Recentemente, o artigo de Mariano et al abordou o tema da hospitalização domiciliária como uma ferramenta útil e que tem vindo a revelar importantes mais valias, demonstrando um potencial interessante no que diz respeito à prestação de cuidados de saúde a doentes oncológicos.1
Este modelo está já bem implementado em outros paises europeus, como Espanha e França, com resultados promissores. Em Portugal, esta ferramenta foi implementada em 2015, no Hospital Garcia de Orta, com resultados igualmente satisfatórios. Os benefícios dizem respeito à diminuição do tempo de internamento em meio hospitalar, permitindo uma redução das infeções nosocomiais, importante fonte de morbimortalidade, apresentando ainda um bom perfil de custo-efetividade.2
Os doentes oncológicos, pelas suas particularidades, nomeadamente o estado de imunossupressão e risco de neutropenia, beneficiam definitivamente desta modalidade, atendendo a potencial diminuição do risco de complicações infeciosas associadas, que moldam negativamente a sua evolução clínica, permitindo ainda um maior conforto, a merecer especial consideracao neste tipo de doentes e a diminuição de custos.3
A seleção do local de tratamento destes doentes neutropénicos, no estudo unicêntrico de Mariano et al, foi efetuada atraves do índice de prognóstico MASCC (Multinational Association of Supportive Care in Cancer), uma ferramenta útil, que estima os riscos associados a neutropenia febril.1
Não obstante, e apesar desta ferramenta, atendendo ao seu estado clínico o agravamento dos doentes pode ser súbito, colocando, ocasionalmente, em risco a vida do doente. Por esses motivos, o seu acompanhamento deverá ser proximo e particularmente cuidado; salientando-se aqui a educação ao doente, alertando para a maior incidência de agravamento clinico entre o sétimo e 14o dia após quimioterapia bem como, a identificação precoce de sinais e sintomas de infeção de novo, tendo, inexoravelmente, em conta o status de performance do doente. Deste modo, os criterios de elegibilidade devem ser cuidadosamente analisados, uma vez que o desenvolvimento de complicações num ambiente sem supervião gera enorme preocupação.4,5
Após a sua instituição em Portugal, em 2015, esta modalidade foi replicada em outros centros, igualmente com bons resultados. A pandemia SARS-Cov-2 veio afetar este plano de expansão, como muitos outros projetos de Saúde em Portugal.
Ainda assim, esta modalidade revelou-se de enorme utilidade durante o ano de 2020 e, principalmente, no início de 2021, permitindo a doentes com infeção COVID-19 clinicamente estáveis o recurso a hospitalização domiciliária, mantendo um elevado nível de cuidados a estes doentes e, sobretudo, libertar valiosas camas nos hospitais, sob enorme pressão neste peróodo, permitindo receber outros doentes e a redução de custos.2
O estudo apresentado pelos autores Mariano et al demonstrou que, na amostra estudada (n = 99), apenas 1 doente faleceu; um doente foi transferido para o hospital e três foram re-internados, verificando-se ainda uma percentagem consideravel (63,6%) de doentes que nao recorreu ao hospital 90 dias após a alta.
Apesar de se tratar de uma amostra pequena, os resultados demonstram ser muito satisfatórios, com uma mortalidade de cerca de 1%, uma taxa de reinternamento baixa - 3% - e, acima de tudo, sem necessidade de nova recorrência ao hospital num período de 90 dias, o que demonstra a efetividade desta abordagem no controlo e gestão de intercorrências, de forma segura e fiável.1
Estes resultados poderão e deverão ser replicados a nível nacional, com um numero maior de doentes envolvidos, procurando a reprodução destes resultados favoráveis após uma correta e criteriosa seleção dos doentes que podem beneficiar deste tipo de abordagem.
Sendo uma ferramenta convincente e engenhosa, especialmente na populacao oncológica, a hospitalização domiciliária permite, não só uma diminuição das infeções nosocomiais, a libertação de camas hospitalares e a redução dos custos associados, mas tambem a recuperacao/tratamento da doença num local emocionalmente e fisicamente mais revigorante.