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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.236 Lisboa set. 2020

https://doi.org/10.31447/AS00032573.2020236.04 

ARTIGOS

Novas direções para a proteção da segurança alimentar na África lusófona? Cooperação técnica entre o Brasil e Angola

New directions for the protection of food security in Lusophone Africa? Technical cooperation between Brazil and Angola.

Jeane Silva de Freitas1
https://orcid.org/0000-0002-6797-5932

Jan Marcel de Almeida Freitas Lacerda2
https://orcid.org/0000-0003-3357-6367

Saulo Felipe Costa3
https://orcid.org/0000-0002-7175-0912

1 Centro de Filosofia e Ciências Humanas, UFPE. Rua Acadêmico Hélio Ramos, s/n., 14.° andar, Cidade Universitária - CEP 50670-901 Recife, Pernambuco, Brasil. jeanesfreitas@hotmail.com

2 Universidade Federal do Tocantins. Rua 03, Quadra 17, Lote 11, s/n., Jardim do Ipês I - CEP 77500-000 Porto Nacional, Tocantins, Brasil. jan_marcell@hotmail.com

3 Universidade Estadual da Paraíba, UEPB. Rua Horácio Trajano de Oliveira, s/n., Cristo Redentor - CEP 58071-160 João Pessoa, Paraíba, Brasil. s.felipe@hotmail.com


 

RESUMO

O presente artigo discute aspetos da cooperação técnica brasileira no campo da segurança alimentar destinada aos países lusófonos, tendo como foco o combate à fome na República de Angola. Discute-se o processo de formação das relações políticas e económicas entre os referidos países, as estratégias de segurança alimentar adotadas por ambos e os projetos/programas implementados por Angola, a partir da cooperação técnica com o Brasil. Assim, parte-se da premissa de que apesar dos avanços positivos alcançados na cooperação entre os dois países na área da promoção da segurança alimentar, o fenómeno da fome ainda é um problema endémico no território angolano, em particular pelas condições socioeconómicas e institucionais do país.

Palavras-chave: Brasil; Angola; segurança alimentar; cooperação técnica brasileira.


 

ABSTRACT

This article discusses aspects of Brazilian technical cooperation in the field of food security for Portuguese-speaking countries, focusing on or fighting hunger in the Republic of Angola. It examines the process of formation of political and economic relations between these countries, the food security strategies adopted by them, and the projects/programs implemented by Angola, based on technical cooperation with Brazil. The premise is that despite the positive progress made in cooperation between the two countries in promoting food security, the phenomenon of hunger is still a persistent problem in the Angolan territory, the result especially of the country’s socioeconomic and institutional conditions.

Keywords: Brazil; Angola; food safety; Brazilian Technical Cooperation.


 

Introdução

Segundo o IPEA (2013, p. 27), a cooperação técnica brasileira visa a capacitação de indivíduos e o fortalecimento de instituições no exterior, através do desenvolvimento de capacidades, pela transferência e compartilhamento de conhecimento e tecnologias nacionais.[1] Todos esses fatores pretendem a adaptação às realidades locais, por meio da capacitação de recursos humanos, do emprego de mão-de-obra local e da conceção de projetos adequados às peculiaridades de cada Estado.

Nesse aspeto, o Brasil acumula uma experiência nacional de política pública na promoção da segurança alimentar e nutricional, o que se coaduna com as perspetivas internacionais para combater a fome e a desnutrição mundial (Santarelli, 2015, p. 24). Vale ressaltar que o Brasil foi o único país do cinturão tropical global a conquistar a posição de potência agrícola, por inovar em tecnologias de manejo, em diferentes condições climáticas, as quais permitiram a transformação de solos degradados em terras férteis (Almino e Lima, 2017, p. 77).

O continente africano foi considerado um importante parceiro para a expansão das alianças políticas e económicas do Brasil. A execução de projetos em África alicerçou-se em três pilares: incentivo à participação de empresas brasileiras, financiamento e concessão de créditos para a reconstrução nacional e, por fim, a cooperação técnica bilateral.

Grande parte do continente africano possui condições geológicas e climáticas semelhantes ao território brasileiro (agricultura tropical), to que torna o país um colaborador relevante na promoção de projetos e pesquisas nas áreas de segurança alimentar e agricultura familiar (Pinho, 2014).

Ao analisar dados de África, os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) são os principais beneficiários da cooperação técnica brasileira. Entre esses países, destaca-se Moçambique, Angola e Guiné-Bissau por terem recebido juntos 27% do volume de cooperação técnica brasileira, nas diversas áreas (IPEA, 2010). Os PALOP concentram o maior número de projetos nas áreas de agricultura, incluindo a produção agrícola e a segurança alimentar.

Sendo as condições agroclimáticas desses países africanos semelhantes ao contexto brasileiro, alguns projetos têm contribuído para o desenvolvimento de pesquisas conjuntas, de que são exemplo a transferência de tecnologias brasileira nas áreas de segurança alimentar e a agricultura familiar. A relevância da inserção do Brasil em África, por meio destes programas, abarca não apenas a redução da pobreza, mas também a recuperação económica e o ajuste estrutural desses países.

Apesar desses fatores, a dependência de diferentes recursos e instituições acarreta problemas como a formulação, apropriação e implementação de políticas de segurança alimentar na região, particularmente em Angola. Com base nesta problemática, o presente artigo analisa as relações políticas e económicas entre o Brasil e Angola no combate à fome em cada Estado, e procura compreender como se tem estruturado a cooperação entre os dois países na promoção da segurança alimentar.

O recorte temporal adotado foram os períodos compreendidos entre 2002 e 2015, por envolver os mandatos dos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, durante os quais se observou uma maior intensificação das relações cooperativas bilaterais entre o Brasil e os países africanos, sobretudo no campo da cooperação técnica em segurança alimentar. Acrescente-se que a referida pesquisa não faz menção às políticas externas dos governos posteriores, a saber, o governo Temer e Bolsonaro, por se tratar de governos que deram prioridade ao alinhamento das suas políticas externas com os países desenvolvidos. Além disso, não foram identificados novos acordos na área de segurança alimentar com os países lusófonos até ao presente. Em termos metodológicos, adotou-se o método indutivo, exploratório e qualitativo por se tratar de um caso específico de cooperação entre o Brasil e Angola.

A estrutura das relações históricas entre o Brasil e Angola

Para se compreender como se construiram as relações entre o Brasil e Angola, será necessário fazer uma breve contextualização histórica deste intercâmbio. Esses países possuem uma relação histórica intrínseca com o Brasil, que estão para além do tráfico, escravidão e subserviência dos negros africanos. Ao longo do século XX, o Brasil alinhou as suas diretrizes com a política colonialista de Portugal, que se radicalizou a partir de 1926 quando se instaurou o regime Salazarista, instituído por António de Oliveira Salazar. Esse regime impunha diretrizes de cunho autoritário, “criando leis que aumentavam a diferença entre brancos e negros na África e fortalecia o processo de exploração colonialista, prejudicando o desenvolvimento destes países” (Rocha e Santos, 2015, p. 16). Outro fator que afunilou as relações entre o Brasil e Portugal foi a implementação do Acordo de Cooperação de Amizade e Consulta[2], em 1953, cujos objetivos privilegiavam tanto o Brasil, quanto Portugal, em relação às transações comerciais desses países com os Estados que estivessem sob a égide de Portugal. No entanto, uma das ressalvas desse acordo era que o governo brasileiro não interviesse nas relações de Portugal com as suas colónias e, portanto, qualquer contacto direto do Brasil com esses territórios estaria condicionado à mediação e ao controlo português (Rocha e Santos, 2015, p. 16).

Essa diretiva foi mantida durante o governo de Juscelino Kubitschek (JK), formulando uma política externa contraditória aos objetivos da então criada Operação Pan-Americana (OPA)[3], que propunha uma modernização económica para o Brasil para reforçar a política externa brasileira. Quatro possíveis razões levaram Juscelino Kubitschek a apoiar o colonialismo português, sendo a primeira de cariz ideológico, ou seja, Juscelino atribuía às causas do subdesenvolvimento económico a entrada do comunismo internacional na América Latina. Então, na sua perspetiva, só se resolveriam os problemas sociais com o desenvolvimento e a expansão económica. Esta posição anticomunista também era defendida por Portugal, que concedeu asilo ao ditador Fulgêncio Batista a pedido dos Estados Unidos, por intermédio do Brasil (Rampinelli, 2008, p. 280).

A segunda razão é de ordem afetivo-histórica, ou seja, o governo Juscelino Kubitschek assumiu um discurso nacionalista com conteúdo ideológico conservador, que se ajustava perfeitamente ao regime salazarista implementado em Portugal. Em outras palavras, a estratégia nacionalista era posta em prática durante os processos eleitorais, pois nesse período aproximavam-se das camadas sociais influenciadas pelas comunidades portuguesas espalhadas pelo país, cujos objetivos eram a manutenção das colónias ultramarinas dentro de uma estratégia de proteção do Atlântico Sul contra o avanço do comunismo. Já a questão ideológica era aceite no plano da afetividade histórica, já que a relação que preocupava as elites brasileiras era a relação entre o Brasil e os EUA, e não com Portugal (Rampinelli, 2008, pp. 281-285).

A terceira razão ocorre no campo eleitoral, pois as comunidades portuguesas, não só as do Brasil, mas também as de outros países, eram estimuladas pela diplomacia portuguesa a defenderem os seus interesses e os de Portugal. Essa estratégia interessava particularmente a Juscelino, pois fazia planos de tentar uma reeleição em 1965 e a proximidade com esses países favorecia-o nesse aspeto.

Por fim, a quarta razão prende-se com o campo religioso, porque a igreja católica manteve um longo período de aliança com o Estado Novo português. Essa aliança iria favorecer ambos os paises, uma vez que restituiria à igreja católica o estatuto (a Concordata) perdido na I República e poria fim ao anticlericalismo. Já ao regime de Salazar, essa mesma igreja garantiria as bases políticas, sociais e ideológicas ao presidente do Conselho. Esse discurso religioso também é utilizado por Juscelino para o favorecer na campanha presidencial, quando convidou para uma deslocação ao Brasil o mais alto representante da hierarquia da igreja portuguesa, o cardeal Cerejeira, que por sua vez, fez altos elogios ao Brasil e à figura de Juscelino Kubitschek (Rampinelli, 2008, pp. 281-285). Em relação ao posicionamento do então presidente, o embaixador Costa e Silva (2003) declarou:

O Juscelino me disse que os brasileiros não aceitariam uma posição política contrária, que fosse um desarranjo a Portugal. Podemos não gostar do colonialismo português, dizia ele, mas não podemos fazer nada que machuque Portugal. A opinião pública brasileira não aceita isto. Curiosamente, quando Jânio sobe ao poder dinamizou extraordinariamente a relação com à África. Foi quando abriu novas embaixadas, enviou missões de reconhecimento à África, da qual fiz parte, colocou o problema da colonização, das colônias portuguesas, nas Nações Unidas. Na primeira votação, o Brasil votou contra Portugal (1961), mas, na segunda votação, votou a favor dos portugueses; o que aconteceu entre o primeiro e o segundo voto? A opinião pública no Brasil se levantou [contrário], então, ele não pode enfrentar a posição política. Tinha os que diziam que era impossível votar contra Portugal. Jânio Quadros tinha posição a favor da independência negociada, e era o que dominava na época. Eu e o Antonio Houaiss achávamos que o colonialismo português não tinha futuro. A ideia era de que o Brasil estivesse atrelado e, eu acho que o Brasil nunca se atrelou a uma relação combativa. Vendo do ponto de vista, não do futuro, mas do presente da época, tenho que te confessar que éramos minoria. Toda a imprensa era a favor de Portugal, somente o comentarista Paulo de castro, do Diário de Notícias do Rio de Janeiro era contrário. A imprensa que tinha cacife era anticolonialista, mas no caso de Portugal era especial; era Portugal que tinha que resolver […] [apud Santos, 2010, p. 33-34].

Em paralelo, nesse período, o Brasil era um país fortemente agrário com uma produção de café importante no cenário internacional, assim como a produção de café desenvolvida por Angola. Essa produção angolana era vista como uma competição negativa para o Brasil, porque o Tratado de Cooperação e Amizade não trouxe benefícios ao país (Santos, 2010, p. 31). Sobre esta questão económica envolvendo o Brasil e Angola, o embaixador Costa e Silva (2009) defendeu:

[…] O Brasil não tinha interesse nenhum em Angola, nem em Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau; deveria ter, mas não tinha, e não tinha por um motivo simples; é que desde a independência do Brasil, Portugal impediu a presença do Brasil em Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe; o Brasil não conseguia sequer ter um cônsul […] [apud Santos, 2010, p. 33].

A partir de 1961, esse posicionamento alterou-se em virtude do rompimento da política colonialista do então presidente, Jânio Quadro, que passou a aproximar-se com as chamadas Províncias Ultramarinas. Essa abertura possibilitou a vinda de estudantes africanos para o Brasil, estabelecendo convénios com vários países africanos que perduram até aos dias de hoje. Esta rutura do governo Jânio Quadros com a política colonialista foi motivada por missões diplomáticas com o intuito de desenvolver uma relação mais estreita com a política, a cultura e a economia desses países e províncias (Rocha e Santos, 2015, p. 16).

Esta política de aproximação com África manteve-se com o seu sucessor, João Goulart, sustentando uma Política Externa Independente (PEI), contudo sem grandes avanços devido às pressões internas contra os posicionamentos do então presidente que, na visão das elites brasileiras, mantinha um alinhamento com as ideias socialistas, por defender reformas de base como a polémica reforma agrária. Esses eventos contribuíram para a cominação do golpe civil-militar, em 1 de abril de 1964, que modificou a política governamental do país em relação ao continente africano, por existir um temor do expansionismo soviético através dessas colónias africanas. Com essa política, o Brasil manter-se-ia distante das colónias africanas e voltar-se-ia para Portugal, apoiando-o nas suas decisões nas Nações Unidas (Santos, 2010, p. 35).

No entanto, a partir da década de 1970, no governo Médici, houve um processo de reaproximação com as colónias portuguesas da África em decorrência da crise do petróleo, que abalou os países ocidentais, impulsionando-os a criarem uma política mais proativa em relação a África. Essa conjuntura de reaproximação política e económica dos países ocidentais com a África coincidiu com as mobilizações internas dessas colónias, com o objetivo de se tornarem independentes de Portugal. O processo de descolonização acelerou o reconhecimento da independência de Angola, que, por parte do Brasil, ocorreu no governo do general Ernesto Geisel, em 1975, com a intensificação das relações políticas e económicas entre ambos os países. Todavia, a manutenção da política Sul-Sul foi prejudicada com a chegada de José Sarney ao poder na década de 1980, em virtude dos problemas económicos e políticos que assolavam o país. Uma conquista desse período foi a criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), tendo o Brasil participado nessa formação (Rocha e Santos, 2015, p. 18).

Segundo Visentini (2012, p. 41), o processo de independência de Angola[4] foi muito mais complexo, tendo envolvido o massacre de milhares de africanos pelos portugueses, sobretudo no início dos conflitos em 1961, mas também o protesto de várias organizações contra as ações dos portugueses. Com a Revolução dos Cravos em Portugal, em abril de 1974, os movimentos de libertação em Angola tornaram-se mais problemáticos, tendo-se cindido em três movimentos[5], com ajuda externa para cada um deles, o que culminou numa guerra civil na região. Em novembro desse mesmo ano, enquanto as tropas zairenses eram derrotadas no norte com o apoio da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), a República Popular de Angola era proclamada em Luanda, e a República Democrática de Angola era fundada no Huambo, no planalto angolano, pela UNITA, com apoio sul-africano. Apesar da retirada dos cubanos do solo angolano em 1989, seguiram-se quase 15 anos de guerra civil na região, que terminou em 2002 com a morte de Savimbi (Visentini, 2012, pp. 41-42).

Outro fator relevante sobre a política externa do governo Sarney para a África foi a aprovação da Declaração de Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1986, que tinha por objetivo uma maior cooperação regional, assim como a manutenção da paz entre os países da região. Essa foi uma tentativa do governo Sarney para diminuir a dependência externa frente aos EUA e, desse modo, reforçar a cooperação Sul-Sul. No entanto, a política externa do seu sucessor, Fernando Collor, em 1990, destoou consideravelmente dessa política multilateral anteriormente implementada, devido à conjuntura doméstica, mas, principalmente, à instabilidade do cenário internacional da época, sobretudo a crise financeira e o fim da Guerra Fria (Digolin, Assis e Agata, 2016).

Essa redução na política externa brasileira para África perpetuou-se no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), com uma modesta aproximação com os países presentes na CPLP, isto porque o corpo diplomático brasileiro da década de 1990 foi deslocado para outras áreas prioritárias, tal como Europa, Estados Unidos e América do Sul (Saraiva, 2002). Ainda que a política africana desse período tenha sido reduzida, o envio de uma força de peacemaking a Angola impulsionou o interesse das empresas brasileiras por esse país. No segundo mandato do governo FHC, em parceria com a Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o Brasil implementou ações de combate à Sida (HIV) em países africanos devido ao relativo sucesso da sua política doméstica de controlo desta doença (Silva, 2002 apud Vigevani, Oliveira e Cintra, 2003, p. 55). Apesar destas ações, as relações do Brasil com a África nessa década foram “ajustadas a um contexto atlântico”, sendo este continente entendido pelos formuladores de política externa como pouca relevante para a inserção internacional do Brasil (Saraiva, 2002, p. 10).

A África ficou fora do norte da política externa do Brasil nos anos 1990. O Brasil se deixou contaminar pela interpretação ingênua das relações internacionais kantianas, em torno das quais as saídas para a modernidade estavam no multilateralismo e no esforço da construção de uma agenda global consensual e na regulação de temas globais como o liberalismo econômico, o meio ambiente, os direitos humanos, entre outros. Essa confusão conceitual levou ao abandono de ricos caminhos anteriores já trilhados pelo Brasil na África, emanados pelo modelo de substituição de importações e da política de promoção de exportações. Ao confundir meios com fins, a política exterior brasileira perdeu sua racionalidade anterior [Saraiva, 2002, p. 11].

Além desses fatores, outro dado destoante desse período foi que apesar do ex-ministro das Relações Exteriores, Luiz Felipe Lampreia, ter defendido nos seus discursos a necessidade de se reconhecer a importância da CPLP, sobretudo na mediação dos conflitos em Angola, Guiné-Bissau e Timor Leste, houve uma “fusão do Departamento da África (DEAF) e do Departamento do Oriente Próximo (DEOP) do Ministério das Relações Exteriores, o que sugere uma falta de prestígio de ambas as regiões na pauta externa brasileira” (Digolin, Assis e Agata, 2016, s/p).

Por outro lado, a retoma e valorização da política africana coube ao período do presidente Luís Inácio Lula da Silva (Lula), que superou a retórica e impulsionou as relações cooperativas Sul-Sul. De acordo com Visentini:

Desde o início do governo Lula, em 2003, a diplomacia brasileira tem dado atenção especial à África, intensificando os laços com o continente, pois o Brasil passou a desenvolver uma diplomacia “ativa e afirmativa”. Uma visão estratégica e uma perspectiva coerente são as novas bases das relações Brasil-África, tomando, tomando-se o principal foco da chamada Sul-Sul. Relações bilaterais e multilaterais tem se desenvolvido de maneira notável mais áreas do comércio e investimento (principalmente nos setores petrolíferos, de mineração e infraestrutura), saúde, ciência e tecnologia, diplomacia e mesmo segurança e defesa [Visentini, 2012, pp. 222-223].

Uma das iniciativas concretas do governo Lula para manter uma sinergia ativa em direção a África foi o incentivo à criação, em 2006, da Cúpula América do Sul-África (ASA)[6], que segundo o Ministério das Relações Exteriores do Brasil,

[…] tem expandido e aprofundado seu relacionamento com a África, abrindo canais de diálogo político, forjando novas parcerias comerciais e ampliando projetos de cooperação. A Cúpula América do Sul-África (ASA) é uma das iniciativas que refletem essa aproximação do Brasil com o continente africano. Por ser o único mecanismo a reunir periodicamente líderes africanos e sul-americanos, é plataforma privilegiada para o estreitamento de laços entre as duas regiões. Participam da Cúpula 66 países dos dois continentes - 12 sul-americanos e 54 africanos -, correspondendo a cerca de um terço do dos Estados-membros das Nações Unidas, reunindo um PIB da ordem de US$ 6 trilhões e um total de mais de 1,4 bilhão de pessoas. A participação brasileira na ASA reflete a prioridade da América do Sul para o Brasil e a importância crescente atribuída à África, vista cada vez mais como parte da nossa vizinhança […] [BRASIL, 2018].

Dentro dessas ações implementadas, destaca-se a instalação do escritório Regional da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em África, em 2006, no Estado do Gana. Essa instalação foi possível em virtude de um acordo bilateral estabelecido entre o Brasil e o Gana, retomando os termos do acordo firmado entre os dois países em 1974, referente ao Acordo Básico de Cooperação Técnica e Científica (Rocha, Santos, 2015, p. 19).

Apesar das críticas atribuídas à política africana do governo Lula, considerada por alguns como imperialismo soft, em função da dimensão solidária dos programas sociais implementados em sua política externa (Visentini, 2012), há evidências concretas, não apenas no âmbito nacional, mas também no estímulo de políticas de cooperação internacional com países em desenvolvimento, com foco no combate à fome. Nesse contexto, as iniciativas implementadas na África, no que diz respeito à Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), especialmente em Angola, serão melhor debatidas nas seções seguintes.

Estratégias para a segurança alimentar no Brasil e em Angola

Em função da Primeira Guerra Mundial, entendia-se que o termo segurança alimentar estava intimamente relacionado com as ideias de estratégia utilizadas pelos Estados para neutralizar o inimigo. Contudo, com o passar dos anos, essa definição aglutinou uma conceptualização mais ampla e inclusiva, especialmente a partir de 1996, quando a Organização da Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), refinou essa ideia incorporando o termo “acesso social” à definição de segurança alimentar e, assim, estabeleceu um conceito usado até os dias atuais (BRASIL, 2013, p. 30).

A FAO é uma organização internacional da ONU que lidera esforços internacionais para erradicação da fome e da insegurança alimentar. A organização compreende a definição de segurança alimentar da seguinte forma:

[…] quando todas as pessoas, a todo tempo, possuem acesso físico, social e econômico a alimentos nutricionais suficientes e seguros, para suprir suas necessidades e preferenciais para uma vida ativa e saudável. Os quatro pilares da segurança alimentar são disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade [FAO, 2003, p. 29].

Dessa forma, percebe-se que a “Segurança Alimentar é uma equação de vários fatores, pois depende diretamente da produção, da distribuição, do acesso, do consumo e da qualidade dos alimentos” (Liverman, Kapadia, 2010 apud Brasil, 2013, p. 32). O termo “a todo tempo” está relacionado com a estabilidade da segurança alimentar ao longo do tempo, ou seja, a segurança alimentar geralmente varia ao longo do tempo, seja estacionalmente ou como resultado de choques irregulares, a exemplo de mudanças climáticas, mortes ou conflitos regionais. O acesso físico e económico é inter-relacional, enquanto a acessibilidade cultural pode ser vista como precedendo outros loci de acesso (Jones, et al., 2013). A figura 1 sumaria uma via conceptual que liga os loci da segurança alimentar aos domínios da disponibilidade, do acesso e da utilização. Os fatores descritos abaixo, exemplificam os aspetos que podem ser barreiras ou promotores de segurança alimentar.

 

 

Quando um Estado não consegue garantir segurança alimentar à sua população, há sérios riscos de se chegar à falência das suas instituições, o que pode causar um contexto de insegurança política e militar no âmbito da emergência de revoltas, conflitos civis ou, até mesmo, o transbordar do problema para esferas externas, a exemplo das migrações regionais ou extra regionais (Albuquerque, 2013, p. 179). Assim, a segurança alimentar doméstica é um dos principais determinantes para a segurança nutricional, que por sua vez só pode ser totalmente compreendida quanndo considerada nos níveis global, nacional, regional, até aos limites local, familiar e individual.

A segurança nutricional é o produto da segurança alimentar e da segurança de saúde, considerando-se uma inter-relação entre os dois.[7] Assim, a segurança nutricional deriva do acesso a uma alimentação saudável e a cuidados de saúde preventivos. Outro fator que impacta na segurança alimentar é a disponibilidade de uma variedade de alimentos nutritivos a nível local, regional e nacional. No entanto, essa disponibilidade no âmbito nacional depende diretamente da produção doméstica para consumo local, que por sua vez é uma variável que está sujeita à renda familiar disponível (Pérez-Escamilla e Segall-Corrêa, 2008, p.16).

Nesse contexto, nas últimas décadas, os países em desenvolvimento adotaram novas estratégias políticas para reduzir os seus problemas domésticos relacionados com a pobreza. Esse processo iniciou-se na década de 1990 com as políticas sociais inovadoras implementadas pelo Brasil e pelo México no que se refere à criação de programas de transferência condicionada de renda, tomando-se por base os princípios das políticas públicas. Essas políticas consistiam em fornecer um subsídio monetário às famílias de baixa renda com a finalidade de combater a pobreza extrema, melhorar o desenvolvimento humano e o crescimento económico nessas regiões. Desde então, esses modelos difundiram-se rapidamente e foram adotados por vários países latino-americanos, especialmente nos anos subsequentes aos anos 2000 (Sugiyama, 2011, p. 251).

Nesta conjuntura mundial, o Brasil buscou promover as suas políticas públicas para o desenvolvimento e a erradicação da fome nacional. Esse processo iniciou-se em 2003, com base nas análises comparativas fornecidas pelas escalas de experiências desenvolvidas pelo Departamento de Agricultura dos EUA, conhecida como Medida do Inquérito à Segurança Alimentar dos Domicílios dos EUA[8] (HFSSM), que no Brasil foi adaptada para a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA).[9] Inicialmente, investigaram-se grupos focais em quatro áreas urbanas para discutir conceitos-chave de segurança alimentar. Os resultados foram fortemente validados e com possibilidade de replicarem em áreas rurais (Pérez-Escamilla; Segall-Corrêa, 2008, p. 22).

Sob a égide do governo Lula da Silva, criou-se a Coordenação Geral de Apoio às Ações de Combate à Fome (CGFOME) no âmbito do Ministério das Relações Exteriores, como uma estratégia de internalizar as ações sociais na diplomacia brasileira e, assim, institucionalizar a vontade política no processo de inserção do tema do combate à fome como uma nova linha de ação internacional do Brasil (MRE, 2012). Além disso, criaram-se políticas com o intuito de fortalecer a cooperação Sul-Sul, a exemplo do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), o Bolsa Família (programa de transferência de renda condicionada), e a expressão maior de sua experiência nacional em segurança alimentar e nutricional, ou seja, o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN).

É importante ressaltar que o Programa de Alimentação Escolar não é originário do Brasil, nem tão pouco é uma novidade para as políticas públicas de outros países. No entanto, a experiência brasileira tornou-se um modelo de sucesso reconhecido internacionalmente. A singularidade do programa brasileiro deve-se ao facto de que ele reúne três temáticas em um só programa alimentar: educação, segurança alimentar e nutricional e inclusão produtiva. Nesse sentido, o PNAE do Brasil é considerado o maior programa alimentar do mundo com caráter universalizante - perdendo apenas para o programa indiano - por aliar a alimentação escolar saudável à compra direta de alimentos, por meio da agricultura familiar (WFP, 2013b; Borges, 2018, p. 47).

Em 2003, criou-se o Programa Bolsa Família consubstanciado à iniciativa do Fome Zero - por meio da Medida Provisória n.° 132, posteriormente convertida na Lei n.° 10836/2004 - como o principal programa de combate à pobreza extrema no Brasil (Soares et al., 2010, pp. 27-28). Diferentemente do caso mexicano, o modelo brasileiro abarcou uma amplitude maior de beneficiários, atingindo mais de 12 milhões de famílias, especialmente pelas características geográficas e sociais do país. Com isso, esse programa conseguiu importantes impactos económicos, no que concerne os bons resultados em indicadores sociais. Esses impactos despertaram a atenção da comunidade internacional para a replicação dessas políticas públicas brasileiras, em função dos resultados positivos apresentados (Leite; Peres, 2013, p. 366).

Em 2006, a Lei brasileira n.º 11 346, de 15 de setembro de 2006, Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional, criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), evidenciando a nova política nacional para o tema, e representou a consagração de uma conceção abrangente e intersetorial de segurança alimentar e nutricional, especialmente por unir dois princípios orientadores das ações: o direito humano à alimentação e a soberania alimentar[10] (CONSEA, 2006, p. 3). Tal conceito abrangente é institucionalizado do seguinte modo:

Art.º 3.º: A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras da saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis [BRASIL, 2006].

É interessante notar também o conceito de insegurança, o qual é detalhado pelo CONSEA (2006, p. 4) como:

Insegurança - situações de insegurança alimentar e nutricional podem ser detectadas a partir de diferentes tipos de problemas, tais como fome, obesidade, doenças associadas à má alimentação, consumo de alimentos de qualidade duvidosa ou prejudicial à saúde, estrutura de produção de alimentos predatória em relação ao ambiente e bens essenciais com preços abusivos e imposição de padrões alimentares que não respeitem a diversidade cultural.

O SISAN[11] compreende os órgãos das esferas municipais, estaduais e distritais, entre os quais o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), cujo Conselho se traduz num importante espaço de articulação entre a esfera governamental e a sociedade civil, dado que atua ao nível da formulação de políticas e orientações, incluindo as políticas exteriores do país na área de segurança alimentar.

Somados a esses fatores, em 2014, um relatório da FAO apontou que o Brasil foi o único país no mundo, entre os mais populosos, a conseguir reduzir em 82,1%, no período de 2002 a 2014, o seu quadro de fome doméstica. Em comparação com outros países, a exemplo da Indonésia que reduziu a fome no seu território para 49,3%, o Brasil reduziu significativamente a quantidade de pessoas famintas no seu território em 40% - se comparado com o período de 1990 que apresentava 25,5 milhões para 1,8 milhões em 2014 - de pessoas que passavam fome no país (Borges, 2018, p. 46), conforme se observa na figura 2.

 

 

Convém destacar que a partir da implantação do Programa Fome Zero, os países da América Latina e da África demonstraram vasto interesse nas políticas públicas brasileiras, o que proporcionou um desenvolvimento dos programas de cooperação técnica no âmbito bilateral, trilateral e de natureza multilateral, a exemplo do ESAN-CPLP, que entre os seus principais objetivos se destaca o estabelecimento de Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional nos países da CPLP (Sarmento; Pinto, 2015). Ademais, o Estado brasileiro passou a estabelecer parcerias, em vários projetos, com organismos internacionais como a FAO, o PNUD e o PMA, com a finalidade de construir e fortalecer a agricultura familiar e os programas de alimentação escolar na América Latina e na África. Esses programas facilitariam o intercâmbio de projetos geridos pelo PMA para programas nacionais independentes (Dias, 2018).

A partir desses êxitos alcançados no âmbito nacional, o Brasil pôde exportar projetos de cooperação técnica na área de alimentação escolar para vários países, a exemplo da Bolívia, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Haiti, Nicarágua, Panamá, Suriname, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Timor Leste e Palestina (CAISAN, 2009, p. 50). Essa exportação de “tecnologia social”, ou seja, a replicação de programas sociais brasileiro bem sucedidos para o contexto de países em desenvolvimento, sobretudo os Estados africanos, rendeu ao Brasil, durante o governo Lula, uma importante ferramenta de projeção de soft power[12] brasileiro no estreitamento de suas relações bilaterais (Júnior e Faria, 2015, p. 18).

Considerando as semelhanças culturais, económicas e de recursos naturais, a América Latina e a África foram regiões que propiciaram a transferência de expertise brasileira, por meio de projetos de Cooperação Técnica Internacional (CTI), para diversas áreas naqueles países. A Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento (CTPD) “é considerada uma parte da cooperação Sul-Sul e baseia-se nos avanços técnicos e sociais do Brasil” (Berndt, 2009, p. 32). Esse papel credível do Brasil foi essencial para que o país se tornasse um prestador de CTI nos anos subsequentes à década de 1970. A partir desse período, houve um aumento da demanda de países africanos e latino-americanos pela cooperação técnica brasileira (Berndt, 2009, p. 33). Na África, a política externa brasileira, a partir dos anos 2000, teve duas orientações: o interesse político e económico no continente e a estratégia de inserção internacional do Brasil, atendendo a que o continente africano nesse período era um grande mercado em potencial de extensão, sobretudo no tocante às matérias-primas, como o petróleo.

A execução de projetos em África alicerçou-se em três pilares: incentivo à participação de empresas brasileiras, financiamento e concessão de créditos para reconstrução nacional e, por fim, a cooperação técnica bilateral. Dentro do escopo da cooperação técnica, a agricultura foi a área prioritária nas trocas bilaterais entre os governos africanos e brasileiros. Considerando as potencialidades agrícolas do Brasil, não apenas como exportador de numerosas matérias-primas e bioenergia, mas também pelo seu potencial no desenvolvimento de políticas relevantes de segurança alimentar, o Brasil tornou-se um colaborador relevante na promoção de projetos e pesquisas nas áreas da segurança alimentar e agricultura familiar no continente africano, especialmente porque a região possui condições geológicas e climáticas semelhantes às brasileiras (agricultura tropical) (Pinho, 2014).

Nesse contexto, a cooperação técnica brasileira visa a capacitação de indivíduos e o fortalecimento de instituições no exterior, caracterizando-se pelo desenvolvimento de capacidades, pela transferência e pelo compartilhamento de conhecimento e tecnologias nacionais.[13] Todos esses fatores com vista à adaptação às realidades locais, por meio da capacitação de recursos humanos, do emprego de mão-de-obra local e da conceção de projetos adequados às peculiaridades de cada Estado (IPEA, 2013, p. 27).

Algumas instituições nacionais, a exemplo da Embrapa[14], passaram a ser fortemente procuradas por países interessados na acumulação de experiências positivas do Brasil, nomeadamente nas áreas da “pesquisa agropecuária, técnicas de plantio, treinamentos laboratoriais para pesquisa agrícola e melhoramento genético, programas de distribuição de renda, de combate à desnutrição infantil e alimentação escolar” (MRE, 2010).

Em Angola, o governo preocupou-se em trazer para o país novas tecnologias agrícolas e, com isso, estabeleceu uma cooperação com a Embrapa, afim de identificar possibilidades de transferência de tecnologias. Nesse contexto, a Embrapa procurou apoiar o Sistema Nacional de Investigação Agrária de Angola (SNIA), transferindo para este país africano a sua expertise em inovação agrícola, por meio do fortalecimento das instituições de pesquisa e pela promoção de um sistema de sustentabilidade agropecuário. Com essa cooperação, a Embrapa implementou tecnologias tropicais brasileiras em solo angolano, com o cultivo de novos produtos agrícolas, a exemplo do arroz, feijão, soja, milho e hortaliças (Vieira, 2009; Ministério da Agricultura, 2008).

Essas novas técnicas transferidas pela Embrapa para a agricultura angolana trouxeram significativas transformações locais, sobretudo na “reestruturação do Instituto de Agricultura de Angola (IAA), que incluiu a criação de 16 centros de pesquisa até 2013”. Nessa ocasião, a Embrapa conseguiu promover um aumento do nível da produtividade agropecuário angolano com o incremento de novos projetos de melhoria agrícola (Embrapa, 2009). Outra iniciativa que merece nota, embora não esteja sob o amparo oficial da cooperação técnica brasileira, são os “projetos multissetoriais e mecanismos participativos para a gestão de questões de segurança alimentar e nutricional”, em Angola, desenvolvidos pelos profissionais brasileiros do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA). Os objetivos desse projeto seguiram as diretrizes gerais da FAO, ou seja, eliminar a fome, a insegurança alimentar e a desnutrição, envolvendo uma ação conjunta entre a FAO, a Embrapa e o Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Angola é considerado o 16.º país do mundo com maior potencial agrícola devido à “disponibilidade de recursos naturais como a água, terra arável e um clima propício para a agricultura” (Marcelino e Morgado, 2015, p. 9). Apesar da abundância em recursos naturais, dos 575 900 km² de solos férteis, apenas 5,7% são explorados, o que correspondem a 12% do PIB do país, incluindo-se a agricultura, a pecuária e a silvicultura. Esse quadro era menos dramático antes da guerra civil, sendo Angola autossuficiente nas principais culturas alimentares: café, sisal, milho, banana, tabaco, algodão, feijão, açúcar, óleo de palma e arroz, com exceção do trigo.

Em 1975, Angola deixou de ser uma colónia de Portugal e declarou a sua independência após 14 anos de intensos conflitos. No entanto, a sua independência foi seguida por um período de 27 anos de guerra civil que custou a vida de um milhão de pessoas e o deslocamento de outros quatro milhões. Porém, a partir de 2002, o país vem experimentando um período de relativa paz, estabilidade política e crescimento económico anual considerável, sobretudo quando comparado com os percentuais mundiais (FAO, 2012, p. 10), conforme exemplificado na figura 3.

 

 

Em 2001, a incidência de pobreza no país era de 68%, reduzindo-se para 36,6% em 2008.[15] Apesar desses indicadores refletirem uma evolução, há assimetrias territoriais no país, pois a incidência de pobreza nos meios rurais é maior do que nas zonas urbanas. Além disso, outros fatores contribuem para que o quadro de pobreza angolano seja ainda mais preocupante, especialmente quando se agregam outros parâmetros para além da questão da renda, como é o caso dos indicadores de saúde (mortalidade e nutrição), educação (anos de estudos e matrículas de crianças) e padrão de vida (eletricidade, água, saneamento, etc.), percebe-se que o país possui 77,4% da população em situação de pobreza multidimensional (IEH, 2011, p. 15), conforme se observa no quadro 1.

 

 

No cenário pós 2002, as exportações agrícolas foram seriamente prejudicadas por vários fatores, entre os quais o colapso das estruturas internas de comércio e distribuição; níveis insuficientes de crédito interno para a agricultura e a pecuária; e fraco apoio institucional (FAO, 2012, p. 12). Apesar desses fatores, nos últimos anos, o Plano de Desenvolvimento de Médio Prazo do Sector Agrícola (PDMPSA)[16] vem desenvolvendo vários programas de apoio ao crescimento agrário na região. Implementado em 2013, e concluído em 2017 (Marcelino e Morgado, 2015, p. 12), esse plano teve como objetivo:

[…] promover a transformação sustentável da agricultura de subsistência para uma agricultura comercial orientada para o mercado, visando a segurança alimentar e a dinamização da agro-indústria nacional, o combate à fome e à pobreza, com foco na agricultura, na pecuária, nas florestas e em outros recursos naturais. É nesta vertente que se insere o Projecto Pungo Adongo em implementação na região de Capanda, província de Malanje, contando com a presença da empresa ODEBRECHT [Marcelino e Morgado, 2015, p. 12].

A despeito da vertente agrícola do PDMPSA, na esfera da agricultura familiar é considerado o principal agente de empregabilidade do meio rural, com um percentual de 38% em empregos diretos para a população rural angolana. Na esfera da agricultura empresarial, são implementados investimentos em larga escala “para a operacionalização das intenções de revitalização da agricultura e da agroindústria de grande dimensão” (Marcelino e Morgado, 2015, p. 12).

Face à dependência da população em relação à economia informal, em termos de absorção, quase total, dos alimentos da agricultura familiar, as autoridades governamentais angolanas buscaram iniciativas para a compra de alimentos da agricultura familiar, por meio do Ministério do Comércio. Desde 2010, o governo buscou implementar ações como o “Programa de Absorção da Produção Local e o Programa de Promoção do Comércio Rural”. No entanto, essas iniciativas não surtiram o efeito desejado, pois não se pautaram pelas dinâmicas dos camponeses e agricultores familiares angolanos, considerando-se que essa população corresponde a 90% da produção agrícola do país (Bezerra, et al. 2015, p. 76). Com esse cenário, do ponto de vista da segurança alimentar, Angola ainda enfrenta uma situação preocupante, pois cerca de 40% da população é considerada desnutrida, comparando-se ao nível geral da África Subsaariana que é de 28%[17] (IEH, 2011, p. 17), conforme se observa adiante.

A insegurança alimentar em Angola pode ser explicada tanto por causas diretas, como por causas indiretas.

Segundo o relatório do Programa Alimentar Mundial (PAM), os principais grupos vulneráveis à insegurança alimentar em Angola são: pessoas internamente deslocadas, retornados (ex-deslocados ou ex-refugiados), reassentados e grupos sociais vulneráveis (idosos, crianças, órfãos e viúvas de guerra, minorias étnicas, agricultores de baixa renda, crianças de ruas, inválidos de guerra). Nesse sentido, apesar dos modestos avanços alcançados, especialmente em face dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), Angola ainda tem um longo caminho a percorrer (IEH, 2011, pp. 18-19).

A partir do exposto, percebe-se que a segurança alimentar e nutricional faz parte de um conjunto de medidas para se alcançar uma alimentação adequada e de qualidade. Desse modo, não basta apenas diminuir os índices de desnutrição, pelo contrário é primordial que se criem políticas que garantam modelos de produções de alimentos que valorizem, por exemplo, a agricultura familiar, produzindo-se assim, um modelo de alimentação mais saudável para as populações contemporâneas e futuras.

Reflexões sobre a cooperação técnica entre o Brasil e Angola em segurança alimentar

No contexto africano, Angola é considerada uma das melhores economias da região subsaariana, no entanto está longe de ser um mercado seguro para investimentos estrangeiros. O que atrai o investidor estrangeiro são outros fatores relevantes, tais como terem o maior rendimento per capita da África subsaariana, ser um país rico em recursos naturais, e um grande exportador de petróleo, etc. (Banco Mundial, 2013).

Nesse sentido, Angola tem sido um alvo relevante para os investimentos privados do Brasil. Um exemplo desse investimento é a fazenda Pungo Andongo, localizada na província de Malanje, com extensão de 36 000 hectares. Nessa propriedade, a Embrapa-África desenvolve um projeto de agronegócio onde o ator responsável pela produção e operacionalização da farinha de milho, plantas de ração animal, capacitação e gestão da produção agroindustrial, é a empresa Odebrecht. No âmbito desse projeto, a Odebrecht assinou um acordo com a Embrapa-África em 2007 para dar apoio técnico em experiências com milho, feijão, arroz e soja (Fonseca, Esteves e Gomes, 2015, pp. 29-30).

Entre 2003 e 2012, o Brasil e Angola firmaram 62 projetos de cooperação técnica, científica e tecnológica, especialmente nas áreas da saúde (16 projetos), e da educação (13 projetos) (Marcelino e Morgado, 2015, p. 43). No campo da cooperação técnica, em meados da década de1980 foi firmado o primeiro instrumento jurídico de cooperação entre o Brasil e Angola, o “Acordo de Cooperação Econômica, Cientifica e Técnica”, que se tornou uma espécie de guarda-chuva, posteriormente para o estabelecimento de quinze ajustes complementares e três protocolos (ABC, 2018).[18] Atualmente, estão em execução seis projetos de cooperação na área de agricultura, sete projetos nas área de saúde e educação, somados a três projetos ainda em negociação, conforme sumariado no quadro 4.

 

 

 


(clique para ampliar ! click to enlarge)

 

Os projetos listados no site da ABC com o status de “em execução”, também incluem cursos sobre produção sustentável de hortaliças, numa parceria triangular entre a ABC, a JICA[19] e a Embrapa. O objetivo desses cursos destina-se a melhorar a segurança alimentar dos países africanos de língua portuguesa, possibilitando a melhoria do conhecimento e o desenvolvimento das capacidades na produção de hortaliças. O projeto “Capacitação em Segurança Alimentar no Brasil e em Angola”, liderado pelo Centro de Estudos em Segurança Alimentar (CSFS) da Ryerson University, no Canadá, e o Centro de Referência em Segurança Alimentar e Nutricional (CERESAN) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), é outro dos projetos implementados. O principal objetivo desse projeto é catalisar a colaboração internacional dos países de língua portuguesa para a promoção da educação em segurança alimentar. Além disso, esse projeto também engloba a capacitação de estudantes angolanos e brasileiros na promoção da segurança alimentar nessas regiões (Fonseca, Esteves e Gomes, 2015, p. 31).

Em 2013, foi lançado o projeto “Fome Zero África” em parceria com a União Africana, o Instituto Brasileiro Lula e a FAO, numa iniciativa para acabar com a fome nesse continente. O principal objetivo desse programa seria eliminar a fome e a pobreza até 2025, com recursos obtidos pelo Fundo Fiduciário de Solidariedade Africana para a Segurança Alimentar lançado em 2012 na Conferência Regional da FAO para a África. Apesar de muitos países africanos contribuírem para esse fundo, incluindo Angola, a principal preocupação dos especialistas em relação a essa inciativa consiste na capacidade de adaptação desse programa às realidades angolana (Fonseca, Esteves e Gomes, 2015, p. 32).

Do ponto de vista económico, a parceria entre instituições públicas de Angola e as empresas brasileiras, tais como a Odrebrecht, Camargo Correia e Andrade Gutierrez, têm marcado presença no território angolano no campo da exploração de minerais, agroindústria e construção civil. Porém, no que se refere à responsabilidade social, essas empresas representam pouco reflexo na promoção da segurança alimentar e nutricional da população angolana. Segundo Waldersee (2015, p. 4), o comércio bilateral entre o Brasil e Angola cresceu consideravelmente entre 2000 e 2010. Nessa cooperação, as empresas brasileiras tiveram um papel significativo, conforme observado no quadro 5.

 

 

Angola concentra o maior número de empresas privadas brasileiras em África, sobretudo no campo dos investimentos do BNDES, que destinou 2,8 bilhões de dólares para a África em 2007, destinados aos investimentos privados. Desse montante, Angola recebeu 96% (Waldersee, 2015). Diferentemente de outros países africanos com os quais o Brasil coopera, Angola não é um país dependente exclusivamente da ajuda económica externa, sobretudo dos chamados novos prestadores, como é o caso do papel do Brasil noutros países em África. A cooperação para o desenvolvimento com Angola tem seguido o modelo de desenvolvimento angolano e a sua dependência face ao petróleo (Waisbich et al., 2016, p. 8 apud Fonseca, Esteves e Gomes, 2015).

Nesse contexto, o intercâmbio comercial entre o Brasil e Angola cresceu cerca de 35,9%, o que representa US$ 1,99 bilhões de dólares no período de 2009 a 2013. Conforme observado na figura 1, em 2013 o saldo da balança comercial brasileira atingiu um superávit de US$ 544 milhões de dólares com esse intercâmbio (Calete, Zilli e Vieira, 2016, p. 8), conforme observado adiante na figura 5.

 

 

 

Cabe ressaltar ainda, que no contexto desse intercâmbio entre as empresas brasileiras e o aparato institucional angolano, determinadas práticas implementadas por algumas empresas brasileiras são consideradas nocivas ao continente africano, pois envolvem atos de corrupção, no sentido de gerarem vantagens económicas para as empresas brasileiras e uma parcela da elite governamental dos países africanos. Um exemplo dessas ações é o caso da Odebrecht em Angola, em 2015, no município de Sumbe, província de Kwanza-Sul, quando a referida empresa ocupou terras para construir um condomínio, o que provocou confrontos com a população local em decorrência da perda das terras e da destruição das suas plantações (Infaga, 2017, p. 95).

Considerações finais

As relações entre o Brasil e Angola assentam num importante conjunto de fatores históricos. Nos últimos anos, o Brasil vem empreendendo ações no combate à fome e à pobreza que deram resultados positivos no contexto doméstico, e possibilitaram que as suas políticas públicas servissem de modelo para outros países que padeciam de situações semelhantes, sobretudo na luta pela superação da insegurança alimentar.

Angola enfrentou a exploração, o domínio colonial português, e longos anos de guerra civil até alcançar a independência na década de 1970. Esse contexto político e económico do país aprofundou ainda mais os problemas sociais da população angolana, especialmente no combate à fome. Todavia, o país vem desenvolvendo medidas de promoção e aprimoração dos recursos agrícolas, a exemplo da agricultura familiar, para desenvolver o conhecimento e implementação de técnicas para os produtores angolanos.

Nesse contexto, ressaltamos os acordos estabelecidos entre o Brasil e Angola com vista, especialmente, à capacitação de profissionais e à transferência de tecnologias implementadas por agências brasileiras, como é o caso da Embrapa. Fica evidente, mediante os acordos listados, que há uma colaboração entre os dois países no âmbito da SAN, de maneira direta ou indireta. Apesar dos aparentes benefícios apresentados na cooperação em SAN entre o Brasil e Angola, os projetos brasileiros desenvolvidos em Angola ainda necessitam de maior atenção no que respeita à efetividade da sua prática, particularmente na adaptação às realidades locais e na melhoria efetiva da insegurança alimentar da região. Além disso, essa atenção não deve ser vista apenas à luz da política externa brasileira, mas também como uma forma de fortalecer as suas posições institucionais no campo doméstico e internacional.

 

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Recebido a 17-04-2019 . Aceite para publicação a 19-02-2020.

 

[1] Sobre cooperação técnica e suas diferentes modalidades, v. Cobradi (2013), ABC (2013) e Caisan (2013).

[2] Constituiu forma jurídica à comunidade luso-brasileira.

[3] “A Operação Pan-Americana foi uma proposta de cooperação internacional de âmbito hemisférico que tinha por tese que o desenvolvimento e o fim da miséria seriam os meios mais eficazes que se apresentariam como soluções para os países atrasados. A OPA foi lançada numa conjuntura adequada, em 1958, imediatamente após a mal sucedida viagem do então vice-presidente Nixon à América Latina, oportunidade em que o antiamericanismo dos sul-americanos ficou evidenciado nos incidentes de Lima e Caracas. Esta parte da América ficara à margem do Plano Marshall, carente de divisas, não reconhecera os benefícios das cooperações então vigentes em outras áreas do globo. As relações entre Estados Unidos e a América Latina pediam revisão. A proposta de JK, voltou-se para uma atualização das relações entre os dois segmentos do continente (Cervo, Bueno, 2002, p. 290)”.

[4] “[…] país com maiores potencialidades econômicas (petróleo, ferro, diamantes e minerais estratégicos) e com expressiva minoria branca” (Visentini, 2016, p. 120).

[5] São eles a FNLA, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e, mais tarde, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA). Segundo Visentini (2012, p. 41): “A FNLA e a UNITA eram correntes moderadas e pró-ocidentais de base étnica do norte (bakongos) e do sul (lunda, ambó e ngaguela), respectivamente; o MPLA era de tendência marxista, de base urbana e interetnica, mas com predominância dos quimbundos e ovimbundos, da região central e litorânea. A primeira era apoiada pelo Zaire (Mobutu era cunhado de Holden Roberto), Estados Unidos e China; a segunda pela África do Sul, China e, discretamente, durante certo período, pela própria polícia política portuguesa, enquanto o terceiro movimento tinha um suporte cubano e soviético”.

[6] Maiores informações no site oficial das Relações Exteriores: http://www.itamaraty.gov.br/index.php?option=com_content&view=%20article&id=3674:cupula-america-do-sul-africa-asa&catid=171&lang=pt-BR&Itemid=436. Acesso em 06-12-2018.

[7] O presente artigo escolheu abordar teoricamente os conceitos de segurança alimentar e nutricional de forma separada, mesmo enfatizando as suas diferenças e a recorrência da literatura e índices em juntá-los. Desse modo, articula-se aqui tanto os termos isolados quanto em conjunto.

[8] É uma escala de medição baseada na experiência da insegurança alimentar, cujo método de pesquisa é qualitativo. Para mais informações v. Panel to Review US Department of Agriculture’s Measurement of Food Insecurity and Hunger - National Research Council. Food insecurity and hunger in the United States: An assessment of the measure. Washington, DC: National Academies Press, 2006.

[9] Esse indicador é composto por 15 questões qualitativas para medir a perceção da população sobre o acesso aos alimentos, permitindo a mensuração da insegurança alimentar e nutricional em todo território nacional. Com base nesses dados, o governo federal pôde instituir o Programa Bolsa Família, para transferência direta e condicionada de renda, com o objetivo de combater a pobreza e a fome e, consequentemente, promover a segurança alimentar e nutricional (Pérez-Escamilla e Segall-Corrêa, 2008).

[10] Esses dois princípios significam: o primeiro, que o direito à alimentação é um direito fundamental da humanidade; e segundo, que cada país tem direito soberano de definir as suas políticas e estratégias para garantir o direito à alimentação para toda a população (CONSEA, 2006).

[11] São esferas do SISAN, a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN), os Órgãos e entidades de segurança alimentar e nutricional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, as Instituições privadas, com ou sem fins lucrativos, que manifestem interesse na adesão e que respeitem os critérios, princípios e diretrizes do SISAN (Dias, 2018).

[12] Soft Power significa a capacidade de se conseguir algo por meio da atração em vez da coerção. É uma ação que surge da atratividade da cultura, das ideias e das políticas de um país. A sedução é sempre mais eficaz do que a coerção, ou seja, quando se leva as pessoas a admirar e a querer as suas ideias, por exemplo, não é preciso gastar tanto com armas (NYE, 2004).

[13] Sobre cooperação técnica e as suas diferentes modalidades, ver Cobradi (2013), ABC (2013) e Caisan (2013).

[14] A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) possui acordos com países, instituições estrangeiras de pesquisa e organismos internacionais para parceria em pesquisa e transferência de tecnologia, e configura-se como um dos principais atores na cooperação SUL-SUL brasileira (MRE, 2010; Embrapa, 2012).

[15] Em Angola, considera-se o limiar da pobreza em 1,70 USD/dia e o limiar da pobreza extrema ou indigência em 0,76 USD/dia. A nível mundial, a margem da pobreza é de 2 USD/dia e o limiar da pobreza extrema em 1 USD/dia. A fim de permanecer com essa tendência decrescente, o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) 2013-2017, priorizou o Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Fome, visando reduzir essencialmente a pobreza no meio rural.

[16] O PDMPSA engloba não apenas as questões agrícolas, mas também a pecuária, florestas e outros recursos naturais.

[17] Essa metodologia é classificada a partir do Índice Global de Fome (GHI - sigla em inglês), que agrega três indicadores: nível de desnutrição infantil, taxa de mortalidade infantil e proporção de pessoas com deficiência calórica).

[18] Para maiores informações, site oficial da ABC: http://www.abc.gov.br/Projetos/CooperacaoSulSul/Angola.

[19] Agência de Cooperação Internacional do Japão.

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