INTRODUÇÃO
Num mundo em constante transformação, onde continuamente surgem novos desafios, é imperativo conhecer, compreender e acompanhar a nova revolução tecnológica. Esta, de forma célere, está a alterar hábitos, comportamentos, relacionamentos e a forma de trabalhar na sociedade em geral. O sector da saúde será um dos que absorverá o maior impacto desta transformação, que apesar de estar no seu início, é inequívoco que no futuro o mundo jamais será igual ao que conhecemos hoje.
O termo E-saúde é frequentemente usado para abranger o uso de informações e tecnologias de comunicação no tratamento de utentes, diagnóstico de doenças, informação e comunicação com os utentes ou outros serviços de saúde, conduzindo pesquisas e apoiando o aconselhamento1.
As intervenções automáticas via telemóvel têm sido amplamente usadas para amplificar a comunicação perioperatória, proporcionar o acompanhamento e reduzir a ocorrência de eventos adversos pós-operatórios2-4. Paralelamente, a Internet proporciona a utilização de intervenções comportamentais que têm sido utilizadas na telerreabilitação, especialmente nas áreas rurais5.
As intervenções educacionais, proporcionadas pela E-saúde, podem também ser definidas como intervenções pedagógicas, verbais ou escritas, com ênfase no conhecimento e arquitetadas para transmitir informações6.
A E-saúde está a transformar drasticamente a oferta de cuidados de saúde e simultaneamente proporciona o atendimento mais individualizado e estimula o envolvimento ativo do utente7.
Na educação do utente do foro ortopédico, as soluções pedagógicas com recurso à internet podem ser alternativas económicas às intervenções educacionais atuais, medidas pela aquisição de conhecimento, satisfação e feedback do utente, ansiedade, capacitação, autoeficácia e atitudes de saúde, autogestão e mudança de comportamento, bem como resultados clínicos8.
De salientar que o uso de dispositivos inteligentes e a Internet está a tornar-se cada vez mais comum entre a população idosa.
Atualmente, em todo o mundo, o número de utilizadores de smartphones ultrapassa os três biliões e está previsto crescer exponencialmente em várias centenas de milhões nos próximos anos. Em Portugal, o número de pessoas que utilizarão smartphones em 2025 está projetado para atingir 7,9 milhões, conectados à internet9.
As aplicações móveis em saúde apresentam um grande potencial de transformação dos comportamentos do utente em áreas que afetam a saúde, como melhorar implementação de programas de tratamento e medicamentos prescritos, ou adesão às instruções e recomendações10. As aplicações móveis mostram-se como um meio facilitador do atendimento centrado no utente, fornecendo suporte personalizado, melhorando a segurança, auxiliando as interações com os prestadores de cuidados e aperfeiçoando as transições no atendimento em todo o sistema11.
As soluções tecnológicas por via de APP não devem ser encaradas como uma oportunidade para substituir o cuidado humano; em vez disso, as aplicações móveis podem melhorar o serviço fornecido ao proporcionar a capacitação dos utentes e melhorar a continuidade dos cuidados nos mais diversos ambientes8.
O aumento da capacidade de computação e da conectividade via dispositivos móveis levou ao surgimento de uma subdivisão da saúde eletrónica, denominada e difundida como Saúde Móvel (mHealth) que transformam o modo e a qualidade da pesquisa clínica e da assistência de saúde à escala mundial.
A telessaúde apresenta-se como uma condição essencial à transformação digital que o Sistema de Saúde Português atravessa, com ganhos evidentes reconhecidos a nível internacional. A prestação de cuidados de saúde através de teleconsultas permite levar o Serviço Nacional de Saúde a todos os cidadãos, eliminando quaisquer barreiras geográficas13.
Vários autores refletiram sobre a necessidade de gerir as doenças a longo prazo tendo em vista a melhoria da qualidade de vida dos utentes, prevenindo incapacidades e problemas adjacentes. Estes autores reforçam a importância da saúde digital, da telemedicina e da telerreabilitação14. À luz deste pensamento, as novas tecnologias aliadas à saúde, proporcionam o fornecimento de consultas, tratamentos e a monitorização da saúde, mostrando “resultados positivos, viabilidade, eficácia e satisfação do paciente na gestão da sua doença”14. Na mesma linha de pensamento, num estudo realizado com o objetivo de investigar os efeitos da telerreabilitação após procedimentos cirúrgicos ortopédicos, concluiu-se que existem fortes evidências a favor da telerreabilitação em utentes que realizaram Artroplastia Total do Joelho15.
No serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa (CHTS), anualmente são realizadas cerca de 220 artroplastias totais do joelho (ATJ), em que os utentes permanecem internados em média 3 a 5 dias. O Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa abrange 5% da população portuguesa (540 mil habitantes), em 12 concelhos de quatro distritos, distribuídos por dois mil quilómetros quadrados.
Pela experiência, identificou-se a necessidade e oportunidade do desenvolvimento de uma solução tecnológica que permita melhorar o conhecimento dos utentes e seus cuidadores de forma a fomentar a Literacia em saúde e a permitir uma adequada capacitação pré-operatória de forma a dar ferramentas para uma melhor gestão da recuperação pós-operatória e reabilitação funcional. A equipa de enfermagem de reabilitação, munida de competências específicas, assume neste cenário um papel essencial no alcance da máxima autonomia destes utentes e na reintegração no seu quotidiano.
MÉTODO
Iniciou-se a construção do Programa de reabilitação, apelidado de +PERTO, Programa de Enfermagem de Reabilitação Tecnológico, passível de ser incorporado numa aplicação móvel (APP). Após apresentação da proposta do projeto ao Conselho de Administração do CHTS, e este ser aprovado, assinalou-se a importância deste ser acoplado na aplicação MyCHTS já desenvolvida e implementada.
O +PERTO será um módulo disponível a todos os utentes elegíveis para ingressarem no programa de reabilitação tecnológico.
Uma vez que o CHTS não tinha recursos para desenvolver o software necessário, procurou-se uma empresa externa com grande experiência no desenvolvimento de soluções tecnológicas para fins de saúde e hospitalares.
Tendo em conta a vasta experiencia da equipa de Enfermagem em cuidados de reabilitação nos doentes submetidos a ATJ, o recurso a peritos na área da reabilitação e a relatos (feedback) de utentes e cuidadores, foi possível, através da metodologiaPDCA (Plan - Do - Check -Action)desenhar e desenvolver todas as fases e secções do +PERTO.
A imagem gráfica do +PERTO está registada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e o programa de reabilitação na Inspeção Geral das Atividades Culturais (IGAC).
Os objetivos são:
- Desenvolver um Programa de reabilitação digital, acompanhado de canal comunicacional e monitorização para utentes submetidos a ATJ desde o período pré-operatório até às primeiras seis semanas do pós-operatório.
- Aumentar e melhorar a literacia em saúde dos utentes e seus cuidadores, aumentar a conectividade com a equipa de saúde e fomentar a tomada de decisão.
- Aumentar a satisfação dos utentes nos cuidados de saúde e nos cuidados de Enfermagem de Reabilitação.
RESULTADOS ESPERADOS
O Programa +PERTO conta com 4 secções fundamentais:
Programa de exercícios dirigidos à reabilitação da ATJ, dividido em 3 fases:
Uma secção de informações uteis, que são fornecidas de forma gradual ao longo do programa e com sistema de feedback que permite à equipa de reabilitação saber se o utente assimilou a informação ou se por sua vez necessita de esclarecimentos adicionais por parte da equipa;
Secção de monitorização e acompanhamento on-time.
Uma secção ‘’Fale com o Enfermeiro de Reabilitação’’, que funciona como um canal comunicacional, mas também permite assistir o utente e cuidador na tomada de decisão em aspetos tais como: dor, edema e ferida cirúrgica. Todos os contatos serão respondidos pela equipa de enfermagem de reabilitação de serviço, já que dispõem de 12 horas de Enfermagem de reabilitação, 7 dias por semana. Esta funcionalidade permite ainda a realização de videochamada para acompanhamento de exercícios em tempo real.
Esta aplicação permite em on-time, através de indicadores de ação, acompanhar o desempenho e receber feedback à medida que a aplicação é usada pelos participantes através das suas respostas a questionários e formulários. Está criado um alerta em caso do utente apresentar dor ‘’catastrófica’’ que permite conhecer o que despoletou a dor e atuar no seu controlo. Os utentes são elucidados a identificar sinais e sintomas de alerta para saberem quando devem procurar ajuda diferenciada. Permitindo que estes controlem melhor a dor, o edema, e ferida cirúrgica; serão mais capazes de participar ativamente e com proveito no programa de exercícios de reabilitação estipulado e aumentar a sua capacidade para o autocuidado, permitindo uma eficaz preparação e efetivo conhecimento pré-operatório, alcançando os melhores resultados de recuperação possíveis.
A identificação precoce de sinais e sintomas, permitirá a atempada deteção e monitorização de complicações pós-operatórias com o objetivo de diminuir a taxa de infeções e reinternamentos.
Ao longo do programa, os utentes e seus cuidadores são munidos de recomendações, estratégias e técnicas que lhes dão as ferramentas necessárias para uma melhor transição no processo saúde/ doença que estão a experienciar. Recebendo informações credíveis, selecionadas e fracionadas, são capazes de aumentar a sua consciencialização da real recuperação, funcionalidade e expectativas pós-operatórias.
É espectável que a utilização do +PERTO permita reduzir o número de contatos para o hospital/ serviço em geral, possibilitando um efetivo aproveitamento da equipa de saúde e dos recursos hospitalares.
CONCLUSÃO
Atendendo à extensa área de abrangência e grande distribuição de população, esta APP possibilita que os habitantes possam receber cuidados de saúde através das novas tecnologias, reduzindo assim as barreiras geográficas que a distância e os difíceis acessos da região do Tâmega e Sousa apresenta.
Numa área de intervenção tão específica como a enfermagem de reabilitação onde o contato físico, o apoio, a inspeção, o toque e o olhar são apenas algumas ferramentas que os enfermeiros se fazem valer na arte de cuidar e reabilitar; os desafios da tecnologia na saúde surgem no mínimo como desafiantes e que fazem questionar premissas até então dadas como certas. Mas, é inequívoco que, não substituindo qualquer cuidado prestado pelo enfermeiro ou por outro profissional de saúde, a tecnologia vem acrescentar valor num novo paradigma da saúde onde se pretende ultrapassar barreiras, vencer preconceitos e atingir a universalidade.
Ainda no presente, mas com projeção num futuro que se prevê com serviços de saúde personalizados, próximos e num tempo que corresponda às necessidades dos utentes, a enfermagem de reabilitação que aqui se personifica, pretende estar na vanguarda com a utilização concomitante das novas tecnologias e assim estar +Perto.