Introdução
A relação entre as promessas que os partidos fazem em período de campanha eleitoral e as decisões políticas que tomam depois das eleições está no cerne da democracia representativa (Mansbridge, 2003; Maravall, 2013; Schedler, 1998). Neste sentido, o modelo do partido responsável advoga normativamente que os partidos, quando eleitos, devem cumprir os respetivos mandatos (por exemplo: Downs, 1957; Mansbridge, 2003). Este modelo tem estado usualmente na base dos estudos sobre o cumprimento de promessas eleitorais, conduzindo à expectativa geral de que os partidos cumprem, em grande medida, o mandato que lhes é conferido nas eleições. A pesquisa prévia tem, globalmente, convergido para a confirmação desta expectativa, concluindo que os governos tendem a cumprir as promessas feitas durante a campanha eleitoral, e que mesmo os partidos de oposição cumprem uma percentagem substancial dos seus compromissos eleitorais (por exemplo, Klingemann et al., 1994; Artés, 2013; Serra-Silva e Belchior, 2019). Os níveis de cumprimento são, porém, muito diversos entre governos e entre países, dado que vários fatores podem interferir na performance dos partidos.
No que respeita ao caso português, a pesquisa tem essencialmente explorado a importância do tipo de governo no cumprimento de promessas eleitorais (Moury e Fernandes, 2018; Thomson et al., 2017), restringindo-se a três legislaturas (1995-1999; 2005-2009; e 2009-2011). A exceção a esta tendência é o trabalho de Serra-Silva e Belchior (2019), que analisou o cumprimento dos mandatos dos partidos de oposição em Portugal entre 1995 e 2015. O caso português foi também estudado com o propósito de aferir a perceção dos cidadãos sobre o nível de cumprimento das promessas do governo (Belchior, 2019). Nenhum destes trabalhos apresentou uma análise circunstanciada do cumprimento das promessas eleitorais dos partidos políticos portugueses (estes, ou focaram legislaturas específicas, ou apenas os partidos de oposição).
O presente artigo tem como propósito central a realização desta análise, mediante a resposta a três objetivos principais: (a) aferir o nível de cumprimento dos programas eleitorais dos partidos políticos portugueses - da oposição e do governo - entre 1995 e 2019; (b) averiguar em que medida o cumprimento dos mandatos pelos governos corresponde a reformas de curto ou de longo prazo; e (c) identificar as condições institucionais de governação que explicam o cumprimento dos mandatos pelos governos. Para responder a estes objetivos, o artigo baseia-se em dados produzidos no âmbito dos dois projetos nacionais sobre cumprimento de promessas eleitorais em Portugal: Party Pledges and Democratic Accountability e Public Preferences and Policy Decision-Making.1 Estes projetos cobrem a análise dos manifestos eleitorais dos cinco principais partidos com assento parlamentar entre 1995 e 2019, compreendendo sete ciclos eleitorais. A presente análise representa quase uma década de recolha de dados e de investigação.
Depois da discussão da literatura mais relevante sobre o tópico e da enunciação das expectativas gerais da pesquisa, apresentamos as fontes de dados e as opções metodológicas. Por último, divulgamos e discutimos os principais resultados.
Promessas partidárias: teoria, pesquisa prévia e hipóteses
A relação entre promessas eleitorais e tomada de decisão pelos partidos políticos está bem estabelecida pelo modelo do mandato partidário (Budge e Hofferbert, 1990; Klingemann et al., 1994; também conhecido como modelo da representação promissória - Downs, 1957; Mansbridge, 2003 - ou modelo do partido responsável - ver Schmitt e Thomassen, 1999, cap. 6-9). O pressuposto normativo é duplo: por um lado, espera-se que os eleitores escolham em quem votar seguindo um raciocínio consciente e informado; por outro, espera-se que o sistema partidário seja competitivo e diferenciado e que, após as eleições, os partidos cumpram o mandato que lhes foi concedido. Os eleitores têm controlo indireto sobre a tomada de decisão dos partidos na medida em que se espera que os partidos cumpram as suas promessas, que provavelmente refletem as preferências dos seus eleitores (Downs, 1957; Powell, 2004). Apesar de a perspetiva do mandato da representação estar longe de ser indiscutível (King et al., 1993; Manin, 1997, pp. 163-183), as suas premissas normativas têm orientado a maior parte da investigação até agora realizada sobre a relação eleitos-eleitores. É também esta a perspetiva teórica em que assenta a presente pesquisa.
Do ponto de vista empírico, a pesquisa prévia permite, de um modo geral, uma melhor compreensão do papel dos programas eleitorais enquanto fundamento da legislatura, tendo alcançado pelo menos duas conclusões importantes (Artés, 2013, pp. 144-145; Artés e Bustos, 2008, pp. 323-326; Costello e Thomson, 2008, pp. 251-252; Klingemann et al., 1994; Mansergh e Thomson, 2007; Moury, 2011; Royed, 1996; Thomson et al., 2017). Primeiro, demonstrou que os programas eleitorais não são meros documentos burocráticos ou propagandísticos e que os partidos os consideram seriamente quando se trata de decidir sobre as políticas a serem adotadas. Segundo, demonstrou que os partidos do governo tendem a manter a palavra dada aos eleitores em período de campanha e que mesmo os da oposição, dentro dos constrangimentos ao cumprimento do mandato que tal condição implica, fazem um esforço significativo no sentido de cumprir a sua palavra.
As razões pelas quais os partidos cumprem os seus compromissos eleitorais são diversas. A literatura tem-se debruçado sobre um conjunto restrito de fatores explicativos do cumprimento, em especial: o tipo de governo, o contexto económico durante a legislatura e, ainda, o tipo de promessa em questão, adiante discutidos.
No que diz respeito à primeira variável explicativa, tem sido demonstrado que os executivos de partido único têm maior probabilidade de cumprir as suas promessas eleitorais do que os governos de coligação (Thomson et al., 2017), mas que ter ou não ter maioria legislativa é indiferente (Artés, 2013; Moury, 2011; Moury e Fernandes, 2018). Estes resultados relacionam-se com a teoria dos veto players, que foca o número e as preferências dos atores de veto; isto é, os “actores individuais ou colectivos cujo assentimento é necessário para que ocorra mudança do status quo” (Tsebelis, 1999, p. 591). O argumento da teoria do ator de veto é simples. Dado que as mudanças de policy têm de ser aprovadas por todos os atores de veto, estas tornam-se menos prováveis quanto maior for: a) o número de atores de veto; b) a distância externa entre eles e c) a congruência ideológica entre si. Num sistema parlamentar, os atores de veto são os partidos governantes, bem como outros atores constitucionalmente investidos com o poder de veto (nomeadamente o presidente, em sistemas presidenciais - e alguns semipresidenciais -, algumas segundas câmaras legislativas, ou ainda outras maiorias que não a governativa - Tsebelis, 1999). Assim, no caso português os atores de veto são os partidos do governo e o presidente da República, em caso de coabitação (ou seja, quando um presidente e um primeiro-ministro, em exercício simultâneo de funções, são de partidos diferentes).
De notar ainda que esta teoria classifica como ator de veto qualquer partido no governo, independentemente de os governos serem de coligação mínima vencedora, sobredimensionados (isto é, com mais partidos do que se precisa para obter uma maioria) ou de minoria. Os dois pressupostos subjacentes são que, por um lado, é necessário o consentimento de todos os partidos coligados numa maioria sobredimensionada para que a legislação seja aprovada e, por outro, que os governos de minoria estejam equipados para impor a sua vontade num parlamento, como se de uma maioria se tratasse (Tsebelis, 1999).
O argumento principal na presente pesquisa é, por isso, que quanto mais atores de veto estiverem presentes no sistema, menor será a capacidade de cumprimento de promessas pelos partidos no governo. Desta forma, a hipótese a testar é:
H1 Quanto maior a presença de veto players, menor a chance de o governo cumprir as suas promessas eleitorais.
O segundo fator explicativo que a pesquisa tem contemplado reporta ao tipo de promessa; mais concretamente, ao grau de exigência (em termos de recursos materiais, pessoais ou temporais) inerente ao cumprimento de uma promessa. Quanto mais exigentes as promessas, menor a possibilidade de serem cumpridas. O tipo statu quo (promessas focadas na continuidade das ações do governo anterior) é considerado mais fácil de cumprir quando comparado às promessas de mudança (que implicam alterar uma política já estabelecida ou adicionar novos elementos), pois são menos exigentes no que respeita aos esforços requeridos aos partidos (Costello e Thomson, 2008; Mansergh e Thomson, 2007). A expectativa é, portanto, que os governos sejam mais capazes de cumprir o seu mandato no que respeita às promessas que garantam a manutenção do statu quo. Dado que a literatura tem reiteradamente concluído pela maior probabilidade de cumprimento das promessas statu quo, esta variável será integrada na análise como controlo.
Para além da comparação entre promessas statu quo versus mudança, a literatura não tem explorado outras características das promessas com eventual relevância explicativa, como é o caso do tipo de reforma política que as promessas implicam - reformas de curto ou longo prazo. As reformas de longo prazo pretendem gerar benefícios a dez, vinte ou mais anos, sendo que se prevê que os benefícios sejam maiores a longo do que a curto prazo. Baseando-nos numa tipologia de políticas de longo prazo desenvolvida por Kraft (2017), incluímos nesta definição categorias como a criação de capital humano, investimento em investigação e desenvolvimento, criação de capital físico, reformas estruturais e políticas públicas de prevenção de saúde.2 Com a introdução desta variável na análise, pretendemos averiguar em que medida o cumprimento dos mandatos pelos governos corresponde a reformas de curto ou de longo prazo. Por um lado, focamo-nos, sob o ponto de vista descritivo, na avaliação dos níveis de cumprimento de promessas que correspondem a cada um destes tipos de reforma, ao longo do tempo e por governo. Por outro lado, como forma de validação dos resultados obtidos a nível descritivo, exploramos esta variável enquanto fator explicativo do cumprimento do mandato.
O terceiro fator explicativo presente na literatura sobre cumprimento reporta ao contexto económico. As condições económicas, habitualmente, afetam as agendas partidárias (por exemplo, Budge e Farlie, 1983; Jones e Baumgartner, 2005; Klingemann et al., 1994). Por um lado, um contexto de crescimento económico confere aos governos mais liberdade para cumprir o seu programa, especialmente quando isso implica um aumento nos gastos, que é o cenário mais comum. Por outro lado, um contexto de crise cria constrangimentos à implementação do programa eleitoral em consequência das inerentes restrições orçamentais, legitimando o incumprimento (justificado também em função de outros interesses nacionais). O contexto económico tem sido pontualmente contemplado na explicação do cumprimento das promessas eleitorais pelos governos e, apesar de ser expectável uma relação positiva entre as duas variáveis, os resultados alcançados têm sido relativamente inconsistentes (por exemplo: Thomson et al., 2017). Esta variável será também integrada na análise como variável de controlo. Entram ainda na análise outras variáveis com este estatuto, tais como o número de promessas no programa eleitoral e a duração do governo, presumindo-se que, quanto maior o volume de promessas no programa eleitoral e quanto menor a duração do governo, maiores são as dificuldades do governo em conseguir concretizar o seu mandato eleitoral.
O caso português, dados e método o caso português
Portugal é um laboratório interessante para estudar o cumprimento de promessas porque o seu sistema partidário e de governo oferece condições relevantes para testar as variáveis anteriormente referidas. Em primeiro lugar, nos últimos 25 anos, Portugal teve vários tipos governo: governos maioritários (de coligação ou não) e governos minoritários. Com a exceção do governo de 2015-2019, os governos minoritários não tiveram o apoio formal de outros partidos, preferindo negociar cada orçamento ou legislação com maiorias que iam variando de composição (Moury e Fernandes, 2018). O governo socialista de António Costa, pelo contrário, contou com o apoio explícito dos três partidos de esquerda radical (BE, PCP e PEV). Esta variação oferece as condições necessárias para o estudo do efeito do número de veto players no cumprimento eleitoral dos governos.
Em segundo lugar, o semipresidencialismo português é também relevante para podermos averiguar o efeito dos atores de veto na performance dos governos. Embora o poder do presidente tenha sido limitado pela reforma constitucional de 1982, este continua a ter poderes significativos (Neto e Lobo, 2009). O caso português permite-nos, portanto, avaliar se a coabitação é relevante no cumprimento de promessas.
Por último, mas não de somenos importância, dispõe-se atualmente para o estudo do caso português de uma base de dados excecionalmente ampla (cobre 24 anos e sete ciclos eleitorais) sobre o cumprimento das promessas eleitorais, o que proporciona condições únicas para estudar o tópico.
Fontes de dados e método
As fontes de dados decorrem de dois projetos de investigação: Party Pledges and Democratic Accountability e Public Preferences and Policy Decision-Making. O primeiro destes projetos fez o levantamento das promessas dos programas eleitorais nas legislaturas de 1995-1999 e 2005-2009 e analisou o respetivo cumprimento. O segundo replicou a mesma análise em cinco outras legislaturas: 1999-2002, 2002-2005, 2009-2011, 2011-2015 e 2015-2019. O número total de observações na base de dados é de 6367 promessas, incluídas nos programas eleitorais de cinco partidos portugueses com assento no Parlamento em sete ciclos eleitorais.3 Destas, 1568 promessas (apenas foram incluídas as promessas em relação às quais foi possível aferir o respetivo cumprimento) foram propostas pelo PS, 1543 pelo PSD, 1431 pela CDU, 1172 pelo CDS-PP e 653 pelo BE. Os partidos no governo apresentaram 1943 promessas nos seus programas eleitorais, sendo 1207 propostas pelo PS, 432 pelo PSD e 304 pelo CDS. A unidade de observação na nossa análise é a promessa eleitoral.
Como na generalidade das pesquisas sobre o tema, a metodologia utilizada para identificar as promessas e avaliar o seu cumprimento é a desenvolvida por Royed (1996). Seguimos a sua definição de promessa como “o compromisso de realizar alguma ação ou produzir algum resultado, em que uma estimativa objetiva possa ser feita sobre se a ação foi efetivamente realizada ou o resultado produzido” (p. 79). Apenas quando os compromissos dos partidos se relacionam com ações ou resultados testáveis estes foram incluídos como promessas. Promessas como “[c]ontinuar a apoiar as mulheres para que possam conciliar a sua vida profissional e familiar” não foram incluídas, pois não são claramente verificáveis. Pela mesma razão, um bom exemplo de promessas incluídas no estudo é: “Promulgar um novo regime legal para a política do solo”. Resumidamente, o método de Royed consiste em identificar declarações de promessas precisas e objetivamente testáveis nos programas eleitorais dos partidos (compromissos vagos, não testáveis, não foram incluídos na análise) e verificar o seu cumprimento pesquisando em diversas fontes (como legislação, sites oficiais ou contatos diretos com departamentos públicos).
As promessas são classificadas como totalmente cumpridas (se a evidência indica que a promessa foi completamente cumprida), parcialmente cumpridas (se os esforços dos partidos levaram apenas à concretização parcial do que foi prometido) e não cumpridas (se não houver evidência junto das diferentes fontes consultadas de que o partido cumpriu a promessa). Foram excluídas da análise as promessas relativamente às quais não foi possível determinar uma destas condições; isto é, promessas em que prevaleceu a indecisão sobre o respetivo cumprimento ou incumprimento.
De modo a garantir a fiabilidade da identificação e codificação das promessas dois codificadores trabalharam simultaneamente em diferentes programas eleitorais, e testes simples de validação cruzada foram rotineiramente realizados relativamente a cada programa eleitoral. Os testes apoiaram-se na seleção aleatória de uma amostra das páginas/promessas dos programas e sua identificação, codificação e avaliação realizadas por um codificador diferente. O processo foi repetido até um nível de conformidade superior a 90% ser alcançado.
Variável dependente
A variável dependente na análise explicativa (o cumprimento das promessas) consiste numa variável dummy que, à semelhança do usualmente seguido pela literatura, compara as promessas totalmente cumpridas mais as parcialmente cumpridas (1), às promessas não cumpridas (0).
Variáveis independentes
A análise explicativa centra-se na aferição das condições institucionais de governo, em particular do número de veto players (na versão teórica de Tsebelis, 1999), enquanto fator explicativo do cumprimento de promessas pelos governos. Com este propósito calculou-se o número de atores de veto em cada legislatura, atribuindo um ponto a cada partido no governo, com a possibilidade de outro ponto adicional caso a família partidária do presidente fosse diferente daquela do primeiro-ministro (número de veto players_1).
É de notar que, para alguns autores, os partidos de oposição teriam que ser contados como atores de veto no caso de governos minoritários (Curini e Zucchini, 2010). Para verificar este argumento, àquele número base é adicionado um ponto na eventualidade de o governo ser minoritário (número de veto players_2). Em ambos os casos o número de veto players oscila entre um mínimo de um e um máximo de três. De modo a facilitar a interpretação dos resultados, ambas as variáveis foram dicotomizadas (com 0 correspondendo a uma baixa ou nula presença de veto players (1) e 1 correspondendo a uma maior presença de veto players (2 ou 3).4
Inclui-se ainda na análise explicativa um conjunto de outras variáveis com o intuito de exercerem algum controlo sobre a relação entre veto players e cumprimento das promessas: o tipo de promessas, o contexto económico, assim como o número de promessas no programa eleitoral e a duração do governo. Para avaliar a importância do tipo de promessa, as promessas de statu quo são testadas por comparação às promessas de mudança. Cada promessa é codificada como statu quo (1) se se foca em continuar as ações do governo anterior e como mudança se altera uma política já estabelecida ou adiciona elementos novos (0).
Com o propósito de aferir se promessas relativas a reformas de curto ou longo prazo têm efeito no nível de cumprimento dos governos, foi criada uma variável que classifica uma promessa como sendo reforma de longo prazo se tem como objetivo criar retornos crescentes e positivos num período longo de tempo (1), e de curto prazo se não for este o caso (0).
O crescimento médio do PIB per capita é considerado como indicador para medir o contexto económico. Por fim, consideram-se ainda o número de promessas nos programas eleitorais dos partidos do governo e a duração do governo medida em meses.
O cumprimento de promessas eleitorais dos partidos políticos portugueses entre 1995 e 2019
Iniciamos a análise apresentando o panorama geral e descritivo do cumprimento das promessas nos partidos portugueses (no governo ou na oposição) entre 1995 e 2019, como mostra o quadro 1. Sem surpresa, e corroborando pesquisas anteriores, os dados revelam que os níveis de cumprimento são substanciais, que os partidos no governo cumprem mais do que os partidos da oposição e que os partidos mainstream (PS e PSD, excetuando o CDS) cumprem geralmente mais que os partidos challengers (BE e CDU).
Mesmo considerando os governos que não concluíram o seu mandato, os partidos no poder cumpriram, em média, quase 60% das suas promessas. Na oposição, a diferença entre o Partido Socialista e o Partido Social-Democrata é notória: enquanto o PS, mesmo não fazendo parte do governo, continua a cumprir uma média de 60,9% das suas promessas eleitorais, o PSD cumpre apenas 39,7% quando se encontra na mesma posição. Mais relevante é o facto de a disparidade do nível de cumprimento do PSD enquanto partido da oposição variar substancialmente em função da distribuição parlamentar do partido do governo, em concreto, do PS. Quando o PS governa com minoria, o PSD regista um cumprimento médio de 42,9%. Quando o PS dispõe de maioria absoluta no parlamento, o cumprimento total ou parcial das promessas eleitorais do PSD cai para 26,9%. Estes dados são sugestivos de um importante condicionamento dos executivos de maioria socialista sobre a capacidade de execução do mandato do PSD, enquanto partido de oposição.
No que diz respeito aos pequenos partidos de oposição portugueses, estes cumprem em média, total ou parcialmente, cerca de 30% das promessas eleitorais, embora haja variações importantes. A CDU apresenta, em média, melhor desempenho (35,0%), seguido pelo BE (30,8%) e depois pelo CDS-PP (30,6%).
Um resultado importante é que, ao contrário do PSD, o cumprimento de promessas dos restantes partidos não varia sobremaneira consoante o PS governe com maioria ou minoria. Numa minoria parlamentar, a CDU cumpre 34,6%, o BE 31,2% e o CDS 30,7%. Estes valores não diferem substancialmente dos observados perante governos de maioria, em que a CDU cumpre 35,9%, o BE 28,6%, e o CDS 28,0%.
O caso da XIII legislatura é paradigmático, uma vez que tanto o BE como a CDU faziam parte da solução informal de governo, o que, como é observável em detalhe no quadro 1, não fez variar substancialmente os seus níveis de cumprimento, em comparação com outras minorias do PS, como Guterres I e II, ou Sócrates I. Este resultado é surpreendente e contraria a ideia consensual de que um partido da oposição consegue fazer aumentar a sua influência junto do governo com acordos pré-eleitorais (cf. Artés, 2013).
No quadro 2, apresentamos os resultados do cumprimento pelos partidos do governo, olhando também para o cumprimento das reformas de curto e longo prazo, assim como outras variáveis explicativas e de caracterização.
Uma primeira conclusão sobre este quadro é que a governação em minoria parlamentar não impede o bom cumprimento de promessas. Com a exceção do governo maioritário de Sócrates I (2005-2009), que teve um bom desempenho (75,1% das promessas cumpridas total ou parcialmente), os governos socialistas foram todos minoritários. Entre estes, Guterres I (1995-1999) concretizou total ou parcialmente 85,4% das suas promessas (este governo teve o contexto económico mais favorável de todo o período em análise, conforme mostra o quadro 2). De modo semelhante, Costa I (2015-2019) cumpriu total ou parcialmente 86,8% das suas promessas. Mesmo os dois governos socialistas remanescentes, que não concluíram o seu mandato, foram capazes de cumprir total ou parcialmente 61,5% (Sócrates II, 2009-2011) e 50,7% (Guterres II, 1999-2002) das suas promessas eleitorais.
Estes resultados mostram que o executivo minoritário encontra poucos obstáculos no seu curso de ação (ver Lisi, Moury e Belchior, 2019). Atestam também a teoria original de Tsebelis (1999), que menospreza, no seu modelo, a ausência de uma maioria parlamentar. No mesmo sentido, a confirmar empiricamente a teoria dos veto players e a investigação sobre a importância do tipo de governo no cumprimento das promessas (por exemplo, Naurin, 2014, pp. 1048, 1054-1056; Thomson et al., 2017), observa-se que os dois governos de coligação - ambos maioritários e do PSD e CDS-PP - tiveram um desempenho consistentemente menor do que o dos governos de um partido, por sua vez, socialistas. O governo de Passos Coelho (2011-2015) cumpriu apenas 61% das suas promessas (PSD e CDS-PP). O anterior governo de coligação do PSD/CDS-PP (2002-2005) não subsistiu até o final do mandato e só foi capaz de cumprir (total ou parcialmente) 30% das promessas previstas nos programas eleitorais.
A coabitação pode também ser apontada como um fator causal do cumprimento. O caso do presidente Jorge Sampaio do Partido Socialista e o governo de coligação PSD-CDS, entre 2002 e 2005, é disso um bom exemplo: Sampaio dissolveu a Assembleia da República já quando Pedro Santana Lopes era primeiro-ministro, após a partida de Durão Barroso para Bruxelas. A média de cumprimento dos dois partidos coligados ficou pelos mais baixos registados: 30%.
No quadro 2 vemos ainda como a performance económica tem um peso ambíguo na capacidade de cumprimento das promessas. De facto, das três legislaturas que registaram uma taxa de crescimento real do PIB superior a 2%, em duas delas observou-se que o cumprimento de promessas eleitorais superou os 80%. Isto ocorreu entre 1995-1999 e 2015-2019, nos primeiros governos socialistas de António Guterres e de António Costa, respetivamente. Porém, notamos que a segunda maior taxa de crescimento do PIB foi registada entre 1999-2002, período correspondente ao segundo governo de Guterres em que apenas 50,7% das promessas foram cumpridas. Ainda, o primeiro governo de Sócrates, entre 2005-2009, apenas registou uma taxa de crescimento do PIB de 0,42% e, no entanto, foi o terceiro a cumprir mais promessas, comparativamente, com 76,2%. Por fim, o governo de Passos Coelho cumpriu mais promessas que o governo anterior da mesma maioria (PSD/CDS-PP), embora tenha governado durante o auge da crise económica e sob assistência financeira externa.
O cumprimento do mandato pelos governos portugueses: reformas de curto e de longo prazo
No quadro 2 apresentamos ainda o número de promessas e do cumprimento de reformas de curto e de longo prazo, por governo. É possível observar que a maior parte das promessas eleitorais (72%) dos partidos que viriam a formar os governos entre 1995-2019 foram exclusivamente de curto prazo e que não se observam diferenças significativas entre governos. É importante salientar que as promessas de longo prazo podem incluir vantagens no futuro próximo. Por exemplo, uma medida que torne os tribunais mais eficazes com a transição para tecnologias digitais ajudará ao funcionamento do poder judicial no curto e no longo prazo.
Esta proporção elevada de promessas a curto prazo não é surpreendente, dado que vários investigadores têm defendido que os decisores políticos, ao ponderarem sobre políticas públicas, utilizam critérios estratégicos associados a uma visão de curto prazo e raramente iniciam políticas que sejam vantajosas apenas, ou sobretudo, para um período longo, fora da sua legislatura ( Kayser, 2005). Isto porque os decisores e estruturas partidárias estão preocupados com a sua reeleição, e como a população tende a não querer arriscar (Fernandes e Rodrik, 1991; Jacobs e Matthews, 2012), os políticos preferem jogar pelo seguro. Em particular, em tempos de contenção orçamental, contexto que caracterizou grande parte dos governos estudados, existe evidência de que as políticas de longo prazo são as primeiras a serem cortadas ou ignoradas, ao invés de medidas com maior visibilidade imediata junto da população ( Jacques, 2020).
Porém, comparando as duas últimas colunas do quadro 2, observa-se que o nível de cumprimento das promessas de curto e longo prazo é idêntico, situando-se em ambos os casos, em média, em 61% das promessas. Essa tendência verifica-se entre os governos mais e menos cumpridores, registando-se em todos eles uma percentagem semelhante de cumprimento de promessas que implicam reformas de longo e de curto prazo.
Um olhar aprofundado sobre as promessas eleitorais permite-nos concluir que uma esmagadora maioria das promessas de longo prazo não possuía quaisquer custos acrescidos visíveis e imediatos para a população. Só 13 promessas de longo prazo com custos a curto prazo foram incluídas nos manifestos eleitorais de todos os partidos que formaram governo, o que significa que os partidos tendem a prometer poucas medidas destas, antecipando que serão impopulares. De facto, só dois governos prometeram e aprovaram medidas de longo prazo com custos para a população: o PS de 2005 (3) e o PSD de 2011 (3), ambas em contexto de recessão. Por exemplo, no programa eleitoral do PS de 2005 estava prevista - e foi cumprida - a limitação dos montantes mais altos das pensões, que passaram a estar balizados pelo valor estabelecido ao nível do vencimento líquido do presidente da República. Num contexto de resgate, o PSD propôs reduzir o nível de despesa com subsídios, transferências e indemnizações compensatórias ao sector empresarial do Estado, algo que também cumpriu. Em ambos os casos, eram claros os custos a curto prazo. Por oposição, como exemplo negativo, o mesmo governo PSD/CDS-PP, devido à enorme impopularidade e oposição à medida, não cumpriu a sua promessa de transferir parte do custo da TSU para os trabalhadores. Em 2015, noutro caso, o governo do PS não cumpriu a sua promessa de taxar as heranças para financiar a segurança social.
O cumprimento do mandato pelos governos portugueses: fatores explicativos
O terceiro e último objetivo visa identificar as condições que afetam o cumprimento dos mandatos pelos governos portugueses. A análise correspondente encontra-se no quadro 3, em que a variável dependente mede se a promessa foi pelo menos parcialmente cumprida (1), ou não (0). Cada observação corresponde a uma das promessas nos programas eleitorais do(s) partido(s) que constituíram governo após as eleições, respeitando ao período entre 1995 e 2019. Dada a estrutura agregada dos dados (por partido e ano), não é aconselhado utilizar uma análise de regressão comum, dado que a assunção da independência das observações não está assegurada. Ao invés, estimamos modelos lineares generalizados mistos, com erros-padrão robustos, agrupados por partido*ano eleitoral (Heck et al., 2012: cap.4).
O modelo 1 testa a importância das condições institucionais de governo no cumprimento das promessas eleitorais focando no número de veto players 5 e controlando por contexto económico, tipo de promessas, número de promessas no manifesto e duração do governo. O modelo 2 testa o mesmo conjunto de fatores, mas considera como características institucionais o tipo de governo e a existência de coabitação presidencial. Desta forma será possível compreender que veto players são mais relevantes na explicação da performance dos governos.
São três as principais conclusões no que respeita à importância das características institucionais em que o executivo governa. Primeira, a maior presença de veto players tanto parece penalizar como potenciar a capacidade de o governo cumprir as suas promessas eleitorais, dependendo da forma como a variável é operacionalizada. Recorde-se que a variável veto players_1 contempla como atores de veto os partidos no governo e o presidente em caso de coabitação presidencial, enquanto a veto players_2 adiciona a estes atores os partidos de oposição em caso de governo minoritário.
No que respeita à variável veto players_1 o efeito sobre o cumprimento das promessas eleitorais é negativo e substancial (o mais relevante dos coeficientes negativos), indicando que uma maior presença de atores de veto numa legislatura (2 ou 3) produz um decréscimo de 0,25 (isto é, de 75%) nas chances de cumprimento do mandato. Dito de outro modo, Tsebelis (1999) tinha razão ao afirmar que os veto players diminuem a capacidade de tomada de decisão e estava ainda certo quanto à necessidade de não contabilizar, em governo de minoria, os partidos de oposição como veto players.
De facto, a correlação positiva entre o cumprimento e a variável veto players_2 (controlando pela variável veto players_1) mostra, numa condição ceteris paribus, que os governos de minoria cumprem mais promessas do que os restantes. Este resultado é congruente com a literatura discutida anteriormente (Moury e Fernandes, 2018; Lisi, Moury e Belchior, 2019).
As figuras 1 e 2 representam as estimativas de cumprimento das promessas em função de cada uma destas duas variáveis independentes, medidas em termos de médias marginais. De modo consistente com os resultados do quadro 3, observa-se que uma presença mais expressiva de veto players_1 (2 ou 3) contribuiu para o decréscimo do nível de cumprimento do mandato, enquanto no caso de maior presença de veto players_2 o contributo é no sentido do aumento do cumprimento.
O segundo modelo permite averiguar quais os veto players com maior impacto no cumprimento eleitoral. Dos dados neste modelo destaca-se o efeito positivo e robusto dos governos de partido único no cumprimento eleitoral (de entre os controlos, apenas as promessas statu quo impulsionam mais o cumprimento). Por comparação aos governos de coligação, os de partido único veem aumentadas as suas chances de cumprimento eleitoral cinco vezes (a Figura 3 ilustra esta relação mediante a representação das médias marginais estimadas). Esta conclusão está alinhada com os resultados alcançados pela literatura sobre este tópico, que reiteradamente têm concluído que os governos de partido único têm melhor desempenho que as coligações (por exemplo, Moury e Fernandes, 2018; Thomson et al., 2017) e permite também compreender melhor os resultados da veto players_2, dado que na amostra em análise, apenas com exceção de um, os governos de partido único são minoritários (Sócrates I, 2005-2009).
É de notar que, em Portugal, os governos com um partido único são sempre do PS, enquanto os de coligação são sempre compostos por partidos de direita (PSD e CDS-PP). Por esta razão não é possível em Portugal distinguir os efeitos das duas variáveis. Não há na literatura evidência que mostre que os partidos de esquerda cumprem mais os seus mandatos que os de direita. Porém, existem trabalhos que mostram bem que os partidos conseguem um cumprimento maior quando governam sozinhos (Thomson et al., 2017). Em Portugal, os governos de esquerda que precisam ou querem uma maioria ampla podem encontrar aliados tanto à esquerda quanto à direita, algo que não é verdade para os governos de direita. Não podemos excluir, por isso, que aquelas duas variáveis tenham um efeito independente sobre o cumprimento, que, contudo, não conseguimos controlar.
O modelo 2 indica ainda que a existência de coabitação presidencial não afeta significativamente o cumprimento do mandato. Apesar de o efeito ser negativo, o coeficiente está aquém da significância estatística. Em suma, os resultados obtidos sugerem que uma maior presença de atores de veto dentro do governo, isto é, de partidos parceiros de coligação com os quais é necessário gerir o processo governativo, implica uma menor capacidade de os executivos concretizarem o seu mandato eleitoral. Os partidos da oposição, mesmo com governos de minoria, assim como a presidência, não parecem ter um papel relevante enquanto veto players do cumprimento das promessas pelo executivo. A expectativa de que quanto maior o número de veto players, menores as chances de o governo cumprir as suas promessas eleitorais (H1) é assim corroborada, mas apenas para os atores de veto dentro do governo.
Ainda, a análise descritiva sugeriu que não existem diferenças relevantes entre governos quanto ao nível de concretização de promessas relativas a reformas de curto ou longo prazo, nem entre estas. A integração desta variável na análise de regressão visou validar estatisticamente esta conclusão. Dado que em ambos os modelos em que a variável foi integrada os coeficientes não são significativos, conclui-se pela inexistência de efeito do tipo de reforma na capacidade de concretização das promessas pelos governos.6
Terminamos com uma breve análise das variáveis de controlo. De modo geral, as conclusões reiteram a pesquisa anterior. O fator explicativo mais importante é o facto de a promessa implicar ou não mudança política. Se a promessa visa a manutenção do statu quo aumenta quase oito vezes a possibilidade de cumprimento, por comparação à que acarreta uma mudança política. O crescimento percentual do PIB conduz a um aumento do cumprimento eleitoral de cerca de 24 pontos percentuais por cada unidade percentual de aumento, mas apenas no modelo 1. No modelo 2 a relação não tem significância estatística. Finalmente, o número de promessas e a duração do governo têm, de modo geral, efeito positivo, mas muito fraco. No primeiro caso, cada 10 promessas que acrescem nos programas eleitorais aumenta as chances de cumprimento em 4 pontos percentuais, sinalizando que os programas eleitorais mais extensos não são, tendencialmente, menos, mas antes mais cumpridos (note-se, porém, que a percentagem é muito baixa e a estabilidade da significância fraca, pois não se mantém no modelo 2). No segundo caso, cada mês de duração do governo contribui para aumentar em 6 pontos percentuais o cumprimento do mandato.
CONCLUSÕES
Não obstante a pesquisa já realizada sobre o cumprimento de promessas eleitorais em Portugal, nenhuma procede a uma análise abrangente e circunstanciada do cumprimento das mesmas pelos partidos políticos portugueses. Os estudos anteriores, ou focaram legislaturas específicas (restringindo-se a três legislaturas: 1995-1999; 2005-2009; e 2009-2011), ou apenas os partidos de oposição. O presente artigo teve como propósito central a concretização desta análise global e detalhada, visando responder a três objetivos específicos: (a) aferir o nível de cumprimento dos programas eleitorais dos partidos portugueses - da oposição e do governo - entre 1995 e 2019; (b) averiguar em que medida o cumprimento dos mandatos pelos governos corresponde a reformas de curto ou de longo prazo; e (c) identificar as condições institucionais de governação que explicam o cumprimento dos mandatos pelos governos.
Em sintonia com a pesquisa prévia sobre o tópico, no que respeita ao primeiro destes objetivos, a análise do cumprimento das promessas indica que: a taxa de cumprimento dos governos é substancial (no seu todo cumprem, em média, total ou parcialmente, quase 60% das promessas); os partidos do governo cumprem mais do que os da oposição (que, ainda assim, cumprem em média, total ou parcialmente, cerca de 30% das promessas); e os partidos mainstream (PS e PSD, excetuando o CDS) cumprem geralmente mais que os partidos challengers (BE e CDU). Os dados mostram ainda que os governos minoritários em Portugal detêm uma taxa de cumprimento superior (74,4%) aos governos maioritários (55,7%). Entre os pequenos partidos da oposição, a coligação comunista é a mais cumpridora no período em análise, seguida pelo BE. Ambos os partidos parecem apoiar-se substancialmente nos seus programas eleitorais para o desenvolvimento das respetivas atividades parlamentares.
Em relação ao segundo objetivo da pesquisa, verificou-se que uma larga maioria das promessas eleitorais (72%) dos partidos de governos no período em análise foram de curto prazo, não se observando diferenças significativas entre governos quanto a esta tendência. O nível de cumprimento das promessas de curto e de longo prazo é idêntico, situando-se em ambos os casos, em média, em 61% das promessas.
Finalmente, o terceiro e último objetivo visou identificar as condições institucionais de governação que explicam o cumprimento dos mandatos pelos governos. A principal conclusão a este respeito é que o efeito dos veto players não é homogéneo entre estes, dependendo essencialmente de quem os atores de veto são e não propriamente da maior ou menor presença destes em cada legislatura. Verificou-se, por um lado, que a presença de atores de veto dentro do governo (os partidos parceiros de coligação) constrange significativamente a capacidade de os governos concretizarem o seu mandato eleitoral. Os governos de partido único, que por isso não dependem da negociação entre parceiros de coligação para a tomada de decisão, tendem a ver aumentadas as suas chances de cumprimento do mandato quase cinco vezes, por comparação aos governos de coligação.
Ainda, os partidos de oposição não parecem contar como veto players quando os governos são de minoria. Este resultado corrobora a perspetiva de Tsebelis (1999) que argumenta que os governos minoritários estão devidamente equipados para implementar as reformas previstas eleitoralmente. Neste mesmo sentido, Moury e Fernandes (2018) demonstram que os governos minoritários têm incentivos maiores para um bom desempenho por comparação aos maioritários. Isto porque temem pela sua subsistência no cargo e são pressionados pelos partidos de oposição para executar as promessas eleitorais que favoreçam estes últimos.
De igual modo, a presidência (em coabitação) não aparenta constituir uma barreira significativa ao cumprimento dos mandatos pelos governos. Embora o presidente possa ter um papel-chave no funcionamento do governo - como verificado sob o mandato de Jorge Sampaio ao dissolver a Assembleia da República - este papel é exercido pontualmente e não de modo sistemático, pelo que o seu impacto no cumprimento das promessas ao longo do mandato é negligenciável.
Em suma, a expectativa de que quanto maior a presença de veto players, menores as chances de o governo cumprir as suas promessas eleitorais (H1) é corroborada no que respeita aos governos de coligação, mas não relativamente aos partidos de oposição ou à existência de coabitação presidencial.