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Psicologia

versão impressa ISSN 0874-2049

Psicologia vol.16 no.2 Lisboa jul. 2002

https://doi.org/10.17575/rpsicol.v16i2.482 

Identidade racial e preferência em crianças brasileiras de cinco a dez anos

Racial identity and preference in 5 to 10 years old brazilian children

Dalila Xavier de França*; Maria Benedicta Monteiro**

*,** Centro de Investigação e Intervenção Social do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa.

 


RESUMO

Neste artigo analisam-se o efeito da cor da pele e da idade sobre a identidade e a preferência raciais de 238 crianças brasileiras brancas, negras e mulatas de cinco a dez anos. As variáveis dependentes foram a categorização racial, a auto-identificação racial, a avaliação emocional da pertença e a preferência. Os resultados indicam que a maior parte das crianças categoriza os seus pares de acordo com a raça. Em relação à auto-identificação racial, as crianças negras e mulatas são as que menos se auto-identificam correctamente. Relativamente à avaliação emocional da pertença, verificamos que as crianças negras de cinco a seis anos são as que menos gostam de ser como são e que mais gostariam de ser diferentes. Outras análises (ACM) mostraram que as crianças negras de cinco a oito anos são as que mais se percebem como negras, e que as crianças negras de nove e dez anos são as que mais se percebem como mulatas e gostam de ser o que acham que são. Em relação à preferência, verifica-se que a criança branca é a preferida, seguida da mulata, enquanto a negra é preterida. Os resultados são interpretados e discutidos à luz da teoria da identidade social e do racismo na infância.1

Palavras-chave Identidade racial, autocategorização, preferência social e branqueamento.


ABSTRACT

This paper analyses the effects of skin colour and age on social identity and racial preference among 238 white, mulatto and black brazilian children aged from 5 to 10 years old. Racial categorisation, racial self-identification, emotional evaluation of racial belonging and peer-preference were used as dependent measures. Results showed that the majority of children categorise their peers correctly, according to their race. Racial self-categorisation was mostly biased in black and mulatto children. Other analyses showed that black children, aged from 5 to 8, perceived themselves mostly as Blacks, while older black children perceived themselves as mulatto and liked to be what they thought they were. Concerning emotional evaluation, black children, aged 5 to 6, identified less with their ingroup than older ones. Concerning social preference, the white target was the most preferred, followed by the mulatto one, while the black target was the less preferred. These results are discussed within the social identity theory framework and racism in childhood.

 


Introdução

Na extensa literatura da psicologia social sobre a identidade social e as relações intergrupais (Tajfel, 1978a; 1981; Tajfel & Turner, 1986; Turner & Brown, 1978), pouca atenção tem sido dada ao tema da construção e gestão da identidade de grupos étnicos e raciais minoritários (Clark & Clark, 1955; Outton, Singer & Devlin, 1998; Frledman, 1980; Holmes, 1995; Hutnik, 1991). Especialmente no Brasil praticamente não existem pesquisas empíricas relativas a este tema, constituindo excepção os trabalhos de Oliveira (1998) e Lima (no prelo). Esta limitação num mundo no qual os contactos entre os grupos humanos e os conflitos étnicos marcam a vida social é, certamente, problemática.

Neste estudo analisam-se a identidade e a preferência raciais em crianças brasileiras brancas, negras e mulatas de cinco a dez anos. A identidade racial é entendida na perspectiva da teoria da identidade social de Tajfel (1978a), como a parcela do autoconceito da criança que deriva do conhecimento da sua pertença a uma categoria racial, juntamente com o significado emocional e de valor associado a essa pertença. A preferência pode ser entendida como a disposição pessoal para estabelecer relações com alguém do próprio ou de outros grupos raciais (Miiner, 1973). Foge ao âmbito deste estudo discutir as justificadas controvérsias inerentes ao termo raça. Este termo é usado aqui no sentido de Ramsey (1987: 56-72) "para identificar grupos humanos que são discernidos por características físicas convencionalmente definidas como diferenças raciais ... referindo-se a diferenças na cor da pele, tipo de cabelo e estrutura facial..."

Identidade social e identidade racial

A noção de identidade é central na compreensão e explicação das interacções e relações entre os grupos (Murrell, 1998). É através de experiências directas e indirectas que os indivíduos vão construindo a sua identidade (Tajfel & Tumer, 1986). Parte da identidade é formada nas (e pelas) relações sociais dos indivíduos, e está associada à pertença a categorias sociais ou grupos de pessoas. Esta identidade, denominada por Tajfel (1978a) identidade social, é definida como a "parcela do autoconceito do indivíduo que deriva do seu conhecimento da sua pertença a um grupo (ou grupos) social, juntamente com o significado emocional e o valor associado àquela pertença" (Tajfel, 1981: 290).

O critério determinante da pertença é que os indivíduos se definam e sejam definidos pelos outros como membros de um determinado grupo (Tajfel & Turner, 1986). A pertença do indivíduo a um grupo atinge o seu significado quando comparada com a avaliação das diferenças entre esse e outros grupos. De modo que esses outros grupos são um instrumento e um pretexto para a construção, manutenção e defesa da identidade social (Monteiro & Ventura, 1997). A comparação pode resultar em uma identidade social positiva, na preservação e valorização da identidade e favoritismo do próprio grupo, caso o grupo seja avaliado positivamente; ou em uma identidade social negativa, caso a avaliação do próprio grupo seja negativa (Tajfel, 1978a; Tajfel, 1981; Tajfel & Turner, 1986). Existe uma tendência dos indivíduos para manter ou acentuar a auto-estima pela valorização da identidade social (Tajfel & Turner, 1979). Nas relações entre grupos sociais a acentuação da auto-estima dá-se pela comparação do próprio grupo com outros e valorização do seu grupo em detrimento dos outros grupos (Tajfel, 1978a).

Como afirma Tajfel (1978a; 1981), os indivíduos apresentam várias identidades conforme os grupos nos quais estejam inseridos. Uma maneira através da qual o indivíduo pode distinguir a sua identidade é em termos de grupos raciais. Muitos autores afirmam que, desde cedo na vida, o indivíduo é capaz de se definir em termos da pertença a grupos raciais e mostra-se activo na aprendizagem e compreensão desta inserção (Aboud, 1988; Allport, 1954; Brown, 1995; Clark & Clark, 1955; Clark & Cook, 1988; Hirschfeld, 1996; Katz, 1983; Rotheram & Phinney, 1987; Ramsey, 1987; Tajfel, 1972; 1978a; 1981). Por exemplo, Holmes (1995) afirma que na primeira infância as crianças já se definem em termos da pertença a um grupo racial. O seu estudo foi baseado na observação de crianças americanas brancas e negras do jardim de infância, através do desenho do auto retrato da criança. Ela observou que as crianças negras enfatizavam com clareza a própria cor da peie quando descreviam o seu auto-retrato. Entretanto, as crianças brancas referiam-se mais a outros atributos em suas auto-descrições, do que à cor da peie.

A identidade é composta por várias dimensões que variam de um pólo individual e privado para um pólo intergrupai, público e contextuai (Jackson & Smith, 1999; Trew & Benson, 1996). Estas dimensões englobam aspectos tanto cognitivos e emocionais quanto motivacionais (ver Smith, 1997, para uma revisão). Para Rotheram ei aí. (1987), a identidade racial ou étnica é composta pelas seguintes dimensões: consciência étnica (consiste na compreensão por parte da criança do próprio grupo étnico e do dos outros); auto-identificação étnica (refere-se à aquisição de um rótulo étnico preciso e consistente, baseado na auto percepção enquanto membro de um grupo étnico; salienta-se, entretanto, que o rótulo étnico válido é aquele que os outros atribuem ao indivíduo); atitudes éticas (são os sentimentos relativos ao próprio e aos outros grupos, que resultam em maneiras específicas de responder aos mesmos); e os comportamentos étnicos (referem-se aos comportamentos sociais padrão e específicos de um determinado grupo). Diversas investigações têm sido feitas utilizando estes componentes em conjunto ou isoladamente, com o objectivo de analisar a identidade dos grupos, ora sob a designação "racial" ora "étnica" (Aboud, 1988; Dutton, Singer & Devlin, 1998; Friedman, 1980; Hirschfeld, 1996; Hutnik, 1991; Milner, 1973; 1983; 1984; Ramsey, 1987).

Já Ellemers, Kortekaas e Ouwerkerk (1999) propõem que a identidade social possui três dimensões distintas, uma cognitiva, outra avaliativa, e ainda a emocional. A dimensão cognitiva é composta pela autocategorização, que os autores definem como a consciência cognitiva da pertença de alguém a um grupo social. A dimensão avaliativa é representada pela auto-estima, que consiste na conotação de valor positivo ou negativo associado ao grupo social. E por fim, a dimensão emocional é composta pelo compromisso emocional, que consiste no envolvimento emocional com o grupo.

No presente estudo, utilizaremos um conjunto de componentes mais próximos daqueles de Ellemers et al. (1999). Assim, utilizaremos os seguintes componentes: a) a categorização racial; b) a autocategorização; e c) a avaliação emocional da pertença.

A categorização racial

A categorização racial refere-se à capacidade da criança para distinguir as pessoas em termos dos seus traços físicos de natureza racial, tais como a cor da pele, o tipo de cabelo e a estrutura facial (Brown, 1995; Ramsey, 1987; Rotheram et al, 1987). A identidade racial pressupõe conhecimento de que o mundo social é organizado em grupos raciais (Katz, 1983). Assim, a criança necessita de ser capaz de distinguir os grupos e aprender que características são relevantes para a inclusão ou a exclusão de alguém num determinado grupo (Katz, 1983). Isto é possível através do processo de categorização (Tajfel, 1972; 1978a), o qual considera a acentuação de similaridades das características dos objectos dentro de uma mesma categoria, e de diferenças entre características dos objectos em categorias diferentes, critério para distinguir objectos sociais e não sociais e organizar o mundo social. O efeito de acentuação é tanto mais pronunciado quanto a categorização 6 relevante e saliente para o indivíduo (ver Abrams & Hogg, 1988).

O processo de categorização racial é o primeiro passo na formação de atitudes raciais, quer positivas, quer negativas (Aboud, 1988; Goodman, 1964; Katz, 1976; Tajfel, 1981). Allport (1954) afirma que muito cedo as crianças apresentam curiosidade e interesse quanto às diferenças raciais, de modo que, os primeiros indícios da categorização racial podem estar na observação por parte da criança de que algumas peles são brancas e outras negras.

Aos três anos de idade as crianças podem identificar, classificar e rotular pessoas por grupos raciais (Aboud, 1988; Allport, 1954; Brown, 1995; Clark et al., 1955; 1988; Holmes, 1995; Katz, 1983; Rotheram et al, 1987; Ramsey, 1987; Tajfel, 1972; 1978a; 1981). Contudo, a categorização de pessoas por raça é influenciada por factores situacionais e do desenvolvimento cognitivo da criança (Ramsey, 1987). Do Angulo situacional, os contactos sociais prévios que as crianças mantêm com pessoas de outras raças e a saliência da raça na situação podem determinar as categorizações (Allport, 1954; Ramsey, 1987). Do ângulo do desenvolvimento, apesar de as crianças já aos três anos de idade usarem as características raciais para categorizarem os grupos (Katz, 1983), a posterior aquisição de capacidades cognitivas, como a reversibilidade e a descentração (ver Piaget, 1964; Piaget & Inhelder, 1998), permite-lhes classificações desta espécie mais rigorosas. De facto, Ramsey (1987) explica a tendência de crianças pequenas para categorizarem uma criança caucasiana de pele mais escura como negra, com base na incapacidade de descentração das crianças, de modo que a saliência de uma característica determinou por si só a categorização.

Clark e Clark (1955) estudaram a categorização racial em crianças negras americanas de três a sete anos. Eles utilizaram como material estímulo quatro bonecas, duas castanhas e de cabelos pretos, e outras duas brancas e de cabelos amarelos. Os resultados indicam que 75% das crianças de três anos e mais de 90% das de cinco anos, já categorizavam correctamente os grupos raciais. Outros estudos confirmam que a categorização racial correcta está presente por volta dos três anos (Clark & Cook, 1988; Katz & Zalk, 1975).

Dutton, Singer e Devlin (1998) estudaram crianças euro-americanas, afro-americanas e hispânicas, de oito a onze anos de idade, que estudavam em escolas racialmente segregadas e integradas nos EUA, com o objecti vo de verificar se as crianças distinguiam figuras de pessoas dos três grupos. Não observaram diferenças significativas entre as escolas ou em termos da capacidade das crianças para distinguir as figuras correctamente. As figuras afro-americanas foram distinguidas correctamente 91% das vezes, as euro-americanas 98% das vezes, e as hispânicas foram 91% das vezes.

Friedman (1980) estudou a categorização racial em crianças do jardim de infância, e do primeiro e terceiro anos de escolas segregadas e integradas nos EUA. Utilizando a metodologia de Clark e Clark (1955), observou que mais de 90% das crianças brancas foram capazes de escolher correctamente as bonecas "branca", "de cor"(coloured) e "negra" (black), e 89% a boneca "preta" (negro). Todos os sujeitos do terceiro ano apresentaram capacidade de categorização racial. Entretanto, no jardim de infância e no primeiro ano (quatro a seis anos), aproximadamente 6% das crianças erraram na distinção da boneca "branca", 9% da boneca "de cor" (co-loured), 6% a boneca 'negra' (black), e 17% da boneca "preta" (negro).

Uma última observação sobre a categorização racial consiste no facto de que, à medida que as crianças percebem as diferenças raciais, percebem também, ainda que de modo rudimentar, o estatuto social relativo dos diferentes grupos. O estatuto relativo dos grupos deriva da comparação intergrupal: quando um grupo pode ser positivamente distinguido de outros grupos relevantes ele tem alto estatuto; entretanto, quando o resultado da comparação intergrupal é negativo, o grupo é considerado como possuindo um estatuto baixo (Ellemers, 1993). Ao tomar consciência do estatuto do seu grupo social de pertença, a criança é envolvida numa grande rede de emoções, conflitos e desejos, os quais são parte do crescimento do seu conhecimento do que a sociedade pensa sobre o seu grupo racial (Clark & Cook, 1988).

Autocategorização racial

Seguindo Ellemers et al. (1999),2 definimos a autocategorização como o conhecimento por parte do indivíduo da sua pertença a um grupo racial. Acrescentamos a esta definição a ideia contida no conceito de auto-identificação étnica de Rotheram et al. (1987), de que o grupo de pertença do indivíduo deve ser aquele que as outras pessoas atribuem a ele, uma vez que, se ignoramos esse aspecto, a escolha da categoria racial para a autodefinição de alguém seria correcta para qualquer grupo ao qual o indivíduo escolhesse pertencer. Ter em conta a opinião das outras pessoas, limita as possibilidades de escolha do indivíduo, de modo a considerar a sua autoclassificação como condicionada à escolha de uma categoria particular, àquela que os outros atribuem a ele ou a categoria socialmente convencionada.

Noactual estado de revisão bibliográfica, não temos conhecimento de estudos que tenham utilizado o conceito de autocategorização relacionado a identidade de grupos raciais. Há apenas alguns estudos que relacionam o conceito de autocategorização com reações emocionais de minorias étnicas e preconceito (e.g. Verkuyten e Hagedoom, 1998; Verkuyten, Drabbels & van den Nieuwenhuijzen, 1999).

A autocategorização tem estreita relação com o estatuto social do grupo; uma vez que os indivíduos lutam por uma identidade social positiva, provavelmente resitirão a identificar-se com grupos de baixo estatuto ou tentarão mudar a sua filiação. Entretanto, outras variáveis scioestruturais além do estatuto relativo influenciam a aceitação do grupo de pertença. Para Tajfel (1978a), os membros de grupos de baixo estatuto tendem a examinar a possibilidade de mudança pessoal para um grupo de alto estatuto se as fronteiras do grupo forem permeáveis, isto é, se houver possibilidade de mudar a sua filiação grupai. Ellemers (1993) demonstrou que, quando membros de grupos de baixo estatuto percebem que as fronteiras do grupo são permeáveis, apresentam fraca identificação endogrupal.

As investigações na área da autocategorização em crianças, anteriores à década de 80, evidenciavam a aceitação da categorização social convencional entre as crianças de estatuto social alto (e.g., crianças brancas na América do Norte e Europa), enquanto as de estatuto social baixo (e.g., crianças negras e outras minorias) apresentavam rejeição e procuravam negar a categoria socialmente convencionada (Clark et al, 1955,1988; Katz, 1983; Milner, 1973; 1983; 1984). Katz (1983) afirma que o estatuto relativo que a sociedade confere aos grupos é reflectido nos sentimentos das crianças sobre seu próprio grupo: crianças que pertencem a grupos de alto estatuto social (crianças do sexo masculino e crianças brancas) raramente desejam ser de grupos de baixo estatuto (sexo feminino ou negra).

Com o advento dos movimentos black power e black's beutiful nos EUA, observou-se o aumento da autocategorização racial em crianças negras (Dutton, Singer & Devlin, 1998; Friedman, 1980). Contudo, Ramsey (1987) salienta, com base nas observações de crianças negras também nos EUA, que embora as crianças se auto-categorizem como negras, elas enfatizam que não têm a pele tão escura quanto alguns dos seus colegas negros. Parece, pois, que estas crianças estão utilizando uma estratégia para valorizar a sua identidade, comparando-se com o próprio grupo numa dimensão diferente (Blantz, Mummendey, Mielke & Klink, 1998; Turner & Brown, 1978; Tajfel, 1978b).

Aboud (1977; 1980; 1988) verifica, ainda nos EUA, que a auto categorização racial torna-se mais consistente com o aumento da idade. Assim, crianças brancas, já aos três anos de idade apresentaram cerca de 75% de capacidade autocategorização, aos quatro e cinco anos de idade crianças brancas autocategorizam-se como brancas em torno de 70 a 80 % das vezes, e estes valores elevam-se para cerca de 100% aos seis e oito anos de idade. Com relação às crianças de baixo estatuto, Aboud afirma que aos três anos de idade as crianças negras são capazes de autocategorizarem-se. Contudo, a autocategorização não é forte nas idades iniciais (três a cinco anos), já aos seis e sete anos de idade a capacidade de autocategorização entre estas crianças chega a 80%; e raramente excede os 90% dos oito a dez anos de idade. Com efeito, Milner (1973), estudando crianças inglesas, paquistanesas e indianas de cinco a oito anos na Inglaterra, encontrou 100% de autocategorização correcta entre as crianças inglesas. Já nas crianças indianas este valor foi de 76% e nas paquistanesas este índice caiu para 52%.

Observa-se com base nesses estudos um quadro de autocategorização diferenciado entre grupos de baixo e alto estatuto. Nas crianças de grupos de alto estatuto a autocategorização é forte; enquanto que as crianças de grupos de baixo estatuto apresentam uma tendência para a rejeição da categoria de pertença.

De facto, algumas interpretações dos resultados relativos à autocategorização caem no âmbito da valorização social atribuída às categorias. Por exemplo, Milner (1973; 1981; 1983) afirma, a respeito da fraca autocategorização em crianças indianas e paquistanesas, que naquelas comunidades a cor branca representa um passaporte para grandes oportunidades e riquezas. Também autores como Clark e Cook (1988) e Katz (1983) analisam a rejeição da categoria de pertença na perspectiva do valor atribuído aos grupos pela sociedade.

No Brasil, verifica-se um quadro em que negros e mulatos apresentam estatuto mais baixo do que os brancos. Em Recife, no nordeste do Brasil, observa-se que ao nível do emprego, da escolaridade e do rendimento, os negros e mulatos apresentam estatuto social e económico inferior aos brancos. Assim, como apontam os dados do Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial — INSPIR (1999),3 com relação ao emprego, a percentagem de negros em funções de planeamento e direcção é inferior ao de não negros4 (8,7% e 18,0%, respectivamente), e ainda os trabalhadores negros estão mais na condição de não qualificados (16,8%) do que os não negros (9,8%). Quanto à escolaridade, observa-se que, enquanto 8,8% dos negros são analfabetos, existem 5,7% de não negros que o sâo. Há ainda 45,7% de negros com 1.° grau incompleto para 31,0% de não negros.5 Já no 2.° e 3.° graus existe uma percentagem de 19,4% e 8,1% de negros, enquanto a de não negros é de 26,3% e 20,6%, respectivamente. No que concerne ao rendimento, observa-se que 61% dos trabalhadores negros recebem até dois salários mínimos,6 enquanto apenas 4% recebem mais de dez salários mínimos. Nos não negros estes índices são de 46% entre os que recebem até dois salários mínimos e 11% entre os que recebem mais de dez salários mínimos. Este quadro de inferiorização do negro não se restringe à região Nordeste. Turra e Venturi (1995) demonstram numa pesquisa de âmbito nacional que também nas outras regiões do Brasil este fenómeno se verifica.

A condição de inferiorização dos negros no Brasil arrasta-se ao longo da história, a ponto de historiadores, sociólogos e antropólogos afirmarem que a valorização da cor branca e o branqueamento caracterizam o racismo brasileiro (Fernandes, 1978; Munanga, 1999; Schwarcz, 1993; 1996).

O branqueamento diz respeito a uma ideologia de valorização social da brancura da pele. Esta ideologia foi propagada por políticos e intelectuais brasileiros do final do século XIX. Estes defendiam a substituição do negro escravo pelo imigrante branco, com o propósito de evitar o prejuízo genético que o negro trazia para a sociedade brasileira, pois existia a ideia de que "quanto mais claro o indivíduo, maior a sua beleza, melhor o seu carácter e sua capacidade intelectual" (Carneiro, 1998:25). Esta ideologia discriminatória tem gerado ao longo da história a perda da identidade racial do cidadáo negro, reflectida na negação da cor da própria pele e no desejo do branqueamento (Fernandes, 1978; Rodrigues, 1995). A este respeito Turra e Venturi (1995) encontram que os brasileiros se autocategorizam através de 135 cores diferentes (e. g; "acastanhada", "alva-escura", "amarela-queimada", "amorenada", "azul-marinho", "baiano", "bem-morena", "branca-melada", "branca-morena", "branca-queimada", "branca-suja", "bronze", "bronzeada", "cafê-com-leite", "canela", etc.), entre o "marrom" e o "negro" há pelo menos 27 denominações diferentes da cor da própria pele pelos brasileiros.

O estatuto diferenciado de brancos, mulatos e negros no Brasil cria hierarquias entre os grupos raciais, como pode ser visto num estudo de Lima (no prelo) com universitários brasileiros Este autor observou que os estudantes percebiam os negros e brancos que obtém sucesso socioeconómico de modo mais positivo do que negros e brancos que fracassam socioeconomicamente. Todavia, numa avaliação posterior sobre a percepção da cor da pele de negros e brancos que são bem sucedidos ou fracassados, oa grupos que obtém sucesso são percebidos como mais brancos do que os grupos que fracassam, e os que fracassam são percebidos como mais negros. De modo que a percepção da brancura da pele como algo associado a coisas positivas e valiosas está presente nos brasileiros.

Oliveira (1998) investigou a autocategorização racial em 163crianças e jovens brancos, negros e mulatos brasileiros de cinco a 15 anos, através da pergunta: "qual é sua cor?" A autora verifica que 100% das crianças brancas se autocategorizam como brancas, enquanto que nos mulatos este índice foi de 57,8%, e nos negros apenas uma em cada duas crianças ou jovens se vêem como negros (50%). A autora interpreta a autocategorização racial de negros e mulatos através da assimilação da ideia de inferioridade do negro: estes indivíduos percebem a cor da sua pele como ameaçadora e adversa, assim negam sua ascendência negra e encontram como solução tomarem-se brancos. Degler (1971) chama a esta "solução" uma "saída de emergência" para os negros e mulatos do Brasil.

Como afirma Tajfel (1978b), não se pode prever os efeitos a longo prazo da rejeição do seu próprio grupo pelos indivíduos. Contudo: * Alienation from the society at large is often the result of social conditions, such as poverty, unemployment, family disintegration, overcrowding, etc.; but the search for some possibilities of regaining self-respect can also be a contributing factor to 'deviant' social behaviour. Withdrawal from the wider community's system of norms, values, prescriptions and achievements, and the creation of groups, which have their own values, divergent from those, which are generally approved, is one possible effect (not by any means confined to minorities) of what is now fashionably called a 'search for identity'. This withdrawal is rooted in acceptance by the minorities of the image of themselves imposed by the society at Urge, and it may result in the rejection of this image through means which are, at best, ineffective in changing the social situation, and at worst, reinforce the existing stereotypes and divisions" (Tajfel, 1978b: 11).

Avaliação emocional da pertença e estratégias de valorização da identidade

Um aspecto importante na definição da identidade racial refere-se à avaliação emocional da categoria de pertença (Tajfel, 1981). Este aspecto tem sido usualmente definido em termos de afectos (amor ou ódio, gosto ou desgosto) (Condor, Brown & Williams, 1987) e de valor (Monteiro, Lima & Vala, 1991) ligados à própria categoria ou a outras.

A avaliação emocional da pertença tem sido estudada no campo da auto-estima (Hutnik, 1991; Milner, 1983; Tajfel & Tumer, 1986; Trew & Benson, 1996). Coren-blum, Annis e Tanalca (1997) afirmam que a auto-estima das crianças é influenciada pela visão predominante na sociedade a respeito do seu grupo. As crianças de grupos de estatuto alto experimentam consistência avaliativa entre os afectos positivos associados à pertença ao seu próprio grupo e o valor atribuído a este pela sociedade, de modo que sua auto-estima é acentuada por identificarem-se com os membros do seu grupo. Num estudo de Monteiro e Ventura (1997), as crianças tendiam a autodefinir-se como tendo desenvolvimento "normal" e a diferenciarem-se positivamente de crianças com "deficiência", assim mantinham-se positivamente distintas ao identificarem-se com um grupo valorizado socialmente (crianças "normais").

Já as crianças de grupos de baixo estatuto experimentam uma discrepância entre o afecto positivo, relativo ao desenvolvimento de atitudes para com o próprio grupo, e o afecto negativo, associado à percepção da avaliação social desfavorável do seu grupo. Essa avaliação desfavorável pode ser mais elevada nas crianças com idade superior a sete anos, pois com o advento do pensamento operacional concreto, crianças de grupos maioritário e minoritário podem compreender o estatuto do seu grupo e como ele é percebido pelos outros (Yee & Brown, 1992; Corenblum, Annis & Tanaka, 1997).

Muitos estudos têm-se dedicado a investigar as respostas dos indivíduos à identidade social negativa e à percepção do baixo estatuto do grupo (Blantz, Mummendey, Mielke & Klink, 1998; Turner & Brown, 1978; Tajfel, 1978b; Tajfel & Turner, 1986). Por exemplo, Tumer e Brown (1978) indicam algumas das principais estratégias que os indivíduos usam para reestabelecer uma identidade positiva. Uma delas é a mobilidade individual, na qual o indivíduo se pode dissociar a ele próprio do seu grupo. Outra é a criatividade social, na qual os padrões de comparação são redefinidos pelos membros do grupo, seja comparando os grupos numa dimensão nova, seja mudando os valores relacionados com o estatuto dos grupos (e.g., o black is beautiful), permanecendo a dimensão de comparação enquanto o sistema de valores a ela associado é invertido. E ainda a estratégia de competição social, na qual os membros do grupo de estatuto baixo tentam ascender a uma identidade positiva através da competição com os membros dos grupos de alto estatuto.

Num estudo mais recente, Blantz et al. (1998) alargaram estas estratégias e propuseram doze formas de manuseio da identidade social negativa, baseadas na teoria da identidade social e da comparação social. São elas: 1) a recategorização superordenada, os membros redefinem: o seu grupo em termos de uma identidade endogrupal comum; 2) a recategorização subordinada: o endogrupo é dividido em dois ou mais subgrupos, o novo endogrupo, então, é percebido como tendo estatuto alto relativamente ao novo exogrupo; 3) a individualização: ocorre uma mudança da auto-categorização social para a pessoal; os membros do grupo de baixo estatuto passam a definir-se como indivíduos únicos e não como membros de um grupo; 4) a competição social; e 5) a competição realística — estas duas últimas estratégias pretendem equilibrar ou reverter a relação de estatuto entre o endogrupo e o exogrupo através de acções colectivas; 6) a reavaliação da dimensão de comparação, que consiste em reverter a avaliação dos pólos da dimensão relevante, sem realmente mudar as posições dos dois grupos sobre esta dimensão; 7) a escolha de uma nova dimensão de comparação: aqui há rejeição da comparação em dimensões que implicam resultados negativos para o endogrupo e comparação em dimensões nas quais o endogrupo apresenta estatuto elevado; 8) a mobilidade individual: apenas o estatuto individual da pessoa muda; 9) a assimilação: consiste na tentativa de tomar o endogrupo tão similar quanto possível ao exogrupo; 10) a comparação temporal: os membros comparam a posição passada e presente do endogrupo em dimensões de comparação relevantes; 11) a comparação com padrão: os sujeitos evitam comparar o endogrupo com outros grupos e, ao invés, comparam-no com um padrão, que são metas e normas socialmente compartilhadas; 12) a procura de um novo grupo de comparação: refere-se à selecção de um novo exogrupo que mantém estatuto baixo relativamente à dimensão de comparação em questão.

Rosenberg (1977) estudou crianças negras em escolas integradas e segregadas nos EUA. Observou que crianças negras de escolas integradas tinham mais baixo nível de auto-estima do que crianças negras de escolas segregadas, mesmo considerando que as suas notas na escola eram melhores do que as das crianças das escolas segregadas. Rosenberg conclui que as crianças negras nas escolas integradas se comparavam com as suas colegas brancas, e esta comparação diminuía a sua auto-estima, enquanto nas escolas segregadas, as crianças faziam comparações endogrupais. Se fôssemos analisar o resultado apresentado pelas crianças de escolas segregadas no estudo de Rosenberg, em termos da estratégia usada para enaltecer sua identidade, diríamos que estas crianças utilizam uma estratégia de criatividade social relacionada com a mudança do objecto de comparação, ou seja, elas escolhem um novo grupo que permite uma comparação de maneira favorável para elas.

Rosenberg afirma ainda que, na adolescência e idade adulta, a comparação com grupos de estatuto mais elevado é inevitável, pois a inserção na sociedade mais ampla, característica desta etapa, leva os indivíduos a escolhas ocupacionais, formação de ideologias políticas, entre outras inserções, que os colocam em situações competitivas e os levam a fazer comparações. De facto, Schunk (1992) afirma que, após os oito anos de idade, as crianças apresentam um intenso interesse por informações comparativas, e este interesse estende-se pela adolescência.

Por outro lado, a capacidade de comparação exige níveis mais elevados de desenvolvimento cognitivo, tal como a capacidade de descentração; assim, antes dos seis anos de idade, as crianças não podem avaliar-se em relação a outras, as suas avaliações são em relação a elas próprias (Schunk, 1992). Para Rosenberg (1977), a comparação social de crianças menores é provavelmente feita exclusivamente com base no próprio grupo étnico e racial.

Preferência racial

A categorização e a auto-categorização raciais per se, não determinam as concepções das crianças sobre os grupos raciais. Para termos uma apreciação das atitudes das crianças face a outros grupos temos que investigar a sua disposição para interagir socialmente com pessoas dos diferentes grupos; isto pode ser percebido através da análise da preferência em relação à própria e às outras categorias raciais. A preferência pode ser definida como a disposição pessoal para estabelecer relações com alguém do próprio ou de outros grupos raciais (Milner, 1973).

A preferência pela categoria racial e de género pode ser percebida em crianças muito jovens (Brown, 1995). Ramsey (1987), investigando crianças de três a seis anos de idade, observou que a categoria género determinou mais a escolha de amizade do que a raça. Entretanto, a categoria racial mostrou-se mais saliente do que a de género, quando foi enfatizada a intensidade da relação, de modo que ao escolher o "melhor amigo", as crianças preferiam alguém da sua própria raça. Quando a escolha era de alguém para brincar ou trabalhar na classe, havia menor preferência por alguém da mesma raça. Tem-se observado que a predominância de escolhas interraciais parece persistir em contextos nos quais as relações sociais são mais próximas (ex: casamento interracial) do que em contextos de relações sociais mais distantes (estudar em escola integrada) (Schofi-eld, 1986).

Vários investigadores afirmam que existe um período "crítico", entre os cinco e os oito anos de idade, durante o qual as crianças parecem tomar-se especialmente etnocêntricas nas suas escolhas (Aboud, 1987; Bigler & Liben, 1993; Brown, 1995; Doyle & Aboud, 1995; Yee & Brown, 1992). Yee e Brown (1992) observaram este fenómeno em crianças de três, cinco, sete e nove anos de idade, num estudo cuja pertença grupai e estatuto foram manipulados experimentalmente. Eles concluem que este período crítico começa aos cinco anos, quando as crianças começam a preferir o seu próprio grupo. Neste período, mesmo as crianças de grupos de baixo estatuto podem apresentar preferência etnocêntrica.

Davey (1983) estudou crianças brancas, indianas e asiáticas de sete a dez anos, na Inglaterra. Davey solicitou que as crianças escolhessem uma criança desconhecida da própria ou de outra etnia para dar doces, sendo o recurso utilizado fotografias de crianças dos três grupos. Quase 60% das crianças brancas, 41,4% das crianças indianas e 39,8% das crianças asiáticas apresentaram escolhas etnocêntricas.

A preferência etnocêntrica nas crianças brancas pode ser percebida desde os quatro anos de idade e permanece cerca dos sete anos, quando ocorre um declínio (e.g. Aboud, 1987). Esse declínio é por vezes explicado em termos da desejabilidade social (Clark, Hocevar & Dembo, 1980), ou seja, da percepção de que o preconceito é socialmente inaceitável (Katz, Sohn & Zalk, 1975).

Em relação à preferência das crianças de grupos minoritários, Milner (1973, 1981), no seu estudo com crianças paquistanesas, indianas e brancas de cinco a oito anos de idade, residentes na Inglaterra, verificou que metade das crianças indianas e um quarto das crianças paquistanesas entrevistadas preferiram a boneca branca do que a da sua própria etnia. A maioria das crianças brancas apresentou preferência etnocêntrica e atribuiu características negativas aos exogrupos. De modo mais amplo, observa-se nas crianças de grupos socialmente desvalorizados uma tendência para apresentarem preferência por grupos socialmente valorizados (Milner, 1984).

Embora os resultados encontrados por Yee e Brown (1992) digam o contrário, parece que a ideia do pico etnocêntrico na preferência das crianças pode ser apropriada apenas para analisar a preferência das crianças de alto estatuto (ver Bigler & Liben, 1993). Brown (1995) afirma que a natureza e a direcção da preferência parecem depender do estatuto do grupo na sociedade, pois crianças de estatuto alto respondem às questões de preferência de modo diferente das de estatuto baixo. Aboud (1987) aponta para o facto de que grande parte dos estudos sobre este fenómeno foram conduzidos em sociedades cuja categoria racial dominante era a branca.

Contudo, tem-se observado, nomeadamente nos EUA, uma mudança da preferência das crianças negras no sentido de uma maior preferência pelo seu próprio grupo étnico (Hutnik, 1991; Friedman, 1980; Aboud, 1988). Esta mudança foi bem documentada por Brown (1995), na comparação das pesquisas de Asher e Allen (1969), realizada em meados dos anos 60, e de Hraba e Grant (1970), realizada no final da mesma década. Nestes estudos observa-se uma acentuada diminuição da preferência das crianças negras pelo exogrupo e o aumento pelo endogrupo do primeiro para o segundo estudo, enquanto o quadro de preferência das crianças brancas se configura o mesmo em os ambos estudos (ver Brown, 1995, para uma revisão).

Com base nestes pressupostos, o presente estudo teve como objecti vo contribuir para um melhor entendimento da identidade racial e da preferência em crianças brasileiras brancas mulatas e negras de cinco a dez anos de idade. Interessou, mais especificamente, verificar a influência da idade e da cor da pele: a) na categorização e a autocategorização raciais das crianças; b) na avaliação emocional que fazem da sua pertença; e c) na preferência que manifestam pelo próprio ou outro grupo.

As principais hipóteses que conduziram o trabalho foram:

— Crianças brancas negras e mulatas de todos os grupos de idades apresentarão capacidade de categorização racial, esta capacidade apresentando-se de forma mais definida em crianças mais velhas (Aboud, 1987; 1988; Clark & Cook, 1988; Katz & Zalk, 1974; Milner, 1984).

— Haverá uma tendência para o branqueamento na autocategorização racial: as crianças negras tenderão a perceber-se como mulatas e as mulatas como brancas (Turra & Venturi, 1995). Espera-se que a capacidade de autocategorização aumente em função da idade das crianças (Aboud, 1988).

— Crianças brancas de todos os grupos de idade avaliarão a sua pertença racial mais positivamente (Katz, 1983) do que crianças negras e mulatas. Com o aumento da idade as crianças negras e mulatas tenderão a avaliar negativamente sua pertença racial (Yee & Brown, 1992).

— Crianças brancas até aos oito anos de idade tenderão para a preferência etno-cêntrica, e este padrão de preferência diminuirá após esta idade (Bigler & Liben, 1993). Já as crianças negras e mulatas tenderão para a preferência alocêntrica e esta aumentará com a idade (Milner, 1983).

Método

Participantes

Participaram na pesquisa 238 crianças brasileiras, sendo 113 do sexo masculino e 125 do sexo feminino, com idades variando dos cinco aos dez anos; sendo 33,2% de cinco e seis anos, 33,2% de sete e oito anos e 33,6% de nove e dez anos. Com relação ao grupo racial, 36,1% eram brancas, 37,4% eram mulatas e 26,5% eram negras. A amostra foi retirada de escolas da rede pública (60,1%) e de escolas da rede privada (39,9%) de ensino da cidade de Aracaju no Nordeste do Brasil.

As variáveis independentes do estudo foram a cor da pele e a idade. A cor da pele consistiu na classificação das crianças em uma das três categorias raciais: branco, mulato e negro. Esse procedimento foi feito momentos antes de cada entrevista: três juízes (entrevistadoras) anotavam secretamente a sua opinião sobre o grupo racial ao qual cada criança entrevistada pertencia, anotando as letras "B" (para branco), "M" (para mulato) ou "N" (para negro) em papel tipo postit, que era entregue à pessoa encarregada de entrevistar a criança. Todas as crianças foram avaliadas com relação ao grupo de pertença pelos três juízes. De maneira geral, o consenso foi elevado, havendo maior grau de consenso entre os juízes na classificação do grupo racial de crianças brancas e negras. Considerámos a idade, nas faixas de cinco e seis anos, sete e oito anos, e nove e dez anos.

Instrumentos e procedimentos

As crianças foram entrevistadas individualmente, nas suas próprias escolas, por três entrevistadoras treinadas (duas mulatas e uma branca). Utilizararn-se fotografias de crianças como material estímulo. O material fotográfico foi confeccionado de modo a considerar as diferenças de idade e sexo das crianças. Desta forma, na confecção das fotografias consideraram-se dois grupos de idades: inferior a sete anos e superior a sete anos. Cerca de 150 crianças de ambos os sexos e dos três grupos raciais estudados serviram de modelo.

Num pré-teste, as fotografias foram submetidas a um júri composto por seis adultos, dois do sexo masculino e quatro do sexo feminino. Este jún selecionou as fotografias com referência à idade, definição racial e atractividade física

Foram escolhidas 48 fotografias, que foram divididas em quatro conjuntos de doze, das quais quatro para cada grupo racial. As doze fotografias foram divididas em quatro subconjuntos (1 = sexo masculino até sete anos, 2 = sexo masculino com mais de sete tinos, 3 = sexo feminino até sete anos; e 4 = sexo feminino com mais de sete anos), cada um contendo uma fotografia de uma criança branca, uma de uma mulata e uma de uma negra. As crianças fotografadas eram desconhecidas das crianças entrevistadas.

Foi elaborado um questionário com 16 perguntas, oito delas visando avaliar as seguintes medidas dependentes: categorização racial, autocategorização racial e avaliação emocional da pertença — determinantes do modo como se processa a identidade racial. Foi analisada ainda outra medida dependente mais voltada para as atitudes, que foi a preferência pelas categorias raciais

a) A categorização racial foi avaliada em dois níveis: classificação e reconhecimento (ver Aboud, 1988). Para proceder à construção do índice de categorização racial os indicadores de classificação e reconhecimento de cada grupo racial foram somados, de modo que índices inferiores a 50% indicaram a falta de capacidade de categorização e superiores indicaram a presença desta capacidade. Utilizámos como indicadores de classificação a organização das fotografias, em pilhas diferentes, sendo uma pilha para cada grupo racial. O indicador de reconhecimento consistiu em organizar fotografias em caixas que continham os rótulos branco, negro e mulato. Além dos nomes de cada grupo racial, havia um papel adesivo com uma cor correspondente ao rótulo.

b) A autocategorização foi avaliada perguntando-se ã criança: "qual desses se parece mais com você?". A resposta era em termos da escolha da fotografia de uma criança do grupo racial igual ao da criança entrevistada. A partir desta variável, pudemos verificar também a rejeição da categoria de pertença, que consistiu na escolha da fotografia de uma criança de raça diferente da criança entrevistada.

c) A avaliação emocional da pertença, foi medida através das questões: "Você gosta de ser 'X'?" e "Você gostaria de ser diferente do que você é?". A resposta era em termos de uma escala de quatro pontos que variou entre "muito", "mais ou menos", "pouco" e "nada". Para auxiliar nas respostas a estas questões, foi elaborado um gráfico, contendo quatro copos apresentando quatro diferentes graus de preenchimento. Um copo cheio representava "muito"; um copo meio, representava "mais ou menos"; um copo com preenchimento bem abaixo da metade, representava "pouco" e, por fim, um copo vazio, representava "nada".

d) A preferência racial foi definida em termos da disposição da criança para estabelecer relacionamento com outras crianças. Foi avaliada em termos das seguintes escolhas: (1) um irmão adoptivo, (2) o melhor amigo, (3) uma criança com quem dividiria doces; e (4) uma criança com quem faria uma prova para nota. Para cada item acima, a criança poderia fazer uma única escolha entre as fotografias de uma criança negra, uma mulata ou uma branca.

Para proceder à análise da preferência foi construído um índice, considerando-se o grau de intimidade ou proximidade envolvido na relação descrita em cada item. A construção do indicador consistiu na atribuição de um valor a cada tipo de preferência em função do grau de intimidade. Assim, o irmão adoptivo foi considerado como indicador de maior grau de intimidade, sendo-lhe atribuído o valor 4.7 Na sequência veio "uma criança com quem fariam uma actividade para nota", o "melhor amigo" e uma criança "com quem dividiria um doce", que receberam os valores 3, 2 e 1, respectivamente. A escala de preferência variou então de 0 (preterição total) a 10 (preferência total) para cada um dos possíveis alvos da preferência.

A categorização racial e autocategorização racial

Para proceder à análise da categorização racial e da autocategorização racial, realizámos uma análise de contingência, cruzando cada variável com a cor da pele (branca, mulata ou negra) e a idade das crianças (cinco e seis, sete e oito, e nove e dez anos).

Com relação à capacidade de categorização racial, verificámos a influência da idade (x2 = 6,555; gl = 2; p<0,038). Notámos o aumento na capacidade de categorização com a idade. Assim, 83,5% das crianças aos cinco e seis anos categorizam os grupos, enquanto este índice cresce para 92,4% aos sete e oito anos e para quase 95,0% aos nove e dez anos de idade. A relação entre a idade e a categorização é determinada pelas crianças de cinco e seis anos de idade, como indicam os valores residuais superiores a +2 ou inferiores a -2 (Bryman & Crammer, 1997). Estes resultados podem ser vistos no quadro 1.

No que respeita à autocategorização racial, verificámos que esta variável é afectada pela cor da pele das crianças (x2 = 95,450; gl = 4; p<0,000). No quadro 2, podemos observar que, nas crianças brancas entrevistadas, quase 80% percebem-se como brancas. Já nas mulatas este índice caiu para 53,9%, havendo 38,2% delas que se percebem como brancas e 7,9% que se vêem como negras. Entre as crianças negras, menos de 40% percebem-se como negras, a maioria delas (47,6%) percebe-se como mulata e há ainda 12,7% de crianças negras que se percebem como brancas. Como indicam os residuais, a relação entre a cor da pele e a autocategorização é determinada sobretudo pelas crianças negras que se vêem como negras (39,7%), pelas crianças brancas que se dizem brancas (79,1%) e pelas crianças negras que se vêem como brancas (12,7%). Nestes resultados observamos percentagens bastante elevadas de crianças mulatas e negras autocategorizando-se como mais claras, na direcção do branqueamento. Estes resultados não foram influenciados pela idade das crianças (x2 = 4,4; gl = 4; p>0,10, n = 141).8 Assim, podemos observar que 46,1% das crianças mulatas e 60,3% das crianças negras rejeitam a sua pertença racial (cfr. quadro 2).

A avaliação emocional da ipertença

Para proceder à análise da avaliação emocional da pertença, realizámos duas Anovas univariadas com cada medida da avaliação emocional da pertença ("Você gosta de ser 'X'?" e "Você gostaria de ser diferente do que você é?") como variável dependente e tendo como variáveis independentes a cor da pele e a idade das crianças. As respostas a esta questão foram medidas através de uma escala que variou em quatro pontos(l - nada e 4 = muito).

Nas análises relativas à variável "Você gosta de ser 'X'?" observámos o efeito principal da cor da pele [F (2,236) = 4,08, p<0,018]. Este efeito indica que as crianças negras gostam menos de ser como são do que as brancas (p<0,003, Least Significance Difference = LSD, p<0,05) e do que as mulatas (LSD = p<0,016). Já as crianças brancas e mulatas não se diferenciam neste aspecto. No quadro 3 apresentamos as médias relativas a estes resultados.

Observou-se ainda um efeito principal da idade [F(2,236) = 5,64, p<0,004]. No sentido de que as crianças de cinco e seis anos gostam menos de ser como são do que as de sete e oito anos (LSD = p<0,045) e as de nove e dez anos (LSD = p<0,002). As diferenças entre as médias das crianças dos dois últimos grupos de idade citados não foi significativa.

Foi observado ainda um efeito de interacção entre a cor da pele e a idade [F (4,236) = 2,49, p<0,044] sobre "gostar de ser X", que qualifica estes resultados (ver quadro 3). Verificámos que aos cinco e seis anos as crianças negras gostam menos de ser como são do que as brancas (LSD = p<0,002) e do que as mulatas (LSD = p<0,003), não havendo nestes dois últimos grupos raciais neste aspecto.

Com o aumento da idade os grupos raciais já não se distinguem (LSD = p>0,10) quanto a gostarem de ser como são.

No que concerne à variável "Você gostaria de ser diferente do que você é?", notámos um efeito principal da cor da pele [F (2,235) = 4,80, p<0,009]. Este efeito indica que as crianças brancas gostariam menos de ser diferentes do que são do que as mulatas (LSD = p<0,007) e as negras (LSD = p<0,008). As crianças negras e mulatas não se diferenciam quanto a este aspecto. Verificámos outro efeito principal, desta vez em função da idade [F(2, 35) = 3,90, p<0,021]. Este efeito mostra que, quanto mais novas as crianças, mais elas gostariam de ser diferentes do que são. Assim, as crianças de cinco e seis anos, mais do que as de sete e oito anos (LSD = p<0,045) e de nove e dez anos (LSD = p<0,014), gostariam de ser diferentes. Contudo, as de sete e oito anos e as de nove e dez anos não se diferenciam no quanto gostariam de ser diferentes do que são (LSD = p>0,10). As médias que expressam estes resultados podem ser vistas no quadro 4.

Estes efeitos principais foram qualificados pelo efeito de interacção cor da pele X idade [F (4,235) = 3,65; p<0,007] (ver quadro 4), no qual se pode observar que, aos cinco e seis anos, as crianças negras apresentam mais desejo de serem diferentes do que as crianças brancas (LSD = p<0,000) e mulatas (LSD = p<0,077). Estas últimas apresentam mais vontade de ser diferentes do que as brancas (LSD = p<0,011). Este efeito desaparece nas demais faixas etárias (LSD = p>0,10).

Os resultados relativos à avaliação emocional da pertença (ver quadros 3 e 4), parecem indicar que a identidade negativa ocorre apenas nas crianças negras de cinco e seis anos de idade. A fim de obter uma visão do conjunto das variáveis envolvidas na identidade racial, fizemos uma análise de correspondência múltipla com as variáveis autocategorização racial, avaliação emocional da pertença (gosta de ser, gostaria de ser diferente), cor da pele (branco, mulato e negro) e idade (cinco e seis anos, sete e oito anos, e nove e dez anos). Os resultados podem ser vistos na figura 1.

De acordo com os valores próprios de cada dimensão,9 a melhor interpretação dos resultados é a que opõe os eixos verticais. Neste sentido, podemos observar um quadro das identidades das crianças que opõe uma identidade positiva, caracterizada pelo "gosta de ser" (muito ou mais ou menos) e pela pouca vontade de querer "ser diferente do que é", a uma identidade negativa, caracterizada pelo "não gosta de ser" ou pelo "gosta pouco" e pelo elevado desejo de "ser diferente". Observa-se então que as crianças brancas de todos os grupos etários se situam na dimensão positiva da identidade e aceitam a sua pertença racial. Por outro lado, as crianças negras aos 8 anos de idade, apesar de se afirmarem negros, aceitando a sua pertença, apresentam-se muito insatisfeitos com ela, pois gostam pouco ou nada de serem como são e queriam muito ser diferentes. Já as crianças mulatas, de todas as faixas etárias, e as negras de nove e dez anos afirmam-se mulatas e ocupam a fronteira entre uma identidade positiva e uma identidade negativa.

A preferência racial nas crianças do Brasil

Para proceder à análise da preferência, cada um dos quatro indicadores desta variável foi tratado através de uma análise de contingência juntamente com a cor da pele da criança e a idade. Observou-se que a cor da pele não afectou esta variável para qualquer dos indicadores (ver quadro 5). Interessante observar estes resultados, pois a não significância deveu-se à preponderante preferência pela categoria branco e a um distanciamento das categorias negro e mulato em todos os indicadores. Sendo assim, 79,8% das crianças escolhem ter como irmão adoptivo uma criança branca (x2 = 4,660; gl = 4; p£0,10; n = 233). E cerca de 69,1% das crianças preferem fazer actividades para nota também com crianças brancas (x2 = 1,378; gl = 4;p>0 (10; n = 233). Este quadro de preferência pele categoria branco permanece, embora em percentagens mais baixas (cerca de 50%) quanto à preferência para o melhor amigo (x2 = 1,027; gl = 4; p>0,10; n = 233) e para dividir um doce (x2 = 2,281; gl = 4; p*0,10; n = 233).

Com relação à preferência em função da idade, observou-se que esta influenciou a preferência da criança para dar doce (x2 = 14,014; gl = 4; p£0,007; n = 233). De modo que, aos sete e oito anos, as crianças preferem menos dar doces às crianças negras (11,5%) do que às mulatas (35,9) e do que às brancas (52,6%). Aos nove e dez anos a preferência pelo negro aumenta um pouco (33,8%), em relação à preferência pelo mulato (22,1%). Contudo, permanece bem mais baixa em relação à preferência para dar doce ao branco (44,2%). Estes resultados podem ser observados no quadro 6.

A fim de verificar as possíveis interacções da preferência em função da cor da pele e da idade da criança, procedeu-se a uma análise dos indicadores de preferência para negros, brancos e mulatos. Realizámos uma Manova, tomando como variáveis independentes a idade e a cor da pele, e como dependentes as preferências para branco, mulato e negro. Utilizando-se o teste de Pilais como critério, observou-se que a combinação das variáveis dependentes consideradas não foi influenciada quer pela idade (F (3,223) = 0,97; p>0,10], quer pela cor da pele [F (3,223) = 1,10; p>0,10], quer pela interacção entre estas duas variáveis [F (4,224) = 0,44; p20,10]. Não foram observados efeitos específicos das variáveis independentes sobre as dependentes.

Discussão

Neste estudo pretendeu-se analisar a identidade racial e a preferência em crianças brasileiras brancas, negras e mulatas de cinco a dez anos.

A nossa primeira hipótese foi a de que crianças negras, brancas e mulatas de todos os grupos de idades categorizariam correctamente os grupos raciais, estando esta capacidade presente de forma mais definida em crianças mais velhas. Os resultados confirmaram esta hipótese, pois mais de 80% das crianças já aos cinco anos de idade são capazes de categorizar os grupos raciais estudados. Este índice chegou a 95% nas crianças de nove e dez anos de idade.

Embora os estudos realizados por Qark e Clark (1955), Friedman (1980) e Dutton et ai (1998) tenham analisado crianças de grupos raciais diferentes dos abordados neste estudo, podemos dizer que nossos resultados corroboram aqueles, visto que as faixas de idade são semelhantes. Contudo, ocorre uma diferença entre os resultados aqui encontrados e aqueles verificados por Clark & Clark (1955), que verificam que já aos dnco anos de idade as crianças categorizam 90% das vezes. Por outro lado, encontramos percentagens mais elevadas do que as encontradas por Friedman (1980), que observou que 38% de suas crianças do jardim de infanda não categorizaram as raças por ele estudadas.

Como sugere Katz (1983), a identidade racial pressupõe o conhecimento de que o mundo social é organizado em grupos raciais. Com base nos resultados aqui encontrados, podemos dizer que a maioria das crianças já aos dnco nos de idade percebe que existem categorias raciais diferenciadas, e esta percepção aumenta com a idade. Assim, o primeiro critério para o surgimento da identidade racial foi satisfeito, ou seja, as crianças brasileiras percebem a distinção entre os grupos raciais.

A hipótese relativa à autocategorização era a de que haveria uma tendência para o branqueamento na autocategorização racial das crianças negras e mulatas; e que a autocategorização correcta aumentaria com a idade. Esta hipótese foi parcialmente confirmada, pois embora tenhamos observado a tendência para o branqueamento, ou seja, 60% das crianças negras e 40% das mulatas branquearam, não observámos o efeito da idade. Estes resultados são diferentes dos encontrados por Aboud (1977; 1980; 1988) que verifica o aumento da autocategorização em crianças através das idades.10

Conforme Qark e Cook (1988), logo que as crianças aprendem a categorizar os grupos, apreendem, de modo elementar, o estatuto desses grupos na sociedade. Esta afirmação leva-nos a compreender que o modo como as crianças negras e mulatas se autocategorizam, pode ser permeado pelo modo como percebem as categorias negro e mulato no seu dia-a-dia. Ao observarem que a maioria dos indivíduos destas categorias ocupam trabalhos menos valorizados, possuem menor qualificação educacional e moram em lugares com poucas infra-estruturas, ou seja, ao perceberem o valor dado à sua categoria pela sociedade (ver dados do INSPIR, 1999), utilizam o branqueamento como forma de defender-se da carga estereotípica negativa imposta à sua categoria racial. Estariam estas crianças tentando atenuar a percepção da cor da sua pele, tornando-a mais agradável para si e mais próxima da que é valorizada socialmente, a fim de conseguir ascender a uma identidade racial mais positiva?

O branqueamento, então, pode ser entendido como uma estratégia de negação da própria pertença racial. Como afirma Tajfel (1978a), quando os grupos sociais percebem as fronteiras que os separam de outras categorias como permeáveis, e quando a adopção de outra forma de identidade pode elevar a auto-estima dos membros, pode ocorrer a mobilidade individual. Neste caso, por perceberem as fronteiras raciais ou de cor que os separam da categoria "branco" como fluidas e por perceberem que os "mais brancos" têm mais alto estatuto, os negros e mulatos dissociam-se dos seus grupos através do branqueamento.11 De facto Ellemers (1993), noutro contexto, encontrou baixos valores de identificação endogrupal em membros de grupos de estatuto baixo que percebem as fronteiras do grupo como permeáveis.

Os resultados verificados vão na direcção das afirmações de Fernandes (1978) e Rodrigues (1995), a respeito da perda da identidade dos negros brasileiros, expressa através da negação da própria cor e da busca do branqueamento. Também corroboram os achados de Oliveira (1998), relativos à negação da ascendência negra pelas crianças negras e mulatas brasileiras, e os achados de Milner (1973; 1983; 1984), sobre a negação da pertença étnica em crianças paquistanesas e indianas na Inglaterra, relacionada com o estatuto superior da cor branca para os indivíduos daquela sociedade.

Os nossos resultados são diferentes dos encontrados por Friedman (1980) e Duíton et al. (1998), que verificam uma forte autocategorização em crianças negras no seu grupo de pertença. Este resultado pode ser devido à força do movimento negro nos EUA, local onde estas pesquisas foram realizadas. Segundo Munanga (1996), o facto de o racismo, em países como EUA e África do Sul, ter sido durante muito tempo flagrante, fez surgir uma forte coesão grupai e movimentos de reivindicação dos direitos por parte dos negros. Em contrapartida, no Brasil, o racismo sempre velado, impediu a mobilização dos negros em torno dos seus direitos civis12.

A nossa terceira hipótese foi a de que crianças brancas avaliariam a sua pertença racial mais positivamente do que as negras e mulatas, e que com o aumento da idade crianças negras e mulatas tendiam a avaliar mais negativamente sua pertença racial. Esta hipótese foi parcialmente confirmada. Observámos que as crianças brancas apresentam-se satisfeitas com a sua pertença. Contudo, entre as negras os resultados relativos ao quanto gostam de serem como são, são baixos aos cinco e seis anos, elevando-se a partir dos sete anos de idade, resultado que não era esperado. E ainda, com relação ao quanto gostariam de ser diferentes, os resultados indicam que as crianças negras de cinco e seis anos querem ser mais diferentes do que as brancas e mulatas da mesma idade. As mulatas, ainda, gostariam de ser mais diferentes do que são do que as brancas.

Enquanto a análise da autocategorização racial aponta para a rejeição da própria categoria de pertença por parte de algumas crianças, sobretudo das mulatas e negras, a análise da avaliação emocional da pertença parece indicar que apenas as crianças negras de cinco e seis anos avaliam negativamente a sua pertença. Porém, ao analisarmos o conjunto das medidas de identidade (ver figura 1), verificamos um quadro das identidades mais amplo e complexo do que o apresentado nas Anovas.

Podemos afirmar, com base na figura 1, que apenas as crianças brancas apresentam identidade racial positiva, visto que são elas que afirmam serem brancas e gostarem de ser como são e que não gostariam de ser diferentes. Juntamente com Corenblum et al. (1997), podemos dizer que estas crianças apresentam congruência entre os seus afectos e que as avaliações que fazem do próprio grupo, e que sua auto-estima elevada as faz afirmar a sua identidade.

Em relação às mulatas, os resultados revelam que, apesar de a maioria delas afirmarem que são mulatas, elas estão na fronteira entre uma identidade positiva e uma identidade negativa. O mesmo acontece com as crianças negras de nove e dez anos, que se afirmam mulatas e, portanto, rejeitam a sua pertença.

Assim, a avaliação emocional da pertença das crianças negras de nove e dez anos, que afirmam gostarem de serem como são e não quererem ser diferentes, torna-se aqui mais clara, pois, estas crianças afirmam que gostam de serem mulatas e que não querem ser diferentes do que são, ou seja, mulatas. Nesta idade, estas crianças já percebem o estatuto social do seu grupo (Yee & Brown, 1992). Adicionalmente, já sofrem com o conflito de não quererem identificar-se com um grupo percebido desfavoravelmente (Corenblum et al., 1997); a sua saída parece ser a de dizer que são de uma outra cor, negando o facto objectivo em função das expectativas sociais ligadas à cor da pele no Brasil. Pode-se dizer, então, que estas crianças estão a utilizar a mobilidade social como estratégia de acentuação da sua identidade.

A análise de correspondência múltipla (ACM) revela-nos ainda que as crianças negras de cinco a oito anos apresentam identidade racial negativa, visto que afirmam não gostarem de ser como são e que gostariam de ser diferentes. Nas crianças de cinco e seis anos, estes resultados podem ocorrer, porque a incapacidade de descentração as impede de dissociar-se do seu grupo e utilizar a estratégia do branqueamento, de modo que sua auto-estima é afectada, porque elas se avaliam em relação ao próprio grupo (ver Schunk, 1992; Rosemberg, 1977), o qual possui baixo estatuto. Em relação às crianças negras de sete e oito anos, os resultados conjuntos, das Anovas e da ACM, indicam que elas ocupam uma posição intermediária entre as outras duas faixas etárias.

Se analisássemos os resultados relativos às crianças negras na perspectiva de Corenblum et al. (1997), poderíamos dizer que elas apresentam igualmente congruência entre os seus afectos e as suas avaliações, já que estas crianças se recusam a pertencer a um grupo que é socialmente desvalorizado. Isto é tanto mais provável quanto as crianças negras aos nove e dez anos que se percebem como mulatas, são as que têm altos valores de avaliação emocional da pertença.

Estes dados permitem concluir que a identidade racial das crianças negras pode ser assim resumida: dos cinco aos oito anos elas dizem ser negras, mas não gostam de ser assim; aos nove e dez anos as crianças não aceitam a pertença, afirmam que são mulatas e gostam de ser assim. Já a identidade racial das crianças mulatas apresenta-se mais neutra, como um meio termo entre perceberem-se positivamente e negativamente. Por fim, as crianças brancas, independentemente da idade, possuem uma identidade racial positiva.

Nossa quarta e última hipótese foi a de que crianças até os oito anos de idade tenderiam a preferir o seu próprio grupo, e que este padrão de preferência diminuiria após esta idade. Supusemos ainda que com o aumento da idade as crianças negras e mulatas tenderiam a preferir o exogrupo branco. Esta hipótese não foi confirmada. As crianças brancas de todos os grupos de idade preferiram o seu próprio grupo em todas as escolhas relativas à preferência, corroborando assim as conclusões de Aboud (1987; 1988), Davey (1983), Hutnik (1991) e Milner (1973; 1983). Contudo, a preferência das crianças negras e mulatas foi exclusivamente dirigida à categoria "branco", independentemente da idade.

Com relação à preferência, de maneira mais ampla, independentemente da idade e da cor da pele das crianças, elas preferiram os brancos, quer como irmão adoptivo, quer para realizarem actividades escolares, quer como melhor amigo, quer para dividirem um doce. Estes resultados foram contrários aos de Ramsey (1987) e Schofield (1986), que defendem que a intensidade da relação pode produzir preferência etnocêntrica. Não foi observado, no presente estudo, a existência do "período crítico" da preferência salientado por alguns autores (Aboud, 1987; Bigler & Liben, 1993; Brown, 1995; Doyle & Aboud, 1995; Yee & Brown, 1992), ou seja, após os oito anos de idade o padrão de preferência das crianças permaneceu o mesmo.

O que chama mais a atenção nestes resultados é que, mesmo na interacção mais importante, escolha para irmão, que indica maior grau de proximidade no relacionamento, as crianças negras quase não escolhem um negro ou mulato. Estes resultados foram contrários aos encontrados por Asher & Allen (1969), Davey (1983), Friedman (1980) e Hraba & Grant (1970). Talvez a diferença entre os resultados encontrados no presente estudo e os dos referidos autores esteja no modo como são encaradas as questões raciais nos diferentes contextos nos quais as pesquisas foram realizadas.

Os resultados demonstraram um efeito da idade apenas relativamente à preferência para dar doce. Embora as crianças prefiram predominantemente a criança branca, ocorre uma diminuição dessa escolha com a idade e um aumento da preferência pelo negro entre as crianças mais velhas. Este efeito pode indicar a percepção do negro como "necessitado". Assim, a acção de dar doce ao negro, em vez de indicar proximidade na relação, pode indicar filantropia, sendo ainda um comportamento que não implica nenhuma percepção de competência no outro ou necessidade de interacção com ele, como as outras acções implicavam. E ainda pode associar-se à norma de justiça da necessidade, no sentido de que os pobres/negros são necessitados e que, quem pode, deve ajudar.

Por fim, uma vez que a identidade é construída num contexto social, mudanças no contexto podem operar mudanças na identidade e estas mudanças podem ter resultados sobre a preferência. Como foi demonstrado por algumas da pesquisas supra citadas (Asher & Allen, 1969; Dutton et al., 1998; Friedman, 1980; Hraba & Grant, 1970), nas quais as mudanças na identidade e preferência de crianças negras americanas coincidiram com a expansão do movimento negro nos EUA. Assim, acreditamos que o quadro de identidade das crianças negras e mulatas brasileiras pode ser revertido.

Este estudo aponta para a necessidade de explorar mais em detalhe o branqueamento como estratégia de aquisição de identidade positiva, em linha com os estudos que afirmam que os indivíduos podem utilizar as estratégias da mobilidade social ou deserção do grupo de pertença, a fim de acederem a uma auto-estima positiva (Blantz et al., 1998; Tajfel, 1978b; Tajfel, 1981; Turner & Brown, 1978); e ainda a mudança na orientação da identidade racial de crianças negras e mulatas no período que compreende os 6 aos 8 anos de idade.

 

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Notas

1Os estudos apresentados neste artigo foram co-financiados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) — Governo Federal do Brasil.

2Ellemers et ah (1999) avaliaram a autocategorização através das seguintes afirmações que deveriam ser respondidas em uma escala de 7 pontos, sendo 1 "not at al" e 7 "very much": I identify with other members of my group; I am like other members of my group; My group is an important reflection of who I am.

3A pesquisa teve o objetivo de obter informações básicas sobre emprego e desemprego. Foram investigados indivíduos de 10 a 40 anos, de ambos os sexos em 7.500 domicílios de 14 municípios da região metropolitana de Recife.

4Foram definidos como negros os pretos e mulatos e como não negros os brancos e amarelos.

5O 1o grau compreende oito anos de escolaridade; o grau compreende três anos de escolaridade; e o 3o grau refere-se ao nível universitário.

6Um salário mínimo é equivalente a 66,7 US$ ou 18,000$00 escudos portugueses.

7Baseámo-nos em Hinde (1997), que afirma que as relações de intimidade possuem as seguintes propriedades: 1) quantidade de tempo que as pessoas passam juntas; 2) variedade de coisas que pessoas fazem juntas; e 3) o grau de influência que cada pessoa exerce sobre a outra. Já Holmes (1995), distingue diversos graus de intimidade, entre os quais inclui aqueles dirigidos para os familiares e o melhor amigo como os mais íntimos. Miller e Gentry (1980) verificaram que a escolha de alguém para realizar um trabalho escolar não exige alto grau de proximidade mas uma avaliação das capacidades académicas da pessoa envolvida. Esta escala pode ainda ser considerada um indicador de distância social no sentido de Bogardus (1925).

8Para análise da autocategorização em função da idade foram considerados apenas os sujeitos que responderam correctamente a esta questão.

9Dimensão 1: a = 0,48; dimensão 2: a = 0,35.

10Crianças brancas de 3 a 8 anos de idade e negras de 3 a 10 anos de idade.

11Ver dados de Turra e Venturi (1995) referidos neste artigo. Nós também investigámos a cor da pele atribuída espontaneamente pelas crianças na presente pesquisa, através da questão "qual é a cor de sua pele?".

12Na África do Sul, durante o apartheid, havia comparativamente mais estudantes negros nas universidades do que no Brasil da democracia racial (Munanga, 1996).

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