INTRODUÇÃO
O solo é um recurso limitado e a intensidade das diferentes práticas nele desempenhadas podem ter impactos positivos e compatíveis com os serviços ecossistêmicos que o mesmo desempenha (aprovisionamento, ciclagem de nutrientes, regulação, suporte e habitat), favorecendo assim a sua manuntenção. Ao contrário disso, o habitual são atividades que geram a remoção do solo, como a pressão das infraestruturas, crescentes índices de monocultivos, uso intensivo de máquinas agrícolas e ocupação urbana, contribuindo para a sua degradação (Alexandre, 2015; Bucella, 2015; Martins e Fernandes, 2017).
A degradação do solo refere-se aos processos que afetam a complexidade das suas propriedades, principalmente a estrutura, prejudicando assim as funções por ele desempenhadas e seu potencial de uso. Ela é provocada por fenómenos naturais ou principalmente por ação antropogénica e tem como resultado a perda da capacidade produtiva deste recurso (Lal, 1997).
A Comissão Europeia apresentou ao Parlamento, em 2002, uma estratégia temática de protecção do solo (COM (2002) 179) onde foram identificados os oito principais tipos de degradação dos solos na União Europeia, que são: a erosão, a diminuição da matéria orgânica, a contaminação, a salinização, a compactação, a perda de biodiversidade, a impermeabilização, os deslizamentos de terras e as inundações.
Muitos desses tipos de degradação estão diretamente associados à má gestão do solo, que leva à erosão excessiva, à diminuição da matéria orgânica e à compactação. As práticas de gestão adoptadas comumente na agricultura tendem a favorecer o aumento na produtividade em detrimento da conservação dos recursos utilizados para tal. As consequências de tais práticas não respeitadoras do solo são a diminuição da sua fertilidade, a eutrofização de corpos d’água, a emissão de gases de efeito estufa, dentre outras. Como resultado, a relação entre degradação e desertificação se torna cada vez mais próxima e irreversível (Alexandre, 2015; Geslain-Laneelle, 2015).
Devido ao crescente interesse da humanidade com a necessidade de preservação do meio ambiente, houve, ao longo da última década, o estímulo ao uso de atividades consideradas ultrapassadas (Ayache, 2011). Diante do panorama atual, com o alerta de esgotamento dos recursos em um contexto agrícola de intensificação com a degradação, os agricultores e silvicultores redescobriram o valor da tração animal, da necessidade de redução do consumo de energia fóssil e do estímulo a processos favoráveis a natureza. Esse despertar, em certas situações, consegue remediar uma porção dos danos causados (COM, 2002; Merino, 2013; Chevillot, 2014).
O tipo de sistema adoptado para o cultivo tem impactos na estrutura do solo, favorecendo ou não a agregação e podendo afetar a densidade aparente do solo. No sistema de mobilização convencional, onde as atividades de preparo do solo são maioritariamente com utilização de maquinaria agrícola pesada, há estímulos de compactação na zona onde houve a passagem dos rodados, com a formação de sulcos na superfície. A degradação da estrutura do solo gerada pela compactação leva à deterioração do mesmo como um meio de suporte para o desenvolvimento das culturas, restringindo o crescimento das raízes, levando a alterações nas suas propriedades hidráulicas, estabilidade de agregados e fertilidade (COM, 2002; Merino, 2013).
Vários factores precisam ser analisados quando são efetuadas mobilizações no solo, pois refletirão na intensidade das pertubações ali provocadas, como a humidade, textura e agregação do solo, a carga, a pressão excercida e o número de vezes que a maquinaria e equipamentos trafegam no solo, dentre outras (Richart et al., 2005). Da mesma forma que o solo é heterogéneo e as dinâmicas nele propicidas revelam alto grau de complexidade, as operações agrícolas realizadas no mesmo exigem condições diferentes e equipamentos apropriados para cada situação, visando a mínima perturbação da sua estrutura (Bellé et al., 2013; Carvalho Filho et al., 2007).
O uso intensivo de implementos agrícolas, principalmente arados e grades, pode causar efeitos deletérios no solo, compacatando-o e estimulando os processos erosivos. As alterações provocadas pela tração animal podem ser menos acentuadas do que aquelas provocados pela tração mecanizada, devido as menores cargas exercidas sobre o solo, bem como em razão da menor velocidade de deslocamento (Dafonte et al., 2019). Richart et al. (2005) ressaltam a necessidade de associar o uso do maquinário agrícola a práticas que minimizem as alterações provocadas no solo. Por exemplo, a utilização de pneus mais largos e flexíveis; também pode-se recorrer a maquinaria mais leve, fazendo uso de tratores de rastos de pequeno porte e de baixa a média potência, dentre outros.
A relação entre a força de trabalho humana, animal ou mecânica está na exclusividade que as mesmas detêm, notavelmente porque cada uma tem suas características e funções, bem como geram impactos específicos, que vão depender do contexto socioeconômico, magnitude e ambiente. Apesar da posse de grandes máquinas ser associada a poder e prestígio, o seu uso em pequenas propriedades e em terrenos declivosos muitas vezes é inacessível e inadequado, o que torna a contribuição dos animais um factor essencial para continuidade dos processos (Belieres et al., 2014; FAO, 2014; Silva, 2014; SEAPPA, 2016).
A tração animal é uma alternativa sustentável para agricultura, possui baixo impacto ambiental, além de ser uma possibilidade eminentemente viável em pequenas propriedades e regiões de montanha, onde muitas vezes o acesso a máquinas não é uma opção, o que torna a contribuição dos animais de trabalho um factor essencial no seu cotidiano (Hoffmann, 2010; FAO, 2014; Orgiazzi et al., 2016; Rodrigues et al., 2017).
Um aspeto que deve ser levado em consideração em sistemas que utilizam a força de trabalho animal para realização de atividades, é o bem-estar dos animais, esse é um dos pilares para uma agropecuária responsável. Além disso, o bem-estar animal está diretamente relacionado com a saúde destes e sua eficiência ao realizar os mais diversos trabalhos. É comum não ser dada a devida atenção para este componente, apesar do desempenho do animal afetar toda a dinâmica social dos seus proprietários (FAO, 2014).
Embora uso da tração animal seja marginalizado nos países industrializados, como resultado da modernização na agricultura, os animais permanecem sendo um recurso extremamente importante. Por exemplo, na Índia dois terços da área agrícola são arados com energia animal e 14 milhões de carretas puxadas por animais, que podem transportar até 15% do frete total do país (FAO, 2018). A constante desvalorização da força do trabalho feito por animais incide na geração de poucos incentivos a pesquisas científicas na área, bem como, gera estagnação do desenvolvimento de tecnologias que poderiam otimizar a atividade (FAO, 2010). Assim, objetivo desse trabalho foi analisar o efeito de mobilizações com tração animal nas propriedades físicas do solo.
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi realizado em fevereiro de 2018, numa área agrícola coberta com restolho de milho parcialmente decomposto para silagem, inserida na Quinta do Poulão (Figura 1), estação experimental do Instituto Politécnico de Bragança, localizada no Nordeste de Portugal, em Bragança (41° 46' 49.39" N, 6° 47' 59.68"W).
Segundo a classificação de Köppen (Köppen, 1936) o clima é Csb, temperado com verão seco e suave. A precipitação média anual é de 773 mm, sendo a distribuição típica mediterrânica sazonal, com verões secos, e com chuvas concentradas no outono e inverno. A temperatura média anual é de 12,7° C (IPMA, 2019). O relevo local é plano a suave ondulado, com declive < 5% e elevação média de 690 m acima do nível do mar.
Com base nas características apresentadas, o solo foi classificado como Fluvisolo Êutrico (IUSS Working Group WRB, 2015), com textura franco-argilosa e teores de argila, areia e silte de 21%, 54% e 25%, respetivamente. O solo é profundo (2 m), com um horizonte Ap de 0-30 cm seguido de uma sequência de horizontes C correspondentes aos estratos do depósito aluvionar; a espessura dos horizontes e a textura variam espacialmente, mas sempre nas classes franco-argilosas. Possui um teor médio de MO (3%) e tendência a pH ácido [pH(H2O) = 5,6 e pH(KCl) = 5,0].
Ensaio experimental de campo
A área de estudo sofreu divisão temporal, sendo a amostragem realizada imediamente antes e depois das operações culturais, a fim de se entender o seu impacto na estrutura do solo. As alfaias utilizadas foram o escarificador, o arado de aivecas e a combinação de ambos, com modelos adequados para tração motorizada (grupo A) e para tração animal (grupo B). Cada grupo possuía 3 subparcelas de 60 m² (Figura 2). Os trabalhos foram realizados por uma equipa envolvendo investigadores e estudantes de pós-graduação do Instituto Politécnico de Bragança (IPB), da Associação Portuguesa de Tracção Animal (APTRAN), e da Unversidade da Corunha, Espanha.
A tração motorizada foi realizada com uso de um trator agrícola John Deere 5620, com peso de 3.549 kg e potência nominal de 53,7 kW. O animal de tração empregado foi uma égua da raça Ardennais (Equus ferus caballus) com aproximadamente 800 kg de peso vivo. A profundidade média de trabalho atingida, tanto para a mobilização mecânica, quanto para a animal, foi de 0,2 m.
Ensaio de Permeabilidade
Foram coletadas 4 amostras de solo não perturbadas para cada subparcela na profundidade de 0-5 cm, em anéis de aço inoxidável com volume de 100 cm3, constituindo 24 pontos de amostragem, duplicados, tendo conta que o processo foi divido temporalmente (imediatamente antes e depois do emprego das alfaias). As amostras foram tomadas na faixa central de cada subparcela, em termos de largura, na zona de mobilização do solo.
O equipamento utilizado foi o permeâmetro de circuito fechado, tendo sido usado o método da carga constante. As medições foram realizadas individualmente nas amostras contidas no aparelho por 4 dias seguidos. O cálculo da permeabilidade inicial (Ksi) foi realizado com os resultados obtidos no primeiro dia de medições após a saturação da amostra e a permeabilidade final (Ksf) foi obtida com a média das três últimas medições.
Cálculo e classificação da condutividade hidráulica
A Lei de Darcy é utilizada para cálculo de Ks (permeabilidade saturada), considerando:
Ks = (V*L) / (A* t *dH)
Em que: V, volume de água que flui através da amostra (cm³); Ks, coeficiente de permeabilidade ou condutividade hidráulica (cm/h); dH, diferença de nível de água dentro e fora do cilindro da amostra (cm); L, comprimento da amostra de solo (cm); A, superfície da secção transversal da amostra (cm²); t, tempo estabelecido para a medição do volume V(h). Os valores de Ks obtidos foram submetidos a classificação da permeabilidade dos solos (Quadro 1).
Densidade aparente
A Densidade Aparente (Dap) é um valor adimensional, determinado pela razão entre a massa volúmica aparente do solo (ρs) e a da água (ρ = 1 g/cm³).
Dap = ρs / ρ
A massa volúmica aparente do solo foi calcula por: ρs = Msolo seco / Vcilindro
Em que Msolo seco foi obtida por pesagem da amostra seca na estufa a 105ºC até peso constante (durante pelo menos 24 h) e Vcilindro = A * L.
Outras determinações
Com as amostras submetidas ao ensaio de permeabilidade foi possível realizar outros procedimentos suplementares que permitiram determinar, por estimativa, outros parâmetros.
Porosidade à 1h de drenagem
A porosidade à 1 h de drenagem (P1h) foi calculada a partir da razão entre água retida na amostra e o volume do cilindro:
%P1h = 100 * [(Msolo húmido 1h - Msolo seco) / ρ * Vcilindro]
Em que Msolo húmido 1h foi obtida por pesagem da amostra a saída do permeâmetro após 1 hora de drenagem; Msolo seco foi obtida depois da secagem da amostra na estufa a 105ºC até peso constante (durante 24 horas); ρ, massa volúmica da água (ρ = 1 g/cm³). e Vcilindro = A * L.
Percentagens de humidade à 1h e às 24h de drenagem livre
Ao fim do ensaio, as amostras ficaram drenando por 24 horas com intuito de determinar a percentagem de humidade (%H24h), ou seja, uma estimativa da água retida nos seus microporos (Figueiredo et al., 2018), pois a dimensão da amostra (L = 5 cm) justifica assumir que a drenagem rápida da água contida nos macroporos se realiza em 24 h. Determinou-se este teor de humidade através da diferença entre o peso da amostra nessas condições (Msolo húmido), e o peso obtido depois da secagem da amostra na estufa a 105ºC (Msolo seco):
%H24h = 100 * (Msolo húmido 24h - Msolo seco) / Msolo seco
A percentagem de humidade à 1 h de drenagem (%H1h) foi determinada da seguinte forma:
%H1h = 100 * (Msolo húmido 1h - Msolo seco) / Msolo seco
Estas determinações podem ser consideradas equivalentes, respetivamente, à Capacidade de Campo (CC) e à Capacidade Máxima para Água (CMA).
Tratamento estatístico
O tratamento estatístico dos resultados obtidos incluiu a análise de variância (ANOVA). Antes de realizar a ANOVA, o conjunto de dados foi submetido ao teste de normalidade Kolmogorov-Smirnov, utilizando o calculador disponível em https://www.socscistatistics.com/tests/kolmogorov/. Ao final do teste é informado o p-value (valor-p) que se refere ao nível de significância de normalidade dos dados de entrada. Apenas os resultados com p maior que o nível de significância (p > 0,05) são considerados normais e assim pode ser aplicada a análise de variância. O teste mostrou que para os parâmetros Ksi e Ksf, a distribuição não era normal, com valores de p < 0,05. Nestas séries realizou-se um procedimento complementar, à transformação de variável (neste caso logaritmizadas), sendo o teste repetido com a variável transformada.
Após a ANOVA realizou-se a comparação de médias entre tratamentos através do Teste de Tukey da Diferença Honestamente Significativa (HSD - Honestly significant difference), a 5% de probabilidade. O tratamento de todos os dados foi realizado utilizando as ferramentas do software Excel e as comparações de médias a dois factores foi realizada recorrendo ao calculador disponível no site VassarStats (http://vassarstats.net/anova2u.html).
RESULTADOS
Análise de Variância
Para o estudo, foram aplicados dois métodos de análises de variância a dois factores (Quadro 2). Na primeira (ANOVA 1) foi utilizada a razão entre os valores obtidos para cada parâmetro no mesmo ponto depois e antes da aplicação dos tratamentos (D/A), a fim de normalizar a condição anterior às mobilizações em todas as parcelas, independentemente do valor inicial de cada parâmetro. Com essa relação pode-se inferir que os valores > 1 implicam em aumento do parâmetro em estudo e os < 1 implicam a sua diminuição. Dessa forma foi possível considerar somente os factores tração (animal e motorizada) e alfaias.
Uma vez que o efeito das alfaias não se revelou significativo em nenhuma das variáveis, optou-se por realizar em complementaridade outra análise (ANOVA 2), com os valores originais, considerando agora o momento (antes e depois) e a forma de tração.
ANOVA 1 | ANOVA 2 | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Parâmetros | Tração | Alfaia | Interação | Tração | Momento | Interação |
GL=1 | GL=2 | GL=2 | GL=1 | GL=1 | GL=1 | |
Valores de p | ||||||
Ksi | 0.468 | 0.821 | 0.980 | 0.569 | 0.006 | 0.428 |
Ksf | 0.468 | 0.896 | 0.990 | 0.450 | 0.007 | 0.432 |
Dap | 1.000 | 0.465 | 1.000 | 0.530 | 0.0002 | 1.000 |
P1h | 1.000 | 0.174 | 0.300 | 0.194 | 0.345 | 0.447 |
%H1h | 0.703 | 0.482 | 0.797 | 0.255 | 0.001 | 0.700 |
%H24h | 1.000 | 0.444 | 0.862 | 0.292 | 0.0003 | 0.863 |
Ksi - Permeabilidade inicial; Ksf - Permeabilidade final; Dap - Densidade aparente; P1h -Porosidade à 1h de drenagem; %HSat - Percentagem de humidade à 1h de drenagem; %H24h - Percentagem de humidade às 24h de drenagem e GL - Grau de Liberdade.
Apresentação dos Resultados
A permeabilidade (Ks) refere-se à densidade do fluxo de água no solo saturado, e isso se relaciona com as taxas de infiltração e a drenagem no interior deste, que exercem influência no escoamento superficial do solo (Hillel, 1998). Globalmente, os valores médios de Ks foram classificados como muito rápidos. As permeabilidades inicial (Ksi) e final (Ksf) apresentaram diferenças significativas entre os momentos antes e depois, sendo identificado o dobro do valor depois do emprego das alfaias, tanto na tração animal, quanto na motorizada (Figuras 3A e B).
A densidade aparente (Dap) refere-se à massa existente em uma unidade de volume de solo seco. Através da Dap é possível estimar o espaço poroso do solo. Quanto maior a densidade aparente, menor é o espaço poroso (Merino, 2013). A Dap apresentou diferenças significativas apenas em relação ao momento (antes e depois), tendo-se verificado essencialmente decréscimos de 13% e 14%, após as operações com tração animal e motorizada, respetivamente (Figura 3C).
A porosidade do solo diz respeito à fração deste que não é ocupada por sólidos, mas sim por água e/ou ar. Este parâmetro exerce influência na drenagem e na retenção de água, no arejamento e no enraizamento das culturas (Pischedda, 2009; Almeida et al., 2017). De maneira geral, o comportamento da porosidade à 1 h de drenagem (P1h) não foi muito alterado em relação aos tratamentos aplicados, não sendo observadas diferenças estatisticamente significativas (Figura 3D).
As médias obtidas para a percentagem de humidade à 1 h de drenagem (%H1h) foram similares paras as duas trações empregadas, diferindo estatisticamente entre si nos momentos antes e depois, onde foi possível observar um considerável aumento dos valores depois da realização das mobilizações, 16% e 19%, respetivamente com a utilização da tração animal e motorizada (Figura 3E).
A percentagem de humidade às 24 h de drenagem (%H24h) seguiu a mesma tendência da %H1h, apresentando diferenças significativas em relação ao momento (Figura 3F), sendo observados acrécimos no parâmetro após a realização das mobilizações. Assim, a média de aumento global da %H1h foi de 19% para as alfaias tracionadas com auxílio do animal e de 20% para a tração realizada por maquinaria.
DISCUSSÃO
Os aumentos observados para o parâmetro permeabilidade (Ks) têm relação direta com o preparo do solo que, no primeiro momento, ocasiona mudanças na conformação porosa, permitindo assim que a água infiltre com maior velocidade por não serem fornecidos impedimentos físicos. Como afirmam Figureiredo (2015) e Mooney e Nipattasuk (2003), os valores de Ks são muito influenciados pelo maneio, porque as técnicas adoptadas são refletidas na estrutura do solo, exercendo alterações que podem afetar em maior ou menor grau as taxas de infiltração, a retenção e o movimento da água, e consequentemente as taxas de escoamento durante uma chuvada erosiva.
Os valores de densidade aparente (Dap) apresentaram decréscimos após o preparo do solo, esse resultado relaciona-se com o preconizado para os acréscimos observados na permeabilidade (Ks), ou seja, a ação imediata das alfaias, que atuam conferindo maior arejamento ao solo. Em complementaridade, Santiago e Rossetto (2020), relacionaram o revolvimento do solo com a elevação das taxas de oxigenação.
Os aumentos registrados nas percentagens de humidade à 1 h (%H1h) e às 24 h de drenagem (%H24h) seguiram a mesma tendência observada na permeabilidade. Os acréscimos registrados nos parâmetros avaliados têm relação direta com o efeito provocado pelas operações de preparo do solo. Segundo Agvise (2019) e Santiago e Rossetto (2020), as operações agrícolas promovem o revolvimento do solo, levando a alterações na sua geometria, em maior ou menor grau, tendo reflexos na capacidade de retenção de água pelo solo.
É importante ressaltar que as condições experimentais deste estudo sugerem o efeito que a ação do implemento, tracionado pelo animal ou pelo trator, provoca no solo imediatamente após a sua passagem. Dessa forma, apesar de serem observadas diminuições nos valores de Dap, que favorecem resultados positivos em outros parâmetros, sabe-se que a recorrência das técnicas de lavoura, principalmente com tráfego intensivo de maquinaria agrícola pesada, provoca os efeitos adversos no solo, afetando principalmente a sua estrutura (Merino, 2013).
A contínua exposição da MOS leva a sua oxidação e redução do seu conteúdo, provocando perdas de CO2 e aumento na concentração de iões NO3 - sujeitos a lixiviação. Assim, o arranjo das partículas do solo é afetado, gerando uma diminuição brusca na quantidade de poros. O resultado é a atenuação no movimento da água e do ar, redução da infiltração e o surgimento de limitações ao crescimento das raízes (Merino, 2013; Martins e Fernandes, 2017). Como é comprovado por García‐Tomillo et al. (2017) que observaram aumentos de em média 10% na densidade aparente (0-5 cm) dos tratamentos em estudo, bem como, diminuições na porosidade e na permeabilidade, sendo a amplitude de variação superior na sub-parcela do trator em relação a tração animal.
De acordo com Pischedda (2009), o tráfego com tração animal pode, em alguns casos, ser uma ótima alternativa, devido a seu mínimo impacto sobre o solo. O autor completou afirmando que o tráfego de máquinas pode induzir a diminuição do espaço poroso nas camadas mais internas do solo, provocando um assentamento em profundidade sem que haja qualquer tipo de mudanças a nível superficial.
Evidências encontradas em outros estudos confirmam que a tração animal exerce menos perturbações nas propriedades do solo. Garcia-Tomillo et al. (2017) explicaram que o facto de as operações com animais serem tracionadas com menor velocidade e com cargas mais leves no solo, em comparação as operações tracionadas por tratores, denotam que o uso da energia animal representa menor impacto sobre a estrutura do solo. Da mesma forma Levien e Cogo (2001) observaram menores perdas de solo por erosão no tratamento efetuado com tração animal em relação ao trator, mesmo em plantio convencional.
É de referir que a proposta deste estudo não é instituir a rivalidade entre os animais e a maquinaria agrícola, mesmo porque cada atividade tem sua importância e contexto onde é possível a sua utililização. Como é assinalado por Udriot (2006) e Richart et al. (2005), é necessário encontrar o meio mais aplicável de empregar e distribuir as práticas realizadas no solo, visando a minimização dos efeitos deletérios destas, especialmente em áreas mais sensíveis e que exigem maiores níveis de proteção.
CONCLUSÕES
O estudo demonstrou que não houve diferenças estatisticamente significativas entre os dois tipos de tração empregados na área com restolho de milho; porém foram identificadas diferenças significativas entre o momento de aplicação dos tratamentos para os parâmetros permeabilidade inicial (Ksi) e final (Ksf), densidade aparente (Dap), percentagem de humidade à 1 h de drenagem (%H1h) e percentagem de humidade às 24 h de drenagem (%H24h).
Os resultados em relação ao momento evidenciam que a entrada das alfaias tracionadas por maquinaria ou animal exerceram mudanças no solo, principalmente em relação à retenção e ao movimento da água, afetando positivamente estes parâmetros. Isso aponta para a necessidade de estudos complementares, a longo prazo, para avaliar mais profundamente o efeito da tração animal nas propriedades do solo.
Sabe-se que tração animal é uma prática alternativa e viável em pequenas propriedades e seus benefícios no meio rural têm sido negligenciados há muito tempo. É fundamental a promoção de incentivos à pesquisa sobre os aspetos que envolvem essa atividade e a sua relação com o campo, bem como, a criação de meios que facilitem o acesso às técnicas de maneio dos animais a fim de incentivar o pequeno agricultor a obter rendimentos na produção, sem deixar de lado a conservação do solo.