INTRODUÇÃO
Por vezes algumas patologias oncológicas podem estar associadas a determinadas condições laborais; em relação ao Cancro do Ovário (CO) as publicações são escassas. Foi objetivo desta revisão resumir o que de mais relevante surgiu em relação a este tema, ainda que tenha resultado um documento demasiado sucinto.
METODOLOGIA
Em função da metodologia PICo, foram considerados:
-P (population): Trabalhadoras do sexo feminino.
-I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre caraterísticas das tarefas/locais de trabalho que possam aumentar a incidência de CO
-C (context): saúde e segurança ocupacionais nos setores profissionais onde possa haver risco desta patologia oncológica.
Assim, a pergunta protocolar será: Quais as caraterísticas/condições laborais que poderão influenciar a incidência de CO?
Foi realizada uma pesquisa em maio de 2023 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.
No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados. No quadro 2 estão resumidas as caraterísticas metodológicas dos artigos selecionados.
Motor de busca | Password 1 | Password 2 e seguintes, caso existam | Critérios | Nº de documentos obtidos | Nº da pesquisa | Pesquisa efetuada ou não | Nº do documento na pesquisa | Codificação inicial | Codificação final |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
RCAAP | Cancro do ovário | -título e/ ou assunto |
25 | 1 | sim | ||||
Cancro ovárico | 0 | 2 | não | ||||||
EBSCO (CINALH, Medline, Database of Abstracts and Reviews, Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Nursing & Allied Health Collection e MedicLatina) |
Ovarian cancer | -2011 a 2021 -acesso a resumo -acesso a texto completo |
36.667 | 3 | não | ||||
+ occupational | 67 | 4 | sim | 2 4 5 6 11 21 29 43 56 |
Z1 Z2 Z3 Z4 Z5 Z6 Z7 Z8 Z9 |
6 1 4 8 2 3 - 7 5 |
Artigo | Caraterização metodológica | País | Resumo |
---|---|---|---|
1 | Estudo Original | Canadá | Este projeto de investigação pretendeu analisar que tipo de exposição laboral potenciaria a probabilidade de ter CO. Os autores concluíram que este era mais elevado entre professores, mesmo após ajuste de eventuais variáveis enviesadoras. |
2 | Alemanha | O artigo retrata a descrição associada à pesquisa dos asbestos como agente etiológico para o CO, numa amostra de 1000 mulheres expostas a este produto. | |
3 | Esta publicação resume a investigação associada às referências científicas relativas ao CO, cronologica e geograficamente. Os autores concluíram que o número de artigos publicados sobre o tema aumentou progressivamente. | ||
4 | França | Neste projeto pretendeu-se analisar a eventual relação entre os asbestos e o subtipo histológico de CO, numa amostra de 254 trabalhadoras, com média de 60 anos de idade. Não se encontraram associações específicas. | |
5 | EUA, Suécia | Os autores objetivaram analisar a eventual relação entre as caraterísticas do trabalho na incidência e mortalidade do CO, com destaque para a ansiedade e depressão secundárias ao trabalho. Não se encontraram associações claras. | |
6 | Brasil | Foi objetivo deste trabalho comparar a mortalidade das diversas associações aos asbestos, inclusive o CO. Os autores recomendam estudos mais aprofundados. | |
7 | Itália | Trata-se de uma análise da mortalidade de indivíduos expostos aos asbestos, numa amostra de quase 52.000 trabalhadores. Quantificou-se um risco acrescido para o CO. | |
8 | Canadá | O estudo planeou analisar o risco oncológico da cronodisrrupção numa amostra superior a um milhão de indivíduos, maioritariamente do sexo feminino. Não se encontrou relação clara para os diversos cancros destacados. |
CONTEÚDO
Estatísticas
O CO é o 6º (1) , 7º (2) (3) ou 8º (4) mais comum no sexo feminino mundialmente e o quinto mais frequente na Europa (2), ou seja, é responsável por cerca de 4% da patologia oncológica feminina (1). De todos os cancros ginecológicos é o que apresenta maior mortalidade (1) (2) (3) (4) (5). Por exemplo, nos EUA e Canadá a incidência em 2012 foi de 22.240 e 2.600, com 15.550 e 1.750 mortos, respetivamente (1). Em 2015 estimou-se globalmente cerca de 152.000 mortes e uma incidência de 239.000 (2). Outros autores publicaram que o CO é o 5º mais mortal nos EUA. Aqui causa cerca de 7,5 mortes por cada 100.000 habitantes do sexo feminino; na Suécia esse valor é de 8,2 (5), por exemplo.
85% tem origem epitelial (1). Outros investigadores divulgaram apenas que a maioria dos casos se origina através destas células. Cada subtipo histológico apresenta caraterísticas distintas (3).
Etiologia não ocupacional
A etiologia não é conhecida com muita clareza (1) (4); ainda assim, cerca de 10% dos casos poderão estar associados ao estilo de vida (4).
A incidência aumenta com:
-não uso de anticoncecionais orais (ACOs) (1)
-antecedentes familiar de CO (1) (4) (5) e da mama (5) (os genes BRCA1 e 2- associados ao cancro de mama- estão presentes em 10 a 15% do CO (2) (3))
-infertilidade (1)
-sedentarismo (1)
-endometriose (2) (4) (aumenta o risco de CO em cerca de três vezes) (3)
-doença inflamatória pélvica (2) e
Por sua vez, a multiparidade, amamentação (sobretudo se prolongada) (2) (4) e desporto (2) darão alguma proteção (4), bem como o consumo de anticoncecionais orais (2) (4) (5), tal como a laqueação tubar (5).
Etiologia Laboral
Ainda que alguns defendam que não se provaram existir associações entre algumas caraterísticas laborais e o CO (5); outros destacam os fatores a seguir realçados.
Por exemplo, está publicado que os asbestos estão associados ao CO (1) (2) (4) (6) (7) ; inclusive pela IARC. Aliás, alguns até consideram que poderá ocorrer exposição doméstica em situações de cônjuges expostos a concentrações elevadas (através do contato com roupas e cabelos). Não se fizeram associações específicas para o subtipo histológico (4). Dentro dos fatores ocupacionais, há quem considere que os asbestos são os mais importantes (2).
Artigos isolados também mencionaram, neste contexto, o pó de talco (2), tricloroetileno, sílica e a radiação ionizante (1).
O trabalho por turnos é cronodisrruptor e poderá potenciar o risco oncológico. Contudo, algumas coortes não chegaram a essa conclusão. A IARC reconheceu em 2007 que o trabalho por turnos era cronodisrruptor e que, por isso, seria provavelmente carcinogénico para humanos. Contudo, as relações são complexas (8).
Para além disso, alguns investigadores sugerem que a ansiedade possa ser carcinogénica em contexto laboral; no entanto, outros investigadores não concordam (5).
DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO
Ainda que alguns defendam que não se provaram existir associações entre algumas caraterísticas laborais e o CO; outros destacam os asbestos, pó de talco, tricloetileno, sílica e a radiação ionizante, bem como o trabalho por turnos. Contudo, as relações são complexas.
Seria desejável que o tema fosse mais investigado e os dados divulgados, de forma ao conhecimento científico progredir e os locais de trabalho passarem a ser um pouco mais seguros.