1. Introdução
Muito se tem discutido acerca da atual crise urbano-ambiental enfrentada no mundo. Numa análise prévia, destaca-se a Revolução Industrial como marco inicial consolidador de uma sociedade moderna, cujo modelo de desenvolvimento econômico designa-se: capitalismo. A atual crise possui relação direta com o modelo de vida desenvolvido e o sistema econômico vigente, que desempenha importante papel na consolidação dos hábitos e princípios que caracterizam essa sociedade. Diante dessa rigorosa crise, a necessidade de um desenvolvimento sustentável, um dos principais aspetos reforçados em diversas conferências mundiais, firma-se como conceito orientador para Estados, empresas, entidades e organizações governamentais e não-governamentais.
Um olhar mais consciente e preocupado da sociedade com os danos ao meio ambiente, tem se refletido diretamente em modelos de desenvolvimento de produtos, que buscam, através da reutilização e/ou reciclagem de resíduos, reduzir o impacto gerado no ambiente. Este estudo perspetiva abordar aspetos referentes à indústria da construção civil, o impacto gerado pelo setor e iniciativas sustentáveis na área do design.
Foi desenvolvido no âmbito de uma investigação de mestrado em Design Industrial e de Produto, Universidade do Porto, e consiste numa pesquisa exploratória. Desenvolveu-se uma abordagem teórica sobre a temática, a nível mundial e da União Europeia, e explorou-se sobre os resíduos gerados por esse setor. Também foram analisados casos de estudos com informações recolhidas via web, estabelecendo conexões com a economia circular e o ecodesign. A metodologia incluiu o contato com profissionais da área da construção e do design (entre setembro e dezembro de 2022), o que contribuiu para reunir dados e informações em primeira mão sobre o objeto de estudo.
2. A indústria da construção civil
2.1. Resíduos de construção e demolição a nível mundial:
Ao longo da história, a arquitetura tradicional sempre buscou se adequar às condições climáticas e materiais locais. No entanto, com o avanço do processo de industrialização a partir do século XIX, diversos setores, especialmente a construção civil, foram pressionadas a se adaptar a essas mudanças, levando em consideração três fatores: qualidade dos produtos finais, modernização tecnológica (com a racionalização dos processos) e desenvolvimento de inovações tecnológica. Como resultado, técnicas de construção natural passaram a ser vistas como obsoletas e novas tecnologias que prometiam flexibilidade e rapidez foram adotadas em seu lugar (Alencar, 2018) [1].
A indústria da construção civil caracteriza-se como uma das atividades mais imponentes, que contribui de forma significativa no processo de desenvolvimento socioeconômico de um país. Segundo com Raza Khan (2008) [2], as atividades desse setor são muito relevantes para a consecução das metas nacionais de desenvolvimento socioeconômico de fornecimento de infraestrutura, refúgio e emprego. No entanto, a cadeia da construção civil também é responsável por consideráveis impactos ambientais, sociais e econômicos. Segundo especialistas, o setor se encarrega de consumir cerca de metade dos recursos naturais explorados em todo o mundo (Wit et al, 2019) [3], 40% de toda a energia e 40% da água utilizada considerando todo o processo produtivo (Stefan et al, 2017) [4]. Crawford (2021) [5] observa que essa categoria é responsável por aproximadamente 40% das emissões de CO2 e relaciona o agravamento das problemáticas geradas pelo setor da construção civil ao crescimento populacional e a elevação dos padrões de vida e consumo das sociedades contemporâneas. De acordo com o relatório Buildings-GSR 2022 (Global Status Report for Buildings and Construction, 2022), a indústria da construção não está progredindo na direção necessária para atingir o objetivo de descarbonização até 2050, meta estabelecida pelo Acordo de Paris, tratado internacional assinado por centenas de países.
A problemática da construção civil não termina com a finalização da construção ou reforma; estima-se que o setor produza cerca de um terço de todos os resíduos mundiais (Lauritzen, 2020) [6], sendo considerada a indústria mais poluente, na qual todas as fases do processo produtivo geram impactos, sobretudo no que tange à extração de matérias-primas.
Dos materiais utilizados no setor da construção, são exemplos: a cal, a areia, a brita, o aço, o alumínio, o vidro e a madeira. Devido a fácil operação, durabilidade e versatilidade (Belaïd, 2022) [7], a grande máquina motivadora desse setor é o concreto. O material, que é composto por pasta de cimento (água e cimento), areia e brita, é o segundo produto mais consumido pela humanidade, ficando atrás apenas da água (Gagg, 2014) [8]. De acordo com Uratani e Griffiths (2023) [9], apesar da indústria de concreto desempenhar um papel fundamental na construção da infraestrutura moderna, o setor tem um enorme impacto nas emissões de carbono. A produção de um dos seus componentes, o cimento, representa cerca de 7% das emissões globais (Borenstein, 2022) [10]. Além disso, a produção destes e outros materiais de construção apresenta como principais impactos o consumo de energia e recursos, a supressão da vegetação, a alteração de uso e ocupação do solo e resíduos sólidos despejados no meio ambiente.
A geração desses desperdícios que integram os resíduos sólidos, representa pelo menos 30% do total em todo o mundo (Ginga et al., 2020) [11]. Esses resíduos, em crescimento exponencial, constituem um dos principais problemas em áreas urbanas. Dentre os fatores que contribuem para esse aumento, destacam-se a adoção de tecnologias e gestão inadequadas, a urbanização, o crescimento populacional e o desenvolvimento econômico (Alencar, 2018) [1]. A problemática se intensifica quando associada à prática irregular de despejo desses desperdícios, muitas vezes efetuada clandestinamente em terrenos baldios, áreas de preservação, vias públicas e praças (Azevedo et al., 2006) [12]. Essa prática provoca inúmeros problemas ambientais, como a contaminação do solo, das águas superficiais e subterrâneas, aumenta o risco de desastres naturais e da proliferação de vetores de doenças, além de favorecer a degradação paisagística.
O panorama atual impõe urgência na revisão dos procedimentos construtivos, de modo a promover o desenvolvimento aliado à sustentabilidade. A produção excessiva de resíduos no setor da construção, seu descarte inadequado e o esgotamento dos recursos naturais ressaltam a necessidade de soluções ágeis e eficientes para a gestão desses desperdícios. Deste modo, é essencial maximizar o aproveitamento desses resíduos, através da reutilização ou reciclagem, com o desenvolvimento de matérias-primas secundárias e produtos que possibilitem reduzir a exploração de recursos naturais não-renováveis e minimizar os impactos ambientais dessa indústria sobre o meio. Além disso, é necessário promover a conscientização e educação dos profissionais da construção, bem como das comunidades locais, sobre a importância da destinação correta dos resíduos e dos impactos ambientais causados pelo despejo inadequado. Em conjunto com políticas públicas e regulamentações, tais medidas podem contribuir para uma gestão mais responsável e sustentável dos RCD.
2.2. Resíduos de construção e demolição na União Europeia - Portugal:
Os resíduos de construção e demolição são um dos principais fluxos de desperdício na sociedade moderna, sendo responsável por uma parcela significativa da pegada ecológica global (Zhang et al., 2022) [13]. De acordo com Lauritzen (2020) [6], na Europa, estima-se que mais de 30% do total de materiais usados sejam destinados à habitação. Cerca de 65% do total de agregados (areia, cascalho e brita) e 20% do total de metais são utilizados pelo setor da construção. Os RCD representam o maior fluxo em termos de massa na União Europeia (UE). Essa tipologia gerou 868 milhões de toneladas de resíduos em 2017, o que representa 34,7% da geração total de resíduos daquele ano.
De modo geral, os resíduos de construção e demolição possuem uma composição mista, formada pela combinação de diferentes materiais (o que inclui resíduos inertes, não inertes, não perigosos e perigosos) em fragmentos de várias proporções. A gestão dos resíduos de construção e demolição na União Europeia é facilitada pela Lista Europeia de Resíduos (Publicada pela Decisão 2014/955/UE, que altera a Decisão 2000/532/CE, referida no artigo 7.º da Diretiva 2008/98/CE), que estabelece uma categorização detalhada dos RCD.
Devido ao impacto ambiental, social e econômico do setor da construção civil, a gestão dos RCD é um tema prioritário das atuais políticas europeias e do pacote de economia circular. Entre as iniciativas precursoras está a Diretiva-Quadro de Resíduos que entrou em vigor em 2008 (alterada em 2018) que inclui normas para as várias tipologias de resíduos e estabelece regras para os resíduos de construção e demolição. Para o setor, a Diretiva estabeleceu um objetivo de preparação para reutilização, reciclagem e valorização de 70% desse fluxo de resíduos para 2020 (excluindo os materiais de ocorrência natural e os materiais perigosos).
Posteriormente, em consonância com a estratégia para o setor da construção para 2020, foi lançado o Protocolo de Gestão de Resíduos de Construção e Demolição da UE, que se enquadra na Estratégia Construção 2020, bem como a iniciativa que estabelece Oportunidades para Ganhos de Eficiência na Utilização dos Recursos no Setor da Construção. O protocolo faz parte do Pacote para Economia Circular adotado pela Comissão Europeia e tem como objetivo geral o aumento da confiança no processo de gestão de resíduos de Construção e Demolição e na qualidade dos materiais reciclados do setor, visto que, a falta de confiabilidade nas propriedades dos materiais é um dos fatores que torna marginal a utilização de resíduos de construção e demolição como recursos secundários.
Em Portugal, as preocupações com a manutenção do espaço construído e a sustentabilidade no setor da construção civil, já estavam intrínsecas na Expo 98, em Lisboa. De acordo com o Relatório do Estado Atual da Circularidade em Portugal (2022), este setor é de extrema importância para a economia portuguesa. Entretanto, os RCD também constituem parte significativa dos desperdícios gerados no país. Para reduzir os impactos causados pela construção, Portugal estabeleceu uma ampla legislação que fomenta a utilização e valorização dessa tipologia de resíduos, licenciamento e fiscalização de atividades de gestão, regulamentações de deposição e transporte, e estabelecimento de centros de receção e triagem dos resíduos para correto direcionamento dos RCD. Entre as medidas legislativas que se destacam, o país implementou uma a percentagem mínima e obrigatória de incorporação de 10% de material reciclado em obras, o que estimula a indústria a desenvolver processos mais eficazes de reciclagem e a reduzir a extração de recursos naturais. Além disso, o país tem também incorporado diversas estratégias de circularidade para o setor. Entre as estratégias está o Plano de Ação para a Circularidade na Construção - PACCO, uma iniciativa que contempla diversas medidas para incentivar o usos de materiais reciclados, estimula uma implementação de sistemas de gestão mais eficientes, a adoção de práticas de construção mais sustentáveis, a cooperação entre os diversos agentes da construção civil, visa melhorar o monitoramento dos RCD gerados e busca contribuir para consecução de metas estabelecidas pela União Europeia.
As iniciativas relacionadas com resíduos de construção e demolição na UE, bem como a Lista Europeia de Resíduos e a incorporação de iniciativas a nível nacional, são elementos fundamentais para uma gestão de resíduos de construção e demolição mais eficaz, pois, além de auxiliarem na segregação dos materiais, impulsionam uma lógica de circularidade promovendo o aumento do seu potencial de reutilização e reciclagem com um desenvolvimento aliado à sustentabilidade.
3. Economia circular e o Ecodesign na reutilização de resíduos
De acordo com Zhang et al. (2022) [13], a globalização gerou significativas transformações tecnológicas, científicas, institucionais, sociais e econômicas. Apesar de essencial para avanços em diversas áreas, esse processo deu origem a uma diversidade de desafios. Os fenômenos ambientais, sociais e econômicos incluem: a evolução das desigualdades sociais; as evidências de que os recursos naturais são finitos; a perda da biodiversidade; mudanças climáticas; insustentabilidade do modelo de vida padrão baseado em consumo excessivo e produção de desperdícios. Estes são aspetos que evidenciam a complexidade dos fenômenos que afetam a humanidade e confirmam a urgência em ações que possam reverter esse cenário.
Um caminho possível é a economia circular. O modelo que enfatiza a redução, reutilização, recuperação e reciclagem de materiais e energia, é caracterizado por Lamba, Kumar e Dhir (2023) [14] como um ciclo fechado que visa minimizar as perdas ao longo da vida útil de um produto ou serviço, bem como promover a manutenção e economia de recursos. Uma vez que os recursos naturais são limitados e a demanda por recursos está em constante crescimento, pensar sobre a economia circular requer repensar um meio de produção capaz de ressignificar o uso dos resíduos gerados pelas indústrias, dando-lhes um destino adequado para que possam ser reutilizados ou inseridos em novos ciclos, mantendo a qualidade. Esta abordagem impõe alterações fundamentais nos sistemas de produção e consumo, de modo a repensar o futuro e a forma como os seres lidam com o ambiente, separando-o do crescimento econômico baseado no consumo inadequado que gera excessos e desperdícios além das necessidades individuais.
A economia circular difere da linear que extrai, produz e descarta. Perspetiva eliminar o lixo, reaproveitando o máximo de materiais de forma cíclica. Aliado a este conceito está o de Ecodesign que pode ser caracterizado como uma abordagem consciente e sustentável focada no desenvolvimento de produtos mais duradouros e processos mais responsáveis durante todo o seu ciclo de vida (Schäfer & Löwer, 2021) [15].
De acordo com Pazmino (2007) [16], nesse modelo de desenvolvimento do produto, o designer deve refletir desde a conceção do projeto até os seus próximos usos, tomando decisões ecologicamente corretas que minimizem o impacto gerado. No Ecodesign, o último destino de um produto deixa de ser apenas uma questão de gerenciamento de resíduos e passa a ser uma questão de desenvolvimento global do mesmo. Abordagens pautadas no ecodesign podem reduzir de modo significativo o fluxo de desperdícios gerados a curto, médio e longo prazo.
3.1. Reutilização e reciclagem de resíduos de construção e demolição - Casos de estudo
Lauritzen (2020) [6] observa que mais de 90% dos RCD tem potencial de ser utilizado como recurso e substituto de materiais de construção. Porém, o autor ressalta que a maior parte destes resíduos, quando reaproveitado, é depositado ou utilizado como material de enchimento, sendo negligenciadas as oportunidades de reciclagem de alta qualidade. Porém, a reutilização de resíduos de construção e demolição para o desenvolvimento de materiais e peças de design já é fonte de pesquisa de alguns laboratórios, coletivos e escritórios de design e arquitetura.
Grandes quantidades de resíduos são geradas com a substituição de móveis antigos por novos em reformas de interiores. Segundo Alppegren (2019) [17], é um panorama comum tanto em reformulações no setor público, quanto no setor privado. Através da reciclagem e reutilização de materiais disponíveis em obras da Delete (grupo que oferece serviços de limpeza industrial, demolição e reciclagem nos países nórdicos; https://delete.se), a iniciativa Delete’s Waste apresenta objetos exclusivos criados pelos designers Juhana Myllykoski e Johannes Stenberg, dando um novo ciclo de vida às peças encontradas. Os produtos criados a partir de reutilização e reciclagem possuem uma história própria e características singulares. São desenvolvidas peças de design de interiores, tais como móveis, luminárias, lâmpadas ou artigos de decoração. Algumas peças recolhidas já estão prontas para uso, necessitando apenas de uma limpeza e/ou fixação de peças, outras precisam de reparos ou de um redesign para adaptação dos seus usos. Embora grande percentagem do material gerado em demolição tenha potencial para ser reciclado, o projeto aplica em primeiro plano a reutilização dos materiais ou objetos encontrados, auxiliando no controle da extração massiva de recursos naturais para produção de novos produtos na sociedade de consumo.
O exercício de descobrir os materiais disponíveis em construções e/ou demolições e desenvolver peças e revestimentos a partir de sua reciclagem, também está presente no projeto Matterpieces do Studio8. O escritório de arquitetura fundado pelos arquitetos portugueses Luís Lima e Patrícia Gomes, surgiu com o desenvolvimento de um projeto de interiores para um restaurante vegano em Viena, Áustria, no qual os arquitetos questionaram os desperdícios gerados na obra. Movidos pela vontade de projetar uma arquitetura mais sustentável e inclusiva, e de criar estratégias para reduzir os resíduos de construção e demolição, os arquitetos viram um potencial nos desperdícios, passando a incorporá-los em seus projetos. Paralelamente, os arquitetos começaram a utilizar em produtos e revestimentos desperdícios provenientes de outras empresas que realizam a valorização dessa tipologia de resíduo, entre elas a Costa Almeida Construções (Guerreiro, 2022) [18].
É de salientar que encontrar fornecedores de desperdícios da construção, segundo Luís Lima (comunicação pessoal, 15 de outubro, 2022), não foi uma tarefa fácil. O arquiteto relatou dificuldades em obter respostas das empresas que fazem coleta e valorização dos resíduos ainda no processo de idealização da iniciativa. Para maior visibilidade, parcerias e incentivos, os arquitetos candidataram o projeto Matterpieces ao programa Triggers, o qual pretende estimular novas ideias que auxiliem na redução do impacto ambiental. A proposta apresentada foi uma das soluções selecionadas, estando atualmente a integrar a incubadora da Santa Casa da Misericórdia, Casa do Impacto, e atraindo outras empresas para parcerias.
As aplicações desenvolvidas pelo projeto variam de revestimentos para piso e parede a mobiliários, com a criação de bancadas para cozinha e banheiro. Através da experimentação, com o uso de diferentes misturas de materiais, como pó de cimento, pedaços de tijolo, pedra e vidro, os produtos são desenvolvidos pelo estúdio de forma personalizada e única. A composição contém, além dos materiais mencionados, 6% de resina. Para tornar a iniciativa mais sustentável, o estúdio estabeleceu uma parceria com a Universidade do Minho para o desenvolvimento de uma eco-resina. De referir que, além de resíduos de construção e demolição, o Matterpieces utiliza resíduos da indústria metalúrgica, aplicando-o como pigmento na produção de suas peças.
Com base nos mesmos princípios, o projeto Five Mile Radius é um estúdio de investigação, design e fabricação, localizado na Austrália, que procura, através do uso de resíduos de construção e demolição locais, conectar arquitetura, design e história aos habitantes do sítio onde o projeto está inserido. O estúdio valoriza o potencial de uma relação sustentável e cuidadosa do ser com o meio, empregando a circularidade em seus projetos de design e arquitetura.
Com o princípio de manter as características originais da arquitetura, o estúdio TFBO Urban terrazo (Alemanha e República Checa) também desenvolve criações a partir da reciclagem de desperdícios gerados pela indústria da construção.
Além do viés sustentável explorado nas três iniciativas, a produção de peças únicas e personalizadas propiciam ao consumidor o senso de identidade impressa no produto.
Segundo Alppegren (2019) [13], a estratégia de reutilização associada à reciclagem e reparação, está no centro da transição para uma economia circular. Seguindo essa premissa, o estúdio chinês Bentu design inova através da experimentação com as mais variadas tipologias de resíduos, dando uma nova existência e transformando-os em produtos de design. Entre os projetos de reutilização e reciclagem, está o projeto Waste-Opia com peças desenvolvidas a partir de resíduos de demolição. O projeto deu origem a outras experimentações e artigos a partir dessa tipologia de resíduos. A iniciativa surgiu a partir da proposta do governo de Guangzhou (China) de demolir e transformar o espaço urbano na “Cidade do Design”. Huangbian, uma das aldeias que compõem a cidade, foi alvo de uma investigação minuciosa e a demolição dos antigos edifícios do local deu origem a um projeto para reutilização de resíduos gerados neste processo de reconstrução da cidade. O estúdio Bentu desenvolveu a iniciativa Waste-Opia, no qual as peças criadas a partir dos resíduos de betão, agregado de restos de pedra, vidro, cerâmica, procuram reviver a história de um espaço que deixou de existir. Além disso, a equipe manifesta sobre a sustentabilidade ambiental na indústria da construção civil e faz uma crítica sobre a produção do espaço e identidade.
4. Considerações finais
Este artigo constitui um estudo preliminar baseado na revisão da literatura sobre o problema dos desperdícios gerados pela indústria da construção civil e na apresentação de um conjunto de projetos que propõem um caminho alternativo para reutilização e/ou reciclagem desses resíduos. Perspetiva-se um enquadramento e análise do estado da arte para futuro desenvolvimento de um produto a partir de resíduos de construção e demolição.
Apesar de o setor da construção civil contribuir significativamente para o desenvolvimento econômico e social, representa um dos principais responsáveis pela emissão de CO2 e produção de resíduos. A gestão de recursos, com foco na eficiência das matérias-primas, e a reutilização e/ou reciclagem de materiais residuais gerados por essa indústria, são práticas essenciais para reduzir o impacto gerado e incorporar a circularidade. A reutilização e a reciclagem de resíduos são essenciais para o equilíbrio entre natureza e indústria. Neste ponto, o designer pode assumir um papel preponderante no desenvolvimento de produtos e contribuir significativamente no ciclo de vida dos materiais e na implementação de uma economia circular, criando produtos e sistemas com menor impacto ambiental e maiores benefícios para gerações futuras.
Reforça-se a função do designer enquanto questionador de discursos, ideias e padrões sociais, promovendo o levantamento de uma proposta de design responsável, que considere todas as etapas do desenvolvimento de produtos. Os produtos não devem apenas cumprir uma função prática e estética, eles podem oferecer uma nova perspetiva de mundo aos consumidores, pensando sobre processos que beneficiem os seres humanos e o meio ambiente.