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Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia
versão impressa ISSN 0430-5027
Finisterra no.110 Lisboa abr. 2019
https://doi.org/10.18055/Finis13596
ARTIGO ORIGINAL
Acidentes de tráfego com pedestres e ciclistas: um estudo de caso do estado de Santa Catarina, Brasil
Traffic accidents with pedestrians and cyclists: a case study of the state of Santa Catarina, Brazil
Accidents de trafic avec piétons et cyclistes: un étude de cas de l'état de Santa Catarina, Brésil
Accidentes de tránsito con peatones y ciclistas: un estudio de caso del estado de Santa Catarina, Brasil
Vinicius Tischer1
1 Engenheiro Ambiental, Universidade do Vale do Itajaí (Univali), R. Uruguai, 458, Centro, Itajaí - SC, 88302-901, Itajaí, Brasil. E-mail: viniciustischer@hotmail.com
RESUMO
Os acidentes de transportes geram anualmente milhares de vítimas fatais e não-fatais, constituindo um grave problema de saúde pública no Brasil, causando, além dos impactos sociais, impactos na economia do país. Nota-se no Brasil poucos artigos que investiguem essa problemática, visando subsidiar medidas de redução destas taxas. Nesse sentido, o trabalho teve por objetivo avaliar a evolução dos acidentes de transportes envolvendo pedestres e ciclistas, tendo por referência registros municipais no Estado de Santa Catarina, Brasil. Esta avaliação se deu por meio dos registros de óbitos e de internações hospitalares disponibilizados pelo Ministério da Saúde. A avaliação resultou em mapas desenvolvidos em Sistema de Informação Geográfica contendo as taxas de acidentes, além de permitir a identificação da evolução dos registros de acidentes, considerando período de 20 anos. No geral, observa-se uma queda nas taxas de acidentes no Estado (vítimas fatais e nã o-fatais), para ciclistas e pedestres. Melhorias urbanas e de políticas públicas contribuíram diretamente para o fomento a transportes ativos, gerando um aumento no número de usuários ciclistas, e uma redução expressiva nos acidentes relativos ao aumento no número de usuários deste modal.
Palavras-chave: Acidentes de transportes; transporte ativo; ciclistas; pedestres; mobilidade urbana.
ABSTRACT
Transportation accidents generate thousands of fatal and nonfatal victims annually, constituting a serious public health problem in Brazil, causing, besides the social impacts, impacts on the country's economy. There are few articles in Brazil that investigate this problem, in order to subsidize strategies to reduce these rates. In this sense, the objective of this study was to evaluate the evolution of transport accidents involving pedestrians and cyclists, with reference to municipal records in the State of Santa Catarina, Brazil. This evaluation was based on records of deaths and hospital admissions, available by the Ministry of Health. The evaluation resulted in maps developed in Geographic Information System containing the accident rates, besides allowing the identification of the evolution of the accident records, considering period of 20 years. In general, there is a decrease in accident rates in the State (fatal and non-fatal) for cyclists and pedestrians. Urban improvements and public policies contributed directly to the promotion of active transportation, generating an increase in the number of cyclist users, and a significant reduction in accidents related to the increase in the number of users of this modal.
Keywords: Accidents of transport; active transport; cyclists; pedestrians; urban mobility.
RÉSUMÉ
Les accidents de transport génèrent des milliers de victimes mortelles et non mortelles chaque année, constituant un grave problème de santé publique au Bré sil, et entraînant des impacts sociaux, ainsi que des impacts sur l'économie du pays. Il y a peu d'articles au Brésil qui étudie ce problème, visant à subventionner des mesures pour réduire ces taux. En ce sens, l'objectif de cette étude est d'évaluer l'évolution des accidents de transport impliquant des piétons et des cyclistes, en ayant comme base les registres municipaux de l'État de Santa Catarina, Brésil. Cette évaluation a été basée sur des données de d écès et d'hospitalisations mis à disposition par le ministère de la Santé, et qui ont permis de développer une cartographie des taux d'accidents, ainsi que l'identification de l'évolution de ces taux sur une période de 20 ans. En général, il y a une décroissance des taux d'accidents dans l'État (victimes mortelles et non mortelles) pour les cyclistes et les piétons. Les améliorations apportées aux politiques urbaines et publiques ont directement contribué à la promotion du transport actif, générant une augmentation du nombre d’utilisateurs cyclistes et une réduction significative du nombre d’accidents liés à l ’augmentation du nombre d’utilisateurs de ce mode.
Mots clés: Accidents de transport; transport actif; cyclistes; pietons; mobilite urbaine.
RESUMEN
Los accidentes de transportes generan anualmente miles de víctimas fatales e no-fatales, constituyendo un problema grave de salud pública en Brasil, causando además de los impactos sociales, impactos en la economía del país. Se nota en Brasil pocos artículos que investiguen esta problemática, apuntando a subsidiar medidas de reducción de estas tasas. En este sentido, el trabajo tuvo por objetivo evaluar la evolución de los accidentes de transporte involucrando peatones y ciclistas, teniendo como referencia los registros municipales en el Estado de Santa Catarina, Brasil. Esta evaluación se dio por medio de los registros de defunción y de internamientos hospitalarios facilitados por el Ministerio de la Salud. La evaluación resultó en mapas desarrollados en Sistemas de Información Geográfica que contienen las tasas de accidentes, además de identificar la evoluci ón de los registros de accidentes, considerando un periodo de 20 años. En general, se observa una caída en las tasas de accidentes en el Estado (víctimas fatales y no-fatales), para ciclistas y peatones. Las mejoras urbanas y las políticas públicas contribuyeron directamente al fomento a los transportes activos, generando un aumento en el nú mero de usuarios ciclistas, y una reducción expresiva en los accidentes relativos al aumento en el número de usuarios de este modal.
Palabras claves: Accidentes de transportes; transporte activo; ciclistas; peatones; movilidad urbana.
I. INTRODUÇÃO
O elevado número de acidentes de transportes é um grave problema social no Mundo. Anualmente milhares de vítimas fatais são registradas e outras mais sofrem sequelas f ísicas e psicológicas. Os custos sociais decorrentes de acidentes de transportes são elevados para toda a sociedade, sendo apontado por Rocha e Shor (2013) como a principal causa de morte não natural, na atualidade em vários países do mundo.
Acidentes de transportes consistem nos efeitos mais graves do atual sistema do modelo de mobilidade e planejamento urbano. A OCDE (2015) aponta que cerca de 1,3 milhões de mortes acontecem anualmente vítimas de acidentes de trânsito, havendo um número maior ainda de internações, atendimentos em serviços de emergência e danos físicos e psicológicas.
Biffe et al. (2017) ressalta que o custo social resultante destes acidentes é desconsiderado do planejamento de cidades, e exercem prejuízos financeiros e sociais diretos e indiretos, que precisam ser considerados e expostos para a sociedade.
Ademais, acidentes de transportes constituem problema de saúde pública, evidenciado pelo elevado números de internações, sobrecarregando os serviços de aten ção às urgências, agravando e ao alto custo social e econômico para as pessoas, famílias, serviços de saúde e segurança (Biffe et al , 2017).
A atual condição do sistema de transportes favorece altas taxas de acidentes de transportes que acabam por vitimar geralmente usuários mais vulneráveis do sistema, como pedestres e ciclistas (Thynell, 2005; Mello & Portugal, 2007; Vasconcellos, Carvalho, & Pereira, 2011). Litman (2008; 2014) destacam que a precariedade do sistema de transporte público, principalmente em países emergentes potencializa os riscos de acidentes de trânsito, sendo verificada correlação do aumento de viagens de transporte público com a menor incidência de acidentes graves no trânsito. Segundo Gawryszewski, Coelho, Scarpelini, Jorge, & Rodrigues (2009), em conjunto com motociclistas, pedestres e ciclistas representam 72,4% do total dos casos registrados (motociclistas 29,8%, pedestres 24,1% e ciclistas 18,5%).
Scielsleski (1982) e Scalassara, Souza, e Soares (1998) alertam que os acidentes de trânsito não devem ser tratados como uma fatalidade. Estes ocorrem pela deficiência na conserva ção de veículos e infraestrutura, ou são provocados pelos pedestres e condutores e, as falhas humanas se sobrepõem aos demais determinantes dos acidentes.
Acidentes de transportes estão relacionados com questões de planejamento urbano, dessa forma, medidas na infraestrutura das cidades podem contribuir significativamente para a redu ção de acidentes de pedestres e ciclistas Wier, Weintrauba, Humphreys, Seto, e Bhatia (2009) e Herslund e Jørgensen (2003).
Uma cidade planejada para pedestres e ciclistas aumenta a segurança no deslocamento de pessoas, reduzindo as taxas de acidentes, melhorando o dinamismo econômico, atraindo investimentos e contribuindo para a qualificação de um turismo mais sustentável (Southworth, 2005).
De acordo com Litman (2014), a precariedade do sistema de transporte público potencializa os riscos de acidentes de trânsito. Verifica-se que quanto mais viagens de transporte pú blico, menor é a incidência de acidentes graves no trânsito. Nesse sentido, é interessante atentar para os dados da Pesquisa Mobilidade da População Urbana de 2017 (NTU, 2017), sendo apontado que, como decorrência de um transporte público pouco eficiente, é esperado que, à medida que a população melhore sua condi ção econômica, uma das prioridades destes, é aquisição de veículo particular, como substituto ao ônibus.
Biffe et al. (2017) ressalta que os principais fatores que contribuem para os níveis de acidentes e aumento do risco imputados aos usuários mais vulneráveis são: a falta de infraestrutura adequada para pedestres e ciclistas, planejamento de transportes priorizando o uso de carros, velocidades não compatíveis com a geometria das vias existentes e as baixas taxas de uso de transporte público.
Assim, segundo Bacchieri e Barros (2011) medidas para diminuir as ocorrências de acidentes de transportes envolvendo pedestres e ciclistas, devem passar pela reavaliação de pol íticas públicas que estimulam o transporte individual e a concepção de espaços públicos mais seguros. Com a promulgação da Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) (Lei nº 12587/2012) os transportes não motorizados e coletivos são tidos como prioridade. No entanto, medidas carecem de implementa ção urgente, haja vista as elevadas taxas de acidentes de transportes e os baixos investimentos em infraestrutura urbana para pedestres e ciclistas, como apontados pelo estudo Global Outlook on Walking and Cycling (UN Environment, 2016).
Todavia, além destas medidas, Biffe et al. (2017) e Bastos, Andrade, e Soares (2005) alertam para a importância de pesquisas que investiguem dados relacionados a estes acidentes para subsidiar tomadas de decisões e estratégias para a redução de impactos decorrentes do sistema de transportes.
Pesquisas que apresentem estes valores e apontem para possíveis soluções devem ter prioridade, devido aos acidentes de trânsito consistir um problema de saúde p ública, crônico à realidade brasileira, sendo fundamentais para o subsídio de estudos de segurança viária (Souza, Magalhaes, & Cavenaghi, 2008).
Com isso, o objetivo do trabalho é avaliar a evolução dos acidentes de transportes envolvendo pedestres e ciclistas, tendo por referência registros municipais no Estado de Santa Catarina, sul do Brasil. Os registros de acidentes foram obtidos por meio do sistema de dados estatísticos do Ministério da Saúde para acidentes de transportes envolvendo pedestres e ciclistas. Foram calculadas as taxas relativas à população dos municípios realizando-se discussões e relações acerca das maiores taxas, e evolução ao longo dos anos. Trabalhou-se com dados relativos a acidentes fatais e não-fatais (óbitos e internações), além de serem elaborados mapas tem áticos destes registros permitindo uma análise geográfica da distribuição dos municípios com as maiores taxas.
O trabalho visa suprir uma lacuna acerca de dados de acidentes de trânsito a nível municipal e estadual, em subsídio a diagnósticos mais precisos envolvendo as ví timas mais vulneráveis do trânsito (pedestres e ciclistas). Além disso, o estudo apresenta metodologia para a compilação destes dados por meio de representa ção cartográfica, indicadores e taxas a partir das quais poderão ser delineadas estratégias mais efetivas para a redução de acidentes e subsidiar estudos relacionados a impactos sociais e econômicos deste quadro.
Ademais, o desenvolvimento de mais estudos utilizando-se de técnicas de análise espacial poderá ser de grande importância para ações didáticas e de elucidação de questões relacionadas a melhoria da saúde pública (Wier et al., 2009). Sendo destacada a utilização de sistema de informa ção geográfica, que, segundo Santos, Rodrigues, Santos, e Caminiti (2016) enfatiza a necessidade de emprego de ferramentas para a avaliação dos impactos do de medidas urbanas e a segurança de pedestres, sendo desejável realizar análises espaciais e zoneamento e áreas de alta densidade de acidentes.
II. PROCEDIMENTOS DO MÉTODO
O presente estudo refere-se à pesquisa relacionada aos acidentes de transportes e mobilidade urbana, tendo por estudo de caso ocorrências no Estado de Santa Catarina, sendo aqui tratados especificamente, das vítimas de acidentes de trânsito mais vulneráveis: pedestres e ciclistas.
No estudo foram analisados todos os óbitos e morbidade (internações) relacionadas a acidentes de trânsito (causas externas) tendo por vítimas pedestres e ciclistas. Estes são descritos pelo Datasus como: Pedestres traumatizados por acidente de transportes (categorias V01 a V09 do CID 10) e Ciclistas traumatizados por acidente de transportes (categorias V10 a V19 do CID10). Todos os dados foram obtidos no sistema Datasus do Ministério da Saúde, disponível em MS (2017).
A desagregação geográfica do estudo comporta análise em nível municipal pertencentes ao Estado de Santa Catarina, o qual possui 295 municípios, sendo registradas internações por acidentes de transportes envolvendo pedestres e ciclistas em 240 e 229 municípios, respectivamente, assim como óbitos de pedestres e ciclistas por acidentes de transportes em 252 e 155 municípios, respectivamente.
Para os dados de óbito, foram utilizados registros por local de ocorrência e para internações foram utilizados registros por local de residência, uma vez que selecionando por local de internação poderia ocasionar em um maior desvio na inferência do local de ocorrência quando comparado com o local de residência, já que grande parte dos municípios do Estado é de pequeno porte (36,9% dos municípios possuem menos de 5 000 habitantes e 59% até 10 000 habitantes, segundo censo demogr áfico do IBGE, 2010), e não possuem uma estrutura médico-hospitalar adequada para tratamentos de lesões de gravidade severas, sendo utilizadas redes de saúde de munic ípios próximos.
A partir do levantamento destes dados foi possível organiza-los por ordem decrescente, permitindo avaliar as maiores e menores taxas. Dados de óbitos estão disponíveis de 1996 a 2015, e de internações, de 1998 a 2016, permitindo o desenvolvimento de análises históricas acerca dos acidentes de transportes, no período de registro do DATASUS.
A partir da obtenção dos registros de casos de óbitos e morbidade, foram calculadas taxas relativas (por 10 000 habitantes), visando a comparação entre cidades. Devido ao interesse de comparação de municípios no Estado, e pelo grande volume de dados, utilizou-se de Sistema de Informação Geográfica (SIG) para a geração de mapas temáticos e otimizar a didática e apresentação. A base cartográfica utilizada foi a do IBGE, pela qual a tabela de atributos foi integrada com a planilha de dados com números de acidentes por tipo, assim como com as taxas calculadas.
Os mapas foram desenvolvidos em nível de município considerando óbitos e internações de ciclistas e pedestres por 10 000 habitantes, para o último ano de análise (2015). Os dados populacionais foram baseados nas projeções realizadas pelo IBGE (2015). O cálculo das taxas considerou valores relativas a populaçã o, sendo utilizados valores padronizados de acidentes por 10 000 habitantes.
O artigo traz importante contribuição metodológica dissociando as estatísticas de acidentes por tipologia, sendo importante que os diferentes tipos de acidentes e v ítimas sejam estudados separadamente, para que se verifiquem tendências que possam respaldar questões de planejamento urbano e políticas públicas. Estas aná lises foram suplementadas com análise espacial, desagregando os dados em nível de município. Isso permite rápida comparação das unidades administrativas do território e permite o subsidio de ações para que tomadores de decisão, além de permitir o acompanhamento de resultados de políticas públicas, servindo de importante ferramenta de comunicação social para a população. Outro fator de relevância é a possibilidade de comparação das taxas entre outros municípios e estados, inclusive internacionalmente, haja vista a importância e pertinência destas enquanto indicadores.
III. RESULTADOS E DISCUSSÃO
1. Número de óbitos e morbidade
A série histórica de dados permitiu realizar a comparação para um horizonte de tempo de 20 anos sendo verificados uma diminuição geral no número de óbitos e um aumento no número de internações sem vítimas fatais. Entre 1996 e 2015 foram registradas 5 875 óbitos e 15 737 internaçõ es de pedestres e 1 940 óbitos e 5 363 internações de ciclistas em decorrência de acidentes de transportes no Estado de Santa Catarina, ou seja, uma média de aproximadamente 1 446 acidentes por ano. Considerando uma população aproximada de 6 milhões de habitantes no Estado, a taxa anual estaria próxima a 2,41 acidentes por 10 000 habitantes.
Com relação aos municípios, para acidentes envolvendo pedestres, no ano de 2015, as maiores taxas de óbitos foram registradas em Rio do Sul (norte) e São Jos é (litoral centro) com 1,05 e 0,79 vítimas por 10 000 habitantes para o ano de 2015, respectivamente. É importante constatar a redução considerável das taxas comparadas com a década anterior, onde se observavam taxas cerca de 100% superiores para diversos municípios, sendo os mais expressivos Biguaçu (2,21 óbitos por 10 000 habitantes) e Rio do Sul (1,72 óbitos por 10 000 habitantes).
Em contraste com a redução das taxas envolvendo de pedestres, os acidentes fatais de ciclistas aumentaram em praticamente todos os municípios. Nos maiores municípios do Estado destaca-se o crescimento em Joinville, Florianópolis, Itajaí, Jaraguá do Sul e Balneário Camboriú. No ano de 2015 os maiores índices foram registrados em Joinville com 17 óbitos de ciclistas, seguido de Jaraguá do Sul com 12 óbitos e Itajaí com 11 óbitos.
No entanto, quando a comparação é realizada considerando valores relativos a população do município, observa-se que as maiores taxas de óbitos n ão estão relacionadas com o porte do município. Merece destaque Jaraguá do Sul, localizado na região norte (0,79 óbitos por 10 000 habitantes) e Itaja í localizado no centro norte (0,55 óbitos por 10 000 habitantes (fig. 1).
Com relação ao número de acidentes com pedestres sem vítimas fatais, observam-se crescimento nos registros, como é o caso de Joinville, Criciúma, Jaragu á do Sul e Palhoça, e uma diminuição em Blumenau, Brusque, Tubarão, por exemplo. Merece destaque variações bruscas registradas em Florianópolis com registro de mais de 70 internações em 1998 e 2008 e queda para 5 no ano de 2015, e Chapecó passando de 80 internações no ano de 2008 para 37 interna ções em 2016. Em contrapartida, no ano de 1998 Joinville possuía 16 registros, passando para 47 no ano de 2008 e atingiu 52 no ano de 2016, consolidando-se como o município com o maior número de vítimas não-fatais.
A ocorrência de acidentes não fatais para pedestres não apresenta uma tendência bem definida, sendo verificado aumento em alguns municípios e diminuiçã o em outros. Já para ciclistas a tendência observada é de aumento geral no número de acidentes (fig. 2). Com relação às taxas observam-se redu ções expressivas em algumas cidades, com destaque para Chapecó (região oeste) com 5,09 para 1,85 vítimas por 10 000 habitantes, Florianópolis (região litoral centro) com 2,19 para 0,11 vítimas por 10 000 habitantes e Biguaçu (litoral centro) que passou de 3,21 para 0,63 vítimas por 10 000 habitantes Com rela ção às vítimas não fatais de acidentes envolvendo ciclistas, observa-se uma tendência geral de crescimento nos registros, com destaque para os municípios de Joinville e Lages, onde foram registrados 180 e 157 acidentes, respectivamente no ano de 2016, muito acima de outras cidades, como São Jose e Palhoça, as quais registraram 35 e 34 v ítimas, respectivamente. Alguns municípios, no entanto, registram tendências de decréscimo no número de acidentes, tais como Criciúma, Concordia e Gaspar.
Já com relação à taxa per capita, destaca-se o município de Lages (região central do estado) atingindo 9,18 vítimas por 10 000 habitantes em 2016, Joinville (região norte) passando de 0,29 para 2,30 vítimas por 10 000 habitantes entre 2008 e 2016. Dos municípios com maiores reduções destaca-se Chapecó, reduzindo de 1,85 para 0,3 vítimas por 10 000 habitantes, e Brusque que reduziu de 1,33 para 0,17 vítimas por 10 000 habitantes entre 2008 e 2016.
Os dados demonstram que mesmo com aumento da conscientização da integração de pedestres e ciclistas ao sistema de mobilidade urbana e de políticas públicas de segurança, ainda há uma necessidade premente de implementação de medidas de segurança rodoviária para uma redução mais efetiva do nú mero de acidentes. Isso pode ser verificado quando comparado com outros países. Nos EUA, por exemplo, as taxas de acidentes evolvendo ciclistas são de 0,025 e 1,54 vítimas por 10 000 habitantes para acidentes com óbitos e feridos, respectivamente, no ano de 2015 (NHTSA, 2017a). Para pedestres estes atingem 0,67 e 2,2 vítimas por 10 000 habitantes para óbitos e feridos, respectivamente (NHTSA, 2017b). Em Portugal acidentes com ciclistas atingem 0,016 e 1,83 vítimas por 10 000 habitantes e para pedestres 0,08 e 5 vítimas por 10 000 habitantes para óbitos e feridos, respectivamente (ANSR, 2016).
Analisando os valores de forma relativa (percentual) verifica-se que em municípios menores, pequenas variações no número de acidentes provocam grandes varia ções nas taxas calculadas. Além disso, muitos municípios estão sem acidentes há anos, não sendo possível o cálculo de taxas percentuais (divisão por zero).
De modo geral observam-se reduções consideráveis no número de registro de acidentes com óbitos, principalmente nas maiores cidades do Estado, e relacionado a óbitos de ciclistas. Criciúma, por exemplo, atingiu uma redução de 81% entre 1996-2015, Joinville, 69% e Florianópolis 58%. Em contrapartida, houve aumentos substanciais em Chapecó e Palhoça, em aumentos de 60% e 25%, respectivamente (quadro I).
Com relação aos óbitos de pedestres, as taxas sofreram maior variação, onde foram registrados aumentos na ordem de 1 000% nos municípios de Jaragu á do Sul e Itajaí entre 1996-2015. Outros municípios com um aumento elevado nas taxas foram Florianópolis e Rio do Sul, com aumento de cerca de 200% no período. Em contrapartida, houve diminuições em diversos municípios, sobretudo em municípios de porte médio (Biguaçu, Gaspar, Mafra, por exemplo). Em municípios de maior porte (acima de 200 000 habitantes) Itajaí foi o único que reduziu esta taxa no período (33%).
O número de acidentes sem vítimas (internações), no geral, observou-se um aumento considerável nas taxas. Internações de ciclistas sofreram aumento substancial em Içara e Camboriú (750% e 333%, respectivamente) entre 1998-2016. Destaca-se ainda o município de Florianópolis com aumento de 225% no período. No entanto, foram verificadas diminuições nos municípios de Itajaí e Lages (78%, 76%, respectivamente).
Os maiores aumentos, no período de 1998-2016, foram observados com dados relacionados aos acidentes de pedestres, com destaque para Joinville e Itajaí e São José (3 500%, 1 400% e 775%, respectivamente). Reduções foram observadas nos municípios e Criciúma e Chapecó (64% e 45%, respectivamente) no período. Nos munic ípios de porte médio, destacam-se os municípios de Itapema e Concórdia, com reduções de ambos de 60%.
2. Taxa de óbitos e morbidade
No Estado de Santa Catarina os municípios com as maiores taxas de óbitos de pedestres e ciclistas são municípios de pequeno porte. As maiores taxas de óbitos de pedestres foram registradas em Paulo Lopes, São Bernardinho e Vargeão, com 4,14, 3,42 e 2,59 óbitos por 10 000 habitantes, respectivamente (fig. 3). Para ciclistas, as maiores taxas foram registradas em Agrolândia, Sangão e São João do Sul, com taxas de 1,96, 1,76 e 1,31 óbitos por 10 000 habitantes (fig. 4). É importante, considerar a influência demográfica na manifestação destas taxas.
Se por um lado há forte relação do número de óbitos relacionados e o tamanho da cidade, também se verifica elevadas taxas em municípios pequenos, devido ao valor receber o efeito de cidades com baixa população, onde uma ocorrência passa a ter uma elevada taxa, proporcional a população.
O estado de Santa Catarina possui diversos municípios de pequeno porte. Segundo o censo 2010 do IBGE, 59 dos 293 municípios possuem uma população inferior a 10 000 habitantes. Isso faz com que, registros isolados de casos possam gerar correspondência de elevadas taxas proporcionais à população.
Considerando-se as vítimas fatais de pedestres por faixa populacional, nas maiores cidades (acima de 10 000 habitantes) as maiores taxas foram registradas em São José, Tubar ão e Lages com taxas de 0,79, 0,56 e 0,53 óbitos por 10 000 habitantes, respectivamente. Para ciclistas, as maiores taxas foram registradas em Jaraguá do Sul, Itajaí e Balneário Camboriú, com valores de 0,77, 0,55 e 0,34 óbitos por 10 000 habitantes, respectivamente.
Em municípios de porte intermediário (50-100 000 habitantes) as maiores taxas de mortalidade de pedestres foram registradas em Rio do Sul, Videira e Caçador, com taxas de 0,10, 0,58 e 0,52 óbitos por 10 000 habitantes, respectivamente. Para ciclistas, os maiores valores foram registrados em Rio do Sul, Navegantes e Içara, com taxas de 0,45, 0,30 e 0,16, respectivamente.
Outro fenômeno evidenciado é que muitos destes municípios possuem casos isolados de acidentes, sendo que alguns não registraram acidentes na maioria dos anos de registro. Com isso, é importante associar estes valores com a análise dos números absolutos de acidentes registrados, o que permite entender a magnitude destes impactos, avaliando a exist ência de problemas crônicos de acidentes.
As maiores taxas de internações por acidentes de transporte envolvendo pedestres foram registradas em Jardinópolis, Galvão e Irati, com 11,96, 10,56 e 9,88 interna ções por 10 000 habitantes, respectivamente (fig. 5). Para ciclistas, as maiores taxas foram registradas em Bocaina do Sul, São José do Cerrito e Painel, com taxas de 13,92, 11,86 e 11,68 internações por 10 000 habitantes (fig. 6).
Para ciclistas, as maiores taxas foram registradas em Lages, Joinville e Palhoça, com valores de 7,89, 2,10 e 1,93 óbitos por 10 000 habitantes, respectivamente. Em municí pios de porte intermediário (50-100 000 habitantes) as maiores taxas de internações de pedestres foram registradas em Biguaçu, Laguna e Videira, com taxas de 1,73, 1,24 e 0,97 internações por 10 000 habitantes, respectivamente. Para ciclistas, os maiores valores foram registrados em Biguaçu, São Bento do Sul e Camboriú, com taxas de 2,68, 1,47 e 1,18, respectivamente.
3. Estatísticas SC
Quando analisadas as taxas de óbitos agrupados no Estado, verificam-se tendências de decrescimento. No caso de óbitos de pedestres, a série histórica permite avaliar um decrescimento de cerca de 0,61 óbitos por 10 000 habitantes entre 1996 e 2015, passando de 0,78 para 0,31 óbitos por 10 000 habitantes (fig. 7). A pesar de existir pico de 0,91 óbitos por 10 000 habitantes no ano de 1997, a partir do ano de 1998 se observa uma tendência que se aproxima da linear, com taxas reduzindo progressivamente até o ano de 2015.
No caso de acidentes envolvendo ciclistas as variações são mais pronunciadas, atingindo um máximo de 0,25 óbitos por 10 000 habitantes em 2003, e apresentando tendência de decréscimo a partir de então, para 0,14 óbitos por 10 000 habitantes em 2015.
Avaliando-se as taxas de internação de vítimas de acidentes de transportes, observam-se tendências distintas entre as vítimas pedestres e ciclistas. Para acidentes envolvendo pedestres, há uma oscilação maior dos valores no início do século XXI, a partir de 2008 há aumentos relevantes nos acidentes, culminando em uma taxa de 3,28 internações por 10 000 habitantes no ano de 2012, e a partir de então, decréscimo para 0,86 internações por 10 000 habitantes, menor taxa do período analisado.
O histórico de dados de acidentes envolvendo ciclistas, no entanto, apresentou queda nas taxas de internações a partir de 1998 até o ano de 2008, e desde então possui tendência crescente, atingindo 1,06 internações por 10 000 habitantes no ano de 2015, maior valor nos dados avaliados (fig. 8).
Para melhor subsidiar as conclusões destas análises é interessante que dados de acidentes sejam observados em conjunto com dados de evolução dos deslocamentos a p é e por bicicleta. Segundo a pesquisa do Sistema de Informação da Mobilidade (ANTP, 2016) verifica-se um decréscimo no número de descolamentos a pé e um crescimento progressivo da participação da bicicleta na estrutura de deslocamentos no sistema de transportes em nível de Brasil. Dados do Sistema de Informação de Mobilidade Urbana mostram que o modal de transportes que mais cresceu em número de viagens entre 2003-2014 foi à bicicleta, representando em 2014 4,1% da divisão de modos de transporte, apresentando aumento nos últimos 12 anos de 5% ao ano, e 8% entre 2013-2014 (ANTP, 2016). Segundo Pereira e Prates (2017) esse crescimento pode ser interpretado como uma resposta às condições de tráfego com o predomínio de carros particulares e seus efeitos negativos associados.
Nesse sentido, observando-se a evolução nas taxas de divisão dos modos pode-se afirmar que com o aumento das viagens de bicicleta também se elevam as ocorrências de acidentes, devido, também, ao maior número de usuários. No entanto, quando se observa os valores na forma de taxa (acidentes por número de viagens ou por usuários) é comum verificar redução nas taxas de acidentes. Por exemplo, no Brasil no ano de 2003 foram registrados 1.263 acidentes envolvendo ciclistas (fatais e não fatais) e em 2014 1 357 acidentes (aumento de 7,4%). Ao mesmo tempo foi registrado um aumento no número de viagens de bicicleta (1,2% em 2003 e 2,6% em 2014), o que aponta para taxas de acidentes de 9 924 acidentes/bilhão de viagens no ano de 2003 e 4.052 acidentes/bilhão de viagens em 2014, correspondendo a uma redução de 59,2%.
Nesse sentido, enquanto está em curso um aumento na participação do uso de bicicleta nos deslocamentos no país, o número de acidentes não-fatais envolvendo ciclistas, igualmente, sofreu aumento vertiginoso a partir de 2013 (fig. 9). Isso reflete uma tendência apontada em estudos internacionais, onde o aumento de acidentes é justificado devido ao aumento no número de usuários, e dessa forma, mesmo havendo aumento nos números absolutos, há redução nas taxas relativas ao número de usuá rios.
Em contrapartida, as taxas de óbitos, vêm sofrendo redução podendo ser explicado devido a maiores investimentos em infraestrutura para transportes e deslocamento de bicicletas, e o início de uma cultura onde inclui o ciclista como participante do espaço urbano destinado aos deslocamentos. Ressalta-se que as taxas de acidentes são relativas a população do Estado de estudo de caso e não em relação ao número de usuários do modo de transporte (fig. 9).
Enquanto houve redução no número de acidentes com vítimas fatais (pedestres e ciclistas), o número de acidentes sem vítimas fatais apresentou uma maior varia ção ao longo dos anos, apresentando picos substanciais entre 2010-2012, seguido de um decréscimo. A participação das viagens a pé, no entanto, vem perdendo participação na distribuição dos modos, passando de cerca de 38,9% em 2003 para 36,5% no ano de 2014.
Nesse sentido, observa-se que a redução da taxa de óbitos pode também ser resultante da menor participação de pedestre nos deslocamentos, sendo importante que investigações aprofundadas sejam conduzidas para um melhor entendimento deste processo (fig. 10).
Na última década, esforços foram feitos por órgãos governamentais no sentido de reduzir o número de acidentes, com a realização de campanhas de conscientização e humanização do trânsito (e.g movimento Maio Amarelo), melhorias nas infraestruturas, segurança e de acessibilidade. Além disso, a partir da promulgação da PNMU em 2012, ações de promoção de transportes ativos estão sendo intensificadas, visando melhorar os índices de participação destes modos, principalmente da bicicleta.
Isso estimulou investimentos em ciclovias e na promoção destes transportes com cases de sucesso no Estado de estudo de caso (e.g município de Balneário Cambori ú). Este fenômeno nacional contribuiu diretamente para um aumento no número de viagens realizadas por bicicleta, tirando parte da participação das viagens de carros para viagens curtas urbanos. Esse aumento, ao mesmo tempo, contribuiu para elevar o número de acidentes registrados, sendo verificado um crescimento exponencial, principalmente acidentes n ão-fatais. Com isso, a interpretação destes dados deve ser feita em conjunto com dados de volume de deslocamento por modo de transporte, uma vez que, em alguns casos haveria uma redução expressiva nos acidentes relativas ao aumento no número de usuários deste modal.
IV. CONCLUSÃO
Avaliações relacionadas ao número de acidentes de transportes consistem em importantes informações para a gestão urbana de cidades. O entendimento hist órico da evolução de acidentes, por tipo de veículo e de vítima, permite estabelecer relações de causa e efeito além de servir de alerta para a sensibilização da população e tomadores de decisões sobre a implicação do processo de planejamento de cidades adotado atualmente.
O transporte ativo vem recuperando a importância que outrora possuía, sendo apontado como uma das estratégias para a melhoria da qualidade dos deslocamentos, reduçã o de impactos econômicos, sociais e ambientais. Por outro lado, pedestres e ciclistas representam a parcela mais vulnerável do sistema de mobilidade urbana, e o conhecimento preciso de aspectos que possam gerar gargalos para a ampliação destes deslocamentos torna-se cada vez mais imprescindível.
Por meio dos resultados da pesquisa verificou-se um panorama dos acidentes de transportes para o Estado de Santa Catarina, permitindo entender tendências relacionadas ao número de acidentes de transportes envolvendo pedestres e ciclistas. O acompanhamento dos acidentes de transportes é imprescindível para o desenvolvimento de políticas públicas de planejamento urbano e segurança pública com foco na redução de vitimados.
Destacam-se, no entanto, limitações no trabalho que servem de recomendação à estudos subsequentes. A escala do trabalho, por abranger um grande número de municípios, permite uma análise mais orientada a politicas estaduais, porém não excluindo o fator didático e de sensibilização à orienta ção de políticas públicas locais e regionais. Ademais, é desejável que o exercício comparativo seja expandido para outros estados e países visando entender os fatores de influência na redução das taxas de acidentes. Além disso, o trabalho poderá servir de referências para estudos mais especí ficos e aprofundados que possam apresentar correlações entre os principais fatores geradores de acidentes e as implicações das atuais taxas deslocamentos por tipo de modo de transporte utilizado.
AGRADECIMENTOS
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, Brasil.
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