividade brônquica, reversível espontaneamente ou com recurso a tratamento (WHO, 2022). A sua concetualização suporta-se num quadro de sintomas respiratórios característicos, como sibilos, dispneia, aperto torácico e tosse, associados a limitação do fluxo expiratório, que variam de intensidade e ao longo do tempo (GINA, 2021).
A Direção Geral da Saúde (DGS, 2019), diz-nos que esta doença surge essencialmente na infância, sendo considerada uma das doenças crónicas mais frequentes em todo o Mundo. Contribui para o aumento da mortalidade, bem como para os gastos associados aos cuidados de saúde. Pode ainda persistir ao longo dos anos, com grande impacto na vida do doente, dos cuidadores e, até mesmo, da comunidade. Wang et al. (2019) chegam mesmo a afirmar que uma gestão ineficaz da doença, tal como as exacerbações decorrentes, podem afetar negativamente a progressão da doença e mesmo as relações familiares.
Em Portugal, a prevalência de asma, de acordo com os dados da DGS (2018a), é de 6.8%, estimando-se que a prevalência média atingirá mais de 11% da população no grupo etário dos 6-7 anos, 11.8% no dos 13-14 anos e 5.2% no dos 20-44 anos.
O diagnóstico da doença é essencialmente clínico e pode ser realizado em qualquer idade. Porém, de acordo com os dados da DGS (2018b) e da Iniciativa Global para a Asma (GINA, 2021), em crianças com idades inferiores a 5-6 anos, fazer um diagnóstico definitivo é um processo difícil e desafiante. É de facto comum (até estas idades) as crianças apresentarem “episódios recorrentes de sibilância e/ou tosse em diversos fenótipos que não persistem além desta idade, devido ao pequeno calibre das vias aéreas” (DGS,2018b).
Atualmente, a inexistência de cura para a asma é uma realidade, porém esta pode ser controlada através de terapêutica dirigida, evicção de alergénios e programas de educação adequados e direcionados tanto à criança como aos pais. O estudo de Ezzell (2017), mostrou que estas medidas no seu conjunto conduziram a uma diminuição da morbi e mortalidade, bem como dos custos associados aos cuidados de saúde.
O protocolo de tratamento a instituir deve ser individualizado e contemplar medidas farmacológicas e não farmacológicas, ajustadas à criança e ao estádio da doença. Os objetivos do tratamento, na senda das recomendações de Elnaggar (2021), visam controlar os sintomas e os níveis de atividade diária, reduzir o risco de agudizações e a obstrução brônquica persistente e ainda minimizar os efeitos adversos da medicação.
A realidade portuguesa, demonstrada pelo Observatório Nacional das Doenças Respiratórias e da DGS, (2019) apresenta ainda bastantes debilidades uma vez que metade dos jovens asmáticos não tem a doença controlada, gastando-se em urgências e atendimentos não programados até 700 euros anuais por cada doente com asma, sendo o custo individual da asma não controlada, o triplo do valor quando comparado com casos controlados. Acrescentam ainda o facto de estes gastos poderem representar até 0.9% da despesa nacional em saúde, verificando-se uma tendência para a elevada ocorrência de internamentos em idade pediátrica (43% em 2016). Além disso, as agudizações da asma contribuem para o absentismo e diminuição do sucesso escolar, bem como para o absentismo dos pais ao trabalho, afetando a qualidade de vida da criança e família, a qualidade do sono, o aumento do stress, a ansiedade e a limitação da atividade física (Vos et al, 2019; Oland, Booster & Bender, 2017).
A Reabilitação Respiratória (RR), é atualmente um recurso cada vez mais frequente no tratamento de pessoas com doença respiratória crónica. Para a Ordem dos Enfermeiros (OE, 2018) a RR constitui-se como um complemento ao tratamento farmacológico relevante e potenciador de melhorias significativas. Define RR como “uma intervenção abrangente, baseada numa avaliação extensiva dos doentes, seguida por tratamentos individualizados que incluem - mas não limitados a - exercício físico, educação e alteração comportamental, desenhados para melhorar a condição física e emocional de pessoas com doença respiratória crónica, e para promover a adesão prolongada a comportamentos de saúde” (OE, 2018, p. 28).
Os benefícios apontados a estes programas (RR) são diversos destacando-se: redução das hospitalizações, dos recursos associados aos cuidados de saúde, dos sintomas de dispneia; desconforto dos membros inferiores; melhoria da força muscular e tolerância ao exercício; melhoria da qualidade de vida, da capacidade funcional, da função emocional; aumento da autoeficácia, conhecimento e autogestão colaborativa (Almeida et al., 2023). Estes benefícios adquirem especial relevo quando são dirigidos à criança.
Estudos levados a cabo por Yeh, et al. (2016), revelam que os programas de RR com autogestão e a implementação de planos individualizados contribuem para melhorar o estado clínico da pessoa asmática; uma intervenção centrada na família promove a capacitação da mesma e a adesão ao regime terapêutico; os programas de capacitação revelam efeitos positivos tanto na criança como na família. A existência de programas de intervenção em escolas e dirigidos a crianças entre os 5 e os 18 anos, que incluam a capacitação para a autogestão da doença, mostraram estar associados a uma redução de 30% de idas ao Serviço de Urgência, a uma diminuição significativa de internamentos e de dias de absentismo escolar (GINA, 2021; Cançado et al., 2019).
Pese embora, o conhecimento existente sobre os benefícios da RR, em Portugal as respostas são ainda insuficientes, devendo-se este facto ao reduzido número de centros de reabilitação e á sua centralização nos grandes centros urbanos, dificultando deste modo a acessibilidade a crianças residentes em outras zonas do País (DGS, 2019). Seria benéfica a existência de Enfermeiros Especialistas em Enfermagem de Reabilitação quer em equipas hospitalares quer em equipas dos cuidados de saúde primários, em toda a área geográfica nacional, por forma a garantir o acesso adequado e personalizado a todos que necessitem (Castilho et al., 2020)
Neste sentido, optou-se pelo desenvolvimento de uma revisão sistemática (RS) que se alicerça num modelo de revisão que tem como objetivos fundamentais: mapear as evidências existentes sobre os efeitos da implementação de programas de Reabilitação Respiratória Pediátrica em crianças com asma entre os 6 e os 12 anos e constituir um exercício preliminar que fundamente e desenvolvimento futuro de programas de RR ajustados.
1. Métodos
Distintos objetivos e questões de revisão, conduzem ao desenvolvimento de diferentes abordagens que são desenhadas para, de forma mais eficaz e rigorosa, sintetizar a evidência, as revisões sistemáticas são uma das tipologias de abordagem (Aromataris & Munn (2020).
Assim, com o propósito de fundamentar as intervenções do EEER ao nível da prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação da criança com asma, com base na produção do conhecimento científico mais recente, surge esta RS. A questão de investigação desta RS é orientada de acordo com o método PICO (cf. tabela 1).
Tabela 1 Método PICO.
Participantes (P) | Criança com asma dos 6 aos 12 anos |
Intervenção (I) | Reabilitação Respiratória |
Comparação (C) | Cuidado habitual |
Resultados (O) | Melhorias na função pulmonar, controlo da asma, qualidade de vida |
Para o efeito foi elaborada a seguinte questão de investigação: “Quais os efeitos da RR na função pulmonar, no controlo da asma e na qualidade de vida da criança com asma entre os 6 e os 12 anos?”
Para ajudar na seleção dos estudos/artigos relevantes para o desenvolvimento da temática, foram definidos critérios de elegibilidade explanados na Tabela 2.
Tabela 2 Critérios de elegibilidade.
Critérios de elegibilidade | Critérios de inclusão |
Participantes | Crianças com asma dos 6 aos 12 anos |
Intervenção | Reabilitação Respiratória, com pelo menos um dos componentes das guidelines internacionais (atividade física, educação para a saúde e/ou mudanças comportamentais) |
Comparador | Comparar a Reabilitação Respiratória com os cuidados habituais |
Outcome | Função pulmonar, Controlo da asma, Qualidade de vida |
Desenho/s dos/s estudo/s | Estudos experimentais e quasi-experimentais Estudos randomizados controlados |
Na estratégia de pesquisa dos estudos, recorreu-se aos seguintes descritores MeSH para a pesquisa da MEDLINE Complete: “child”, “asthma”, “rehabilitation nursing”, “exercise therapy”, “respiratory therapy” e “breathing exercises”. Para as restantes bases de dados e plataformas - CINAHL Complete, MedicLatina, Nursing & Allied Health Collection: Compreensive, Complementary Edition, Science Direct, Scopus, Directory of Open Access Journals, Academic Search Complete, Complementary Index, Science Citation Index, Scielo e Business Source Complete - foi realizada uma adaptação dos descritores para linguagem natural ou para os respetivos léxicos. Assim, definiu-se a frase boleana “child” AND “asthma” AND (“rehabilitation nursing” OR “exercise therapy” OR “respiratory therapy” OR “breathing exercises”).
Na pesquisa foram também aplicados limites relativos ao período e ao idioma da publicação, tendo sido selecionados estudos publicados entre janeiro de 2015 e julho de 2020, em língua portuguesa, inglesa, francesa e espanhola. Após pesquisa em diferentes bases de dados foi obtido um total de 114 artigos.
Para sintetizar o processo de seleção dos estudos, Aromataris & Munn (2020) propõe a elaboração de um fluxograma. Neste estudo optou-se pelo fluxograma PRISMA (Page et al, 2020), correspondente à identificação, análise, seleção e inclusão dos artigos ( Figura 1).
Para a avaliação da qualidade metodológica dos artigos foi utilizada: nas metodologias de estudos quasi-experimentais o JBICritical Appraisal Checklist for Quasi-Experimental Studies. No caso dos estudos randomizados recorreu-se ao JBI Critical Appraisal Checklist for Randomized Controlled Trials.
Dos 114 artigos identificados, 10 foram submetidos ao teste de relevância II e 5 à avaliação crítica da qualidade metodológica, tendo sido incluídos 5 estudos primários (um estudo quasi-experimental e quatro ensaios clínicos randomizados). Os 5 estudos incluídos, foram catalogados e identificados com E1, E2, E3, E4 e E5, por forma a facilitar a sua identificação ao longo do presente trabalho (Tabela 3).
Tabela 3 Identificação e avaliação dos estudos incluídos na pesquisa
Avaliação metodológica | Nível de evidência | ||
E1 | Elnaggar, R.K, Shendy, M.A. & Mahmoud, M.Z. (2019). Prospective Effects of Manual Diaphragmatic Release and Thoracic Lymphatic Pumping in Childhood Asthma. Respiratory Care, 64 (11), 1422-1432. | Alta qualidade | B/2b |
E2 | Gomes, E.L.F.D. et al (2015). Active Video Game Exercise Training Improves the Clinical Control of Asthma in Children: Randomized Controlled Trial. PLoS ONE 10 (8): e0135433. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0135433. | Alta qualidade | B/1b |
E3 | Zhang, Y.-F. & Yang, L.-D. (2019). Exercise training as an adjunctive therapy to montelukast in children with mild asthma: A randomized controlled trial.Medicine, 98(2), e14046. https://doi.org/10.1097/MD.0000000000014046. | Alta qualidade | B/1b |
E4 | Azab, A. S. Azab, A. S. R., Moawd, S. A., & Abdul-Rahman, R. S. (2017). Effect of Buteyko breathing exercises versus yoga training on pulmonary functions and functional capacity in children with bronchial asthma: A randomized controlled trial. International Journal of Therapies & Rehabilitation Research, 6(1), 148-153. | Alta qualidade | B/1b |
E5 | Yeh, H.Y.; Ma, W.F.; Huang, J.L.; Hsueh, K.C. & Chiang, L.C. (2016). Evaluating the effectiveness of a family empowerment program on family function and pulmonary function of children with asthma: a randomized control trial. International Journal of Nursing Studies, 60: 133-144. | Alta qualidade | B/1b |
2. Resultados
Os artigos selecionados tiveram a sua publicação em 2015 (E2), 2016 (E4 e E5) e 2019 (E1 e E3). São estudos do tipo quasi-experimental (E1) e Ensaios Clínicos Randomizados (E2, E3, E4 e E5). Todos os artigos foram redigidos em inglês, cumprem o intervalo definido (janeiro de 2015 a julho de 2020) e apresentam dispersão geográfica (Arábia Saudita, Brasil, China, Egipto e Taiwan).
Globalmente, todos os artigos descreveram os programas de intervenção e avaliaram os efeitos dos programas de RR no controlo da asma, na função pulmonar e na qualidade de vida. Abordaram especialmente a realização de exercícios respiratórios (E1 e E4) e de exercício físico (E2 e E3), porém destacar o empoderamento familiar integrado no (E5). A duração dos programas foi divergindo em semanas, entre 4 (E1), 8 (E2 e E3), 12 (E4) e 16 em (E5).
O E1, de Elnaggar, Shendy & Mahmoud (2019), analisou os efeitos da técnica de libertação diafragmática (DRT) e da técnica da bomba linfática torácica (TLPT), em comparação com o treino respiratório convencional (CRR). Avaliou também a IgE sérica, a função pulmonar, a excursão diafragmática e a diferença alvéolo-arterial de oxigénio, na criança com asma. As 60 crianças (10 aos 18 anos), com o diagnóstico de asma moderada e grave, incluídas no estudo foram divididas em três grupos e submetidas a diferentes intervenções: DRT, TLPT e CRR. A DRT teve como objetivo otimizar a função do diafragma; A TLPT teve como objetivo promover a desobstrução das vias aéreas e melhorar a expansão pulmonar e a ventilação. A CRR teve por objetivo reduzir a hiperventilação e a hiperinsuflação, promovendo a normalização do padrão respiratório e aumentando a força dos músculos respiratórios; este treino compreendeu cinco etapas: expiração diafragmática lenta e profunda, inspiração nasal e expiração com lábios semi-cerrados, inspiração fracionada (inspiração curta, seguida de pausa respiratória para melhorar a ventilação colateral e corrigir a hiperventilação), reeducação diafragmática e técnicas de relaxamento (redução da tensão psíquica e muscular). O programa teve a duração de 4 semanas, com 3 sessões semanais e os resultados revelaram melhorias significativas de todas as variáveis, nos diferetes grupos. No que respeita à função pulmonar, verificou-se diferença significativa da capacidade vital forçada (CVF) e volume expiratorio forçado no primeiro segundo (FEV1), sem alteração relevante do débito expiratório máximo (PEF); com melhores resultados de CVF e FEV1 para o grupo da DRT. Ficou demonstrado que a DRT é potencialmente mais eficaz que a TLPT e que o CRR, no que concerne à função pulmonar, à excursão diafragmática e à diferença alvéolo-capilar de oxigénio. Contudo, todos os grupos apresentaram uma diminuição significativa da IgE sérica no final das sessões de tratamento, embora não exista diferença significativa entre os grupos.
O estudo E2 de Gomes et al (2015), teve como objetivo determinar se o exercício aeróbio envolvendo um sistema de jogo interativo de computador influencia positivamente o controlo da asma, a inflamação das vias aéreas e a capacidade de exercício em crianças com o diagnóstico de asma moderada a grave. Neste estudo estiveram envolvidas 26 crianças (com uma média de idades de 7.5 ± 1.9 e 8.0 ± 2.0, para o grupo de jogo de computador e para o grupo de passadeira, respetivamente). Todas as crianças mantiveram o tratamento com budesonido e β2-agonistas, sem alteração da dosagem, ao longo do programa de intervenção, embora distribuídas em dois grupos (grupo do jogo de computador - VGG e grupo de passadeira - TG). No grupo VGG, foi utilizado o jogo “Reflex Ridge” da Kinect Adventure (XBOX 360 Kinect®) - realizado um período de aquecimento de cinco minutos numa passadeira a 2 Km/h, seguido de 30 minutos de jogo (10 sessões de 3 minutos, com um intervalo de descanso de 30 segundos) e relaxamento durante 5 minutos; a intensidade foi aumentada à medida que a criança concluía um nível com sucesso; num nível superior do jogo a criança realizou saltos, agachamentos e movimentos laterais. No grupo TG as crianças fizeram um aquecimento de 5 minutos numa passadeira, a 2 Km/h, posteriormente 30 minutos de exercício físico (aeróbio), terminando com 5 minutos de relaxamento; quando a criança manteve a mesma intensidade de exercício durante duas sessões, sem aumento dos sintomas, a intensidade foi aumentada em 5% (aumento da velocidade e inclinação da passadeira, de acordo com o Protocolo de Bruce). Nos dois grupos, antes e após cada sessão, foi executada avaliação do PEF (antes e após inalação de 400 µg de salbutamol, em três medições, para avaliar broncoconstrição induzida pelo exercício). O programa de intervenção teve a duração de 8 semanas (2 sessões semanais, de 40 minutos). Os resultados demonstraram que o exercício físico com recurso a um jogo (interativo) de computador é eficiente no controlo da sintomatologia da asma, bem como na aptidão aeróbia e na redução da inflamação das vias aéreas em crianças com asma moderada a grave. Acrescentaram ainda que o exercício aeróbio, combinado com a terapêutica, contribuíram para o melhor controlo da doença e aumento da capacidade aeróbia.
O estudo E3, de Zhang & Yang (2019), teve por objetivo comparar a eficácia do exercício físico como terapia adjuvante ao montelucaste em 72 crianças (4 aos 12 anos) com o diagnóstico de asma ligeira. As crianças foram distribuídas em dois grupos: experimental (montelucaste e exercício aeróbio) e de controlo (montelucaste). O programa implementado teve a duração de 6 semanas (3 sessões semanais, de 40 minutos). A função pulmonar foi avaliada com recurso à espirometria (nomeadamente ao FEV1 e ao índice de Tiffeneau); a qualidade de vida foi avaliada com recurso à escala Pediatric Allergic Disease Quality of Life Questionnaire (PADQLQ), em que pontuações mais elevadas significam piores índices de qualidade de vida). Os autores salientaram que o exercício aeróbio como terapia adjuvante ao montelucaste pode ser benéfico para crianças com asma ligeira; as crianças do grupo experimental apresentaram alívio significativo dos sintomas clínicos e melhoria da qualidade de vida. No que concerne à função pulmonar, não houve diferença significativa, em comparação com o grupo de controlo. Nas 2 semanas de acompanhamento, as crianças de ambos os grupos mantiveram alívio dos sintomas clínicos, melhoria da qualidade de vida e da função pulmonar.
O E4 de Azab, Moawd & Abdul-Rahman (2017), compararam os efeitos do método de respiração Buteyko versus a prática de yoga na função pulmonar e na capacidade funcional da criança com asma brônquica. Aqui estiveram envolvidas 40 crianças (7 aos 12 anos) com o diagnóstico de asma ligeira a moderada, distribuídas por dois grupos: método de respiração de Buteyko (grupo I) e prática de yoga (grupo II). O método de respiração de Buteyko, também designado “pausa de controlo” consiste em inspirar (2 segundos) e expirar (3 segundos) de forma suave e silenciosa pelo nariz; apertar o nariz com os dedos para evitar entrada de ar na expiração e contar quantos segundos consegue suster a respiração (até sentir necessidade de inspirar). No yoga a respiração ocorre apenas pelas narinas (inspiração, pausa respiratória e expiração, cada uma com duração de 6 segundos) - 6 a 9 repetições - e relaxar postriormente. A avaliação da função pulmonar foi realizada através de espirometria (nomeadamente os valores de FEV1, CVF, índice de Tiffeneau e volume residual), tendo-se verificado melhoria significativa dos valores nos dois grupos, à exceção do volume residual. Os autores concluíram que houve melhorias semelhantes, nos dois grupos, ao nível da função pulmonar (FEV1, CVF e Índice de Tiffeneau) e da capacidade funcional, sendo que ambas as intervenções podem ser consideradas eficazes no tratamento da criança com asma.
O estudo de Yeh, Ma, Huang, Hsueh & Chiang (E5-2016), teve por objetivo avaliar a eficácia de um programa de empoderamento da família, na função familiar e na função pulmonar de crianças. Envolveu 65 famílias, com crianças dos 6 aos 12 anos, com o diagnóstico de asma moderada e grave. Existiam dois grupos: experimental (34 famílias submetidas a um programa de empoderamento familiar, que consistiu em quatro diálogos de aconselhamento com a criança e com a família, capacitação do cuidador para o controlo da asma, incluindo a entrega de folhetos educativos; este programa teve por base o Modelo de Cuidados Centrados na Família) e de controlo (31 famílias com cuidados habituais). As crianças e famílias incluídas no grupo experimental foram acompanhadas durante 16 semanas (4 sessões, com 50 minutos de duração). Os autores concluíram que, com a implementação do programa de empoderamento familiar, se verificou redução do stress parental e melhoria da função familiar. As crianças do grupo experimental apresentaram melhoria da função pulmonar (FEV1 e PEF) e do controlo da sintomatologia da asma, em comparação com as crianças do grupo de controlo. Verificou-se ainda uma diminuição significativa da sintomatologia (tosse, pieira e dispneia) nas crianças do grupo experimental, em comparação com as do grupo de controlo.
Em síntese global, pode afirmar-se que a avaliação dos resultados dos cinco estudos é demonstrativa dos benefícios dos programas de reabilitação nos participantes dos estudos.
3. Discussão
Os estudos incluídos nesta revisão tinham na sua totalidade o objetivo de avaliar os efeitos da RR na criança com asma, não obstante, as metodologias seguidas foram divergindo entre si. A análise individualizada dos estudos mostra que os programas de RR descritos divergiram nas técnicas utilizadas e no tempo total de duração (mínima 4 e máxima 16 semanas), contudo a frequência semanal foi bastante semelhante nos estudos selecionados. O tempo decorrido em cada sessão não é explicitada em todos os estudos, mas constatou-se que oscilavam entre 15 (E4) e 40 minutos (E2, E3). Embora não exista consenso entre autores, sobre o nº de sessões a implementar a OE (2018), sugere um padrão que se ajuste a cada caso e se desenvolva em média, entre quatro e seis num período mínimo de quatro semanas, e 3 sessões, quando realizado em contexto comunitário. A DGS (2019) tem também emitido algumas recomendações, propondo a implementação de programas de RR, com uma duração mínima de 8 a 12 semanas, através de 2 sessões semanais (supervisionadas), com uma duração/sessão de cerca de 20 a 60 minutos no módulo de treino de exercício e de 60 a 90 minutos em módulos de carater educacionais.
Todos os programas de RR foram realizados em instituições em contexto de ambulatório, e consequentemente nenhum deles em Cuidados de Saúde Primários. Os motivos provavelmente estarão relacionados com a severidade da doença uma vez que existia asma ligeira em (E3, E4), asma moderada (E1, E5) e asma grave (E2, E5). Foi ainda observado que o fluxograma seguido nos programas se baseou em diretivas emanadas pela DGS relativamente às DPOC e retificada em 2019, mas com as devidas adaptações, emergindo deste facto, a necessidade de elaboração de um fluxograma semelhante, mas especificamente dirigido à criança com asma.
Pese embora a variabilidade já referida, sobre a duração e a intensidade dos programas, descritos nesta RS, há benefícios reais nas crianças que deles beneficiam aos níveis físico, e psicossocial, mas também nas famílias, independentemente do grau e severidade da doença (ligeira, moderada e grave). Estes dados encontram-se alinhados com os de Almeida et al., (2023) e Bettencourt et al, (2020).
As intervenções identificadas, embora não sendo implementadas na totalidade por EEER, poderão sê-lo, uma vez que estão reguladas pela Estratégia Global para o Diagnóstico, Gestão e Prevenção da Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (Agusti et al, 2020), pela OE (2018) e pela DGS (2019). A análise e interpretação dos resultados, remete-nos para os efeitos positivos encontrados ao nível da função pulmonar (4 estudos), do controlo da asma (1 estudo) e da própria qualidade de vida (1 estudo). Quanto à função pulmonar, (parâmetro relevante no diagnóstico e monitorização da asma) foi um outcome comum a quatro dos cinco estudos. Especificamente, verificaram-se melhorias ao nível do PEF (E1 e E5), CVF e FEV1 e, consequentemente, do índice de Tiffeneau (E1, E3, E4 e E5). O controlo da asma (E2), feito através do Asthma Control Questionnaire (ACQ), mostrou estar relacionado com a melhoria da capacidade aeróbia e com a redução da inflamação das vias aéreas, à semelhança dos de Castilho et al. (2020).
A dimensão qualidade de vida, destacada em (E3), foi avaliada através do PADQLQ, revelando melhorias significativas estando em associação com melhorias da função pulmonar e quadro sintomatológico da asma. Os efeitos benéficos relatados veem corroborar os de Elnaggar (2021) e estão em sintonia com os objetivos do tratamento da asma, descritos pela OE (2018) e GINA (2021), descritos anteriormente.
As evidencias constatadas nos diferentes estudos dão especial enfoque à realização de exercícios respiratórios e prática de exercício físico. Trata-se de componentes incluídas nas diretivas da OE (2018), para os Programas de RR, com especificidade para treino de exercício, educação, RFR, intervenção nutricional e suporte psicossocial. São aspetos reforçados pela DGS (2019), e Costa et al. (2018) ao aconselhar a integração de módulos de treino de exercício módulos educacionais e de apoio psicossocial. A Iniciativa Global para a Asma (GINA, 2021), complementa as diretivas anteriores com recurso simultâneo à terapêutica farmacológica e técnicas de relaxamento. Como aspeto inovador destaque-se a inclusão de exercícios mais apelativos e motivadores, como é o exemplo de jogos interativos através de computador (Pizzichini et al., 2020).
Sobre os instrumentos de avaliação da função pulmonar e do controlo dos sintomas usados nos estudos, pudemos observar, que foram maioritariamente a espirometria e ACQ. Contudo, para a avaliação do controlo da asma, foram utilizados Testes de Controlo da Asma Infantil (c-ACT), que engloba duas secções distintas: uma dirigida à criança e outra dirigida aos pais. Estes testes que já se encontram atualmente validados para a população portuguesa por Félix, Lopes, Henriques & Soares (2019).
Podemos referir como limitação do estudo, o número reduzido de estudos identificados e incluídos nesta revisão. De facto, os resultados da pesquisa revelam escassez de estudos neste âmbito, emergindo deste facto, a necessidade do desenvolvimento de outros estudos que integrem programas estruturados atualizados e adaptados no âmbito da RR a criança com asma. Uma outra limitação prende-se com a inclusão apenas de artigos publicados em inglês, espanhol, francês e português. Portanto, artigos divulgados em distintos idiomas poderiam também ser relevantes para a revisão realizada. A própria especificidade da estratégia de pesquisa pode eventualmente ter restringido o número de estudos incluídos.
Como implicações para a prática, sugere-se: a construção de fluxogramas semelhantes aos propostos no controle da DPOC, mas adaptados e especificamente dirigidos às crianças com asma; adoção de metodologias estratégicas criativas e atrativas na implementação de programas; Estimular o desenvolvimento dos programas em cuidados de saúde primários, uma vez que a família emerge como unidade de cuidados, tornando-se imperativo o desenvolvimento de competências que permitam a avaliação e intervenção familiar; promover partilha de experiências e evidências no que respeita aos resultados da implementação dos referidos programas, na medida em que contribuirão certamente, para o controlo da asma e da qualidade de vida da criança e família, reduzindo também o impacto socioeconómico.
Conclusão
Este estudo teve por objetivo mapear as evidências existentes sobre os efeitos da implementação de programas de Reabilitação Respiratória em crianças com asma entre os 6 e os 12 anos. Foram identificados cinco estudos, que diferiram entre si nas amostras, nas técnicas utilizadas, na duração total dos programas e no tempo decorrido em cada sessão. Como era expectável, todos os programas de RR foram realizados em contexto institucional em regime de ambulatório. O fluxograma seguido nos programas baseou-se fundamentalmente nas diretivas emanadas pelas autoridades em saúde relativamente às doenças pulmonares obstrutivas crónicas, com as devidas adaptações.
Não obstante, as divergências referidas na implementação dos programas, foram observados benefícios significativos na qualidade de vida das crianças, sobretudo aos níveis físico e psicossocial, mas também nas famílias, independentemente do grau e severidade da doença. Numa análise mais detalhada, as melhorias foram visíveis na função pulmonar, na capacidade de controle da asma e na redução da inflamação das vias aéreas. Um outro achado de carater relevante, foi a inclusão em alguns programas de sistemas de jogos interativos computadorizados mais atrativos para as crianças e com influência positiva. Destacar ainda o empoderamento familiar integrado no E5, revelando-se eficazes nas melhorias pretendidas.
Contribuições dos autores
Conceptualização, R.M. e C.A.; tratamento de dados, R.M., C.A. e N.C.; análise formal, R.M., C.A. e N.C.; investigação, R.M., C.A. e N.C.; metodologia, R.M., C.A. e N.C.; administração do projeto, R.M. e C.A.; recursos, R.M., C.A. e N.C.; programas, R.M. e C.A.; supervisão, R.M.; validação, R.M., C.A. e N.C.; visualização, R.M., C.A. e N.C.; redação - preparação do rascunho original, R.M., C.A. e N.C.; redação - revisão e edição, R.M.