INTRODUÇÃO
A batata-doce [(Ipomoea batatas L.) Lam.] é uma planta dicotiledónea da família das Convolvuláceas. O seu sistema radicular é constituído pelas raízes absorventes, que absorvem os nutrientes e suportam a planta, e pelas raízes de reserva, doravante designadas por batata-doce, onde se acumulam os produtos fotossintetizados (Huaman, 1992). A cultura foi introduzida na Europa, na África e na Índia pelos marinheiros portugueses e espanhóis (Grüneberg et al., 2009).
A nível mundial a cultura da batata-doce tem grande expressão e importância alimentar, com uma produção estimada em 2021 de cerca de 89 milhões de toneladas, numa área de 7 410 026 ha (FAOSTAT, 2023). Em 2021, os 10 maiores países produtores mundiais foram: China, Malawi, Tanzânia, Nigéria, Angola, Etiópia, Indonésia, Ruanda, Estados Unidos da América e, por último Uganda (FAOSTAT, 2023). A produção de batata-doce no continente europeu, é reduzida, quando comparada com outras zonas do globo, embora exista uma tendência para um aumento da área de cultura. Os principais países produtores europeus são Espanha, Portugal, Itália e Grécia (FAOSTAT, 2023). Estima-se que a área de produção em Portugal seja, desde 2020 de cerca de 1 500 ha (Ferreira, 2021).
A batata-doce é consumida em fresco ou transformada em farinha para bolos, biscoitos ou outros produtos alimentares. O amido produzido é utilizado na indústria alimentar, têxtil e do papel, na preparação de glucose líquida e de colas (Nedunchezhiyan & Ray, 2010). A batata-doce também pode ser utilizada para a produção de bioetanol (Elsayed & El-Khateeb, 2017; Lourenço et al., 2018). As folhas são usadas na alimentação, na preparação de bebidas verdes como infusões ou para fins medicinais (Nedunchezhiyan & Ray, 2010). Na alimentação animal são utilizadas como forragem verde ou silagem (Monteiro et al., 2007; Figueiredo et al., 2012). Em Portugal, atualmente, às folhas da batata-doce não é atribuída importância alimentar ou económica, sendo a cultura realizada só para a produção de raízes de reserva.
Nos países em desenvolvimento, a batata-doce constitui uma opção económica para minorar a “fome escondida” de micronutrientes devido ao teor em β-caroteno, um percursor da vitamina A, ácido ascórbico (vitamina C), ferro, zinco e cobre (Chipungu et al., 2017).
A batata-doce apresenta composição e teor em nutrientes muito variáveis, dependendo sobretudo de fatores genéticos e ambientais (Bovell-Benjamin, 2007).
A composição mineral da batata-doce tem sido determinada em diversos estudos para: (i) conhecer o seu contributo para a nutrição humana (Laurie et al., 2012; Aywa et al., 2013; Luis et al., 2014; Sanoussi et al., 2016; Vizzotto et al., 2018; Senthilkumar et al., 2020); ii) estabelecer diferenças entre cultivares (Picha, 1985; Montes et al., 2010; Hernández et al., 2016); (iii) selecionar e indicar à produção as melhores cultivares (Ukom et al., 2016; Chipungu et al., 2017); iv) determinar a extração e a exportação da cultura (Scott & Bouwkamp, 1974; Echer et al., 2009; Fernandes et al., 2020). O conhecimento da composição mineral da batata-doce constitui também um contributo importante para estabelecer um plano de fertilização adequado.
A batata-doce ‘Lira’, produzida no concelho de Aljezur (Algarve) e em parte do concelho de Odemira (Alentejo), encontra-se registada desde 2009 como “Batata-doce de Aljezur” com Indicação Geográfica Protegida (IGP) [Regulamento (CE) n.º 752/2009 da Comissão, de 17 de agosto de 2009]. As raízes de reserva caracterizam-se por ter uma forma piriforme alongada, epiderme de cor púrpura ou castanho avermelhada e polpa amarela, com calibre entre 8,5 cm x 4,0 cm e os 16,5 cm x 7,1 cm e peso entre 50 g a 450 g (Ferreira et al., 2021). Trata-se de uma cultivar tradicional com um paladar muito apreciado pelo consumidor, mas com baixa produtividade, atribuída, entre outros fatores, às características dos solos onde é produzida. A monitorização da fertilidade dos solos de 50 parcelas de “Batata-doce de Aljezur” revelou que os solos são maioritariamente arenosos, pobres em matéria orgânica, potássio, magnésio e micronutrientes (Veloso & Mano, 2021). As condições de produção da batata-doce ‘Lira’, nomeadamente o nível de fertilidade dos solos, sugerem que uma fertilização mais ajustada às necessidades da cultura poderá contribuir para um aumento da produção.
Os ensaios de campo constituem um dos meios mais importantes para obter informação e estabelecer recomendações de fertilização adequadas, mas são um processo moroso, mesmo tratando-se de uma cultura anual, realizada numa área geográfica limitada e com condições edafoclimáticas semelhantes. Na ausência de ensaios de fertilização, a determinação da biomassa produzida e da composição mineral constituem um suporte fundamental para conhecer as necessidades da cultura.
O objetivo do presente trabalho foi determinar para a batata-doce ‘Lira’ a quantidade de biomassa produzida e a composição mineral das diferentes frações da planta em N, P, K, Ca, Mg, Fe, Mn, Zn, Cu e B, de modo a obter informação para a elaboração de recomendações de fertilização adequadas em condições de produção em campo de cultura.
MATERIAL E MÉTODOS
Local de produção
Na região da “Batata-doce de Aljezur”, entre 2018 e 2020, foram selecionados três produtores em três locais de produção diferentes (Cavaleiro, S. Teotónio e Odeceixe). Anualmente, em parcelas da cultivar Lira, com uma área de cerca de 1 hectare cada, procedeu-se à colheita de amostras de terra e de plantas de batata-doce nos campos dos produtores selecionados. Em 2020, a colheita foi efetuada apenas no Cavaleiro e em S. Teotónio.
A tecnologia de produção foi a utilizada em rotina pelos agricultores. A propagação da batata-doce ‘Lira’ é feita maioritariamente por plantação de estacas caulinares que são produzidas em viveiro que se inicia em fevereiro, com a plantação de raízes a 10-15 cm de profundidade e um compasso de 50 × 60 cm. A plantação para o local definitivo das estacas caulinares ocorre em abril/maio, em solo à rasa ou em camalhões, através da sua plantação com um compasso que pode variar de 50 a 80 cm entre linhas e 20 a 50 cm entre plantas na linha, o que equivale a uma população de 30000 a 45000 plantas por hectare, seguindo-se uma rega ligeira. A adubação de fundo decorre aquando da preparação do terreno e raramente é feita alguma cobertura. O controlo das infestantes efetua-se através de sachas ou mondas. A cultura beneficia com rega que é maioritariamente por aspersão ou gota-a-gota. O ciclo cultural é de quatro a cinco meses, efetuando-se a maior parte das colheitas em outubro, quando as raízes atingem a maturação e não existe excesso de humidade no solo (Louro & Marreiros, 2021).
Solo
Antes da instalação da cultura procedeu-se à avaliação da fertilidade do solo, através da análise de 8 amostras de terra colhidas na camada 0-20 cm, dos três locais de produção selecionados. Os métodos analíticos utilizados foram os seguintes: análise granulométrica - método do hidrómetro; matéria orgânica - digestão com dicromato de sódio e determinação por espetrofotometria de absorção molecular (EAM) UV/Vis, tendo sido aplicado o fator de correção 1,29 para compensar a oxidação incompleta do carbono orgânico pelo dicromato; pH (H2O) - suspensão solo:água de 1:2,5 (v/v) e leitura potenciométrica; fósforo e potássio extraíveis (P-AL e K-AL; Egnér et al., 1960) - extraídos com lactato de amónio a pH 3,65 e determinados por espetrometria de emissão de plasma com detetor ótico (ICP-OES Thermo Scientific® iCAP 7400 Duo); magnésio extraível - acetato de amónio 1M (pH=7) e leitura em espetrofotometria de absorção atómica com chama (EAA, GBC® 932); ferro, manganês, zinco e cobre extraíveis - AAAc-EDTA (Lakanen & Erviö, 1971; LQARS, 1977) e quantificação por EAA; boro extraível - água fervente e determinação por ICP-OES; catiões de troca - acetato de amónio 1M (pH=7) e leitura por EAA para Ca e Mg e por espectrometria de emissão atómica em chama (EEC) para K e Na; acidez potencial - obtida por titulação do mesmo extrato com hidróxido de sódio 0,1M; capacidade de troca catiónica potencial (CTCp(7,0)) obtida por soma dos catiões de troca (SCT) com a acidez potencial; grau de saturação (GS (Ca, Mg, K, Na)) determinado por cálculo (SCT x 100/CTCp(7,0)).
Material vegetal
A cultivar estudada (Lira) caracteriza-se por ter um ciclo cultural de 120 a 150 dias, as raízes de reserva têm forma piriforme alongada, epiderme de cor púrpura ou castanha avermelhada, polpa amarela e muito doces (Ferreira et al., 2021).
Na época habitual de colheita de batata-doce, na região, setembro/outubro e em cada um dos locais de produção, marcaram-se ao acaso seis unidades de amostragem, distribuídas por toda a parcela, correspondendo cada uma a duas linhas contíguas de plantas, com um metro de comprimento. As plantas de cada unidade de amostragem foram colhidas para registo da produção de biomassa e posterior análise química. As plantas, num total de 325, foram divididas em parte aérea (caules e folhas), raízes de reserva e raízes absorventes (Figura 1). As diferentes partes foram lavadas com água destilada, colocadas em local fresco, à temperatura ambiente, para secar a água de lavagem e pesadas posteriormente. As batatas-doces foram calibradas por classes de peso fresco, em laboratório, com base no referido por Santos (2004). O número de amostras obtido, por classes, foi o seguinte: 48, ≤50 g; 48, [51-250 g]; 46, [251-450 g] e 12 ≥451 g.
A metodologia de amostragem das batatas-doces foi adaptada de Porras et al. (2014). Para a determinação da matéria seca (MS) e análise mineral das raízes de reserva selecionaram-se, em cada uma das unidades de amostragem e para cada calibre, cinco raízes. Quando o número de raízes era inferior a cinco a amostra foi constituída pela totalidade das raízes. Para obter uma amostra representativa, as raízes foram divididas em quartos cortados longitudinalmente e de dois quartos opostos foram retiradas fatias muito finas até perfazer o peso fresco de, aproximadamente, 150 gramas.
As amostras da parte aérea, das raízes absorventes e das raízes de reserva, após determinação do peso fresco, foram secas numa estufa com ventilação (MMM MEDCENTER - VENTICEL 404) a (65±5) ºC, até o peso se encontrar estabilizado; em seguida procedeu-se à sua pesagem. A produção de matéria seca da parte aérea e das raízes absorventes foi calculada a partir da biomassa total das amostras. A produção de matéria seca das batatas-doces foi estimada a partir da matéria seca de amostras com aproximadamente 150 g em fresco.
Após secagem, as amostras foram moídas, acondicionadas em frascos de plástico, identificadas e conservadas em local fresco até à realização da análise. Nas amostras das diferentes partes da planta foram determinados os teores totais de N, P, K, Ca, Mg, Fe, Mn, Zn, Cu e B segundo os métodos analíticos em uso no INIAV, I.P./Laboratório Químico Agrícola Rebelo da Silva: o nitrogénio foi determinado pelo método de Kjeldahl (Vogel, 1978), o fósforo, o potássio, o cálcio, o magnésio, o ferro, o manganês, o zinco, o cobre e o boro foram determinados numa solução clorídrica das cinzas, obtidas após incineração em mufla (500 ± 25) °C, utilizando um espetrómetro de emissão de plasma (THERMO SCIENTIFIC iCAP 7400 ICP-OES) (Duarte et al., 1998).
O índice colheita (IC) foi calculado através da expressão: [IC = (massa da matéria seca das raízes de reserva /massa da matéria seca total da planta) x 100].
Como termo de comparação com a ‘Lira’ utilizou-se, na maior parte dos casos, a cultivar Beauregard, por ser considerada como uma cultivar padrão (Ferreira et al., 2021).
Análise estatística dos dados
Para a análise estatística dos resultados recorreu-se ao software STATISTICA 12 para Windows. Os dados relativos à composição mineral das diferentes partes da planta foram sujeitos a análise de variância (ANOVA Tipo I). As médias do teor de cada um dos nutrientes analisados foram comparadas pelo teste de Scheffé (p≤0,05).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Solo
Os solos dos diferentes locais de produção apresentam maioritariamente textura arenosa, são pouco ácidos, com pH compreendido entre 5,2 e 6,3, pobres em matéria orgânica, potássio, magnésio e micronutrientes (Mn, Zn, Cu e B). O teor de fósforo é alto na maior parte das parcelas. A capacidade de troca catiónica e os teores de cálcio, magnésio e potássio de troca são muito baixos na totalidade das parcelas (Quadro 1).
Parâmetros | Cavaleiro | S. Teotónio | Odeceixe | |||||||||
2018 | 2019 | 2020 | 2018 | 2019 | 2020 | 2018 | 2019 | |||||
pH (H2O) | 5,9 | 5,6 | 5,2 | 6,3 | 6,0 | 6,0 | 5,2 | 5,7 | ||||
Matéria Orgânica (%) | 0,25 | 0,30 | <0,25 | 0,25 | 0,43 | <0,25 | 0,90 | 0,75 | ||||
Areia (%) | 95,7 | 95,7 | 95,2 | 96,7 | 96,7 | 97,2 | 86,8 | 89,7 | ||||
Limo (%) | 0,9 | 0,9 | 1,9 | 0,9 | 0,9 | 1,9 | 5,0 | 4,9 | ||||
Argila (%) | 3,3 | 3,4 | 2,9 | 2,3 | 2,4 | 0,9 | 8,2 | 5,4 | ||||
Textura | Arenosa | Arenosa | Arenosa | Arenosa | Arenosa | Arenosa | Areno-franca | Areno-franca | ||||
Fósforo extraível (P2O5) (mg/kg) | 176 | 51 | 102 | 176 | 173 | 129 | 219 | 155 | ||||
Potássio extraível (K2O) (mg/kg) | 31 | 25 | 55 | 28 | 24 | 34 | 54 | 38 | ||||
Magnésio extraível (Mg) (mg/kg) | 28 | 31 | 21 | 28 | 35 | 24 | 44 | 75 | ||||
Ferro extraível (mg/kg) | 26 | 20 | 13 | 29 | 29 | 19 | 250 | 191 | ||||
Manganês extraível (mg/kg) | 16 | 10 | 21 | 3 | 6 | <2,5 | 12 | 10 | ||||
Zinco extraível (mg/kg) | <0,5 | <0,5 | 0,7 | 1,5 | 1,1 | 0,8 | 1,5 | 1,4 | ||||
Cobre extraível (mg/kg) | 0,2 | <0,1 | 0,5 | 0,5 | 0,4 | 0,5 | 0,6 | 0,3 | ||||
Boro extraível (mg/kg) | 0,26 | <0,20 | <0,20 | 0,30 | <0,20 | <0,20 | 0,30 | <0,20 | ||||
Ca de troca (cmol (+)/kg) | 0,27 | 0,26 | 0,26 | 0,50 | 0,59 | 0,46 | 1,0 | 0,88 | ||||
Mg de troca (cmol (+)/kg) | 0,05 | 0,10 | 0,07 | 0,15 | 0,16 | 0,10 | 0,34 | 0,44 | ||||
K de troca (cmol (+)/kg) | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | ||||
Na de troca (cmol (+)/kg) | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | <0,10 | 0,13 | 0,24 | ||||
CTCp (7,0) (cmol (+)/kg) | 0,80 | 2,45 | 1,14 | 1,00 | 2,55 | 1,04 | 3,16 | 3,54 | ||||
GS(Ca, Mg, K, Na) (%) | 50 | 16 | 38 | 71 | 31 | 62 | 49 | 46 |
CTCp(7,0) - Capacidade de Troca Catiónica potencial a pH 7,0; GS - Grau de Saturação do complexo de troca com Ca, Mg, K e Na.
Produção de biomassa e teor de matéria seca
A produção média de matéria fresca (MF) por planta foi de 1092,7 g, sendo que desta 50 % corresponde às raízes de reserva, 45 % à parte aérea e 5 % às raízes absorventes. A parte aérea da ‘Lira’ apresentou uma produção média de matéria fresca (491,2 g/planta) (Quadro 2), inferior ao valor mais baixo obtido para a ‘Beauregard’ (660 g/planta) por Mussoline & Wilkie (2017).
Fração da planta (n=48) | Produção de matéria fresca/planta (g) | Produção de matéria seca/planta (g) | Teor de matéria seca (%) |
Parte aérea | 491,2 ± 34,4 | 69,1 ± 4,8 | 14,2 ± 0,2 |
Raízes de reserva | 542,1 ± 24,6 | 171,6 ± 7,8 | 31,9 ± 0,3 |
Raízes absorventes | 59,4 ± 2,8 | 16,7 ± 0,9 | 28,2 ± 0,6 |
n - número de observações; sm - desvio padrão da média.
Na produção de matéria seca (MS) destacam-se as raízes de reserva que acumularam o dobro (67 %) da MS da parte aérea (27 %) e das raízes absorventes (6 %) em conjunto (Quadro 2). O índice colheita (IC) foi de 66,7 %, ligeiramente superior ao obtido para a ‘Beauregard’ (65,8 %), por Lewthwaite & Triggs (2000). As raízes de reserva apresentaram uma produção média de 171,6 g MS/planta, bastante inferior ao valor mais baixo, de um conjunto de quatro cultivares, obtido na ‘Nemagold’ (250 g MS/planta), por Scott & Bouwkamp (1974). A produção de matéria seca da parte aérea da ‘Lira’ (69,1 g/planta) foi inferior ao valor mais baixo (74 g MS/planta) obtido na ‘Redmar’, pelos mesmos autores.
O teor de matéria seca é uma característica fundamental de qualidade da batata-doce, variando com os diferentes genótipos, provavelmente devido à constituição genética, ao solo, à duração do dia e às práticas culturais (Hossain et al., 2022). A ‘Lira’ apresentou um teor médio de matéria seca de 14,2 % na parte aérea, 28,2 % nas raízes absorventes e 32,0 % nas raízes de reserva (Quadro 2). O teor de MS da ‘Lira’ foi superior aos valores obtidos para a ‘Beauregard’: 18,7 % (Yencho et al., 2008) e 19,8 % (Laurie et al., 2012). Foi também superior ao teor de 28 %, da ‘Serolane’, que foi o valor máximo de um conjunto de dez cultivares obtido por Laurie et al. (2015); muito próximo do teor 32,9 %, da ‘Pumpkin’, e superior ao teor 30,0 %, da ‘Chestnut’, valores observados por Maria & Rodica (2015).
O teor de matéria seca da batata-doce é uma característica importante para os consumidores e para as utilizações industriais de batata-doce, e constitui um fator relevante nos programas de melhoramento. Assim, deverão ser preferencialmente selecionadas cultivares com teores de MS superiores a 25 % para serem produzidas para consumo em fresco e superiores a 30 %, para utilização na indústria (Rukundo et al., 2013). A ‘Lira’, com um teor de matéria seca superior a 30 %, poderá vir a tornar-se interessante na indústria para a produção de produtos diferenciados, como por exemplo farinhas para padaria e pastelaria e aperitivos.
Produção de batata-doce
A produção média de batata-doce por planta foi de 542,1 ± 24,6 g (Quadro 2), dos quais 41,9 ± 4,2 g correspondem a batatas-doces com calibre ≤50 g e 500,2 ± 26,0 g a batatas-doces com calibre ≥51 g. Se compararmos a produção média por planta da ‘Lira’ com a de outras cultivares produzidas no arquipélago dos Açores (Ledo, 2019), verificamos que representa aproximadamente metade da ‘Pai’ (1042,1 g), dois terços da ‘Abóbora’ (812,3 g) e menos de dois terços da ‘Estrela’ (927,9 g). Em relação a cultivares mais produtivas, como a ‘Chestnut’ (1071 g), a ‘Lira’ produz cerca de metade e um terço da ‘Pumpkin’ (1600 g), respetivamente (Maria & Rodica, 2015). Constata-se que a ‘Lira’ é uma cultivar pouco produtiva, mas que pelas suas características organoléticas é muito apreciada pelo consumidor (Louro & Marreiros, 2021).
Composição mineral da batata-doce
As raízes de reserva representam o principal meio de exportação de nutrientes da ‘Lira’. Neste estudo determinou-se a composição mineral e relacionou-se a variação da mesma com o calibre (Quadro 3) e o local de produção (Quadro 4), de modo a obter informação que possa contribuir para estabelecer planos de fertilização adequados.
Referência | Presente estudo | Picha (1985) | Bradbury & Holloway (1988) | Montes et al. (2010) | Laurie et al. (2012) | Luis et al. (2014) | Hernández et al. (2016) | Vizzotto et al. (2018) | |
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Origem | Portugal | USA | Pacífico Sul | La Palma | África do Sul | Tenerife | Tenerife | La Palma | Brasil |
Material analisado | raiz | polpa | polpa | raiz | polpa | polpa | raiz | raiz | polpa |
Nutrientes (mg kg-1 MF) | |||||||||
N* | 2651 | 2507 | 2288 | - | - | - | 2848 | 3248 | - |
(1101-4364) | (2176-3408) | (-) | (-) | (-) | (-) | (1728-3856) | (1824-5264) | (-) | |
P | 401 | 540 | 510 | - | 400 | - | - | - | - |
(226-654) | (380-640) | (-) | (-) | (280-510) | (-) | (-) | (-) | (-) | |
K | 3449 | 3420 | 2600 | 2086 | 2780 | 4385 | 5940 | 2090 | 3166 |
(1541-4957) | (2450-4030) | (-) | (1453-2824) | (1910-3340) | (4094-4551) | (4790-7570) | (1450-2820) | (1692-3953) | |
Ca | 264 | 280 | 290 | 974 | 500 | 552 | 439 | 974 | 292 |
(64-911) | (200-410) | (-) | (251-1809) | (340-630) | (322-789) | (119-875) | (251-1810) | (168-448) | |
Mg | 240 | 180 | 260 | 244 | 260 | 564 | 238 | 244 | 293 |
(128-476) | (130-220) | (-) | (150-435) | (150-370) | (422-706) | (131-393) | (150-435) | (184-465) | |
Fe | 4,4 | - | 4,9 | 17,0 | 9,3 | 6,2 | 26,4 | 17,0 | 0,9 |
(0,4-13,8) | (-) | (-) | (9,2-39,5) | (7,3-12,6) | (4,8-7,2) | (17,2-44,1) | (9,2-39,5) | (0,6-1,5) | |
Mn | 5,7 | - | 1,1 | 1,8 | - | 2,3 | 1,6 | 1,8 | 0,5 |
(0,1 -25,2) | (-) | (-) | (0,7-3,1) | (-) | (1,7-2,7) | (0,9-3,1) | (0,7-3,1) | (0,2-0,7) | |
Zn | 2,7 | - | 5,9 | 1,1 | 6,0 | 2,3 | 2,3 | 1,1 | 0,3 |
(0,2-7,7) | (-) | (-) | (0,5-2,6) | (5,1-6,9) | (1,7-2,5) | (1,3-3,4) | (0,5-2,6) | (0,2-0,5) | |
Cu | 1,0 | - | 1,7 | 1,8 | - | 1,3 | 1,5 | 1,8 | 0,2 |
(0,1-2,5) | (-) | (-) | (0,6-3,0) | (-) | (1,2-1,4) | (0,9-1,9) | (0,6-3,0) | (0,1-0,4) | |
B | 1,3 | - | 1,0 | - | - | - | - | - | - |
(0,1 -2,3) | (-) | (-) | (-) | (-) | (-) | (-) | (-) | (-) |
*Calculado a partir do teor de proteína (Teor de nitrogénio = teor de proteína/6,25), exceto no presente estudo.
Classes de calibre (g) | N.º de observações | Nutrientes (mg kg-1 matéria fresca) | |||||||||
N | P | K | Ca | Mg | Fe | Mn | Zn | Cu | B | ||
≤50 | 48 | 2625 ± 124 a | 418 ± 13 a | 3015 ± 114 b | 375 ± 28 a | 284 ± 11 a | 5,7 ± 0,54 a | 8,4 ± 1,04 a | 3,1 ± 0,29 a | 1,0 ± 0,11 a | 1,4 ± 0,10 a |
51-250 | 48 | 2571 ± 107 a | 384 ± 11 a | 3549 ± 90 a | 221 ± 14 b | 224 ± 7 b | 3,8 ± 0,31 b | 4,9 ± 0,55 b | 2,5 ± 0,22 a | 0,9 ± 0,09 a | 1,3 ± 0,10 a |
251-450 | 46 | 2660 ± 110 a | 385 ± 12 a | 3653 ± 91 a | 201 ± 12 b | 216 ± 7 b | 3,8 ± 0,36 b | 4,3 ± 0,53 b | 2,5 ± 0,22 a | 0,9 ± 0,10 a | 1,3 ± 0,10 a |
≥451 | 12 | 3050 ± 165 a | 454 ±16 a | 4007 ± 140 a | 231 ± 29 b | 224 ± 12 b | 3,9 ± 0,50 ab | 3,6 ± 0,82 b | 3,1 ± 0,43 a | 1,2 ± 0,18 a | 1,6 ± 0,19 a |
Em cada coluna dos nutrientes, os valores da média com a mesma letra não diferem entre si de forma significativa (p≤0,05) pelo teste de Scheffé; sm - desvio padrão da média.
Nitrogénio: O teor médio de nitrogénio determinado na ‘Lira’ foi de 2651 ± 62 mg kg-1 MF, superior à média dos valores obtidos na polpa (2507 mg kg-1 MF), por Picha (1985) e (2288 mg kg-1 MF), por Bradbury & Holloway (1988). Porém, é inferior aos valores médios (2848 mg kg-1 MF) e (3248 mg kg-1 MF) obtidos, respetivamente, em Tenerife e La Palma, em dois conjuntos de quinze cultivares (Hernández et al., 2016) (Quadro 5).
Local de produção | N.º de observações | Nutrientes (mg kg-1 matéria fresca) | |||||||||
N | P | K | Ca | Mg | Fe | Mn | Zn | Cu | B | ||
Cavaleiro | 55 | 1850 ± 68 b | 341 ± 10 c | 3104 ± 78 b | 199 ± 11 b | 200 ± 5 b | 4,3 ± 0,46 a | 7,3 ± 0,84 a | 1,6 ± 0,14 c | 0,5 ± 0,04 c | 1,1 ± 0,09 c |
Odeceixe | 62 | 2960 ± 83 a | 412 ±10 b | 3384 ± 104 b | 203 ± 14 b | 254 ± 11 a | 4,7 ± 0,14 a | 7,0 ± 0,72 a | 4,1 ± 0,16 a | 1,7 ± 0,05 a | 1,8 ± 0,04 a |
S. Teotónio | 37 | 3178 ± 57 a | 446 ± 9 a | 3795 ± 98 a | 356 ± 22 a | 266 ± 9 a | 4,4 ± 0,40 a | 3,5 ± 0,51 b | 2,8 ± 0,23 b | 0,9 ± 0,08 b | 1,3 ± 0,09 b |
Em cada coluna dos nutrientes, os valores da média com a mesma letra não diferem entre si de forma significativa (p≤0,05) pelo teste de Scheffé; sm - desvio padrão da média.
Os teores médios de nitrogénio das batatas-doces, nas quatro classes de calibres analisadas, não são significativamente diferentes, sendo o mais baixo (2571 mg kg-1 MF) obtido em raízes de calibre [51-250 g] e o mais alto (3050 mg kg-1 MF) em raízes de calibre ≥451 g (Quadro 3). O teor de nitrogénio (1850 mg kg-1 MF) das batatas-doces produzidas no Cavaleiro é significativamente mais baixo que nas produzidas em Odeceixe (2960 mg kg-1 MF) e em S. Teotónio (3178 mg kg-1 MF), não diferindo estas entre si (Quadro 4).
Fósforo: O teor médio de fósforo determinado na batata-doce ‘Lira’ foi de 401 ± 7 mg kg-1 MF, superior ao teor obtido na polpa da ‘Beauregard’ (300 mg kg-1 MF) por Laurie et al. (2012), mas inferior aos valores médios (540 mg kg-1 MF e 510 mg kg-1 MF) referidos, respetivamente, por Picha (1985) e Bradbury & Holloway (1988) (Quadro 3). Os teores de fósforo das batatas-doces, nas quatro classes de calibres analisados, não são significativamente diferentes. O teor foi tendencialmente mais baixo (384 mg kg-1 MF e 385 mg kg-1 MF) nas batatas-doces de calibre [51-250 g e 251-450 g] e mais alto (454 mg kg-1 PF) nas de calibre ≥451 g (Quadro 3). Observaram-se diferenças significativas no teor de fósforo das amostras provenientes de cada um dos locais de produção, sendo o mais alto (446 mg kg-1 MF) determinado nas batatas-doces produzidas em S. Teotónio e o mais baixo (341 mg kg-1 MF) nas amostras de Cavaleiro (Quadro 4).
Potássio: O teor médio de potássio determinado nas raízes de reserva da ‘Lira’ foi de 3449 ± 59mg kg-1 MF, que é superior aos teores obtidos na polpa da ‘Beauregard’ (2490 mg kg-1 MF e 1691,8 mg kg-1 MF), respetivamente, por Laurie et al. (2012) e Vizzotto et al. (2018). Comparando com os valores médios indicados no Quadro 5 verificamos que o teor de potássio da ‘Lira’ é superior ao teor médio da polpa de diferentes cultivares, sendo apenas inferior aos valores obtidos na polpa e na raiz (4385 mg kg-1 MF e 5940 mg kg-1 MF) por Luis et al. (2014) e Hernández et al. (2016). O teor de potássio das raízes de calibre ≤50 g é significativamente mais baixo que o dos restantes calibres. Não se observaram diferenças significativas entre o teor de potássio das batatas-doces dos restantes calibres (Quadro 3). O teor de potássio (3795 mg kg-1 MF) nas batatas-doces produzidas em S. Teotónio é significativamente mais alto do que nas produzidas em Odeceixe (3384 mg kg-1 MF) e no Cavaleiro (3104 mg kg-1 MF), não diferindo estas entre si (Quadro 4).
Cálcio: O teor médio de cálcio na ‘Lira’ foi de 264 ± 12 mg kg-1 MF que é muito inferior ao da polpa da ‘Beauregard’ (490 mg kg-1 MF) determinado por (Laurie et al., 2012), mas semelhante a 269,3 mg kg-1 MF, obtido por Vizzotto et al. (2018). O teor de cálcio da ‘Lira’ é sempre inferior ao teor médio indicado pelos autores compilados no Quadro 5, refletindo a pobreza em cálcio de troca nos solos deste estudo. O teor de cálcio das raízes de calibre ≤50 g (375 mg kg-1 MF) é significativamente mais elevado que o das restantes classes de calibre, que não diferem significativamente entre si (Quadro 3). O teor de cálcio (356 mg kg-1 MF) das batatas-doces produzidas em S. Teotónio é significativamente mais alto que o das de Odeceixe (203 mg kg-1 MF) e do Cavaleiro (199 mg kg-1 MF), que não diferiram significativamente entre si (Quadro 4).
Magnésio: O teor médio de magnésio determinado na batata-doce ‘Lira’ foi de 240 ± 5 mg kg-1 MF (Quadro 5), que é superior ao teor (210 mg kg-1 MF) obtido por Laurie et al. (2012), mas inferior ao valor (324,5 mg kg-1 MF), referido por Vizzotto et al. (2018), ambos na polpa da ‘Beauregard’. O teor médio de magnésio da ‘Lira’ é idêntico ao valor (244 mg kg - 1 MF) obtido, respetivamente, para a polpa e para a raiz por Montes et al. (2010) e Hernández et al. (2016). Todavia, é superior ao teor obtido na polpa (180 mg kg-1 MF) por Picha (1985) e menos de metade do valor indicado também para a polpa (564 mg kg-1 MF) por Luis et al. (2014) (Quadro 5). O teor de magnésio das batatas-doces de calibre ≤50 g é significativamente superior (p≤0,05) ao dos restantes calibres, entre os quais não se observaram diferenças significativas (Quadro 3). O teor médio de magnésio das batatas-doces produzidas no Cavaleiro (200 mg kg-1 MF) é significativamente mais baixo que nas de Odeceixe (254 mg kg-1 MF) e de S. Teotónio (266 mg kg-1 MF), não diferindo estas entre si (Quadro 4).
Ferro: O teor médio de ferro da ‘Lira’ foi de 4,4 ± 0,23 mg kg-1 MF, inferior aos valores médios indicados na bibliografia para outras cultivares, exceto o referido por Vizzotto et al. (2018) (Quadro 5). Os teores médios de ferro mais elevados observaram-se nas classes de calibre ≤50 g (5,7 mg kg-1 MF) e ≥451 g (3,9 mg kg-1 MF), que não são significativamente diferentes entre si. Os teores mais baixos detetaram-se nas batatas-doces das restantes classes de calibre, mas que não diferiram significativamente entre si (Quadro 3). As batatas-doces dos diferentes locais não apresentaram diferenças significativas entre si, embora o teor de ferro (4,7 mg kg-1 MF) das amostras provenientes de Odeceixe fosse o mais elevado, possivelmente devido ao teor muito alto em ferro dos solos destas parcelas (Quadros 1 e 4).
Manganês: O teor médio de manganês da ‘Lira’ foi de 5,7 ± 0,43 mg kg-1 MF, superior ao da polpa da ‘Beauregard’ (0,3 mg kg-1) (Vizzotto et al., 2018), assim como a todos os valores médios obtidos por outros autores em diferentes cultivares (Quadro 5). O teor médio de manganês das batatas-doces de calibre ≤50 g (8,4 mg kg-1 MF) é significativamente mais elevado que o dos outros calibres. Entre as restantes classes de calibre, o teor foi tendencialmente mais alto no calibre [51-250 g] (4,9 mg kg-1 MF) e o mais baixo no calibre ≥451 g (3,6 mg kg-1 MF) (Quadro 3). Os teores médios de manganês das batatas-doces produzidas no Cavaleiro (7,3 mg kg-1 MF) e em Odeceixe (7,0 mg kg-1 MF) são os mais elevados e significativamente diferente dos teores das produzidas em S. Teotónio (3,5 mg kg-1 MF) (Quadro 4).
Zinco: O teor médio de zinco determinado na ‘Lira’ foi de 2,7 ± 0,14 mg kg-1 MF, que é inferior ao valor obtido por Laurie et al. (2012) (6,9 mg kg-1 MF), na polpa da ‘Beauregard’, mas superior ao teor (0,2 mg kg - 1 MF) referido por Vizzotto et al. (2018). É também superior aos valores médios obtidos por diversos autores em diferentes cultivares, exceto no caso dos valores (5,9 mg kg - 1 MF) e (6,0 mg kg - 1 MF) referidos respetivamente por Bradbury & Holloway (1988) e Laurie et al. (2012) (Quadro 5). Os teores médios de zinco das batatas-doces das quatro classes de calibre analisadas não são significativamente diferentes (Quadro 3). O teor médio de zinco (4,1 mg kg-1 MF) das batatas-doces produzidas em Odeceixe foi significativamente mais alto que os teores das raízes produzidas no Cavaleiro (1,6 mg kg-1 MF) e em S. Teotónio (2,8 mg kg-1 MF) que também diferem entre si (Quadro 4).
Cobre: O teor médio de cobre da ‘Lira’ foi de 1,0 ± 0,05 mg kg-1 MF (Quadro 5), sendo inferior aos resultados de outros autores, exceto no caso da ‘Beauregard’ (0,2 mg kg-1 MF) obtido por Vizzotto et al. (2018). Não se verificaram diferenças significativas entre os teores de cobre nas classes de calibre analisadas, variando este entre 1,2 mg kg-1 MF nas batatas-doces de calibre ≥451 g e 0,9 mg kg-1 MF nos restantes calibres (Quadro 3). No entanto, observaram-se diferenças significativas no teor de cobre das batatas-doces produzidas nos três locais, sendo as de Odeceixe as que apresentaram o teor mais alto (1,7 mg kg-1 MF) e as do Cavaleiro o teor mais baixo (0,5 mg kg-1 MF) (Quadro 4).
Boro: O teor médio de boro na ‘Lira’ foi de 1,3 ± 0,05 mg kg-1 MF, ligeiramente superior ao teor de boro (1,0 mg kg-1 MF) obtido na polpa de batata-doce por Bradbury & Holloway (1988) (Quadro 5). Não se verificaram diferenças significativas entre os teores médios de boro nas diferentes classes de calibre, variando este entre 1,6 mg kg-1 MF no calibre ≥451 g e 1,3 mg kg-1 MF nos calibres [51-250 g] e [251-450 g] (Quadro 3). Foram observadas diferenças significativas nas batatas-doces dos três locais de produção, com o teor mais elevado nas de Odeceixe (1,8 mg kg-1 MF) e o teor mais baixo (1,1 mg kg-1 MF) nas do Cavaleiro (Quadro 4).
Apreciação global: Os resultados obtidos permitem-nos afirmar que a composição mineral da ‘Lira’ não é muito diferente de outras cultivares. As raízes de diferentes calibres só apresentaram uma composição mineral significativamente diferente nos teores de K, Ca, Mg, Fe e Mn, sendo que os teores nas batatas-doces de calibre ≤ 50 g foram superiores aos das restantes classes, no caso do K, Fe e Mn. As batatas-doces com este calibre não são comercializáveis em fresco, podendo ser utilizadas por exemplo para farinhas e alimentação animal. O teor de nutrientes variou com o local de produção refletindo, provavelmente, as diferentes técnicas culturais e a duração média do ciclo cultural (Cavaleiro - 128 dias, Odeceixe - 129 dias e S. Teotónio - 137 dias), que sendo um pouco mais longo em S. Teotónio permitiu que a batata-doce acumulasse mais nutrientes. Embora a fertilidade do solo da parcela de Odeceixe seja ligeiramente superior, não correspondeu a teores mais elevados de macronutrientes nas batatas-doces. A fertirrega, em S. Teotónio, permitiu ajustar melhor a aplicação de fertilizantes ao consumo pela planta, o que poderá ter contribuído para uma maior acumulação de nutrientes na batata-doce.
Composição mineral da parte aérea
Nitrogénio: O teor médio de nitrogénio da ‘Lira’ (17,4 g kg-1 MS) (Quadro 6) é inferior ao valor (19,7 g kg-1 MS) da ‘Nemagold’, sendo este o mais baixo de um conjunto de quatro cultivares obtido por Scott & Bouwkamp (1974). De acordo com Mussoline & Wilkie (2017) a ‘Beauregard’ apresenta um teor de proteína de 141 g kg-1 MS, correspondendo a um teor de nitrogénio de 22,6 g kg-1 MS, superior ao da ‘Lira’. Se compararmos com os valores determinados por Fernandes et al. (2020) para a ‘Canadense’, num ensaio com os tratamentos: testemunha (vegetação espontânea), cultivo prévio de duas leguminosas (Crotalaria spectabilis e Mucuna aterrima) e aplicação de diferentes níveis de nitrogénio (N0, N50, N100 e N200 kg ha-1), o teor de nitrogénio da ‘Lira’ (17,4 g kg-1 MS) é semelhante aos valores observados nos tratamentos: M. aterrima x N0 (17,4 g kg-1 MS) e Testemunha x N200 (17,5 g kg-1MS).
Fração da planta (n = 48) | Nutrientes | ||||||||||
N | P | K | Ca | Mg | Fe | Mn | Zn | Cu | B | ||
(g kg-1 matéria seca) | (mg kg-1 matéria seca) | ||||||||||
Parte aérea | 17,4 ± 0,43 | 1,7 ± 0,05 | 21,2 ± 0,73 | 16,0 ± 0,54 | 7,8 ± 0,22 | 181,0 ±13,00 | 386,9 ± 28,97 | 24,2 ± 1,10 | 9,9 ± 0,54 | 40,5 ± 1,63 | |
Raízes absorventes | 10,1 ± 0,41 | 1,3 ± 0,05 | 10,4 ± 0,44 | 12,3 ± 0,75 | 4,2 ± 0,30 | 772,7 ± 71,80 | 271,6 ± 24,97 | 23,4 ± 1,14 | 8,8 ± 0,47 | 26,1 ±1,70 |
Matéria seca a100 a 105ºC; n - número de observações; sm - desvio padrão da média.
Fósforo: O teor médio de fósforo da ‘Lira’ (1,7 g kg-1 MS) (Quadro 6) é inferior aos valores 2,4 g kg-1 MS (Scott & Bouwkamp, 1974) e 3,6 g kg-1 MS (Mussoline & Wilkie, 2017) obtidos, respetivamente, na ‘Redmar’ e na ‘Beauregard’. Comparando com os resultados observados por Fernandes et al. (2020) para a ‘Canadense’, o teor de fósforo da ‘Lira’ é igual ao observado nos tratamentos: Testemunha x N0 e Testemunha x N100.
Potássio: O teor médio na parte aérea da ‘Lira’ (21,2 g kg-1 MS) (Quadro 6) é inferior aos valores obtidos na ‘Nemagold’ (29,1 g kg-1 MS) e na ‘Beauregard’ (31,4 g kg-1 MS), referidos por Scott & Bouwkamp (1974) e Mussoline & Wilkie (2017), respetivamente. Comparando com os resultados observados por Fernandes et al. (2020) para a ‘Canadense’, o teor de potássio da ‘Lira’ é igual ao obtido com o tratamento: M. aterrima x N200.
Cálcio: O teor médio da parte aérea da ‘Lira’ (16,0 g kg-1 MS) (Quadro 6) é superior ao valor obtido na ‘Centennial’ (14,6 g kg-1 MS) por Scott & Bouwkamp (1974) e ao valor mais alto observado na ‘Canadense’ (9,2 g kg-1 MS), no tratamento: C. spectabilis x N100 (Fernandes et al., 2020). Porém, foi praticamente igual ao teor obtido para a ‘Beauregard’ (15,9 g kg-1 MS), por Mussoline & Wilkie (2017).
Magnésio: O teor médio de magnésio da parte aérea da ‘Lira’ (7,8 g kg-1 MS) (Quadro 6) é superior ao valor (4,3 g kg-1 MS) obtido na ‘Centennial’ e na ‘Beauregard’, respetivamente, por Scott & Bouwkamp (1974) e Mussoline & Wilkie (2017). A ‘Lira’ apresentou também um teor superior ao valor mais alto (5,4 g kg-1 MS) observado para a ‘Canadense’, no tratamento: C. spectabilis x N100, por Fernandes et al. (2020).
Ferro: O teor médio de ferro da parte aérea da ‘Lira’ (181,0 mg kg-1 MS) (Quadro 6) é muito superior ao valor (58 mg kg-1 MS) determinado na ‘Beauregard’, por Mussoline & Wilkie (2017). Porém, é inferior aos valores obtidos na ‘Centennial’ (256 mg kg-1 MS) e na ‘Canadense’ (818 mg kg-1 MS, no tratamento: C. spectabilis x N200) (Scott & Bouwkamp, 1974; Fernandes et al., 2020).
Manganês: O teor médio da ‘Lira’ (386,9 mg kg-1 MS) (Quadro 6) é muito superior ao valor apresentado para a ‘Beauregard’ (51,7 mg kg-1 MS), por Mussoline & Wilkie (2017), assim como aos teores na ‘Centennial’ (269 mg kg-1 MS) e na ‘Canadense’ (109,6 mg kg-1 MS, no tratamento: C. spectabilis x N200) obtidos respetivamente, por Scott & Bouwkamp (1974) e Fernandes et al. (2020).
Zinco: O teor médio da parte aérea da ‘Lira’ (24,2 mg kg-1 MS) (Quadro 6) é superior aos valores observados para a ‘Beauregard’ (14,3 mg kg-1 MS) e para a ‘Canadense’ (23,8 mg kg-1 MS, no tratamento: C. spectabilis x N100) respetivamente, por Mussoline & Wilkie (2017) e Fernandes et al. (2020).
Cobre: O teor de médio da ‘Lira’ (9,9 mg kg-1 MS) (Quadro 6) é superior ao valor observado na ‘Beauregard’ (4 mg kg-1 MS) por Mussoline & Wilkie (2017), mas inferior ao obtido na ‘Canadense’ (10,7 mg kg-1 MS, no tratamento: Testemunha x N0), por Fernandes et al. (2020).
Boro: O teor médio da parte aérea da ‘Lira’ (40,5 mg kg-1 MS) (Quadro 6) é inferior ao valor mais baixo de um conjunto de quatro cultivares obtido na ‘Redmar’ (45 mg kg-1 MS), por Scott & Bouwkamp (1974).
Apreciação global: Os resultados obtidos na composição mineral da parte aérea da ‘Lira’ não diferem muito dos de outras cultivares, no entanto, os teores de nitrogénio e de potássio são inferiores, exceto na ‘Canadense’ e os de cálcio e magnésio são superiores. Relativamente aos micronutrientes o padrão não é uniforme. O potássio e o manganês foram o macro e o micronutriente com os teores mais elevados.
Composição mineral das raízes absorventes
As raízes absorventes da ‘Lira’ apresentaram teores médios de nutrientes inferiores ao da parte aérea, exceto de ferro. O cálcio (12,3 g kg-1 MS) e o ferro (772,7 mg kg-1 MS) são, respetivamente, o macronutriente e o micronutriente presentes em maior quantidade (Quadro 6). O cálcio foi também o macronutriente absorvido em maior quantidade pela ‘Canadense’ (Echer et al., 2009).
Exportação de nutrientes pela batata-doce
Com base na composição mineral das raízes de reserva (Quadro 5), determinou-se a exportação média de nutrientes por tonelada de matéria fresca da batata-doce ‘Lira’: 2,65 kg t-1 de N; 0,40 kg t-1 de P; 3,45 kg t-1 de K; 0,26 kg t-1 de Ca; 0,24 kg t-1 de Mg; 4,4 g t-1 de Fe; 5,7 g t-1 de Mn; 2,7 g t-1 de Zn; 1,0 g t-1 de Cu; 1,3 g t-1 de B.
CONCLUSÕES
Os resultados obtidos confirmaram que a batata-doce ‘Lira’ apresenta baixas produções, relativamente a outras cultivares. No entanto, a certificação como ‘Batata-doce de Aljezur’, faz dela uma referência para o consumidor. A produção média de batatas-doces com calibre ≥51 g foi de apenas 500,2 g por planta. Apresentaram um teor de matéria seca superior a 30 %, o que de acordo com alguns autores constitui uma boa característica para uma cultivar poder ser utilizada na indústria. À colheita, 67 % da matéria seca total por planta encontrava-se nas raízes de reserva, 27 % na parte aérea e a restante nas raízes absorventes.
A composição mineral em macronutrientes da batata-doce, por ordem decrescente, foi K > N > P > Ca > Mg e da parte aérea K > N > Ca > Mg > P. A composição mineral em micronutrientes nas duas frações da planta, por ordem decrescente, foi Mn > Fe > Zn > B > Cu. O potássio e o manganês foram, respetivamente, o macro e o micronutriente presentes em maior quantidade nas raízes de reserva e na parte aérea. Nas raízes absorventes o cálcio e o ferro foram, respetivamente, o macro e o micronutriente com teores mais elevados. Por ordem decrescente, a composição mineral nas raízes absorventes foi Ca > K > N > Mg > P > Fe > Mn > B > Zn > Cu.
A composição mineral da batata-doce variou pouco com a classe de calibre. As de calibre ≤50 g apresentavam teores significativamente menores de K, Mg e Mn e maiores de Ca. Nos restantes calibres, embora se observasse que as da classe ≥451 g apresentavam teores tendencialmente mais elevados de nutrientes (exceto Mn), as diferenças não eram significativas.
A composição mineral da batata-doce apresentou diferenças significativas entre os vários locais de produção, exceto no teor de ferro. Estas diferenças resultaram não tanto do tipo de solo (de baixa fertilidade natural em todos os locais), mas provavelmente das práticas culturais utilizadas, nomeadamente da fertilização. A maior duração do ciclo cultural em S. Teotónio também pode ter contribuído para uma maior acumulação de macronutrientes.
Destaca-se a elevada quantidade de potássio exportado pela batata-doce, sendo superior à de nitrogénio em cerca de um terço e quase nove vezes a de fósforo.
No futuro, mais estudos deverão ser realizados, nomeadamente ensaios de fertilização, para conhecer a resposta da produção a diferentes níveis de nutrientes, de modo a aperfeiçoar as recomendações de fertilização e a aumentar a eficiência da utilização dos fertilizantes.