INTRODUÇÃO
O microrganismo da gripe/Influenza é um vírus de ácido ribonucleico (ARN), que pertence à família Ortomixovírus e inclui três tipos: o tipo A (que pode infetar várias espécies) e os tipos B e C (infetam quase exclusivamente humanos) (1).
O vírus é envolvido por um invólucro com duas camadas, uma interna de natureza proteica, e outra externa de natureza lipídica originada a partir da célula hospedeira (1). Existem três tipos de moléculas fixadas que desempenham funções importantes para o funcionamento do vírus. A primeira é a proteína M2, que funciona como canal iónico, regulando o pH no interior do vírus; a segunda é uma glicoproteína de nome hemaglutinina (HA), responsável pela sua virulência, permitindo a adesão do vírus à célula hospedeira; a terceira é a glicoproteína neuraminidase (NA), que permite a libertação do vírus para o exterior da célula hospedeira (1).
Durante a replicação a enzima responsável pela transcrição do ARN do vírus comete sistematicamente erros de replicação e estas mutações não são corrigidas uma vez que o vírus não tem mecanismo próprio de correção (1). Isto origina uma constante mudança na sequência do vírus, ou seja, surgimento de novas estirpes- variações genéticas (1). Em humanos, a estirpe mais prevalente é causada pelo vírus A (1).
Os profissionais de saúde são um grupo particularmente suscetível, uma vez que, no seu contexto de trabalho, são quer fonte de transmissão da infeção a doentes/familiares/colegas, quer recetores (1) (3). Esta transmissão é independente da existência de clínica evidente, bastando para tal ser portador (1) (3). De facto, uma grande percentagem (cerca de 25%) dos profissionais de saúde não apresenta qualquer sintoma da doença, apesar de ter serologia positiva (1) (3).
A pedra basilar na prevenção da gripe consiste na vacinação da população. A eficácia da vacina em diminuir a morbilidade e mortalidade desta doença, independentemente da faixa etária e patologias prévias, está repetidamente documentada em vários estudos, sendo extremamente custo-efetiva (1). Todos os anos, existem campanhas que ambicionam motivar os profissionais de saúde para a vacinação contra a gripe sazonal (3) (4). No entanto, uma grande parte não adere, muito pela persistência de tabus e mitos, mesmo sendo a vacina gratuita (1) (3) (4) (5) (6) (7).
Em estudos anteriores, as principais características associadas a maior prevalência de vacinação contra a gripe sazonal em profissionais de saúde, assim como algumas das motivações para a vacinação foram a idade mais avançada, contacto com crianças, doenças crónicas, vacinação contra a gripe sazonal em anos prévios, doença no passado, eficácia da vacina no passado, gratuitidade da vacina, técnica para evitar o absentismo, proteção individual/doentes/colegas de trabalho/familiares e por recomendações nacionais e internacionais. As principais motivações e características dos profissionais de saúde que os levaram a para rejeitar a vacinação foram o receio de contrair doença devido à vacina, medo de seringas/injeções, receio de efeitos adversos, baixa perceção de risco de contrair a doença, confiança no sistema imunitário para combater a infeção, baixa confiança na eficácia da vacina e nunca ter tido doença ou se ter vacinado no passado (3) (4) (6) (7) (8). Mesmo no contexto particular da gripe pandémica H1N1, as características dos profissionais de saúde e motivações para a vacinação foram semelhantes às encontradas em estudos anteriores (9). Além disso, a consulta de literatura científica, a confiança nos órgãos de saúde pública e o encorajamento por parte de familiares ou médicos potenciaram a toma da vacina (9). Em estudos onde a vacinação contra a gripe sazonal em profissionais de saúde é obrigatória, as taxas de vacinação disparam, atingindo em alguns os 94% (10).
O surgimento do vírus SARS-CoV-2 causou a pandemia COVID-19 (11). Embora na maioria dos casos cause uma doença ligeira, por vezes origina uma infeção grave e que põe em risco a vida, não existido fármacos eficazes para o combate a esta infeção (11). Como os sintomas são inespecíficos e semelhantes a uma constipação comum, supôs-se ter um padrão sazonal a coincidir com a época de Influenza, o que poderia ser desgastante e potencialmente devastador para os sistemas de saúde, sobretudo os já mais debilitados, aumentando a probabilidade de infeções nosocomiais (11). Um estudo que desenvolveu um modelo para avaliar o efeito da vacinação em massa contra a Influenza na disseminação da COVID-19 na época de Influenza, caso os surtos coincidissem, concluiu que o aumento da vacinação contra a Influenza facilitaria a gestão das restantes doenças respiratórias a nível dos sistemas de saúde (11).
Assim, parecia evidente que vacinação contra a gripe sazonal em profissionais de saúde seria, nesta época em particular, essencial, e que a perceção do risco de contrair a infeção, assim como a intenção de vacinação, iria determinar a decisão destes profissionais de se vacinarem ou não contra a gripe (1) (4) (11). No contexto de pandemia COVID-19, a perceção do risco e motivações poderiam ter mudado, influenciando a adesão à vacinação contra a gripe sazonal por parte destes profissionais. Alguns estudos, entretanto, concluíram que a pandemia COVID-19 influenciou positivamente a propensão das populações à vacinação contra a gripe sazonal e outras doenças infeciosas preveníveis com vacinação (12) (13). Um estudo realizado em Itália concluiu que a própria vacinação contra a gripe sazonal em populações com mais de 65 anos foi associada a uma menor transmissão de COVID-19 e a doença por COVID-19 menos grave (14).
Perceber quais as motivações dos profissionais de saúde de um Hospital Central para a vacinação contra a gripe sazonal no ano de 2020/2021 e qual a sua perceção do risco de contrair esta doença motivou a realização deste estudo. Assim, o objetivo foi perceber qual o impacto que a pandemia COVID-19 teve na motivação para a vacinação contra a gripe sazonal e na perceção do risco de contrair gripe nesta época, tal como confirmar se existia relação entre a perceção do risco de contrair gripe e a decisão individual de vacinação no futuro. Pretendeu-se igualmente ponderar se as características individuais e sociodemográficas tiveram influência na perceção do risco.
Com estes dados, podemos avaliar se a situação pandémica alterou a perceção que os profissionais de saúde têm em relação à gripe e também se os padrões de comportamento e decisão face à vacinação contra a gripe sazonal se modificaram. Ao perceber quais as motivações que levam os profissionais de saúde a vacinarem-se e qual a sua perceção do risco relativamente a esta doença, poder-se-ão definir novas estratégias de sensibilização para promover a adesão, otimizando no futuro a cobertura vacinal contra o vírus Influenza nos profissionais de saúde de um Hospital Central, assim como noutras unidades hospitalares e de saúde.
METODOLOGIA
Este projeto de investigação insere-se num dos programas do Serviço de Saúde Ocupacional, referente à vacinação contra a gripe sazonal dos profissionais de saúde de um Hospital Central.
População alvo, amostra e processo de amostragem
A população-alvo deste estudo foram os profissionais de saúde de um Hospital Central que no período de época vacinal contra o vírus Influenza 2020-2021 (entre outubro de 2020 e março de 2021) recorreram voluntariamente ao Serviço de Saúde Ocupacional para serem inoculados com a vacina contra o vírus Influenza (1646 profissionais). O processo de amostragem foi por conveniência e foram selecionados os que aceitaram participar e que preencheram corretamente o questionário. A amostra ficou composta por 212 elementos, independentemente do sexo, categoria profissional ou serviço.
Variáveis em estudo
Neste estudo consideraram-se como unidades de base da investigação a motivação e perceção dos profissionais de saúde de um Hospital Central relativamente à vacinação contra a gripe sazonal; correlacionando tal com os dados demográficos, como idade, sexo, anos de serviço, agregado familiar e doença crónica.
Instrumento de recolha de dados e pré-teste
Optou-se por um questionário não validado e anónimo, elaborado pelos investigadores, com base na revisão bibliográfica efetuada. Este questionário encontra-se dividido em duas partes, correspondendo a primeira às variáveis de atributo referidas anteriormente e a segunda a questões relacionadas com motivações e perceção do risco dos profissionais de saúde. O questionário foi aplicado entre 05/10/2020 e 31/03/2021.
Foi aplicado o questionário como pré-teste a cinco profissionais de saúde da população-alvo, que não fizeram parte da amostra final, no período de 2 a 4/10/2020. Foi possível verificar que não existiu ambiguidade na interpretação das questões, tendo sido o instrumento de recolha considerado adequado, não sendo necessário realizar ajustes à sua estrutura.
Critérios de inclusão e exclusão
Como critérios de inclusão consideraram-se ser profissional de saúde, exercer funções no Hospital Central em questão, ter-se vacinado contra a gripe sazonal e querer participar. Como critérios de exclusão considerou-se não ter preenchido corretamente o questionário aplicado.
Tratamento e apresentação dos dados
Os dados obtidos na aplicação deste instrumento foram analisados com recurso ao programa estatístico Microsoft Excel, possibilitando desta forma serem apresentados através de tabelas e gráficos. Pretendeu-se com esta análise encontrar relações entre diferentes perceções de risco de contrair gripe, historial de vacinação contra a gripe, motivação presente para a vacinação, certas características sociodemográficas (como sexo, idade, agregado familiar), categoria profissional e clínicas (como patologias crónicas).
Questões éticas
Neste estudo teve-se em conta o princípio pelo respeito pela vida privada e pela confidencialidade das informações pessoais. Os participantes foram informados sobre a natureza do estudo, o direito ao anonimato e a confidencialidade. Os dados recolhidos apenas puderam ser acedidos pelo investigador principal, que se comprometeu a guardá-los por um período de cinco anos, por exigência de cariz ético hospitalar. Findo esse período, os mesmos serão destruídos, sendo que não poderão ser usados para outro fim que não o desta investigação. O processo não teve quaisquer custos para a instituição onde foi realizada.
RESULTADOS
Apresentação de um Hospital Central
O Hospital onde foi realizado o estudo constitui um Hospital Central, que ocupa cerca de 3200 profissionais de saúde. Historicamente, a taxa de adesão à vacinação contra a gripe sazonal de profissionais de saúde previamente a 2018 era baixa, oscilando entre ao 13 e os 26% (Gráfico 1).
A taxa de vacinação foi progressivamente aumentando ao longo dos anos, fruto de políticas e ações de intervenção implementadas, no sentido de sensibilizar os profissionais de saúde para a importância da vacinação; não obstante, nunca se atingiram os 30% de profissionais vacinados. No outono/inverno de 2018/2019, ocorreu um surto de Influenza no Hospital, no qual muitos doentes, mas também profissionais de saúde foram infetados, o que originou um absentismo laboral considerável, numa altura em que os recursos humanos a nível hospitalar eram já escassos. Talvez em consequência deste evento, a adesão à vacinação nessa e na época vacinal seguinte subiram significativamente, fixando-se um pouco acima dos 30%. Na época vacinal 2020-2021, verificou-se um aumento muito significativo na adesão à vacinação, para cerca de 50% (Gráfico 1).
Analisando a distribuição por categoria profissional na adesão à vacinação ao longo dos anos (Gráficos 2 a 4), podemos constatar que os enfermeiros sempre foram o grupo profissional que mais aderiu. Já os médicos, que no passado aderiam pouco (menos do que enfermeiros e assistentes operacionais), foram aderindo cada vez mais.
(Legenda: AT - Assistentes Técnicos; TSDT - Técnicos Superiores de Diagnóstico e Terapêutica; MED - Médicos; AO - Assistentes Operacionais; ENF - Enfermeiros.)
(Legenda: AT - Assistentes Técnicos; TSDT - Técnicos Superiores de Diagnóstico e Terapêutica; MED - Médicos; AO - Assistentes Operacionais; ENF - Enfermeiros.)
Caraterização da amostra
Foi utilizada uma amostra de 212 profissionais de saúde que trabalham no Hospital em estudo e que responderam voluntariamente ao questionário proposto.
Caraterização das variáveis de atributo
Dos 212 profissionais participantes, a maioria (82,1%) era representada pelo sexo feminino (Tabela 1). A idade média dos participantes era de 44 anos, variando entre os 22 e 71 anos, sendo que a maioria tinha idade compreendida entre os 36 a 50 anos (38,7%), seguida pelo intervalo dos 51 a 65 anos (34,4%).
Relativamente ao agregado familiar, 23,6% dos participantes vivia com o cônjuge e filhos,15,1% apenas o cônjuge, 8,5% apenas com os filhos, 5,7% com outros sem grau de parentesco/vive sozinho, 3,8% com a mãe e o cônjuge, 3,8% com os pais, 3,3% com a mãe, cônjuge e filhos, sendo que 25% dos participantes não respondeu à questão (Tabela 1).
A distribuição dos participantes por categoria profissional foi bastante equitativa, correspondendo a cerca de 20% nas categorias de enfermagem, médicos, assistentes técnicos e assistentes operacionais. Os restantes 20% corresponderam a técnicos superiores e outros.
Em termos de anos de atividade profissional no Hospital, a maioria dos inquiridos incluía-se no intervalo de tempo de um a cinco anos (23,6%), seguidos do período de 26-30 anos (19,8%) e 16-20 anos (17,5%).
Cerca de 25,5% referiram sofrer de alguma doença crónica, sendo a maioria do sexo feminino (79,6%). As mais prevalentes foram a patologia pulmonar e cardiovascular.
Variável | Frequência (n) | Percentagem (%) | ||
---|---|---|---|---|
Sexo | Feminino | 174 | 82,1 | |
Masculino | 38 | 17,9 | ||
Faixa etária | 18-35 | 55 | 25,9 | |
36-50 | 82 | 38,7 | ||
51-65 | 73 | 34,4 | ||
>66 | 2 | 0,9 | ||
Agregado familiar | Cônjuge e filhos | 50 | 23,6 | |
Cônjuge | 32 | 15,1 | ||
Filhos | 18 | 8,5 | ||
Sem grau parentesco | 12 | 5,7 | ||
Mãe e cônjuge | 8 | 3,8 | ||
Pai e mãe | 8 | 3,8 | ||
Mãe, cônjuge e filhos | 7 | 3,3 | ||
Outros | 23 | 10,9 | ||
Não respondeu | 54 | 25,5 | ||
Categoria profissional | Enfermeiro | 46 | 21,7 | |
Médico | 43 | 20,3 | ||
Assistente técnico | 42 | 19,8 | ||
Assistente operacional | 40 | 18,9 | ||
Técnico superior | 28 | 13,2 | ||
Outra | 13 | 6,1 | ||
Tempo de profissão no Hospital (anos) | <1 | 6 | 2,8 | |
1-5 | 50 | 23,6 | ||
6-10 | 26 | 12,3 | ||
11-15 | 25 | 11,8 | ||
16-20 | 37 | 17,5 | ||
21-25 | 22 | 10,4 | ||
26-30 | 42 | 19,8 | ||
>30 | 2 | 0,9 | ||
Doença crónica | Sim | Feminino | 43 | (79,6) |
Masculino | 11 | (20,4) | ||
Não | Feminino | 131 | (82,9) | |
Masculino | 27 | (17,1) | ||
Doença crónica identificada | Patologia pulmonar | 14 | 25,9 | |
Patologia cardiovascular | 14 | 25,9 | ||
HIV/outras imunodeficiências | 6 | 11,1 | ||
Diabetes | 3 | 5,6 | ||
Doença psiquiátrica | 2 | 3,7 | ||
Cancro | 2 | 3,7 | ||
Patologia hematológica | 2 | 3,7 | ||
Outra | 11 | 20,4 |
Caraterização dos comportamentos/atitudes relativamente à vacinação contra a gripe sazonal
Quanto à perceção individual sobre o risco de contrair a doença, encontram-se algumas diferenças entre as categorias a que pertencem os inquiridos, tendo em conta as opções de risco muito baixo/baixo/médio e alto/muito alto. A maioria dos participantes (60,4%) considera ter um risco muito baixo/baixo/médio de contrair gripe sazonal, ao passo que 35,4% considera-o ser alto/muito alto e apenas 4,2% referem não saber qual o seu risco. Analisando para o sexo, não existe uma relação entre este e uma maior ou menor perceção de risco, tendo respondido risco muito baixo/baixo/médio 59,8% do sexo feminino e 63,2% do masculino; a perceção de risco alto/muito alto correspondeu a 35,1% do sexo feminino e 36,8% do masculino. Considerando as diferentes categorias profissionais, observa-se uma distribuição semelhante das respostas, sendo, em praticamente todas, escolhida a opção de risco muito baixo/baixo/médio, com valores entre 61,5% e 65,0%; destacam-se os médicos, grupo profissional onde a maior percentagem de respostas (51,2%) indicam uma perceção de risco alto/muito alto. Quanto à faixa etária, em todos os intervalos, a maior percentagem dos inquiridos respondeu muito baixo/baixo/médio risco (valores entre 58,2% e 63,4%), sem relação entre uma determinada faixa etária e uma maior ou menor perceção de risco. A distribuição de respostas quando analisado o tempo de profissão no hospital encontra-se na maioria dos intervalos considerados (em anos completos de serviço) acima dos 59%, considerando muito baixo/baixo/médio risco de contrair a doença. Existe uma pequena diferença no grupo dos trabalhadores com 6-10 anos de profissão, no qual 50,0% reporta uma perceção de risco alto/muito alto. Não podemos, no entanto, afirmar que esta diferença permita atribuir uma relação sólida entre este número de anos de serviço e uma maior perceção de risco de contrair gripe. Analisando a história de vacinação contra a gripe sazonal da amostra, verifica-se que a maior percentagem dos inquiridos que não se vacinaram no ano anterior, mas que já se vacinaram no passado, consideram ter um risco alto/muito alto de contrair a doença (75%). Entre os que nunca se vacinaram contra a gripe sazonal, os que se vacinaram no ano anterior e os que se vacinam anualmente, a maioria das respostas indicam uma perceção de risco muito baixo/baixo/médio, sendo respetivamente 60,9%, 59,6% e 61,0%.
Variável | Frequência (n) | Percentagem (%) | |
---|---|---|---|
Perceção do risco de contrair gripe sazonal | Muito baixo Baixo Médio Alto Muito alto Não sabe |
12 23 93 63 12 9 |
5,7 10,8 43,9 29,7 5,7 4,2 |
História de vacinação da gripe sazonal | Nunca se vacinou Não se vacinou o ano passado Vacinou-se o ano passado Vacina-se anualmente Omisso |
46 28 47 82 9 |
21,7 13,2 22,2 38,7 4,2 |
Intenção de vacinação futura | Sim Não Não sabe |
171 14 27 |
80,7 6,6 12,7 |
Motivação para vacinação da gripe sazonal | Doença crónica Proteção familiares s/ doença crónica Proteção familiares c/ doença crónica Proteção dos doentes Proteção de colegas de trabalho Proteção do próprio Contexto pandemia COVID-19 Doença no ano anterior Outro Omisso |
26 17 38 39 37 71 140 3 13 7 |
12,3 8,0 17,9 18,4 17,5 33,5 66,0 1,4 6,1 3,3 |
Relativamente à motivação para a vacinação contra a gripe sazonal, destaca-se a pandemia COVID-19 como principal motivador (66%). Entre estes participantes, 37,9% consideraram um risco alto/muito alto de contrair gripe. Outras motivações referidas foram a proteção para o próprio indivíduo (33,5%), a proteção dos doentes (18,4%), dos colegas de trabalho (17,5%) e de familiares com doença crónica (17,9%). Dos participantes sem doença crónica, as principais motivações para a vacinação foram o contexto de pandemia COVID-19 (67,0%), e a proteção do próprio (34,2%). Dos participantes com doença crónica, as principais motivações para a vacinação foram as mesmas, embora numa percentagem ligeiramente mais reduzida (63,0 e 31,5%, respetivamente). Não parece existir diferença entre os grupos que apresentam ou não uma doença crónica, revelando que não deverá ter sido esta uma motivação relevante. Por outro lado, entre os que pretendem a vacinação futura, 41,5% apresenta uma perceção de risco alto/muito alto, contrastando com apenas 7,1% no grupo de participantes que não pretendem ser vacinados no futuro.
Variáveis | Total n (%) | Perceção de risco | |||
---|---|---|---|---|---|
Risco Muito Baixo/ Baixo/Médio n (%) | Risco Alto/ Muito Alto n (%) | Não Sabe n (%) | |||
N=212 | 128 (60,4) | 75 (35,4) | 9 (4,2) | ||
Sexo | Feminino Masculino |
174(82,1) 38(17,9) |
104(59,8) 24(63,2) |
61(35,1) 14(36,8) |
9(5,2) 0(-) |
Categoria profissional | Enfermeiro Médico Assistente técnico Assistente operacional Técnico superior Outra |
46(21,7) 43(20,3) 42(19,8) 40(18,9) 28(13,2) 13(6,1) |
29(63,0) 20(46,5) 27(64,3) 26(65,0) 18(64,3) 8(61,5) |
17(37,0) 22(51,2) 14(33,3) 11(27,5) 8(28,6) 3(23,1) |
0(-) 1(2,3) 1(2,4) 3(7,5) 2(7,1) 2(15,4) |
Faixa etária | 18-35 36-50 51-65 >66 |
55(25,9) 82(38,7) 73(34,4) 2(0,9) |
32(58,2) 52(63,4) 42(57,5) 2(100) |
23(41,8) 26(31,7) 26(35,6) 0(-) |
0(-) 4(4,9) 5(6,8) 0(-) |
Tempo de profissão no Hospital (anos) | <01 01-05 06-10 11-15 16-20 21-25 26-30 >30 |
6(2,8) 50(23,6) 26(12,3) 25(11,8) 37(17,5) 22(10,4) 42(19,8) 4(1,9) |
4(66,6) 32(64,0) 12(46,2) 16(64,0) 22(59,5) 13(59,1) 25(59,5) 4(100) |
2(33,3) 18(36,0) 13(50,0) 7(28,0) 12(32,4) 9(40,9) 14(33,3) 0(-) |
0(-) 0(-) 1(3,8) 2(8,0) 3(8,1) 0(-) 3(7,1) 0(-) |
História de vacinação da gripe sazonal | Nunca se vacinou Não se vacinou no ano passado Vacinou-se no ano passado Vacina-se anualmente Omissos |
46(21,7) 28(13,2) 47(22,2) 82(38,7) 9(4,25) |
28 (60,9) 5 (17,9) 28 (59,6) 50 (61,0) |
16 (34,8) 21 (75,0) 18 (38,3) 30 (36,6) |
2 (4,3) 2 (7,1) 1 (2,1) 2 (2,4) |
Motivação para vacinação da gripe sazonal | Doença crónica Proteção familiares s/ doença crónica Proteção familiares c/ doença crónica Proteção dos doentes Proteção de colegas de trabalho Proteção do próprio Contexto pandemia COVID-19 Doença no ano anterior Outro Omissos |
26(12,3) 7(8) 38(17,9) 39(18,4) 37(17,5) 71(33,5) 140(66) 3(1,4) 13(6,1) 7(3,3) |
17 (65,4) 9 (52,9) 23 (60,5) 22 (56,4) 23 (62,2) 47 (66,2) 80 (57,1) 1 (33,3) 9 (69,2) |
8 (30,8) 7 (41,2) 14 (36,8) 16 (41,0) 13 (35,1) 23 (32,4) 53 (37,9) 2 (66,7) 3 (23,1) |
1 (3,8) 1 (5,9) 1 (2,6) 1 (2,6) 1 (2,7) 1 (1,4) 7 (5,0) 0 (-) 1 (7,7) |
Doença crónica | Sim Não |
158(74,5) 54(25,5) |
94(59,5) 34(62,9) |
58(36,7) 17(31,5) |
6(3,8) 3(5,5) |
Intenção de vacinação futura | Não Sim Não sabe |
14(6,6) 171(80,7) 27(12,7) |
13(92,9) 93(54,4) 22(81,5) |
1(7,1) 71(41,5) 3(11,1) |
0(-) 7(4,1) 2(7,4) |
Ao avaliar a história vacinal dos participantes, constatou-se que 21,7% nunca se tinham vacinado contra o vírus Influenza e que 38,7% se vacina anualmente. Nos que nunca se tinham vacinado, 50,0% vacinaram-se no presente ano pelo contexto pandémico de COVID-19 e cerca de 47,8% tenciona vacinar-se no futuro. Analisando os indivíduos que se vacinam de forma intermitente, 66,7% vacinaram-se no presente ano pelo contexto pandémico de COVID-19 e 77,0% pretende vacinar-se no futuro.
Quanto à intenção de vacinação no futuro, a maioria (80,7%) dos participantes pretende fazê-lo. Destes, a maioria já se vacinava no passado (73,0%).
DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
A vacinação contra a gripe sazonal na época vacinal 2020-2021 no Hospital em questão teve uma taxa de adesão sem precedentes (50%), o que confirmou uma mudança de paradigma no que toca à vacinação entre os profissionais de saúde, além de ter sido muito positivo para a instituição, na medida em que não foram, nesta época vacinal, detetados casos confirmados ou situações de absentismo laboral causadas por Influenza em profissionais de saúde. No entanto, os números atuais ainda estão aquém do recomendado para o contexto hospitalar, sendo necessária uma adesão superior para garantir a segurança de profissionais de saúde e doentes no futuro.
Dos 1646 profissionais de saúde vacinados contra o vírus Influenza nesta época vacinal, apenas 212 responderam voluntariamente ao questionário. Esta baixa adesão (cerca de 13%), poder-se-á dever ao facto de, em contexto pandémico, os profissionais de saúde não disporem de tanto tempo para participarem no estudo. Uma limitação encontrada foi o facto de nem sempre as inoculações serem realizadas no Serviço de Saúde Ocupacional, o que dificultou a aplicação do questionário aos profissionais de saúde.
Outra das limitações é a de apenas ter selecionado profissionais que já tomaram a decisão de se vacinar. No entanto, dado o exponencial aumento na adesão à vacinação, comparativamente com anos anteriores, supomos que este se deveu em grande parte a um contexto de pandemia COVID-19.
A grande maioria dos profissionais inquiridos são do sexo feminino, o que reflete a distribuição da população de profissionais ao nível do hospital, onde este predomina.
A maioria dos profissionais que participaram no estudo tinha pelo menos cinco anos de serviço no hospital. Isto pode mostrar que a convivência continuada com um risco biológico conduza a uma mais consciente perceção do mesmo, motivando a vacinação e a participação em estudos relacionados com a mesma.
A maioria dos profissionais considerou apresentar um risco muito baixo/baixo/médio de possibilidade de contrair gripe e apenas 35,4% considera o risco alto/muito alto. Esta perceção do risco é transversal a faixas etárias, sexo, categoria profissional, experiência profissional, história vacinal ou existência de doença crónica. Apenas se observou uma grande diferença na perceção de risco entre os que pretendem ou não vacinar-se no futuro, tendo os primeiros uma muito mais alta perceção do mesmo. Se numa população que já escolheu vacinar-se, a perceção do risco não é elevada, presumimos que numa população que não se vacina a sua perceção é ainda inferior. São assim necessários mais estudos nesta área para se compreenderem quais as reais perceções e motivações dos profissionais de saúde relativamente à vacinação contra a gripe sazonal, para poderem ser implementadas intervenções em saúde direcionadas. A pandemia COVID-19 pode ter ajudado a alertar para a gravidade das doenças infeciosas respiratórias, nomeadamente em contexto hospitalar, dada a sua elevada transmissibilidade e possibilidade de desfecho adverso, sendo, no entanto, necessárias campanhas de sensibilização adicionais para esta temática.
A maioria dos participantes já tem por hábito vacinar-se contra a gripe sazonal, ou seja, já o fez no passado (22,2%) ou fá-lo anualmente (38,7%), assim como a maioria dos participantes que pretendem vacinar-se no futuro já tinham por hábito fazê-lo no passado. Não obstante, cerca de um quinto dos profissionais inquiridos nunca se tinham vacinado e, nestes, podemos ver como motivação dominante para a vacinação o contexto pandémico (50,0%). Além disso, 47,0% dos participantes que nunca se tinham vacinado no passado pretendem fazê-lo no futuro. Os indivíduos que se vacinam de forma intermitente mostraram esta mesma motivação e intenção de vacinação no futuro. Isto pode refletir uma mudança na perceção do risco de contrair gripe, ou talvez na sua gravidade, causada pelo contexto pandémico, em participantes que no passado não se vacinavam, tendo um forte impacto na vacinação presente e futura.
De uma forma geral o contexto pandémico alterou o comportamento e as atitudes relativas à vacinação, já que a motivação dominante para a vacinação foi este contexto, mesmo em indivíduos previamente saudáveis, o que se revela diferente das principais motivações para a vacinação encontradas em estudos anteriores (3) (4) (6-8). Este conhecimento e o impacto da pandemia nos serviços de saúde e em cada um dos profissionais de saúde, pode ser usado no sentido de sensibilizar os mesmos para a problemática que é o vírus Influenza nos hospitais e na comunidade, alertando para a necessidade de vacinação, cada vez mais crucial para uma prestação segura de cuidados de saúde. Espera-se assim atingir a meta que é a vacinação de todos os profissionais de saúde contra a gripe sazonal.