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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.247 Lisboa jun. 2023  Epub 30-Jun-2023

https://doi.org/10.31447/as00032573.2023247.06 

Artigos

A emergência de partidos ecológicos nos países lusófonos: paralelos entre Brasil e Portugal.

The emergence of ecological parties in Portuguese-speaking countries: parallels between Brazil and Portugal.

Antonio Teixeira de Barros1 
http://orcid.org/0000-0002-3061-8202

1. Filiado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCTDD). Professor do Programa do Programa de Pós-Graduação do Centro de Formação da Câmara dos Deputados » Complexo Avançado da Projeção L, Câmara dos Deputados, Via N3, Bloco B, Sala 06 - CEP 70160-900 Brasília, DF, Brasil. antonibarros@gmail.com


Resumo

Este artigo analisa comparativamente as origens dos partidos ecológicos no Brasil e em Portugal. O foco do estudo são os perfis partidários, as suas pautas e posicionamentos quanto à sustentabilidade ambiental. Para tanto, faz-se uma análise dos programas atuais de seis partidos ecológicos brasileiros e portugueses, três de cada país. As conclusões mostram que predominam os perfis partidários de orientação sistémica, que consideram as várias dimensões da sustentabilidade, tais como a económica, a social, a ecológica, a cultural e a espacial. Em todos os perfis partidários, o Estado é considerado o ator principal no âmbito da governança ambiental.

Palavras-chave: partidos políticos; partidos ecológicos; ambientalismo partidário; Brasil; Portugal

Abstract

This article comparatively analyzes the origins of ecological parties in Brazil and Portugal. The focus of the study is party profiles, their agendas and positions regarding environmental sustainability. To this end, an analysis is made of the current programs of six Brazilian and Portuguese ecological parties, three from each country. The conclusions show that partisan profiles of systemic orientation predominate, which consider the various dimensions of sustainability, such as economic, social, ecological, cultural and spatial. In all party profiles, the State is considered the main actor in the scope of environmental governance.

Keywords: political parties; ecological parties; party environmentalism; Brazil; Portugal

Introdução

Há vários paralelos entre Brasil e Portugal no que se refere à formação dos movimentos em defesa do ambiente (Barros e Sousa, 2008 Barros, 2013). Um dos mais relevantes diz respeito aos movimentos de orientação conservacionista, que correspondem às primeiras tentativas de afirmação do ambientalismo nos dois países. Trata-se de uma tendência de política ambiental voltada para a conservação dos recursos naturais, como florestas, rios, oceanos, e as espécies que habitam tais ecossistemas. Em Portugal, essa fase é representada pela criação da Liga para a Protecção da Natureza (LPN), criada em 1948. O Brasil teve uma fase análoga, com a criação da Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza (FBCN, criada em 1958), com perfil semelhante à LPN, tanto do ponto de vista ideológico como organizacional.

Outro paralelo relevante identificado na literatura diz respeito à influência de organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e o Clube de Roma (Barros, 2015a). As ações da ONU influenciaram a gestão pública do ambiente no Brasil e em Portugal. A lei brasileira que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (1978) e o Sistema Nacional e do Meio Ambiente (1985) é um exemplo da pressão exógena (Barros e Sousa, 2008). No ano de 1987, o Governo português promulgou a Lei de Bases do Ambiente, considerada um marco na política portuguesa de proteção do ambiente, mas que foi também resultado das pressões externas (Schmidt, 2008).

Com o passar do tempo e a diversificação dos movimentos ambientalistas, cada país seguiu o seu rumo próprio, redefinindo as suas atividades e a sua relação com o Estado. Nessa perspetiva, o movimento ambientalista brasileiro passou a ser classificado como “histórico e multissetorial”. Passou a reunir não só os ecologistas no sentido estrito do termo, mas também outros movimentos sociais preocupados com a insustentabilidade socioambiental, o crescimento populacional, a ocupação desordenada do solo urbano, a geração de tecnologias ecologicamente eficientes, a geração de energias renováveis e o debate sobre hábitos de consumo menos degradantes (Viola, 1987). Em Portugal também houve uma fragmentação da agenda ambiental e a emergência de movimentos preocupados com as questões locais, como a poluição industrial, o ordenamento territorial, o problema das zonas costeiras e o combate aos incêndios florestais e à poluição marinha (Schmidt, 2008). Teixeira (2011) e Silveira, Nina e Teixeira (2019) enfatizam ainda a importância que a agenda verde passou a ter na opinião pública portuguesa.

Diante do exposto, justifica-se o objetivo de analisar comparativamente as origens dos partidos ecológicos no Brasil e em Portugal. O foco do estudo são os perfis partidários, as suas pautas e os seus posicionamentos quanto à sustentabilidade ambiental. Para que a análise seja possível, é fundamental analisar os perfis e as propostas de partidos políticos brasileiros e portugueses de orientação claramente ecológica, ou seja, que carregam a nomenclatura ambiental ou “verde” já no nome do partido e que apresentam as propostas ecológicas como fundamentais nos seus programas, estatutos e manifestos. O propósito é mapear o modo como as ideias ambientais são articuladas nos programas partidários atuais e que aspectos são enfatizados, além das propostas políticas apresentadas, do perfil de governança ambiental defendido e da noção de sustentabilidade que orienta o discurso ambientalista partidário nos dois países. O estudo contribui para aprofundar os paralelos apontados acima, avaliando a configuração atual e contribuindo para uma maior compreensão da formação dos partidos de orientação ecológica nos dois países. Dessa forma, pretende-se contribuir para o aprofundamento do enfoque aqui proposto, apesar das ressalvas mencionadas acima.

A opção pela análise dos programas partidários justifica-se pela conceção de que, apesar das visões que enfatizam a crise da mediação política nas sociedades contemporâneas, representada, em boa parte, pela crise dos próprios partidos, permanecem as conceções de que os partidos ainda conservam algumas características e funções que lhes são peculiares na democracia representativa. Sartori (1999), Urbinati (2013) e Manin (1995) defendem que, apesar de terem perdido força em várias áreas, os partidos continuam a dominar a política parlamentar e as campanhas eleitorais.

Cabe verificar, portanto, como os discursos ecológicos e ambientalistas passaram a ser articulados, atualmente, nos programas partidários, os documentos mais relevantes para a compreensão das ideias e as propostas dos partidos (Lijphart, 1981; Budge et al., 2013; Jorge et al., 2018). Convém salientar que ecologismo e ambientalismo são duas categorias analíticas complexas e com variadas nuances conceituais (Teixeira, 2011). Há uma extensa literatura sobre os dois conceitos (Viola, 1987; Acuña, 1998; Jatobá, Cidade e Vargas, 2009; Martínez-Allier, 2015; Pinto, 2018; entre outros). De forma resumida, o termo “ecologismo” abriga as diversas conceções que se aproximam pela conotação conservacionista da natureza, enquanto o ambientalismo surge posteriormente com propostas conciliadoras entre desenvolvimento económico e sustentabilidade ecológica. Convém salientar que nem sempre tais distinções conceituais ficam claras nos discursos e documentos dos partidos políticos aqui analisados. Ora se destacam conotações ecologistas, ora são postas em relevo dimensões ambientalistas (Viola, 1987; Acuña, 1998; Vargas, 2009; Barros, 2018). Portanto, a distinção aqui feita situa-se mais no plano dos estudos teóricos do que nas posições partidárias propriamente ditas, que podem ser caracterizadas como híbridas, pois incorporam noções de ambas as perspetivas, ou seja, do ecologismo e do ambientalismo. É por essa razão que Teixeira (2011) prefere referir-se a esses partidos como “os verdes”, para expressar a pluralidade de matizes e nuances ideológicas.

A pesquisa empírica consiste no exame dos programas de três partidos ecológicos brasileiros e de três partidos portugueses.1 Trata-se das seis agremiações mais estruturadas em termos ideológicos e organizacionais, além de serem as mais conhecidas perante o eleitorado. As agremiações brasileiras são: Partido Verde (PV), Partido Ecológico Nacional (PEN)2 e Rede Sustentabilidade. No caso de Portugal são as seguintes: Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), Partido da Terra (MPT) e Pessoas-Animais-Natureza (PAN).

O artigo está organizado em três secções. A primeira aborda o modo como a agenda ambiental foi incorporada pelos partidos políticos ao longo das últimas décadas, com destaque para a situação dos dois países em estudo. Trata-se de uma contextualização sobre questões ambientais e política partidária nos dois países. A segunda descreve os procedimentos metodológicos. A terceira consiste na análise dos programas partidários.

Questões ambientais e política partidária: contextualizando o tema no Brasil e em Portugal

Antes de serem incorporadas nos programas partidários, as pautas ecológicas passaram por uma longa e complexa trajetória de variados tipos de militantismo, com influências endógenas e exógenas (Barros, 2018a). Um dos marcos políticos da constituição de uma arena internacional de controvérsias públicas sobre o ambiente foi a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo (1972), com influências tanto no Brasil quanto em Portugal (Barros, 2018; Schmidt, 2008; Teixeira, 2011). Sob o impulso de Estocolmo, alguns governos de países norte-americanos e europeus deram os passos iniciais rumo às primeiras medidas de política ambiental ainda na década de 1970 - por exemplo, Canadá, Holanda, Suécia e Dinamarca, entre outros (Poguntke, 1993; Jahn, 1997). Iniciou-se aí uma longa trajetória de institucionalização da questão ambiental, que potencializou a sua inserção no campo partidário e parlamentar (Almeida e Premebida, 2014; McNeill, 2001; Barros, 2021). Merecem destaque os estudos que apontam a importância dos partidos verdes na Europa a partir da década de 1970 e a sua contribuição para a reconfiguração das dinâmicas eleitorais (Poguntke, 1993; Jahn, 1997; Richardson e Rootes, 2006; Carter, 2013; Burchell, 2014; Van Haute, 2016; O’Neill, 2019).

A partir desse cenário é que surgiram os primeiros “partidos verdes”, com a inclusão formal do debate na arena eleitoral, fenómeno denominado de “politização do ambiente”, fruto da globalização do debate ecológico (Barros, 2021). A primeira iniciativa teve origem na Tasmânia (Austrália), em 1972, decorrente da decisão de um grupo de ecologistas denominado United Tasmanian Group. Posteriormente, o grupo passou a ser denominado Green Party e fundou uma base na Nova Zelândia (Jahn, 1997; Burchell, 2014). Em seguida, expandiu as suas atividades para a Europa, com o apoio de ecologistas da Suécia, Finlândia, Noruega, Suíça, Holanda, Alemanha e França. Atualmente, essa filosofia orienta partidos políticos em mais de 120 países. Em 2010, o Partido Verde tornou-se a quarta maior bancada no Parlamento Europeu (Barros, 2017a; 2018a; O’Neill, 2019). Na composição de 2019 figura também como a quarta maior bancada, com 75 cadeiras das 751.

O Quadro 1 apresenta uma lista dos partidos verdes pioneiros, que surgiram nas décadas de 1970 e 1980, com destaque para países como a Austrália, a Nova Zelândia, o México, o Brasil e países europeus.

Quadro 1 Partidos verdes pioneiros - panorama internacional 

Fonte: Elaboração própria, com base em Pereira (2014) e Barros (2015). * A denominação foi alterada em 1975 para Ecology Party e em 1985 para Green Party.

No contexto europeu, cabe ressaltar a atuação do Partido Socialista (PS) na França, conforme registam Sainteny (1994) e Duverger (2011). A inclusão formal das temáticas ecológicas no programa partidário do PS teve início em 1972. O debate sobre desenvolvimento sustentável proposto pelo PS levou o partido a reforçar a agenda verde no debate político francês e a ressaltar as várias dimensões do discurso ecológico, com ênfase para a articulação entre ecologia política, ecologia social e cultura global. Tudo isso reforçou e ampliou o escopo do debate partidário sobre a agenda verde. Além de surgir como um novo ator partidário emblemático na sua relação com o ambientalismo, o PS estimulou outros partidos a aderirem à agenda verde, especialmente os demais partidos de orientação socialista, reforçando os vínculos históricos e as convergências entre os socialistas e os movimentos sociais ecológicos (Boy, 1992; Roche, 1992; Sainteny, 1994; Duverger, 2011; Barros, 2018a; 2021).

Outras contribuições relevantes registadas na literatura dizem respeito à experiência dos partidos verdes na Bélgica e na Alemanha (Kitschelt, 1989; Poguntke, 1993). Em ambos os casos, os verdes tornaram-se tão relevantes como agentes do debate público sobre as questões ecológicas que levaram os partidos mainstream a darem atenção ao tema. No caso da Alemanha é importante registar a aliança política entre os verdes e o partido social-democrata, especialmente no período do governo de Gerhard Schröder (1998-2005). Essa aliança fortaleceu a inserção da agenda verde na política alemã (Poguntke, 1993; Irazábal, 2017). Pesquisas de Kaelberer (1998) e de Spoon (2009) registam importantes paralelos na formação dos partidos verdes europeus, com destaque para as semelhanças entre os verdes da Alemanha, do Reino Unido e de França.

No Brasil, as primeiras manifestações públicas contra a degradação do meio ambiente, com propostas oriundas tanto do Estado como da sociedade civil, surgem no início da década de 1970, coincidindo com o período de debates inaugurados pela Conferência de Estocolmo (Viola, 1987). Entre as características desta fase do ambientalismo no Brasil estão a denúncia e a conscientização pública sobre os problemas ambientais locais e regionais, destacando-se a defesa de parques ecológicos, da fauna e da flora e o combate à poluição urbana. A partir da segunda metade da década de 1980, o movimento ambientalista começa a adquirir maior complexidade, superando a fase da denúncia e dando ênfase a projetos políticos mais abrangentes, a fim de exercer influência sobre as agências estatais, o poder legislativo, a comunidade científica e o empresariado no âmbito da governança ambiental (Viola, 1987).

“Governança ambiental” é um conceito complexo e multifacetado, que envolve um amplo debate teórico (Gomides e Silva, 2009).3 Aqui esse conceito é entendido como a ação governamental voltada para o controlo do uso dos recursos naturais (Câmara, 2013), o que implica considerar aspetos como o planeamento ambiental, o conjunto de regras, normas e processos que orientam a ação governamental na esfera de políticas ou as ações ligadas às relações da sociedade com o meio ambiente natural. Em suma, a governança ambiental é composta pelo conjunto de arranjos institucionais, especialmente aqueles que orientam as políticas públicas voltadas para a proteção e recuperação dos recursos naturais, bem como para o desenvolvimento de tecnologias e inovações capazes de amenizar os impactos ambientais, reduzir os riscos e prevenir os desastres e a degradação ambiental (Chaffin et al., 2016; Broto, 2017).

Segundo o modelo de governança ambiental orientado pelo viés liberal, o Estado exerce um papel central como ator das políticas ambientais propostas pelos partidos (Hirst, 2015; Barros, 2021). Essa conceção aproxima-se da ideia de Giddens (2010, p. 96) de “Estado assegurador”, ou seja, significa que “o Estado é responsável por monitorar os objetivos políticos e por procurar certificar-se de que eles se concretizem de forma visível e aceitável”. Trata-se de uma visão similar à desenvolvida por Sachs (2007) no seu conceito de “ecossocioeconomia”, segundo o qual o Estado também exerce um papel central na definição de políticas de desenvolvimento sustentável em áreas estratégicas, como a inovação tecnológica, industrial e energética.

No caso brasileiro, a aproximação entre os movimentos ambientalistas e as instituições estatais foi favorecida pela relação desses movimentos com organizações científicas, “o que levou a uma menor aversão à participação no governo na época da ditadura militar”, devido à credibilidade dos cientistas envolvidos (Abers e Von Bülow, 2011, p. 66). Alonso, Costa e Maciel (2008) mostram que, em vários momentos históricos, figuras expressivas da militância ecológica apoiaram e contribuíram para a criação de órgãos ambientais no âmbito do Estado. Em alguns casos, esses ativistas chegaram a ocupar cargos estratégicos na burocracia ambiental. Os autores demonstram que isso ocorreu durante o governo militar e também após a redemocratização. Entre os exemplos mais notórios estão: José Lutzenberger, no governo de Fernando Collor; Mary Allegretti, na gestão de Fernando Henrique Cardoso; e Marina Silva, Carlos Minc e João Paulo Capobianco, no governo de Lula da Silva (Barros, 2018b).

Do ponto de vista da institucionalização dos movimentos ambientalistas e da consequente incorporação das suas pautas pelos partidos políticos no Brasil, um aspeto relevante registado na literatura diz respeito à atuação dos diretórios estaduais e municipais do Partido Verde (PV), a partir do contexto de redemocratização e da promulgação da Constituição de 1988 (Vieira, 2016). Se a criação do PV, em 1986, foi motivada por fatores externos, a institucionalização e ramificação do partido pelas demais unidades da federação foi um processo diferenciado, com maior articulação com os movimentos ambientalistas locais e regionais, especialmente na região Sudeste (Santos, 2008). Entretanto, a atuação do PV não se limitou a essas regiões, como demonstra Vieira (2016), ao analisar a institucionalização dos movimentos ecológicos e a sua aproximação ao PV na região Nordeste.4

Outro aspeto identificado na literatura sobre a institucionalização dos movimentos ecológicos brasileiros ainda durante o regime autoritário (1964--1985) diz respeito à interlocução direta desses movimentos com instituições do Estado, dispensando a mediação partidária. Esse processo foi facilitado por algumas características específicas dos movimentos ecológicos, como a atuação de cientistas e investigadores e a vinculação com instituições científicas (Alonso, Costa e Maciel, 2008). Por essa razão, os partidos ecológicos brasileiros surgiram somente após a redemocratização, tendo o PV sido o primeiro, em 1986.

Enquanto a aproximação entre os partidos e os movimentos ambientalistas é considerada um fenómeno tardio na maioria dos países latinoamericanos (Scagliola, 2002), no Brasil essa relação remete para a própria origem de alguns partidos, como o Partido Verde (PV), o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) (Hochstetler e Keck, 2007). Além disso, houve uma participação significativa de outras agremiações nesse processo, em função de alianças eleitorais, após a redemocratização. Mesmo não sendo um partido tipicamente ecológico, o PT é apontado na literatura como um partido “com vínculos históricos importantes com o ambientalismo” (Scagliola, 2002, p. 9).

O PSDB também ofereceu contribuições ambientais, protagonizadas por Fábio Feldmann, militante ecológico desde a década de 1970. Além da sua atuação no estado de São Paulo, Feldmann foi eleito deputado federal em 1986, tornando-se o primeiro representante ambientalista no parlamento brasileiro, e foi reeleito por três mandatos consecutivos. Na Assembleia Nacional Constituinte, coordenou o grupo que redigiu o capítulo da Constituição de 1988 sobre o meio ambiente. Juntamente com outros representantes ambientalistas, Feldmann atuou como autor e relator de vários projetos de lei na área ambiental, tais como as leis que instituíram: a Política Nacional de Recursos Hídricos (1997); a Política Nacional de Educação Ambiental (1999); o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), em 2000; a Lei da Mata Atlântica (2006); o Estatuto da Cidade (2001); entre outros (Mittermeier et al., 2005).

Em 2011 foi criado o Partido Ecológico Nacional (PEN), com o propósito de ampliar o debate partidário sobre as questões ambientais, mas com a meta de se diferenciar do Partido Verde (PV). Enquanto o PV defendia o desenvolvimento sustentável associado a outros temas da agenda de esquerda, como direitos de minorias, novos arranjos familiares, inclusão social e maior liberdade individual, o PEN surge ligado à igreja Assembleia de Deus, relacionando a causa ambiental com a conservação dos costumes e dos valores cristãos (Barros, 2018a). De acordo com o então presidente nacional do PEN, Adilson Barroso, o novo partido defende o crescimento sustentável, “mas sem radicalismos”. Nas suas palavras, “somos a favor da produção, da indústria, da geração de empregos, mas sempre respeitando o meio ambiente” (Barroso, 2012).

O PEN mudou a sua denominação, em 2017, para Patriota, após um inquérito eletrónico aos seus filiados. Além disso, redefiniu o seu programa partidário com o propósito de apoiar a candidatura de Jair Bolsonaro à Presidência da República, nas eleições de 2018. Por esse motivo, outros temas foram priorizados, como a segurança pública, a redução da maioridade penal e maior flexibilidade para a posse e porte de armas. Apesar disso, o desenvolvimento sustentável permaneceu como um dos seus focos principais. Conforme o seu novo programa partidário, a sustentabilidade requer “um pacto entre os vivos, os mortos e aqueles que ainda irão nascer” (Patriota, 2018).

O seu objetivo político é apresentado da seguinte forma: “defender a sustentabilidade na economia, saúde, educação, segurança, produção, fauna e flora, através de ação política de seus representantes, resguardando-se a soberania nacional e o regime democrático”. Por outro lado, o texto repudia “a histeria propagada pelo obscurecimento da causa ambiental por ideologias que buscam subverter a ordem estabelecida pelos valores do ocidente, a soberania nacional e do desenvolvimento propagado pela livre iniciativa” (Patriota, 2018).

A Rede Sustentabilidade foi registada oficialmente como partido em 2015. O partido surgiu de um movimento liderado por Marina Silva, desde 2011, com o propósito de renovar as práticas políticas e o sistema partidário brasileiro. A denominação “rede” foi adotada em função dos vários significados que o novo partido escolheu associar à sua imagem: dinamismo, conexão, ligação, relação, diálogo, redes digitais, organização aberta e horizontal (Prates e Pereira, 2015).

A Rede emerge com a estratégia de se associar ao discurso de uma “nova política”, alinhando-se ainda à ideia de sustentabilidade (Barros, 2018a). Dessa forma, a sua principal representante, Marina Silva, aciona duas perspetivas ancoradas em consensos morais contemporâneos: a nova política (necessidade de renovação do campo político) e o desenvolvimento sustentável (imperativo de uma nova ordem económica), conforme Castro (2017). Além disso, Marina Silva recorre a outras estratégias para fortalecer o seu ethos discursivo, como a sua trajetória de militância ambiental, a sua fé religiosa e a sua condição de mulher amazónida. Tudo isso concorre para uma formação partidária híbrida, denominada de “neoliberalismo bricoleur”, ao abraçar a agenda económica do neoliberalismo, representada pela economia verde, mas com uma aura de nova política, reforçada pela metáfora da rede (Castro, 2017).

No caso de Portugal, o estudo de Pereira (2014, p. 185) mostra que antes de 25 de Abril de 1974, o ambiente “não tinha grande expressão junto do poder político instituído e do partido único do regime”. Além disso, a agenda ambiental ainda não encontrava ressonância na opinião pública, visto que as preocupações eram outras, como o trabalho, os salários, os direitos civis e o saneamento básico. Assim, o debate ambiental era realizado principalmente nos meios científicos (Eloy, 1994). Segundo a análise de Rodrigues (1995, p. 7) a institucionalização tardia do sistema democrático no país também contribuiu para retardar a entrada da agenda ecológica no sistema partidário e político:

Até 1974, as iniciativas que terão, de algum modo, influenciado a emergência dos temas do ambiente em Portugal foram pouco mais do que insignificantes, reduzindo-se a um ou outro protesto tímido e pontual.

A autora destaca a contribuição da publicação Cadernos do Século, de 1970, coordenada por Afonso Cautela,

Uma iniciativa que merece registro pelo alerta que representou em temas públicos e por constituir uma tentativa de alargamento do entendimento da ecologia, ao divulgá-la como ideia progressista e socialmente relevante, ultrapassando a visão conservacionista. [Rodrigues, 1995, p. 8]

Os movimentos sociais ambientalistas são reconhecidos na literatura portuguesa como importantes motivadores e difusores do debate ecológico, antes da sua institucionalização no sistema político e partidário (Schmidt, 2003; Pereira, 2014; Teixeira, 2011). O contexto que permitiu a emergência desses movimentos está relacionado com os movimentos populares de contestação política no período pós-revolucionário do 25 de Abril (Rodrigues, 1995).

As organizações que surgiram nessa época apresentavam grande afinidade com as ideias de esquerda. Isso levou a uma associação da ecologia com uma abordagem de natureza mais social e crítica, como os questionamentos sobre as lógicas económicas do sistema capitalista e as suas consequências em termos de exploração dos recursos naturais (Soromenho-Marques, 2005). Um exemplo emblemático desta fase é o Movimento Ecológico Português (MEP), voltado “para as críticas ao industrialismo e à ideologia da sociedade de consumo” e para “o combate à proliferação incontrolável de poluentes e resíduos industriais” (Rodrigues, 1995, p. 10).

Um segundo momento igualmente relevante, conforme a literatura consultada (Barca e Delicado, 2016; Rodrigues, 1995), foi o movimento pacificista antinuclear, que predominou no período de 1976 a 1983:

Seria em torno da luta antinuclear que o mais forte protesto popular surgiria, após o rearranjo político-militar que teve lugar com o 25 de novembro de 1975. A inversão que a partir daí se verificou introduziu no espírito de muitos dos ativistas e militantes mais empenhados na causa revolucionária, uma pesada sensação de descrença. Mas, ao longo dos anos de 76 e 77, ressurgiu alguma animação em torno da luta contra a central nucelar que, entretanto, o governo projetava instalar na povoação de Ferrel. [Rodrigues, 1995, p. 14]

A terceira fase registada na literatura foi marcada pela organização e pelo pragmatismo dos movimentos ecológicos em Portugal, no período de 1984 a 1990:

Muito embora neste período se tenham ainda feito sentir as preocupações com a luta pelo desarmamento, é, na verdade, com a aproximação da segunda metade de 1980 que começa a definir-se uma viragem do associativismo orientado para o problema ambiental. Apesar de não ser possível estabelecer uma data rigorosa para esta “viragem”, começam a delinear-se atitudes e programas de intervenção da parte das associações que encaram a defesa do ambiente em moldes mais consequentes e pragmáticos, dando lugar a novos protagonismos, entre os quais se destacam os da Quercus, da LPN e do Geota. [Rodrigues, 1995, p. 11]

Todo esse longo processo, combinado com o contexto internacional, a relação de Portugal com a União Europeia e a emergência de um ambientalismo internacional, favoreceu a abertura do sistema político e partidário para as pautas verdes, sob uma gama plural de perspetivas (Barros e Sousa, 2008; Teixeira, 2011). Cabe ressaltar ainda, nesse contexto, a popularização das questões ecológicas, devido, em parte, à atuação dos media, que passaram a interessar-se tanto pelas questões globais quanto pelos problemas locais, como registam os estudos de Luísa Schmidt (1999; 2003; 2008) e Rosa (2006).

No contexto português, de forma similar ao que sucedeu no Brasil, como ressaltam Soromenho-Marques (2005) e Schmidt (2008), a origem conservacionista do ambientalismo lusitano favoreceu a aproximação entre os movimentos ativistas e o Estado. A política ambiental oficial, implantada após 1974, contou com o apoio e assessoria da LPN, a primeira entidade ecológica portuguesa. Um dos exemplos dessa proximidade foi a criação da Subsecretaria de Estado do Ambiente (SEA), em 1974, vinculada à Secretaria de Estado da Habitação e Urbanismo, no âmbito do Ministério do Equipamento Social e do Ambiente. No ano seguinte, foi criado o Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagista, também vinculado à SEA. O Estado português daria um novo impulso às suas políticas ambientais, sob o impulso dos organismos internacionais e das políticas europeias, especialmente após a adesão do país à União Europeia, em 1986 (Soromenho-Marques, 2005).

No âmbito partidário, sob a influência francesa5, o Partido Socialista (PS) foi o primeiro partido português a abraçar a agenda verde, ao incorporar o tema no seu programa, em 1974, com uma perspetiva conservacionista. O texto do partido defendia temas como o equilíbrio biológico, a estabilidade ecológica, a preservação das florestas e dos recursos aquíferos, a valorização da paisagem e a qualidade de vida (Barros e Sousa, 2008).

A década de 1980 foi decisiva para “esverdear” a política portuguesa (Melo e Pimenta, 1993). Em 1982 foi criado o Movimento Ecologista Português - Partido “Os Verdes” (MEP-PV), que posteriormente passou a chamar-se PEV (Teixeira, 2011). Vários fatores contribuíram para essa evolução, a começar pela integração de Portugal na então Comunidade Europeia, que começou a priorizar as questões ambientais. Isso chamou a atenção dos partidos, visto que o tema passou a perpassar nos debates eleitorais em toda a Europa (Schmidt, 2008). O ano de 1986 foi declarado “Ano do Ambiente”, o que intensificou o debate e a inserção de temas da agenda verde na opinião pública (Pereira, 2014, p. 241), devido à ênfase mediática.

Na década de 1990, os principais partidos políticos portugueses “cobriram-se de verde”, com a adoção de retóricas ambientais diversas e plurais ( Teixeira, 2011). Como regista Pereira (2014, p. 276),

os partidos, sem exceção, não podiam deixar de estar na “crista da onda” sob a pena de ficarem desfasados da realidade, atento os fóruns europeus e internacionais, onde pontificava o debate sobre os problemas ambientais que iria conhecer o seu ponto culminante com a Conferência do Rio, em 1992. Depois, porque não podiam ficar ultrapassados em relação aos seus congéneres europeus.

Esse cenário levou o Partido Popular (CDS-PP) a seguir a mesma trilha, em 1993, com a inclusão de um ponto sobre ecologia no seu programa, como explica Pereira (2014). Isso ocorreu em consequência de uma redefinição que resultou de “uma renovação geracional e de uma diferenciação ideológica do CDS”, sob a liderança de Manuel Monteiro (CDS, 2020). Essa renovação incluiu a alteração da denominação do partido, “somando-se a expressão Partido Popular e passando-se a usar a sigla C. D. S./Partido Popular” (CDS, 2020).

O CDS-PP autodefiniu-se, na época, como um partido “naturalmente ecológico”, pois entendia que “vida e natureza são dois valores indissociáveis”. A habitabilidade do planeta “depende da preservação do ambiente e a dignidade da vida depende da sua qualidade”. Por essa razão, o debate sobre ambiente “deve assumir o centro das preocupações políticas e do desenvolvimento”, envolvendo-se “em todas as políticas setoriais” (programa do Partido Popular, 1993, p. 13)6.

Em Portugal, um novo partido ecológico foi criado em 1993, o Movimento o Partido da Terra (MPT). Em 2011 foi criado o partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN). Apesar de algumas convergências entre esses dois partidos, também há especificidades. No primeiro caso (MPT), destaca-se a defesa de princípios como o desenvolvimento sustentável, a qualidade de vida dos cidadãos, a proteção da biodiversidade, a redução da poluição e a conservação das florestas e recursos hídricos. No segundo caso (PAN), o foco é a ênfase na igualdade biológica entre os seres vivos (humanos e não humanos). Cabe ressaltar a visão antropocêntrica do MPT e a perspetiva de ecologia sistémica do PAN, associada aos princípios da ecologia profunda (Silveira, Nina e Teixeira, 2019).

Para o MPT, “proteger a natureza é assegurar condições para a qualidade de vida e a dignidade dos cidadãos portugueses” (Partido da Terra, 2014, p. 1)7. O PAN, por sua vez, reitera a visão biocêntrica e a igualdade biológica no âmbito das políticas ambientais e propõe que os seres humanos, as plantas e os animais devem ser vistos como iguais (Silveira, Nina e Teixeira, 2019).

Essa conceção encontra respaldo nos postulados da chamada “ecologia profunda” (deep ecology), nos termos de Naess (1988), Devall e Sessions (1985), Sessions (1993), Benton (2007), Hoefel (1996), Rocha (2013), entre outros. A ecologia profunda questiona e contesta as visões antropocêntricas, que colocam o ser humano como centro das sociedades e os elementos naturais e demais seres vivos como “recursos” ao serviço dos humanos. O principal ponto em comum nos estudos mencionados é que todos destacam a dimensão da igualdade biocêntrica como requisito para a garantia do equilíbrio ecológico.

Descrição dos procedimentos metodológicos

A premissa que orienta o estudo é a de que a inserção do ambiente nas pautas partidárias deve ser compreendida como um fenómeno social e culturalmente construído. Isso significa dizer que tal fenómeno resulta das relações entre os diferentes sujeitos e atores sociais e políticos, representados por múltiplos polos de interesse, tais como o Estado, a sociedade civil, os movimentos sociais, a comunidade científica e os meios de comunicação (Barros, 2018a).

Importa, portanto, a partir do estudo exploratório aqui proposto, tentar identificar implicações desse processo na relação entre partidos e movimentos sociais ambientalistas, além da influência que tais movimentos exerceram sobre a formação e atuação dos partidos políticos nos dois países. Dessa forma, o propósito é suprir uma lacuna identificada na literatura anteriormente citada, que constata a existência de paralelos e convergências na formação dos movimentos sociais ambientalistas nos dois países, ao realizar a comparação no âmbito dos partidos ecológicos. Talvez a partir deste empreendimento inicial seja possível definir parâmetros para a comparação entre outros países lusófonos.

Quanto à opção por um estudo exploratório de natureza comparada, destacamos que, neste tipo de pesquisa, o propósito é “descobrir regularidades, perceber deslocamentos e transformações, construir modelos e tipologias”, além de identificar “continuidades e descontinuidades, semelhanças e diferenças, explicitando as determinações mais gerais que regem os fenômenos sociais” (Schneider e Schimitt, 1998, p. 49). Assim, podem ser úteis tanto a comparação de casos convergentes como de casos divergentes, a fim de ampliar o escopo exploratório das pesquisas comparativas (Lijphart, 1975). Nos casos em estudo, exploramos, assim, tanto as convergências como as divergências identificadas nos seis partidos examinados.

Nessa perspetiva, é também útil a noção de “famílias partidárias” (Carter, 2013; Elff, 2013; Ennser, 2010; Janda, 1982; Mair e Mudde, 1998), entendidas como um grupo de partidos com certas semelhanças ou afinidades em relação a determinadas ideologias ou temáticas, como, por exemplo, a do ambientalismo, tema aqui em foco. Para Mair e Mudde (1999, p. 212), “a categorização dos partidos de acordo com as famílias mais amplas a que pertencem tornou-se um procedimento comum na pesquisa comparativa sobre partidos políticos e sistemas partidários”. Dessa forma, partidos de países diferentes podem compartilhar traços programáticos semelhantes, como é o caso dos partidos ecológicos brasileiros e portugueses.

Apesar disso, concordamos com a crítica e as ponderações de Guarnieri (2019) acerca da noção de famílias partidárias. Para o autor, existem nuances e complexidades que não são suficientemente cobertas pelo referido conceito, levando a uma possível perceção de “congelamento” e “estabilidade” dos partidos quando estes são agrupados em famílias partidárias. Como ressalta o autor, os partidos são dinâmicos; logo, não cabem em clivagens e classificações estanques. Portanto, o uso deste conceito não resulta necessariamente em enquadramentos simplistas e/ou homogéneos dos partidos analisados.

O estudo utiliza-se da análise documental, tendo como base o texto integral dos programas dos seis partidos selecionados para a investigação. Os documentos foram submetidos à técnica de análise de conteúdo (AC), mais especificamente a de análise categorial, que consiste em formular categorias de análise com base nos temas predominantes nos documentos (Bardin, 2009).8 Para tanto, procedemos à identificação dos temas principais nos textos e documentos escritos, seguindo as diretrizes mais amplas da análise de conteúdo (Klüber, 2014).

A análise dos documentos partidários foi realizada em duas etapas, a partir de um conjunto de procedimentos de análise categorial descritos por Budge et al. (2013), Jorge et al. (2018) e Barros (2014).9 Os procedimentos aplicados por esses autores e aqui utilizados, em consonância com as orientações de Bardin (2009), consistem em duas etapas. A primeira considera sentenças literais inteiras, com o intuito de apreender o sentido do texto em termos mais amplos. Consiste, portanto, numa análise semântica por similaridade, a partir de sinónimos e/ou sentenças com sentidos semelhantes, embora escritos com palavras diferentes. Trata-se de uma estratégia de leitura e interpretação do texto no seu conjunto, e não apenas de termos isolados. A segunda etapa compreende: a classificação dos perfis partidários em relação às vertentes ambientalistas; as perspetivas ecológicas contempladas pelos programas partidários, os eixos temáticos, as propostas de políticas ambientais e o papel do Estado em relação às formas de governança ambiental propostas pelos seus partidos.10

Partindo desses pressupostos, foram definidos os perfis partidários, as suas características e as suas perspetivas ecológicas. Com base na leitura dos documentos, os perfis11 foram classificados em:

1)Ambientalistas radicais - Partidos que criticam o uso da natureza como fonte de recursos económicos e consideram a preservação inconciliável com a economia de mercado. Predominam as perspetivas de ecologia política, ecopolítica e ecossocialismo. Trata-se da vertente mais radical do ambientalismo, de orientação marxista, cuja tónica está na crítica ao sistema capitalista e na defesa de um sistema económico capaz de combater as desigualdades socioeconómicas e promover a justiça social e a justiça socioambiental (Little, 2006; Porto, 2007; Martínez-Alier, 2009; Loureiro, 2014).

2)Ambientalistas sistémicos - Partidos que defendem o desenvolvimento sustentável de forma integrada com outras dimensões da sustentabilidade: cultural, política, social, espacial e ética. Enquadram-se na perspetiva da ecologia sistémica, a visão que defende novos modelos de desenvolvimento em consonância com a cidadania ecológica, o combate à pobreza, o respeito aos direitos humanos e a participação democrática nos processos decisórios relacionados com as políticas ambientais (Barros, 2017a; 2018a).

3)Ambientalistas liberais - Partidos que defendem a conciliação entre desenvolvimento económico e exploração dos recursos naturais, com ênfase na sustentabilidade económica, por meio da economia verde. A sua principal ênfase está no desenvolvimento económico alinhado aos princípios do liberalismo verde, que orientam a economia verde e o mercado verde (Neto, 2006; Barros, 2017b; 2018b).

4)Ambientalistas ecocêntricos - Partidos que tratam os seres humanos, animais, plantas e demais elementos naturais como sendo todos igualmente relevantes, questionando a primazia da perspetiva biocêntrica. A igualdade biocêntrica é um dos princípios da ecologia profunda, colocando os humanos e não-humanos no mesmo plano, ou seja, sem hierarquia entre seres humanos, plantas e animais (Naess, 1988; Devall e Sessions, 1985; Benton, 2007).

Para a análise das diversas dimensões da sustentabilidade, recorremos às contribuições de Ignacy Sachs (1993; 2007):

1)Sustentabilidade económica - É focada na eficiência da alocação e gestão de recursos extraídos da natureza, além de racionalidade nos investimentos.

2)Sustentabilidade social - Prioriza políticas de desenvolvimento humano para promover a justiça social e reduzir as desigualdades. Tem como perspetiva a própria noção de continuidade da vida em sociedade.

3)Sustentabilidade ecológica - Tem como pilar a preservação das fontes de recursos energéticos e naturais, a fim de garantir o equilíbrio da biodiversidade.

4)Sustentabilidade espacial/geográfica - Refere-se às políticas para a ocupação do solo, com uma espacialização mais equilibrada.

5)Sustentabilidade cultural - Consiste no respeito pelas tradições, comunidades nativas e património cultural, a fim de possibilitar harmonia e continuidade em relação aos padrões culturais vigentes.12

A cada perfil partidário correspondem perspetivas ecológicas específicas. Os ambientalistas radicais estão mais alinhados com a ecologia política, ou seja, a tónica é a crítica ao capitalismo e à transformação dos recursos naturais em mercadoria (Porto, 2007; Martínez-Alier, 2009; Loureiro, 2014). Os ambientalistas sistémicos defendem o desenvolvimento sustentável e a economia verde, mas tratam as pautas ecológicas de forma abrangente, integrando-as nas várias dimensões da sustentabilidade, na defesa dos direitos humanos, na inclusão social, no combate à pobreza e às desigualdades sociais e na promoção da democracia participativa no que se refere às decisões no campo das políticas ambientais (Barros, 2017b; 2018a). Os ambientalistas liberais colocam o foco no desenvolvimento económico e na livre iniciativa, a fim de promover o mercado verde (Neto, 2006). O ambientalismo ecocêntrico tem como base uma perspetiva de igualdade ecológica, que coloca todos os seres vivos no mesmo plano, sem considerar os seres humanos como centro do sistema vital. O princípio da igualdade biocêntrica é visto como requisito para a garantia do equilíbrio ecológico em todas as escalas (Naess, 1988; Devall e Sessions, 1985; Benton, 2007).

Passamos agora à análise dos programas partidários, os quais foram agrupados em pares, ressaltando as semelhanças, diferenças e especificidades. Os perfis partidários acima mencionados são aqui utilizados em razão do respaldo já existente na literatura, conforme se observa nas citações supracitadas. O mesmo se aplica às dimensões de sustentabilidade, uma vez que existem correlações já registadas em outros estudos sobre os referidos perfis partidários e as dimensões de sustentabilidade, a partir das contribuições teóricas de Sachs (1993; 2007). Os programas analisados são aqueles cujos documentos constavam, na íntegra, no portal das agremiações na época da pesquisa, o que indica que não houve alteração recente. Os programas dos partidos brasileiros e seus respetivos anos são: PV (2005), PEN (2014) e Rede Sustentabilidade (2018). Os partidos portugueses são: PEV (2009), MPT (2015) e PAN (2018).

Partidos verdes: Brasil e Portugal - análise dos programas partidários

Apesar das raízes culturais comuns, Portugal e Brasil apresentam sistemas políticos distintos. Os dois países apresentam diversidade e assimetrias em termos de organização política e de institucionalização do regime democrático. As assimetrias também existem em termos económicos, demográficos e sociais. No Brasil, além do bicameralismo, “vigora um sistema de governo presidencialista e um sistema eleitoral proporcional de lista aberta, responsável pela geração de um dos sistemas partidários mais fragmentados do mundo” (Braga, Rocha e Carlomagno, 2017, p. 333).

O sistema português, por sua vez, é unicameral, caracterizado por um governo semipresidencialista, um sistema partidário de pluralismo moderado, que adota o sistema de lista fechada e tem um elevado índice de voto partidarizado (Leston‐Bandeira, 2004).

No Brasil há 33 partidos registados na Justiça Eleitoral13, configurando um sistema partidário altamente fragmentado. Em Portugal há 21 partidos, formando um sistema mais estável14. O grande número de agremiações partidárias no Brasil pode ter contribuído para a emergência do fenómeno dos partidos ambientalistas acidentais ou oportunistas (Barros, 2018b, p. 134). Esse fenómeno é explicado pelo autor devido à elevada concorrência partidária, o que levou alguns partidos a “abraçar as causas verdes, mesmo que não seja uma prioridade do partido”. Trata-se, portanto, de estratégia “para aumentar a visibilidade na arena eleitoral, talvez por um imperativo político contextual e pela própria concorrência partidária”. Em Portugal, os partidos de orientação ecológica mantiveram-se mais fiéis ao ideário de justiça social, democracia inclusiva e combate às desigualdades sociais (Vaz, 2016; Guimarães, 2018).

Análise dos programas dos partidos ecológicos brasileiros e portugueses

Passamos agora à análise de conteúdo dos programas partidários, os quais foram agrupados em pares, com um partido de cada país. Para tanto, considerámos os que apresentam maior afinidade programática. Como veremos, o PV apresenta similaridades e convergências com o PEV, enquanto o programa da Rede se aproxima mais do MPT. Os outros dois partidos (PEN x PAN) são divergentes entre si, o que nos levou a explorar as diferenças programáticas. Convém salientar aqui as premissas já expostas no ponto sobre a descrição dos procedimentos metodológicos: conforme Lijphart (1975), Schneider e Schimitt (1998), em estudos comparados tanto são viáveis os paralelos e convergências como os aspetos divergentes, pois isso contribui para ampliar o escopo exploratório das análises. Assim, nos casos em estudo, exploramos tanto as convergências como as divergências identificadas nos seis partidos examinados.

Programa do PV vs. Programa do PEV

Em termos de afinidade programática, o PV e o PEV assemelham-se tanto pela origem, como já foi abordado anteriormente, quanto pelo perfil partidário. Os programas dos dois partidos podem ser classificados como ecologistas sistémicos, com nuances de ambientalismo radical. Coincidentemente, a identificação dos dois partidos com a ecologia política aparece logo na abertura do programa de cada um.

Em ambos os casos, a ecologia política é relacionada com as ações em prol da paz, da justiça e dos direitos humanos:

O PV é um instrumento da ecologia política […] O PV faz parte de uma família política internacional, os verdes, que cresce em todo o mundo, desde o final dos anos 70. Relaciona‐se com os partidos e movimentos verdes de outros países com base na autonomia, fraternidade e solidariedade. Propõe‐se a desenvolver uma estratégia conjunta e uma ação coordenada em favor do desarmamento, da desnuclearização, do ecodesenvolvimento, da solução negociada dos conflitos e do respeito às liberdades democráticas, justiça social e direitos humanos em todos os países. [Programa do Partido Verde, p. 1]

A ecologia política, na visão do PEV, pressupõe “a defesa da Vida, da Paz, da Natureza e do Ambiente”. O respeito pela Natureza e a salvaguarda das componentes naturais “assume-se, pois, como um dos princípios básicos orientadores da concepção e ação política ecológica” (programa partidário do PEV).

Os trechos sublinhados são essenciais para a compreensão da identidade partidária do PV, como o seu vínculo fundador com a ecologia política e a relação e influência de movimentos ambientalistas internacionais. Chama a atenção, ainda, o compromisso assumido com uma agenda internacionalmente compartilhada, como as questões do desarmamento, do combate às armas nucleares, da defesa de projetos de ecodesenvolvimento e do compromisso com as liberdades democráticas, da justiça social e dos direitos humanos (Loureiro, 2014; Porto, 2007; Barros 2017b).

No programa do PEV, a conceção política de ecologia apresenta uma visão “portadora de uma nova forma de pensar o mundo e a organização das sociedades”. Isso porque, segundo o documento, a ecologia política “toma a espécie humana como uma componente da Natureza, tal como outras espécies, constatando a sua dependência em relação a elementos naturais imprescindíveis à sua sobrevivência - como o ar, a água, o solo, a fauna e a flora”.

A dimensão de ambientalismo radical é expressa no texto do programa das duas agremiações, na forma de críticas ao sistema capitalista. O PV considera que o sistema económico global tem causado cada vez mais o aprofundamento das desigualdades sociais, o aumento da exclusão, do desemprego e das injustiças sociais, além dos problemas decorrentes da crise climática. Conforme o programa do PEV, o sistema económico capitalista tem sido um dos agentes causadores da atual crise ecológica, com “provas de que não servem nem para garantir a preservação da Natureza, nem para promover em concreto o bem-estar da espécie humana”.

As críticas do PEV ao sistema capitalista fazem parte do repertório dos movimentos ambientalistas e dos partidos ecológicos adeptos do ambientalismo radical, conforme foi referido na primeira parte do texto (Loureiro, 2014; Porto, 2007). Essa estratégia discursiva justifica-se, certamente, pelo propósito do PEV de causar repercussão entre tais movimentos e de se projetar para o público eleitoral que compartilha essa visão política.

Conforme o programa do PEV, como consequência desse modelo económico,

produzem[-se] resíduos de forma insustentada, lançando-os para o meio ambiente sem controlo, assim se contaminam os recursos hídricos, se esgotam os solos, se polui a atmosfera, se esgotam fontes de energia, se devastam florestas, se elimina a biodiversidade comprometendo-se uma série de ecossistemas. [Programa do PEV, p. 23]

Aqui, o PEV acentua a importância dos resíduos para as políticas ambientais e para os projetos políticos de sustentabilidade. Com razão, o texto chama a atenção para a relevância e a diversidade de resíduos produzidos atualmente, tais como os resíduos industriais, hospitalares, comerciais e residenciais. As adequadas políticas para cuidar de forma correta dos resíduos são apontadas por especialistas como uma das medidas indispensáveis para a qualidade ambiental, especialmente nas metrópoles e megalópoles (Jacobi e Besen, 2011).

O PV aponta o modelo energético como um dos eixos dos problemas causados pelo atual sistema económico. Segundo o texto, as energias poluentes devem ser suplantadas por um modelo energético sustentável, baseado prioritariamente em energias renováveis, tecnologias limpas e redução de desperdícios. Além disso, o programa do PV defende novos modelos e padrões de produção agrícola e industrial, a fim de permitir a qualidade de vida das populações tradicionais e o desenvolvimento sustentável (programa do Partido Verde).

Os dois partidos refutam as propostas de sustentabilidade orientadas pelos princípios do ambientalismo liberal abraçado pelo chamado “capitalismo verde” (Barros, 2018b). A justificação é que essas propostas, embora necessárias e relevantes, não são suficientes, pois são medidas paliativas.

Destaca-se ainda a divergência entre os dois partidos no que se refere ao espectro ideológico. O PV rejeita a dicotomia entre “esquerda” ou “direita”. Segundo o texto do PV, o partido “não se aprisiona na estreita polarização esquerda versus direita”. Por essa razão, o PV “situa‐se à frente”, aberto ao diálogo “com todas as demais forças políticas com o objetivo de levar à prática as propostas e programas verdes”. O PV “identifica‐se com o ideário de esquerda no compromisso com as aspirações da grande maioria trabalhadora da população e na solidariedade com todos os setores excluídos, oprimidos e discriminados” (programa do PV). Entretanto, o partido “não segue os cânones da esquerda tradicional, da mesma forma com que questiona a hegemonia neoliberal, duas vertentes do paradigma produtivista do século XIX” (programa do PV).

O PEV, por sua vez, assume a sua posição de esquerda: “Nós, Verdes, estamos bem sólidos, convictos e determinados no reforço do nosso projecto de esquerda e na defesa nos nossos valores de esquerda” (Os Verdes, 2009, p. 1).15

Voltando ao programa do PV, o documento destaca uma “estreita relação entre a questão ambiental e a questão social” e considera essa perspetiva “a base da proposta verde para uma vida melhor”. Segundo o texto, os problemas, tanto sociais como ambientais, “devem ser tratados numa perspectiva integrada e sistêmica para realmente terem efeito sobre a qualidade de vida da população”. Por essa razão, “a simples preocupação conservacionista da natureza”, desprovida de “uma sensibilidade social aliada à incapacidade de apontar modelos de desenvolvimento sustentável só pode agravar a miséria e abrir caminho a uma devastação ambiental ainda maior no futuro” (programa do PV).

Essa preocupação abrangente reforça a perspetiva de ecologia sistémica adotada pelo PV, o que implica valorizar e relacionar as múltiplas dimensões da sustentabilidade, conforme já foi abordado anteriormente.

Entre outros temas priorizados pelo PV estão: políticas para o setor de recursos hídricos; tratamento adequado do lixo urbano e demais resíduos sólidos; investimentos em projetos e inovação de tecnologias limpas e energias renováveis; proteção dos principais biomas nacionais, como a Amazónia e o Cerrado; e preservação dos rios, matas e florestas. O PV apresenta ainda propostas setorizadas por áreas como: energia renovável, economia verde, poder local, Agenda 21, qualidade de vida, saúde, reforma agrária, combate à fome e à pobreza (programa do PV).

A implementação de um modelo de sociedade sustentável, segundo o PEV, requer “uma organização inovadora do Estado democrático e descentralizado, a fim de se avançar progressivamente para um novo modelo de sociedade” (programa do PEV). O PEV considera que o Estado “tem um papel fundamental a desempenhar na garantia de um desenvolvimento económico sustentável”:

Defendemos que o Estado deve ser o fiel garante da biodiversidade e que deve ter uma intervenção activa na gestão dos recursos naturais e do património natural impedindo a sua delapidação e a sua utilização em prol dum grupo restrito e sem atender ao futuro. [programa do PEV, p. 29].

Em resumo, os programas do PV e do PEV apresentam uma visão ampla e sistémica da sustentabilidade, numa conceção normativa de que a ecologia política deve ter como consequência a dignificação da vida e a humanização da sociedade. Essa perspetiva inclui o debate sobre justiça ambiental e justiça social, especialmente no que se refere à redução das desigualdades socioeconómicas.

Programa da REDE vs. Programa do MPT

A Rede também se autodenomina um partido diferenciado, por isso recusa um enquadramento ideológico preestabelecido. Assim, apresenta-se como “um partido não-partido”, em que “a busca pela sustentabilidade é mais relevante do que as lutas partidárias” (programa da Rede Sustentabilidade). O MPT, por sua vez, define-se como “um partido ecologista, humanista e liberal”, situado no centro do espectro político português, “assumindo-se como um novo centro, uma alternativa credível na política portuguesa” (programa do MPT, p. 6). O MPT descreve-se como ecologista porque defende “o desenvolvimento sustentável, a biodiversidade e o equilíbrio dos ecossistemas”, humanista porque defende “que o ser humano seja a medida de todas as decisões políticas” e liberal porque “a liberdade de cada indivíduo se exprime de forma determinante na sua emancipação económica”, e essa liberdade “é geradora de benefícios para a sociedade” (programa do MPT, p. 6).

Ao contrário daqueles partidos ecológicos que se autodenominam “não-partidos”, “anti-partidos”, “partidos-movimentos” ou que se definem como partidos que criticam o sistema político, o MPT assume-se claramente como partido, sem vergonha da sua identidade política e ideológica, situando-se como um partido de centro, embora denominado “novo centro”. A novidade, portanto, está na sua identidade novocentrista, numa tentativa de situar a sua disputa política de forma nítida no espectro ideológico dos partidos de centro portugueses (programa do MPT, p. 8).

O MPT define-se ainda como “um partido de causas” e não um “partido político” no sentido convencional. A sua retórica de autodenominação não nega a sua identidade de partido político, porém apresenta-se com um diferencial: autointitular-se “um partido de causas” é uma manobra discursiva que deixa implícita a ideia de que os demais não se comprometem efetivamente com as causas, muito menos com a causa ecológica (programa do MPT, p. 9).

Segundo o texto, o Partido da Terra “procura combater a política profissional deslegitimando-a e promover ações destinadas a recuperar o poder vizinhal e comuneiro em todos os âmbitos da vida comunitária” (programa do MPT, p. 7). Com isso, o propósito é romper com a imagem estigmatizada dos partidos que atuam de forma distante da sociedade. Essa noção de distância é muito explorada nas retóricas políticas voltadas para as críticas ao sistema político no seu conjunto e aos partidos em particular (Barros, 2018b).

A ênfase na relação vizinhal e comunitária tem como propósito construir a imagem de uma agremiação mais voltada para a inserção na sociedade do que preocupada com as estruturas institucionais do sistema político convencional, como os demais partidos. Isso leva à inferência de que o seu propósito é construir a imagem de um partido próximo das pessoas, da vida quotidiana e concreta da população portuguesa (Loureiro, 2014; Vaz, 2016).

A Rede articula a sua proposta de sustentabilidade de forma sistémica e abrangente, com os seguintes temas: 1) democracia de alta intensidade; 2) economia de baixo carbono; 3) educação, cultura e inovação; 4) políticas sociais e qualidade de vida; 5) novo urbanismo.

O programa do MPT, por sua vez, ressalta a articulação entre ecologia, humanismo e liberalismo:

O MPT acredita que o Homem deve ser o centro e a medida de todas as decisões políticas. O Partido da Terra defende o primado do princípio da igualdade perante a lei, segundo o qual todos os indivíduos são iguais, independentemente das suas origens étnicas, convicções políticas, religiões, credos, género ou orientação sexual. O MPT entende que a liberdade de cada indivíduo se exprime de forma determinante na sua emancipação económica e que essa liberdade é geradora de benefícios para a Sociedade. [Programa do MPT, p. 5]

Além de professar uma visão antropocêntrica, que entende a Natureza como um conjunto de recursos ao serviço da Humanidade, o MPT adere claramente ao ambientalismo liberal (Barros, 2018a), como se percebe na passagem marcada a negrito. O princípio da liberdade individual, embora associado ao humanismo, é acentuado na sua perspetiva económica; logo, o liberalismo também se estende às conceções ecológicas do MPT.

Na tríade de ecologia, humanismo e liberalismo, o MPT defende “o papel do Estado como regulador, dinamizador e supervisor, capaz de administrar e de controlar de forma eficiente os recursos públicos” (programa do MPT, p. 7). A noção de “estado assegurador” coaduna-se com os princípios liberais e neoliberais que atribuem ao Estado um papel de fiador do mercado e do sistema económico em sentido amplo (Barros, 2018b).

O programa da Rede chama a atenção para os problemas decorrentes das mudanças climáticas, adotando uma perspetiva sistémica, típica da identidade política da Rede: “é preciso dar ênfase à questão climática como um eixo no qual se encontram as várias dimensões da sustentabilidade” (Rede Sustentabilidade, 2016, p. 6.). As relações económicas “devem estar baseadas em valores humanos e promover bem-estar em a toda sociedade, gerar conhecimentos, oportunidades de trabalho e riqueza, o que não se manifesta apenas através de parâmetros monetários e administrativos” (Rede Sustentabilidade, 2016, p. 7). Aqui, observa-se a afinidade da proposta da Rede com as abordagens de socioeconomia de Ignacy Sachs (2007), conforme já foi mencionado anteriormente.

O programa do MPT destaca ainda três pilares: saúde ambiental, vitalidade dos ecossistemas e energias renováveis. O primeiro inclui a qualidade da água, do ar e do saneamento básico; o segundo compreende medidas para a conservação da biodiversidade e dos ecossistemas; o terceiro inclui programas para estimular a inovação tecnológica, a exploração de fontes renováveis de energia e o combate ao uso de energias nucleares no território português (programa do MPT, p. 5).

Os três pilares são articulados por uma ampla noção de sustentabilidade, que transcende a dimensão ambiental em si. Para o MPT, a sustentabilidade inclui a perspetiva ecológica per se, mas também a saúde ambiental, a justiça social, a democracia participativa e a cidadania ativa, como valores para a construção de uma cultura de solidariedade intergeracional, de uma ética humanista e de uma cultura de valorização da lusofonia.

Segundo o texto, “mais do que desenvolvimento sustentável, o objetivo máximo é o relacionamento sustentável, ou seja, o equilíbrio entre Homem/Natureza”. Por essa razão,

O MPT defende o desenvolvimento sustentável, a preservação da biodiversidade e o equilíbrio dos ecossistemas, sustentáculo do bem-estar humano e do equilíbrio do planeta. Defende a urgência de uma política de reordenamento do território que combata eficazmente a desertificação. Acredita que a justiça intergeracional é um critério determinante da acção governativa, tanto ao nível da sustentabilidade ambiental como ao nível das responsabilidades sociais. [Programa do MPT, p. 9]

Mais uma vez, como se percebe nos trechos a negrito, as associações semânticas construídas pelo texto que serve de base para o programa do MPT reiteram a sua visão abrangente de sustentabilidade. Vários aspetos são acionados de forma relacional, como o bem-estar humano e o equilíbrio do planeta Terra, as formas de ocupação do solo e as medidas para evitar a emergência de áreas desertificadas, a responsabilidade socioambiental no presente e a justiça socioambiental em perspetiva intergeracional (programa do MPT, p. 8).

Em suma, o conjunto de propostas da Rede e do MPT reforça a identidade das duas agremiações, sendo o primeiro definido como ambientalista liberal e o segundo como ecologista sistémico (videQuadro 2).

Programa do PEN versus programa do PAN

Os programas do PEN e do PAN são muito divergentes entre si. Enquanto o primeiro adere ao ambientalismo liberal, o segundo enquadra-se nas visões de ecologia profunda. O programa do PEN é similar a um manifesto, embora seja denominado de “Proposta Ecológica”16, segundo a qual,

O PEN nasce para cumprir uma missão. Para preencher um espaço vazio no cenário político brasileiro. Embora a viés ambiental, felizmente, venha aos poucos encontrando espaço no programa político-partidário de algumas agremiações, denota-se que no mais das vezes o que se percebe são iniciativas isoladas, ações pontuais e nenhum processo de continuidade. Mesmo naquelas criadas para tutelar o meio ambiente o ideal cedeu aos interesses políticos, enfraquecendo as bases e empobrecendo o louvável ideal que um dia marcaram suas lutas. [Programa partidário do PEN; negritos acrescentados]

É forçoso observar que o PEN apresenta a sua “missão” como resultado de um diagnóstico negativo sobre a relação entre o campo político e o campo ambiental, especialmente no que se refere ao sistema partidário, conforme está expresso no trecho acima transcrito. Como se percebe nas expressões a negrito, o PEN apresenta-se com uma missão, que se justifica pelo “abandono” dos ideais ecológicos dos demais partidos, que “cederam aos interesses políticos” (programa partidário do PEN).

A meta do PEN é “criar um novo modelo de gestão político-ambiental. Um modelo que respeite especialmente os princípios constitucionais e os direitos fundamentais do cidadão brasileiro, tão esquecidos atualmente” (programa partidário do PEN). Ressalta-se ainda a distinção que o programa do partido faz entre ecologia e política, mesmo tratando-se de um programa partidário.

O PEN organiza as suas propostas em três setores: no campo legal, com a revisão e atualização da legislação nacional; na economia, com a adoção de uma política nacional de economia verde; e no campo do planeamento ambiental de longo prazo, para implementar uma cultura efetiva de sustentabilidade ambiental a nível nacional.

Paradoxalmente, essas propostas contrariam a sua retórica de “mais ecológico e menos partido”. Como é possível deduzir, as propostas acima mencionadas voltam-se todas para o âmbito sistémico, endógeno ao campo político, sem nenhuma proposta afinada com a atuação dos movimentos sociais ambientalistas.

De acordo com a proposta do PAN, ancorada no paradigma da ecologia profunda, “o respeito pela integridade física e mental de todas as espécies de vida na terra é a base de um relacionamento mais pacífico entre os seres humanos e destes com os animais e com a natureza em geral” (manifesto do PAN, p. 2). Conforme o programa do PAN,

o paradigma da civilização hoje globalizada baseia-se no mito da separação entre o eu e o outro, o ser humano, os demais seres vivos e a natureza como um todo. Este paradigma é desmentido pela sabedoria tradicional das culturas planetárias e pela ciência contemporânea, que nos mostram a interconexão de todos os seres vivos no grande ecossistema planetário. [Pessoas-Animais-Natureza, 2018]17

O foco da passagem acima citada está nas críticas formuladas pelo paradigma da ecologia profunda. Segundo essa perspetiva, o relacionamento entre humanos e natureza tem sido fruto de uma relação desigual e inadequada, decorrente do seu caráter utilitário. Devido a séculos de uso instrumental e predatório dos recursos naturais em benefício da Humanidade, a natureza passou a sofrer desequilíbrios. De acordo com o texto, a visão dominante de ecologia liberal e utilitária nem sempre trata de forma adequada a proteção animal:

Os Animais ainda são considerados como objectos subalternos (“coisas”) que podem ser utilizados para os interesses humanos. A exploração dos animais […] acaba a maioria das vezes com a morte deles. [Manifesto do PAN, p. 2]

Por essas razões, “em relação a todas as formas de lidar com o uso de animais, deverá ser cuidadosamente estudado o interesse humano e as consequências para o animal”. Isto significa que

O uso de animais para interesses não vitais dos seres humanos pode nessa aproximação ser recalcado e banido. Isto evidentemente é válido também, entre outros exemplos, para a produção da pele, circo, tourada, pesca desportiva e outras formas bruscas de diversão utilizando animais. [Manifesto do PAN, p. 3]

Nessa perspetiva relacional parasitária e predatória da parte dos humanos, o PAN admite que o uso de espécies animais deve ocorrer apenas para garantir a sobrevivência humana, ou seja, somente na alimentação. Os demais usos são criticados, especialmente aqueles que se destinam a fins recreativos. Dessa forma, o PAN defende que os animais sejam respeitados no seu estado natural e vivam livremente no seu habitat, sem a importunação humana. Assim, o PAN alinha-se aos vários movimentos de defesa da vida animal (Silveira, Nina e Teixeira, 2019).

Das justificações referidas no texto, um dos argumentos acionados contra uma cultura de proteção animal relaciona-se com as tradições culturais, que sedimentaram uma mentalidade de uso instrumental e utilitário dos animais. Entretanto, o PAN argumenta que “as tradições não são de fato fantasmas inalteráveis, mas podem e devem adaptar-se à mudança dos tempos e a um novo conceito e normas morais humanas, pois no passado fez-se o mesmo” (manifesto do PAN, p. 3). Ainda conforme o texto, “um trato cuidadoso e amoroso com a natureza e os animais significa na verdade que os seres humanos demonstram respeito pelo corpo e uma mentalidade íntegra” (manifesto do PAN, p. 2).

Em nome da renovação da mentalidade social, o PAN “apoia todas as iniciativas que visem melhorar as condições de vida dos seres humanos, em harmonia com a natureza e as restantes espécies” (manifesto do PAN, p. 4). O PAN deixa implícita a ideia de que uma eventual mudança no relacionamento dos humanos com os animais está dependente de sistemas de educação que priorizem esse debate, de forma a promover e ampliar a sensibilidade dos humanos em prol do respeito pela vida animal.

Além disso, complementa o texto, o PAN “apoiará e promoverá particularmente ações que visem aumentar a consciência e sensibilidade humanas a respeito do facto evidente de que todos os seres sensíveis desejam igualmente a felicidade e o bem-estar e não desejam sofrer” (manifesto do PAN, p. 5). Por esta via, o PAN “assume estar ao serviço do desenvolvimento do próprio ser humano, na prática de um novo paradigma mental, ético e civilizacional que torne a humanidade mais fraterna e solidária do universo em que vive e de todas as formas de vida com que convive” (manifesto do PAN, p. 5).

O lema do PEN de ser “mais ecológico que partido” coaduna-se mais com as propostas do PAN do que com as dos restantes partidos, em função das suas premissas de ecologia profunda e, sobretudo, do seu perfil ecocêntrico. No entanto, ao colocar humanos e não-humanos no mesmo plano (em igualdade biológica), o PAN torna-se mais genuinamente ecológico do que o PEN. Nesse sentido, a comparação é válida pelo facto de ressaltar as diferenças entre os dois partidos, uma das vantagens dos estudos comparados (Lijphart, 1975; Schneider e Schimitt, 1998).

Perfil partidário, propostas ecológicas e dimensões da sustentabilidade

Com base na análise de conteúdo dos documentos mencionados, classificamos os programas em três perfis partidários, cuja divisão tem um cunho mais didático, visto que pode haver combinações e complementações entre elas. A categorização utiliza-se dos critérios definidos por Barros (2017; 2018a; 2018b) para caracterizar os perfis partidários quanto às propostas ambientais, conforme consta nos Quadros 2 e 3 18.

A classificação dos partidos nos referidos perfis e perspetivas ecológicas não é estanque, como se observa no Quadro 3. Há partidos com perfis multifacetados, visto que a classificação analítica permite enquadrar um mesmo partido em várias categorias, dependendo da abrangência dos seus programas partidários.

A maioria dos partidos em exame contempla todas as dimensões da sustentabilidade nos seus respetivos programas, exceto o PEN e o MPT, que enfatizam duas dimensões: a económica e a ecológica, como exposto no Quadro 3. Trata-se de uma característica dos partidos pautados pelo ambientalismo liberal, que tratam as questões ambientais de forma menos abrangente do que os demais. Convém ressaltar ainda que há quatro agremiações que incluem explicitamente a dimensão ética nos seus programas: PV, PEV, PAN e Rede. No caso do PAN, essa dimensão é associada ainda à perspetiva da ecologia profunda.

Quadro 2 Perfil partidário e perspectivas ecológicas 

Fonte: Elaboração própria, com base em Barros (2017; 2018).

Quadro 3 Partidos agrupados por eixos temáticos e formas de sustentabilidade 

Fonte: Elaboração própria. * Ressaltando que a dimensão ética se associa à dimensão económica da sustentabilidade, mediante a adesão a princípios éticos na esfera produtiva e no consumo (Pitelis, 2013).

Quanto ao perfil de governança dos partidos, observa-se a combinação de variados elementos no perfil de cada um, o que nos leva a deduzir que todos eles adotam propostas híbridas de governança ambiental. Isso significa que são combinados, principalmente, aspetos do ambientalismo liberal e do ambientalismo sistémico. Além disso, o PV e o PEV apropriam-se de elementos do ambientalismo radical, enquanto o PAN abraça elementos vinculados à ecologia profunda.

Como exposto no Quadro 4, os seis partidos entendem que o Estado deve desempenhar um papel de agente regulador das políticas ambientais. O diferencial está no programa do MPT, que, além de regulador, usa os termos “dinamizador” e “supervisor”, embora esses termos possam ser incluídos no rol de sinónimos de “regulador”. Além disso, destaca-se o programa do PAN, que inclui o Estado como agente transformador da cultura ecológica, pela via de uma educação ambiental ancorada no paradigma da ecologia profunda e do princípio da igualdade biológica.

Quadro 4 Perfil partidário e propostas de governança ambiental*. 

Fonte: elaboração própria. * As propostas foram extraídas, literalmente, do texto dos programas dos partidos. Ademais, convém registar que o Quadro 4 se limita à apresentação de exemplos das propostas de governança ambiental, e não representa um inventário exaustivo e completo. Tal inventário não caberia no referido quadro.

Considerações finais

Este artigo teve como objetivo analisar o perfil e as propostas de partidos políticos brasileiros e portugueses de orientação claramente ecológica, a partir dos paralelos históricos comuns que conformaram a política ambientalista nos dois países e a emergência dos respetivos partidos ecológicos. O propósito foi parcialmente atingido - o de verificar se os paralelos e convergências já registados na literatura sobre o ambientalismo nos dois países também existem no campo partidário, considerando os partidos de orientação ecológica. Salientamos o aspeto parcial das conclusões, uma vez que o estudo teve como foco analítico apenas os programas partidários, o que nos impede de apresentar formulações mais abrangentes, conforme será detalhado adiante.

Como foi demonstrado na análise bibliográfica, as convergências iniciam-se no plano mais amplo, em termos históricos, com uma raiz comum na formação dos movimentos ecológicos de base conservacionista (Barros e Sousa, 2008; Barros, 2013; Teixeira, 2011). Outro paralelo diz respeito especificamente à formação dos primeiros partidos declaradamente de orientação ecológica: o PV, no Brasil, e o PEV, em Portugal. Ambos foram influenciados pelos movimentos ecológicos internacionais, o conservacionismo e o pacificismo (Rodrigues, 1995; Barros e Sousa, 2008). Isso implica uma conjunção entre ecopolítica, pacifismo e cultura da paz. Além da defesa da conservação dos recursos naturais, são defendidos princípios como “convivência solidária e pacífica entre os povos, os direitos humanos, a tolerância social e política e de repúdio a todas as formas de violência e discriminação” (Barros, 2015b, p. 14).

Além disso, no caso do PEV, é necessário destacar a influência do PCP tanto na sua formação como partido quanto na formulação da sua política eleitoral. As alianças constantes com os comunistas são apontadas como um dos fatores que influenciam diretamente a atuação do PEV (Sanches, 2015; Jalali e Cabral, 2003; Belchior, 2008; Teixeira, 2011; Freire, 2017; Galastri, 2019). Como registam Jalali e Cabral (2003, p. 17), na esfera ambiental, “o partido Os Verdes é essencialmente um satélite do PCP”. Isso deve ainda, segundo os mesmos autores, à relevância crescente do voto verde, especialmente no caso do eleitorado jovem e urbano. O mesmo se aplica ao PV no Brasil, em que se destaca a identificação com o mesmo perfil eleitoral do PEV (Barros, 2017).

Essa aproximação com os ideários dos partidos comunistas, no entanto, não se aplica ao PV brasileiro da mesma forma que no caso português. Enquanto o PEV se alinhou diretamente ao PCP, no contexto nacional, o PV seguiu as orientações ideológicas de partidos verdes estrangeiros, devido à participação de exilados políticos na sua formação, no Brasil, em meados da década de 1980 (Barros, 2018). O PV recusou, na sua origem, o rótulo de partido de esquerda ou “comunista”, alegando que as questões ambientais deveriam ser transversais e permear todos os espectros ideológicos. Apesar disso, o PV sempre defendeu pautas alinhadas à esquerda, tais como a inclusão social, o combate à desigualdade, as políticas de habitação popular e a defesa dos direitos das minorias sociais (Santos, 2008; Silva; 2016).

A análise dos programas partidários também regista algumas similaridades entre o MPT (Portugal) e o PEN (Brasil), especialmente pelo viés do liberalismo ambiental (Neto, 2006). Ambos defendem a economia verde como um mecanismo de renovação do capitalismo e um caminho viável para o desenvolvimento económico de base sustentável. Contudo, as semelhanças limitam--se à adoção de propostas alinhadas com o ambientalismo liberal, uma vez que o PEN se identifica com um espectro ideológico de direita. Enquanto o MPT se caracteriza pela defesa da sustentabilidade ecológica e económica, o PEN tem como foco apenas propostas voltadas para promover a economia verde (Barros, 2018).

Ainda conforme os documentos, o PAN (Portugal) e a Rede Sustentabilidade (Brasil) convergem no plano de uma visão multifacetada de sustentabilidade económica, social, ecológica, ética e cultural. Ambos se alinham com a visão de ecologia profunda, sendo que o PAN se caracteriza pela visão biocêntrica, enquanto as propostas da Rede Sustentabilidade apontam para perspetivas de ecologia política, cidadania ecológica e justiça ambiental (Prates e Pereira, 2015). Os dois partidos defendem uma renovação da política e do sistema de produção económica. A Rede acentua o seu ethos discursivo pautado por uma “nova política”, embora o programa não deixe suficientemente claros quais os sentidos dessa suposta “nova política” (Prates e Pereira, 2015). Uma diferença identificada entre os dois partidos refere-se à noção de ecologia profunda defendida pelo PAN, que coloca no mesmo plano os humanos, a fauna e a flora, enfatizando a sua visão ecocêntrica (Silveira, Nina e Teixeira, 2019). Essa dimensão não foi registada no programa da Rede.

É oportuno ressaltar o papel do Estado relativamente à governança ambiental na conceção dos seis partidos, que se encontra referido nos documentos analisados. Embora as formulações textuais sejam diferenciadas nos respetivos programas, a ideia geral é a mesma: cabe ao Estado a função de implementar as políticas de sustentabilidade, nas suas várias dimensões. Trata-se de uma conceção próxima às ideias de “Estado assegurador” (Giddens, 2010) e de “ecossocioeconomia” (Sachs, 2007). Isso não significa que o Estado seja o único ator das políticas ambientais, mas é um dos pilares, juntamente com os partidos, a sociedade e os movimentos sociais de orientação ambiental (Barros, 2021).

Há que reiterar e retomar aqui o aspeto relativo ao cumprimento parcial dos objetivos, porque reconhecemos que uma investigação com base nos programas partidários apresenta limitações quanto ao aprofundamento analítico dos paralelos mencionados na introdução. Apesar de serem documentos relevantes (Lijphart, 1981; Budge et al., 2013; Jorge et al, 2018), a pesquisa documental resulta circunscrita aos aspetos formais que constam nos referidos documentos. Outros aspetos ficam impedidos de serem tratados com maior densidade analítica, tais como os fatores contextuais, as dinâmicas históricas, as políticas envolvidas na politização e a inserção dos temas ambientais nas arenas partidárias (Pinto, 2018; Barros, 2021).

Assim, não é possível tecer considerações de teor conclusivo sobre algumas questões, como uma problematização mais fundamentada acerca dos variados significados e implicações das convergências apontadas. Ficam, portanto, pistas para estudos futuros, de maior abrangência, que permitam discutir e aprofundar as perspetivas comparadas, aqui apenas esboçadas. Isso poderia contribuir para a análise mais apurada dos significados dessas convergências e paralelos para os partidos analisados e para o debate sobre a politização e partidarização ambiental, além dos sentidos daí depreendidos para a relação entre ambiente e democracia, em termos mais amplos.

As convergências apontadas a partir do exame dos programas partidários foram relacionadas com o fenómeno das chamadas “famílias partidárias” ( Carter, 2013; Elff, 2013; Ennser, 2010; Janda, 1982; Mair e Mudde, 1998). Segundo Carter (2013, p. 73), no caso específico dos partidos verdes europeus, é possível afirmar que “formam uma família partidária homogênea caracterizada por fortes posições políticas ambientais, libertárias e de esquerda”. No entanto, essa constatação não se aplica de forma generalizada a outros contextos. A análise detalhada de O’Neill (2019) considera que os partidos verdes ibéricos apresentam características distintas em relação às agremiações do mainstream europeu, tais como a formação tardia e devido a pressões da União Europeia, uma menor capacidade de competição eleitoral e, consequentemente, menos poder de negociação e de decisão quanto às propostas de políticas ambientais.

Conforme ressalta Guarnieri (2019), o recurso da classificação dos partidos em famílias partidárias não significa necessariamente uniformidade e homogeneização, tendo em vista as complexidades e as dinâmicas específicas de cada partido analisado. Mesmo sendo voltados e mobilizados para a causa ambiental, isso não significa que sejam todos iguais. Conforme vimos anteriormente, há especificidades e características peculiares, as quais exigiriam estudos igualmente mais aprofundados. Um exemplo que se destaca é o caso do PEN, que não se vincula diretamente às famílias partidárias de orientação ecológica, devido à sua identificação direta com o espectro ideológico de direita. Nesse sentido, há um distanciamento em relação à tradição de formação dos partidos verdes europeus (Carter, 2013; O’Neill, 2019). No caso dos demais partidos examinados, a identificação em termos de famílias partidárias é mais expressiva, apesar das diferenciações já apontadas (Guarnieri, 2019).

Por fim, convém frisar que, apesar das ressalvas acima apontadas, é possível enfatizar as contribuições preliminares do estudo aqui exposto para o exame da relação entre partidos políticos e movimentos sociais ambientais e as influências do ambientalismo na formação e atuação partidária (Alonso, Costa e Maciel, 2008). É necessário ressaltar ainda o papel das alianças eleitorais dos partidos ecológicos com outros partidos de esquerda e centro-esquerda nos dois países, como, por exemplo, nos casos do PV e do PEV (Teixeira, 2011). Tudo isso contribuiu para a ambientalização das campanhas eleitorais e para uma maior visibilidade da agenda verde no âmbito partidário (Barros, 2013; 2021). Esse fenómeno levou a uma ampla adesão dos partidos, especialmente ao ambientalismo liberal (Neto, 2006; Barros, 2018b). Também poderia ser de grande valia um aprofundamento analítico, tendo em conta a literatura comparada entre os partidos ecológicos europeus, norte-americanos e latino--americanos. Poderia, certamente, ser realizada uma vasta investigação, considerando que há muitas variáveis envolvidas, devido às distinções de contexto político e económico, sistemas partidários e perfis de eleitorado.

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Notas

1Entendemos que analisar e comparar os programas atuais de cada partido não seja suficiente para compreender de forma abrangente os paralelos e convergências entre Brasil e Portugal no que se refere à emergência dos partidos de orientação ecológica. Entretanto, pretendemos examinar pelo menos os aspetos formais que constam nos documentos. Outros aspetos serão problematizados a partir de informações históricas e contextuais, com base na pesquisa bibliográfica.

2O PEN mudou a sua denominação para Patriota, em 2017, mas manteve no seu programa a proposta ecológica original, além de incorporar outros temas, como segurança pública e combate à criminalidade.

3Aqui não temos o propósito de esmiuçar as variadas noções e nuances do conceito, posto que já existe vasta literatura sobre isso, como, por exemplo, Bilar (2017), Fonseca e Bursztyn (2009), Gomides e Silva (2009), Jacobi e Sinisgalli (2012), Santos e Bacci (2017).

4O PV foi fundado em 1986, na cidade do Rio de Janeiro, resultado da reunião de ex-exilados políticos, como ecologistas, artistas, intelectuais e ativistas do movimento antinuclear.

5É importante registar que um dos líderes do PS, Mário Soares, esteve exilado em Paris, o que o levou a ter contacto com as ideias ecológicas do PS francês (Schmidt, 2003).

6A íntegra do texto está disponível em: http://www.cds.pt/assets/programa-1993-.pdf.

7A íntegra do documento está disponível em: http://mpt.pt/wp-content/uploads/ESTATUTOS-MPT-ainda-em-vigor.pdf.

8A autora apresenta a AC como um conjunto de variadas técnicas de análise textual, sendo a análise categorial a que agrupa os conteúdos em grandes categorias temáticas, por afinidade semântica.

9Os dois estudos mencionados aplicam técnicas de análise categorial, uma das ferramentas da análise de conteúdo, para o exame de programas partidários, com o propósito de identificar as categorias temáticas mais relevantes nos documentos. Aqui, seguimos essa mesma lógica, ou seja, construir o elenco de categorias analíticas a partir desse tipo de análise, com as adaptações exigidas para o caso em estudo.

10Apesar da consistência metodológica do Comparative Manifesto Project, não foi possível usar as suas ferramentas, porque são voltadas mais para a obtenção de indicadores e índices relativos à posição dos programas partidários perante determinados temas, como migração, saúde, segurança pública etc. O foco, geralmente, é determinar a posição dos programas no espectro ideológico (direita, centro, esquerda) acerca desses temas (Jorge et al., 2018).

11Convém salientar que essas classificações não são estáticas nem excludentes, uma vez que um mesmo partido pode combinar matizes e nuances de diferentes perfis (Barros, 2017a; 2018b).

12Há ainda a dimensão ética (Bursztyn, 2001; Caporal e Costabeber, 2002), que se refere às relações de solidariedade entre as diferentes gerações, além da responsabilidade pelo futuro.

13A lista completa dos partidos brasileiros está disponível em: http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registrados-no-tse.

14A lista completa dos partidos portugueses está disponível em: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/partidos.html?impressao=1.

17O documento está disponível na íntegra em: http://www.pan.com.pt/quem-somos/valores/filosofia-e-missao.html.

18Convém ressaltar que a literatura regista uma grande diversidade de nomenclaturas e classificações dos discursos ambientais. Dryzek (1997) destaca quatro categorias: sobrevivencialismo, resolução de problemas, sustentabilidade e radicalismo verde. O socioambientalismo também ocupa um lugar de destaque, ao propor a superação das dicotomias existentes entre as questões sociais e ambientais, além de defender uma maior participação dos movimentos sociais na elaboração de políticas públicas ambientais (Santilli, 2005).

Recebido: 23 de Janeiro de 2021; Aceito: 14 de Dezembro de 2022

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