Introdução1
O envelhecimento demográfico é um tema que preocupa cada vez mais e, talvez por isso, está bastante presente nos media. Comporta numerosos desafios políticos e sociais, que se entrelaçam com desigualdades socioeconómicas e geográficas, que importa analisar e compreender, de modo a procurar formular respostas adequadas e atempadas.
De acordo com os resultados provisórios dos censos publicados em dezembro de 2021 pelo Instituto Nacional de Estatística (2021), o índice de envelhecimento agravou-se substancialmente desde o início do século. Existem atualmente 182 idosos por cada 100 jovens, contra 128 em 2011 e 102 em 2001. Os dados revelam ainda que quase um quarto da população portuguesa tem mais de 65 anos (23.4%), o que faz de Portugal o terceiro país mais envelhecido do mundo.
“A tendência para o crescimento da população idosa é um dos traços mais salientes da sociedade portuguesa actual”, escrevia Fonseca (2005, p. 65) em abertura de um artigo, há quase duas décadas, no qual assinalava a convergência de Portugal com a generalidade dos países europeus: baixas taxas de natalidade e de mortalidade. Outros autores referem a conjugação desses dois fenómenos demográficos com um terceiro, a emigração. Assim, há cerca de uma década, Cabral et al. (2013) realçavam que “a fortíssima emigração portuguesa das décadas de 1960 e 1970, estão na base desse envelhecimento e da importância absoluta e relativa que a população idosa tem hoje na sociedade portuguesa” (p. 11). Ao prisma dos dados relativos à segunda década deste século disponibilizados anualmente pelo Observatório da Emigração2, podemos destacar também o impacto dos elevados fluxos emigratórios no seguimento da crise financeira global de 2008. Do lado dos estudos migratórios em Portugal, a atenção dada ao tema do envelhecimento é escassa. No entanto, o relatório estatístico anual sobre “Indicadores de Integração de Imigrantes” (Oliveira, 2021) assinala a “mudança de alguns perfis migratórios dos últimos anos, nomeadamente associados ao crescimento de estrangeiros reformados residentes no país, em especial de europeus” (p. 65) e frisa os efeitos deste fenómeno no agravamento do índice de envelhecimento. A autora salienta ainda o impacto diferenciado dos fluxos imigratórias consoante a sua proveniência: “se a imigração de origem de países terceiros à União Europeia atenua o envelhecimento demográfico, a imigração de cidadãos comunitários, pelo contrário, exacerba esse envelhecimento” (p. 63). Assim, a imigração pode ter consequências positivas ou negativas na estrutura etária da população residente, consoante as entradas sejam predominantemente de população jovem ativa ou de população com idades mais avançadas. A este respeito, veja-se o estudo de Peixoto et al. (2017) sobre “migrações de substituição”, no qual são consideradas diversas hipóteses de estrutura etária dos saldos migratórios e se conclui que a atração de migrantes de substituição não é suficiente para travar o envelhecimento demográfico, sendo necessárias medidas de retenção de jovens ativos, entre outras.
Neste artigo, de carater exploratório, pretende-se relacionar o envelhecimento demográfico com outros fenómenos que ganharam amplitude na última década e que para ele concorrem: por um lado, o regresso de migrantes3 portugueses/as em idade de reforma e, por outro, a imigração de pensionistas4 estrangeiros/as para Portugal, atraídos por benefícios fiscais como o regime de residentes não habituais (RNH).
Com base nos dados estatísticos disponíveis, salienta-se a evolução da população estrangeira residente em Portugal e a evolução da migração de regresso de portugueses, mais concretamente da Suíça, volvidas quatro décadas do início de uma emigração laboral maciça para aquele país5. Para dar espessura aos números e discutir algumas questões que estes fluxos migratórios levantam, recorre-se também a dados qualitativos de uma pesquisa de terreno recente sobre a transição para a reforma de casais portugueses na Suíça.
O artigo procura estabelecer paralelos entre fenómenos que são habitualmente tratados separadamente. Esta abordagem permite colocar em perspetiva movimentos migratórios que parecem distintos, porém, tal como afirmam Sampaio et al. (2018): “torna-se cada vez mais difícil de desembaraçar diferentes tipos de migração - económico, familiar, orientado para o estilo de vida - que se sobrepõem e se alimentam uns aos outros” (p. 442). Serão, por isso, abordados diversos elementos (fiscalidade, distribuição geográfica, saúde, rendimentos) nos quais os dois grupos de reformados/as em análise se assemelham ou se distinguem, evidenciando, desta forma, disparidades e hierarquias entre “idosos/as”6 migrantes.
Pretende-se, em suma, encetar uma reflexão relativamente às implicações que a chegada de uma população envelhecida acarreta para o país, tendo presente que Portugal se carateriza por “uma situação de grande fragilidade demográfica” (Oliveira, 2021, p. 59) e foi inclusive qualificado de “local de grave crise demográfica” (Peixoto et al., 2017, p. 255).
Estado da arte: Envelhecimento e migrações
Tem-se assistido, desde os anos 1990, a uma crescente produção académica na interseção de duas tendências sociais globais: envelhecimento e migrações. Este campo de estudos tem vindo a ampliar-se nos últimos anos, gerando múltiplas categorias que refletem a heterogeneidade do campo, entre as quais: “older migrants” (Warnes & Williams, 2006), “international retirement migrants” (King et al., 1998), “retirement return migration” (Ciobanu & Ramos, 2015), “zero generation” (Nedelcu, 2009), ou ainda “late in life family joiners” (Horn, 2019). Cada uma destas categorias remete para um pedaço da complexa realidade social produzida pela crescente mobilidade geográfica. Diversas perspetivas foram adotadas para dar conta das várias dimensões dessa complexidade, por exemplo: vulnerabilidade e exclusão social (Ciobanu et al., 2020), acesso a cuidados de saúde (Gehring, 2016), solidariedades familiares (Baldassar, 2007), “lifestyle” (Sampaio & King, 2019), mobilidade transnacional (Bolzman et al., 2017). É um campo que se caracteriza por uma profusão de termos e abordagens. O que a literatura mostra é que o envelhecimento das/dos migrantes e as migrações das pessoas mais velhas são fenómenos multidimensionais e desiguais moldados por uma pluralidade de fatores micro, meso e macro, tais como a classe social, o género, a saúde, a família, o contexto migratório, os regimes de proteção social ou ainda a fiscalidade, entre outros.
Este artigo não aborda esta multiplicidade de perfis, cinge-se à análise de dois grupos de particular interesse para o tema deste dossiê temático, considerando o seu aumento estatístico na última década e o impacto que poderão ter na sociedade portuguesa num futuro próximo. São: i) trabalhadores/as migrantes portugueses/as que envelheceram nos países de destino e regressam ao país de origem no termo da sua vida profissional; ii) pessoas mais velhas que migram para Portugal com o objetivo de viver a reforma num país que lhes proporcione determinado estilo ou nível de vida. No que se segue, notar-se-á um desequilíbrio entre a literatura relativa a um e outro grupo. Tal se deve a uma parca investigação em Portugal sobre migrações e envelhecimento, uma vez que a produção científica nacional tem estado concentrada em torno da população migrante mais jovem.
A reforma é um momento de transição na vida das pessoas, com um grande impacto tanto ao nível individual como social. É um momento propício para desencadear uma migração, internacional ou interna (das cidades para zonas rurais), e, no caso de migrantes que envelheceram nos países de acolhimento, “a questão do regresso pode ser reativada” (Bolzman & Bridji, 2019, p. 17).
Nos tradicionais destinos europeus da emigração portuguesa, alguns estudos sobre migrantes envelhecidos abrangem portugueses/as e focalizam-se principalmente: i) na sua caraterização, ii) nas suas vulnerabilidades e necessidades e iii) nas intenções de regresso e padrões de mobilidade transnacional associada à reforma.
No início do século, Branco (2004) constatava que o envelhecimento da população portuguesa residente em França tinha duplicado em dez anos e que 10% da população portuguesa tinha entre 60 e 75 anos em 1999. Em 2008, de Almeida publica “Os Portugueses em França na hora da reforma” tendo por base dados de respondentes nascidos em Portugal que participaram no inquérito “PRI - Passagem à Reforma dos Imigrantes” realizado em França em 2002-03. Este estudo inédito abrange um vasto leque de perguntas sobre a trajetória migratória, a situação presente e os projetos futuros de migrantes entre os 45 e os 70 anos. Os resultados revelam que a maioria tem um estado de saúde precário e pensões relativamente baixas quando atingem a reforma, revelam ainda uma clara preferência desta população por ficar em França após a reforma (37.7%) ou por uma prática de residência alternada entre os dois países (36.8%), a opção de regresso permanente é a menos comum (11.1%).
Um estudo recente conduzido no Luxemburgo com portugueses/as entre os 41 e 79 anos aponta para tendências semelhantes: 43% pretende permanecer no país, enquanto 25.2% prefere ir e vir e apenas 21.5% planeia regressar (Albert et al., 2016). As investigadoras explicam esta última percentagem - quase o dobro da encontrada em França - pelo facto de o perfil de migrantes que pretendem regressar a Portugal corresponder essencialmente a pessoas relativamente novas, ainda no ativo e sem netos; acreditam, por isso que as intenções de regresso poderão alterar-se à medida que forem envelhecendo. Tornar-se avós representa, de facto, um dos principais motivos para permanecer no Luxemburgo (Ramos & Martins, 2020), onde o grupo com 65 e mais anos representava, em 2021, praticamente 10% da população portuguesa residente naquele país, de acordo com os dados mais recentes do instituto luxemburguês de estatística (STATEC-CTIE).
Na Suíça, Bolzman e Vagni (2018) analisaram as condições de vida de migrantes entre os 65 e os 79 anos. Neste estudo, a população portuguesa aparece em clara desvantagem comparativa em relação às populações espanhola, italiana e suíça em todos os itens: menor escolaridade, menor sociabilidade, fraca saúde e dificuldades financeiras. Os autores concluem que “os portugueses são claramente o grupo mais desfavorecido” (p. 81). Na Suíça, a população portuguesa começou a surgir em estudos comparativos na última década, nomeadamente estudos que se centram na mobilidade e intenções de regresso de migrantes do sul da Europa, antes e depois da reforma. Analisando dados quantitativos de 2011-12, Bolzman et al. (2017) colocam a hipótese de uma “cultura de regresso” mais forte para explicar a maior propensão dos/as portugueses/as para saírem da Suíça depois dos 65 anos. Também Attias-Donfut e Wolff (2005), num artigo sobre circulação entre país de origem e país de acolhimento, salientam uma maior inclinação para o regresso de portugueses/as residentes em França quando comparam os resultados de várias nacionalidades ao inquérito PRI.
Na revisão da literatura sobre migrantes laborais que regressam na reforma, Ciobanu e Ramos (2015) depreendem que a intenção de regressar “depende da combinação de um grande número de fatores que a podem condicionar ou favorecer” (p. 97), tais como o nível de integração no país de destino, as configurações familiares e redes sociais, mas também os sistemas de saúde, a necessidade de cuidados médicos e a possibilidade de exportar os benefícios sociais para outro país. Outro fator relevante é a idade, sendo mais provável uma migração ocorrer quando se é “jovem-velho” por oposição a “velho-velho”, uma fase associada a vulnerabilidades acrescidas e dependências várias. As necessidades específicas de apoio/cuidados da população migrante portuguesa mais envelhecida começaram, aliás, a emergir na literatura (Karl et al., 2017).
São de referir ainda autores portugueses que analisaram o regresso de migrantes portugueses durante a primeira década do século (2001-2011), tendo por base os censos de 2011 (Oliveira et al., 2016; Oliveira et al., 2017; Peixoto et al., 2019). Estes/as autores/as fazem notar que, nesse período, França e Suíça surgem como os principais países de origem dos regressos observados (com 26% e 12.6% respetivamente) e que cinco países europeus somam 70% do fluxo de regresso (os outros três são Espanha, Reino Unido e Alemanha). Os autores analisam algumas caraterísticas dos/as portugueses/as regressados/as nomeadamente a idade, a condição perante o trabalho e os meios de vida. Constatam que França é o país de onde voltaram mais portugueses/as em situação de reforma (51.9% das pessoas em proveniência desse país na referida década). “Pelo contrário, de países como a Suíça, Espanha e Reino Unido vêm muito poucos emigrantes reformados/pensionistas” (Oliveira et al., 2017, p. 14). Um dado que pode ser explicado pelo período histórico das primeiras levas de migrantes portugueses para cada país, sendo a França o país com o stock mais envelhecido, uma vez que foi o destino predominante nas décadas de 1960-70. Assim, os/as autores/as verificam que apenas cerca de 10% do total de migrantes portugueses/as regressados/as da Suíça no período 2001-2011 eram reformados/as.
Quanto aos/às migrantes reformados/as, o fenómeno revelou-se uma linha de pesquisa prolífera no plano internacional, embora, em Portugal, lhes seja dada uma atenção deficitária. Um artigo recente sobre a população sueca a viver em Portugal abrange pessoas reformadas sem, todavia, analisar as especificidades deste grupo (Rauhut, 2021). Contudo, a abundante literatura em língua inglesa sobre migrantes reformados/as informa-nos sobre os principais fatores deste tipo de migração, cujos contornos se complexificaram e as geografias se expandiram nos últimos anos (Sampaio et al., 2018). O enfoque foi inicialmente colocado em pessoas com alguma capacidade financeira que procuravam melhorar a sua qualidade de vida num país com um clima mais ameno, um ritmo de vida mais relaxado e um custo de vida mais baixo (Casado-Díaz, 2006; King et al., 1998). Mais recentemente, a migração de reformados/as do norte e centro da Europa estendeu-se para leste e oriente, sendo também motivada por dificuldades financeiras nos países de origem (Horn & Schweppe, 2015). Assim, a migração de reformados/as abrange pessoas que se enquadram na chamada migração “estilo de vida”, movidas pelo atrativo de zonas costeiras ou pela busca de um rural idílico, mas também pessoas no limiar da precariedade que migram para poderem viver e não apenas sobreviver (Repetti et al., 2018). Entre estes dois polos, há quem mude de país na perspetiva de garantir um envelhecimento ativo, seja pela criação de um negócio próprio (p. ex. turismo rural) (King et al., 2019), seja por esta migração possibilitar mais oportunidades de atividades ao ar livre e viagens (Torkington & Ribeiro, 2019).
Nota metodológica e apresentação de resultados
Os dados aqui apresentados foram recolhidos no âmbito de uma investigação sobre a transição para a reforma de casais portugueses na Suíça. O trabalho de terreno decorreu entre setembro de 2018 e abril de 2021, tendo sido realizadas vinte entrevistas biográficas, na Suíça e em Portugal, a migrantes na reforma há menos de cinco anos. Estas pessoas foram identificadas essencialmente através de redes de interconhecimento e nalguns casos através de estruturas portuguesas na Suíça. A pesquisa incluiu também uma componente de observação participante, nomeadamente em contexto de viagem entre os dois países. Aviões e aeroportos constituíram espaços privilegiados e momentos oportunos para mais de uma dezena de conversas ocasionais com migrantes reformados/as, nacionais e estrangeiros/as. Esta componente etnográfica permitiu alargar o âmbito das questões de pesquisa iniciais e comparar vivências de dois grupos que são geralmente estudados em separado.
A apresentação de resultados inclui uma análise de dados do instituto suíço de estatística (OFS) relativos aos fluxos de saída e stock de portugueses/as na Suíça, bem como de dados nacionais disponibilizados anualmente pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) relativos à população estrangeira residente em Portugal.
O “regresso de emigrantes” na reforma
O tema “regresso de emigrantes” portugueses/as foi bastante estudado no início da década de 1980, quando, no seguimento de dois choques petrolíferos, a crise económica travou o ritmo de crescimento dos países industrializados e o recrutamento de mão-de-obra estrangeira. Na altura, tratava-se de analisar a reinserção de portugueses/as que tinham regressado em idade laboral e o seu potencial no desenvolvimento regional (Silva et al., 1984). O regresso continuou a ser estudado, em certa medida, durante os anos 1990 para, progressivamente, desaparecer da agenda. Baseando-se num inquérito realizado em 1999 em Ponte de Lima a portugueses/as regressados/as, Roca (2000) notava que “apesar de terem diminuído em intensidade, os contrafluxos continuaram a ser importantes (…) abrangendo um número crescente de emigrantes em idade de pré-reforma” (p. 45), na faixa dos 55-64 anos, o que poderá dever-se ao envelhecimento gradual dos/as portugueses/as residentes no estrangeiro.
Nos últimos anos, o tema “regresso de emigrantes” voltou a merecer atenção tanto por parte da academia7 como da esfera política8. O interesse está, por um lado, em saber se quem emigrou desde o início do século planeia regressar e, por outro, em atrair pessoas em idade ativa, apostando-se na recuperação de parte da mão-de-obra qualificada que saiu do país nos anos da crise económica e da Troika. O foco é posto na reintegração no mercado de trabalho nacional de pessoas em idade ativa e no incentivo à criação de novos negócios em Portugal.
A pesquisa sobre a qual se baseia este artigo centra-se num segmento totalmente distinto da população portuguesa migrante: pessoas entre 60 e 70 anos, reformadas ou em transição para a reforma. Esta pesquisa procura compreender os padrões de (i)mobilidade transnacional quando as pessoas - neste caso, residentes na Suíça - chegam ao termo da sua vida profissional. Nas primeiras incursões no terreno, o tema do regresso impôs-se rapidamente como central. Ademais, tornou-se um tema de grande atualidade, atendendo às alterações observadas nos fluxos migratórios entre Suíça e Portugal nos últimos cinco anos, nomeadamente um saldo migratório negativo desde 2017. Na realidade, as saídas de portugueses/as da Suíça foram bastante constantes ao longo das décadas, contudo tornaram-se mais visíveis agora, dado que o volume destas saídas se intensificou numa altura em que, simultaneamente, se verificou uma diminuição dos fluxos de saída em Portugal, concomitante com a descida do desemprego e sinais de retoma económica. O envelhecimento da população portuguesa na Suíça foi outro dos fatores que concorreu para esta inversão de fluxos migratórios, dado que decorreram quatro décadas desde que a Suíça se tornou um destino predileto para trabalhadores/as portugueses/as, sobretudo a partir da década de 19809. Verifica-se, portanto, que a maioria das pessoas que foram ficando e adiando o projeto de regresso, estão a concretizá-lo com a chegada à reforma. Este fenómeno é percetível nos dados disponibilizados pelo OFS: por um lado, a percentagem das pessoas com mais de 60 anos que saem da Suíça aumentou significativamente na última década (cf. Quadro 1). Por outro, as pessoas com mais de 65 anos representam cerca de 2.2% de população portuguesa residente na Suíça, um número que, apesar de estar a aumentar, é residual, e se explica pela partida de portugueses/as mais velhos/as, contrariamente ao que se tem verificado noutros países (como França e Luxemburgo), onde a mobilidade pendular é uma prática comum dos/das portugueses/as (Albert et al., 2016; Attias-Donfut & Wolff, 2005; de Coulon & Wolff, 2010).
Total | 0-19 anos | 20-39 anos | 40-64 anos10 | 65+ anos | % 65+ anos sobre Total | |
2009 | 4 302 | 881 | 1 981 | 1 359 | 81 | 1.9 |
2010 | 5 036 | 1 022 | 2 343 | 1 556 | 115 | 2.3 |
2011 | 4 038 | 709 | 1 888 | 1 339 | 102 | 2.5 |
2012 | 4 407 | 730 | 2 077 | 1 502 | 98 | 2.2 |
2013 | 4 947 | 745 | 2 273 | 1 788 | 141 | 2.9 |
2014 | 5 923 | 1 002 | 2 607 | 2 133 | 181 | 3.1 |
2015 | 6 734 | 1 272 | 2 734 | 2 477 | 251 | 3.7 |
2016 | 7 659 | 1 491 | 2 871 | 2 929 | 368 | 4.8 |
2017 | 10 115 | 1 964 | 3 439 | 4 039 | 673 | 6.7 |
2018 | 10 909 | 2 036 | 3 611 | 4 666 | 596 | 5.5 |
2019 | 11 116 | 2 252 | 3 662 | 4 655 | 547 | 4.9 |
2020 | 10 909 | 2 036 | 3 611 | 4 666 | 596 | 5.5 |
Fonte: OFS (2021a).
O que motiva o regresso numa fase tardia do ciclo de vida? Vários fatores concorrem para esta decisão, nomeadamente ter bens imobiliários em Portugal, mas também o baixo nível das pensões auferidas comparativamente com o elevado custo de vida na Suíça e o custo dos seguros de saúde. Importa referir que o regresso nem sempre era a intenção prevalecente nos anos que antecederam a reforma. Várias pessoas entrevistadas mencionaram não ter outra escolha: a opção é regressar e viver uma velhice confortável, ou ficar e correr o risco de precarização e ter de recorrer ao apoio dos/as filhos/as ou, eventualmente, aos serviços sociais. Dada a sua posição na escala social, os/as portugueses/as envelhecidos/as estão particularmente vulneráveis naquele país, porém, viver a reforma na Suíça também representa um desafio para um número acrescido de nacionais11. Assim, em 2020, 12% dos/as suíços/as com 65 anos e mais residiam no estrangeiro.
O regresso de migrantes envelhecidos/as coloca várias questões, desde logo, para onde regressam? Estudos anteriores indicam que “a quase totalidade dos regressados se dirige para a mesma freguesia de onde havia saído” (Pinho et al., 2021, p. 994), porém Branco (2004) questiona se quem regresse de França na reforma irá voltar para as localidades de origem, muitas delas desertificadas após décadas de êxodo rural, ou se irá antes preferir fixar-se nas cidades? O autor faz notar que num ou noutro caso, as infraestruturas e equipamentos sociais deveriam sofrer adaptações. Coloca-se, assim, a questão das necessidades que estas pessoas que regressam acarretam para os territórios onde se fixam e, inversamente: o que trazem consigo, em termos recursos, sejam económicos ou outros, menos tangíveis?
A imigração de reformados/as estrangeiros/as
Além de reformados/as nacionais, Portugal tem também acolhido muitos reformados/as estrangeiros/as na última década. O estatuto de residente não habitual, criado em 200912, contribuiu para aumentar a atratividade internacional do país junto desta população: inicialmente aplicava-se uma isenção sobre os rendimentos de pensões estrangeiras durante dez anos, desde 2020, aplica-se uma taxa de 10%.
Os dados do SEF (Quadro 2) indicam um aumento substancial da população estrangeira residente em Portugal com 65 e mais anos na última década. Para esta situação, contribuíram as populações migrantes jovens que se fixaram em Portugal no século passado, mas também a chegada de migrantes “idosos/as” como é o caso de pensionistas que escolhem viver a sua reforma em Portugal.
Total | 65 anos+ | % 65+ anos sobre Total | |
2000 | 208 198 | 356 | 0.2 |
2010 | 445 262 | 18 306 | 4.1 |
2020 | 662 095 | 63 216 | 9.5 |
Fonte: SEF, Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo, 2000, 2010, 2020.
A vinda de pensionistas europeus para Portugal, em particular para o Algarve, não é um fenómeno recente (King et al., 1998). Aliás, na faixa etária 65+, entre 2001 e 2005, os países UE15 representaram mais de metade dos fluxos de chegada de estrangeiros. Contudo, a categoria “migrantes idosos” em Portugal era essencialmente alimentada pelo envelhecimento de pessoas provenientes de países com uma relação histórica com Portugal, vindas no contexto da descolonização ou como migrantes económicos, ocupando lugares distintos no mercado de trabalho nacional (Machado & Roldão, 2010; Marques & Ciobanu, 2012).
Já, no que toca à última década, a intensificação do envelhecimento da população estrangeira residente em Portugal pode estar relacionada com a adoção de uma política fiscal concorrencial adotada com o objetivo de dinamizar a economia portuguesa num contexto de crise financeira e económica global. O estatuto de RNH aplica-se nomeadamente a pessoas com pensões provenientes do estrangeiro que mudem a sua residência fiscal para Portugal e que não tenham residido no país nos cinco anos anteriores a essa mudança. Ampudia de Haro e Gaspar (2021) referem que esta medida política começou a notar-se “a partir de 2014, num cenário de final da crise financeira e quando Portugal intensificou a sua afluência de turistas, o número de indivíduos a solicitar este regime começou a acentuar-se” (p. 8). O relatório do SEF de 2014 assinala, aliás, o impacto do regime fiscal RNH no aumento do fluxo migratório para Portugal, destacando, nesse ano e no seguinte, o crescimento exponencial da imigração de pessoas com cidadania francesa.
Contudo, como sublinham Ampudia de Haro e Gaspar (2021), os dados sobre a evolução e composição dos RNH são de difícil acesso. Um relatório sobre “Os benefícios fiscais em Portugal” (Oliveira, 2019) divulga dados cumulativos relativamente ao ano 2017 (cf. Quadro 3). Apesar de incompletos, estes dados permitem ter uma ideia da tendência que se tem vindo a desenhar nos últimos anos relativamente à vinda de pensionistas para Portugal que beneficiam do estatuto de RNH.
França | 3 105 |
Itália | 1 373 |
Suécia | 1 347 |
Reino Unido | 933 |
Portugal | 550 |
Finlândia | 400 |
Bélgica | 298 |
Brasil | 256 |
Suíça | 235 |
Holanda | 200 |
Total | 9 589 |
Fonte: Oliveira (2019, p. 190).
Uma última nota sobre a população suíça a residir em Portugal. Apesar de pouco significativa quando comparada com outras nacionalidades, o número de residentes provenientes da Suíça tem aumentado de forma consistente ao longo dos anos. Em 2020, eram mais de 4 700 pessoas, das quais 32.1% tinham mais de 65 anos (OFS, 2021b), contra 26.6% em 2017. Estes números têm por base registos consulares e englobam também pessoas binacionais, nomeadamente migrantes portugueses/as naturalizados/as suíços/as que se instalaram em Portugal. Uma análise mais fina permitiu apurar que, em 2020, 55% dos/as residentes suíços/as em Portugal com 65 ou mais anos apenas tinham a nacionalidade suíça (827 em 1 514 pessoas).
Semelhanças e diferenças entre reformados/as migrantes, nacionais e estrangeiros/as
Os/as migrantes reformados/as, sejam nacionais que regressam ou estrangeiros/as que solicitam a residência em Portugal têm mais pontos em comum do que um primeiro olhar, pouco atento, poderia supor. Efetivamente, tantos uns como outros, apontam como motivos que conduzem à escolha de viver a sua reforma em Portugal a busca de um nível de vida acessível/confortável, o clima e o facto de ser um destino não muito distante da família, o que facilita os vaivéns de avós, filhos/as e netos/as. Ao emigrar depois dos 60 anos, procuram melhorar ou manter uma qualidade de vida boa, ou pelo menos decente. Apesar de nem sempre ser uma situação abertamente assumida, permanecer no país onde se residia antes da reforma implica não raras vezes dificuldades financeiras, tanto para migrantes como para nacionais. Carreiras contributivas incompletas, empregos com salários baixos ou a tempo parcial (situações que tocam mais as mulheres) e períodos de desemprego são algumas das situações que contribuem para uma maior fragilidade económica e material numa idade mais avançada. Poder beneficiar do diferencial do poder de compra é um aspeto-motor do movimento norte-sul das pessoas mais velhas, sejam migrantes laborais que optam por regressar na reforma, sejam reformados/as do centro e norte da Europa. É um elemento recorrentemente assinalado na literatura e também observado no terreno.
No entanto, são também de assinalar diferenças substanciais que se transformam por vezes em desigualdades. Desde já, o acesso ao regime fiscal criado para, nomeadamente, atrair reformados/as europeus e que, apesar de se aplicar também a migrantes portugueses/as que regressem na reforma, não os/as beneficiou de igual forma. Os dados empíricos recolhidos durante a pesquisa de terreno dão pistas para as razões de ser desta disparidade: várias pessoas regressadas referem terem recebido informações erradas por parte de funcionários/as da Autoridade Tributária e Aduaneira quando se dirigiram a este organismo para esclarecer os seus direitos; referem ainda não terem sido informadas sobre a possibilidade de beneficiar do regime fiscal RNH quando trataram das burocracias inerentes ao regresso a Portugal junto dos postos consulares da sua área de residência; por outro lado, entre as pessoas entrevistadas beneficiárias do RNH, a situação mais frequente é terem tido conhecimento da medida através de meios de comunicação suíços ou de pessoas beneficiárias que já haviam regressado. Ademais, foi somente em 2019 que o então secretário de Estado dos Assuntos Fiscais veio esclarecer que: “Não é um estatuto apenas para os estrangeiros, mas também para todos os portugueses que regressam com a sua pensão a Portugal”13. Nesse ano, o governo lançou, pela primeira vez, guias fiscais tendo “como objetivo o esclarecimento das dúvidas mais comuns dos concidadãos portugueses que residem no estrangeiro, em matérias de direito fiscal”14. Em suma, esta política fiscal criou desigualdades e gerou descontentamento por parte de reformados/as regressados/as que qualificavam para a medida, mas não tiveram informação atempada nem apoio para dela beneficiar. O RNH fez, aliás, florescer um conjunto de serviços especializados no segmento “reformados europeus”, desde gabinetes de advocacia a agências imobiliárias. Em contrapartida, os Gabinetes de Apoio ao Emigrante são pouco efetivos no apoio (gratuito) que prestam e a sua existência é desconhecida pela maioria dos/as migrantes, que acabam por recorrer a advogados/as e solicitadores/as para resolver as burocracias inerentes ao processo de reinstalação no território nacional.
A distribuição geográfica é outra diferença maior. Apesar de não existirem dados quantitativos sobre a habitação de portugueses/as reformados/as regressados/as nem de reformados/as estrangeiros/as, a pesquisa de terreno e os estudos existentes sobre as diferentes categorias de migrantes fornecem indicações sobre as opções e preferências residenciais. Nota-se uma predominância de estrangeiros/as em regiões costeiras, nomeadamente Algarve, e na Área Metropolitana de Lisboa. Há também quem escolha regiões do interior, porém não existem dados. No caso dos/as migrantes portugueses/as, os estudos existentes apontam para um regresso ao local de partida. Os dados de terreno também corroboram que essa é a opção mais comum, geralmente relacionada com a propriedade de um imóvel. O investimento realizado, financeiro e emocional, é a justificação para esta decisão, mesmo quando não corresponde às aspirações atuais, volvidas décadas sobre o projeto migratório inicial. Esta discrepância é precisamente o que leva certas pessoas a hesitarem em regressar. Umas não querem voltar a viver na aldeia, porque (já) não se identificam com o modo de vida rural, outras não querem voltar para um lugar onde só vivem velhotes e mortos, desabafava uma portuguesa radicada na Suíça, originária do concelho da Guarda. Ela explica que nestas zonas desertificadas do interior, só no verão, quando todas as pessoas que emigraram voltam de férias, é que a terra ganha vida e faz sentido lá estar. A emigração (para dentro e fora de Portugal) esvaziou as regiões interiores da população jovem, contribuindo para o seu envelhecimento. Em estudos sobre o regresso de portugueses/as na década de 1980, era referida a expectativa que o fenómeno pudesse “contribuir para ‘preencher’ zonas deixadas ‘vazias’ exactamente pela emigração” (Amaro, 1985, p. 615), atendendo a que, nessa altura, “ao contrário do que muitas vezes se pensa, o regresso não traz para o País uma população envelhecida (…), mas sim uma população predominantemente em idade activa, trazendo consigo uma 2a geração” (Amaro, 1985, p. 632). Sabemos hoje que a expectativa não se confirmou, que a emigração prossegui a bom ritmo nas décadas seguintes, nomeadamente para a Suíça (Marques, 2009). Todavia, na atualidade, assiste-se ao regresso de migrantes portugueses/as com mais idade, a maioria para as regiões de onde partiu, décadas atrás. Porém, anos de austeridade e desinvestimento público15 levaram à escassez de emprego, serviços e população jovem nessas regiões16. Por isso, certos/as migrantes estão reticentes em voltar para localidades onde não encontram os recursos que estimam necessários nesta fase da sua vida. Há quem opte por fixar-se mais perto de uma grande cidade e de um aeroporto, o que facilita as visitas da/à família no estrangeiro.
Um dos aspetos que as pessoas reformadas avaliam quando mudam de país/região é o acesso e a qualidade dos cuidados de saúde. Este é um aspeto critico dado que a literatura evidencia problemas de saúde acrescidos dos/as portugueses/as emigrados/as nas comparações com outras nacionalidades nos países onde residem. Na pesquisa de terreno também foram observadas numerosas queixas ao nível da saúde e situações de incapacidade ao trabalho antes da reforma; problemas em grande medida associados às profissões exercidas ao longo da vida. Ademais, existe uma maior probabilidade de deterioração do estado de saúde à medida que as pessoas envelhecem. Hall e Hardill (2016) exemplificam isso mesmo no caso de reformados/as britânicos/as em Espanha e salientam várias dificuldades no acesso aos cuidados de saúde, nomeadamente barreiras linguísticas, culturais, mas também financeiras. Nessa senda, Sampaio e King (2019) centram-se no caso dos Açores e salientam o potencial que “‘jovens-velhos’ migrantes orientados para o estilo de vida e ativos” (p. 194) representam para as zonas rurais, mas alertam também para a volatilidade desta população, ou seja, uma possível saída destes/as reformados/as à medida que o seu envelhecimento coloca novos desafios que não são atendidos nas sociedades recetoras. Alguns estudos já refletem o movimento inverso de regresso de reformados/as estrangeiros/as “velhos-velhos” aos seus países de origem; o tema, porém, é ainda marginal nos estudos sobre migração na reforma.
Em termos económicos, a fixação de novos residentes, mesmo envelhecidos traz benefícios, desde já porque fazem funcionar a economia local. Na pesquisa de terreno, pude observar que os casais de portugueses/as regressados/as realizam, quase sempre, um investimento nas suas casas (reabilitação, obras de manutenção e de melhoria) e contratam com frequência serviços informais de apoio (para limpeza, manutenção da casa e trabalhos de jardinagem). Já, os/as reformados/as estrangeiros/as investem na aquisição de uma casa ou apartamento e em despesas de consumo pessoal e lazer. King et al. (1998) previam transferências substanciais de rendimentos do norte da Europa para as regiões de fixação destes/as reformados/as. Porém, cá dentro e lá fora, há quem aponte o dedo ao “eldorado fiscal para reformados europeus”17 em que Portugal se tornou. O boom de estrangeiros/as, muitos pensionistas, mas não só, com poder de compra superior ao da população nacional tem sido visto como um dos motivos que dificultam o acesso à habitação à população portuguesa.
É certo que ambos os grupos de reformados, nacionais e estrangeiros, representam um ganho económico para o país, pois através da sua imigração opera-se um movimento de transferência de pensões e capitais. A sua fixação no território nacional comporta, porém, diferenças. Uma das principais é a sua dispersão/concentração geográfica que, em certos casos, poderão contribuir para sobrecarregar infraestruturas e serviços que (ainda) não foram dimensionados para tamanha procura, atendendo ao rápido agravamento do índice de envelhecimento em Portugal.
Considerações finais
Dois movimentos migratórios que, não sendo novos, se avolumaram recentemente, têm concorrido para o envelhecimento acelerado da população residente: o regresso de migrantes portugueses/as reformados/as e a imigração de reformados/as estrangeiros/as. Neste artigo, foram abordadas algumas das implicações que a vinda destes/as reformados/as acarreta para os territórios onde se fixam. Por falta de espaço, não foi, todavia, possível abordar muitas das questões que estes movimentos migratórios para Portugal colocam: como ocupam o tempo os/as reformados/as vindos/as do estrangeiro? Quais as suas práticas culturais e sociais e quais os seus padrões de mobilidade? O que os/as distingue de quem se reformou em Portugal, equiparando idade e classe social? Que projetos tecem para o futuro? As pensões que hoje avaliam como confortáveis (para quem teve uma carreira contributiva longa no estrangeiro), serão suficientes daqui a dez ou vinte anos para satisfazer necessidades crescentes à medida que vão envelhecendo? No caso de reformados/as da Suíça, a sua segurança financeira será afetada por flutuações futuras na taxa de câmbio? Ademais, a literatura consultada aponta para a predominância de uma migração de reforma de pessoas independentes e ativas, sozinhas ou em casal. Poderá uma alteração significativa nas condições de vida (viuvez, doença, perda de autonomia) desencadear uma migração em sentido inverso, para junto de familiares no estrangeiro?
Na discussão, ficaram patentes diferenças entre pessoas reformadas nacionais e estrangeiras em termos de impacto nos territórios onde se fixam. Também diferem em termos de desejabilidade: dos/as reformados/as nacionais espera-se que regressem (naturalmente), não há por isso nenhuma campanha de informação direcionada. Enquanto os/as reformados/as estrangeiros/as, considerados/as potenciais investidores, merecem uma atenção particular por parte de atores públicos e privados. Um e outro grupo representam um importante contributo para a economia nacional, mas enquanto os/as regressados/as participam da economia local, em particular nas zonas rurais/despovoadas ou em vias de despovoamento onde se reintegram, os/as estrangeiros/as participam sobretudo das dinâmicas de gentrificação em curso. Num e noutro caso, a sua integração não está isenta de uma certa conflituosidade latente, pois os benefícios fiscais para os quais são elegíveis criam hierarquias, outorgando-lhes uma posição de privilégio em relação a quem se reformou em Portugal.
Ao comparar duas categorias de migrantes na reforma, este artigo destaca algumas das múltiplas e complexas interseções que compõem o “nexo envelhecimento e migrações” (Sampaio et al., 2018). Chama igualmente a atenção para a escassez de estudos neste domínio, no plano nacional. Ora, como Bolzman & Vagni (2018) frisaram, e bem, é necessário “produzir descrições mais precisas das condições de vida de todas as pessoas idosas (...) para informar as políticas públicas para que possam considerar a diversidade de situações e necessidades” (p. 85). Importa, ainda, sublinhar o carater urgente destes estudos, atendendo à amplitude que tanto o envelhecimento demográfico como a imigração de reformado/as ganharam na última década em Portugal.